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Afinal, o que é cidadania?

Breve análise sobre o que é cidadania.

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AFINAL, O QUE É CIDADANIA?

In memoriam á professora Ângela  Maria Randolpho Paiva

Resumo:

A busca pelo entendimento sobre a cidadania não é atual, porém somente na modernidade o conceito tomou corpo ao ser observado, investigado e analisado por diversas pensadoras e pensadores da teoria social. A proposta da disciplina eletiva “Sujeitos Coletivos, Cidadania e Democracia” oferecida pela professora do Departamento e Serviço Social Andréia Clapp Salvador,  foi a de trazer o debate sobre a Cidadania e a democracia por várias perspectivas e angulos de análise, como forma de ampliar o entendimento geral sobre os conceitos, que a primeira vista pode parecer para alguns algo dissociados, porém, segundo os teórico estudados nesta disciplina, são interligados. Dessa forma esse trabalho busca apresentar um breve ensaio sobre os “descobrimentos” e percepções que as discussões provocadas pela bibliografia sugerida “também” pela professora Andréia Clapp despertou nas alunas e alunos desta disciplina eletiva.

Palavras chaves: Cidadania; Democracia; Modernidade.

Notas sobre uma disciplina “fora a caixinha”.

A disciplina eletiva “Sujeitos Coletivos ,Cidadania e Democracia” , organizada pela professora Andréia Clapp Salvador, não é uma disciplina “comum” aos estudos clássicos do Serviço Social. De forma ousada, estratégica e inteligente, Clapp surpreende ao oferecer uma bibliografia diversa, que não necessariamente está “presa” à perspectiva marxista, mas que passeia por outras abordagens, tão profundas ao debate quanto a própria perspectiva Marxista , ampliando por assim dizer a capacidade de análise, de erudição e de compreensão dos conceitos por parte das alunas e alunos desta disciplina. Dessa forma temos da profundidade da “cartilha” de Bordenave, ao olhar essencialmente teórico Marxista de Coutinho, enquanto somos guiados por Clapp sobre os pontos que esses autores conversam, ou sobre os pontos em que eles não conversam.  Todo esse exercício intelectual é feito enquanto, com a brilhante condução de Clapp,  discutimos e descobrimos como esses conceitos se aplicam na nossa própria vida, na nossa comunidade, nas nossas pesquisas.

Inovadora, Clapp não propõem, à base da reprodução do “professor ensina, aluno aprende” nem à biografia da disciplina, nem à condução da disciplina.  Com uma orientação própria de quem domina a arte dos processos de ensino-aprendizagem, Clapp convida  as inscritas e inscritos na disciplina a participarem ativamente da construção da própria bibliografia da disciplina. A princípio isso pode parecer ao leitor algo confuso, fora de controle, já que largamente sabido que uma disciplina eletiva de curso de mestrado recebe alunas e alunos de diversas áreas do saber, e é exatamente aí que se situa o sucesso desta disciplina, na participação e no reconhecimento de que todos trazem consigo algo a contribuir.

Dentre os artigos sugeridos sobre Sujeitos Sociais, Cidadania e Democracia por Clapp e pelas alunas e alunos da disciplina destaco os textos que abordaram o conceito cidadania, dentro da perspectiva da modernidade, apresentando seus pontos de diálogo, suas diferentes perspectivas analíticas, e o que as discussões sobre eles despertou em todos que tiveram a oportunidade de experienciar essa disciplina. 

Mas afinal, o que é Cidadania?

Fonte: Dicionário Online de Português

O dicionário descreve o que a maioria das alunas e os alunos da disciplina “Sujeitos Sociais, Cidadania e Democracia” tinham de resposta imediata ao serem perguntados “o que é cidadania”, mas para Schwartz & Botelho (2012), Coutinho (1999) e Paiva (2017) - autores lidos e debatidos na disciplina aplicada - a cidadania não é algo estático, resumido em si, pois, como observam, está em contínuo processo de construção.

Schwartz & Botelho (2012) nos lembra que: 

Apesar do conceito de cidadania ser central na agenda intelectual e política das sociedades contemporâneas, e de cruzar a cada dia novas fronteiras,  ganhando mais espaço nas democracias representativas, não existe uma definição conceitual ou mesmo análises definitivas de sua história.

Os autores surpreendem ao abordar que os processos dinâmicos e historicos de construção da “ideia” de cidadania indicam que sua própria concepção  pressupõe processos de inclusão e exclusão dos sujeitos conforme observamos essas dinâmicas dentro de uma sociedade moderna e conflituosa.

Coutinho dialoga com as autoras ao afirmar que abordar:

o processo histórico-político, dinâmico e contraditório, de aprofundamento e universalização da cidadania na modernidade - processo contraditório, sujeito a avanços e recuos, porque no limite há um antagonismo estrutural entre a universalização da cidadania e a lógica de funcionamento do modo de produção capitalista. ( Coutinho, p 41,1999)

Em uma perspectiva que observa as diferenças como marcadores sociais, Paiva (2015) nos alerta a importância de olhar para o conceito da cidadania a partir da leitura da sociedade moderna brasileira. Para Paiva não é possível revisar o conceito de cidadania sem considerar os processos de inclusão e exclusão próprios de um país com relevantes e significativas marcas de desigualdade. A autora segue na discussão destacando o que ela chama de “dilemas da construção da cidadania em uma sociedade tão desigual quanto a brasileira”. Desse raciocínio Paiva (2015) destaca os seguintes aspectos:

a ambiguidade das relações raciais no Brasil, cuja marca de origem é a desigualdade concentrada na população negra; a importância do surgimento do movimento social negro profundamente ligado ao processo de redemocratização do país; e o processo que se deu para que fosse possível o surgimento das políticas de ação afirmativa para negros no ensino superior. (Paiva, p 128, 2015)

As contribuições Schwartz & Botelho (2012) e Paiva (2015) nos fizeram refletir sobre a ideia comum do que a modernidade acreditou que seria um cidadão. No Brasil, conforme apontam as contribuições de Paiva (2015), o pacto republicano excluiu grupos subalternos da cidadania.  As discussões com as companheiras e companheiros de disciplina refletir sobre como o próprio conceito de cidadania pode se apresentar a proponente de desigualdades quando o olhamos pelo contexto brasileiro. No pacto social republicano grupos subalternos, como mulheres e pessoas negras, não tinham acesso a cidadania.  Discutimos como as mulheres precisavam se organizar para exercer o direito cidadão de votar. E como os movimentos negros, na busca por reconhecimento,  impulsionam sua “inclusão” entre os sujeitos de direitos,os cidadãos. Recordamos como recentemente pessoas pobres, mulheres, crianças e desempregados não tinham seus direitos resguardados. digo, nem tinham acesso a esses direitos. Durante a ditadura as pessoas eram presas apenas por andarem nas ruas sem uma carteira de trabalho. Ou, se precisassem de assistência médica, não a poderia acessar sem o tal documento.  Lembramos durante nossas discussões de como ainda hoje a ideia de “cidadão de bem”, do cidadão “virtuoso ou não virtuoso” (Schwartz & Botelho, 2012), permeia o imaginário nacional. Ou seja, como nos provocaram as autoras, na busca pela crítica do sujeito universal moderno burguês (Paiva, 2015), fica a pergunta: o que a modernidade acredito que é o cidadão?  

A “não cidadania”: uma outra perspectiva

 ”O Paradigma da  Potência e a Pedagogia da Convivência”, artigo de  Fernandes, Souza & Barbosa (2018), veio com a proposta de desconstruir o lugar de onde estávamos olhando o conceito de cidadania.

Fernandes, Souza & Barbosa (2018) nos propõe olhar o conceito da cidadania pela perspectiva do “não cidadão”. Para os autores, os processos historicos depreciativos, inundados de violência simbólica, criaram o que eles chamam de “pedagogias da monstrualização” (Ibdem).  Para o sujeito ”monstrualizado” a cidadania, na sua base mais universal e burguesa,significa desigualdade.  Os autores teorizam que o conceito das “pedagogias da monstrualização” são “mecanismos ampliados de inculcação, os quais tambem conformam o habitus social”. “Habitus Social”. ”Cidadão “virtuoso”, cidadão “não virtuoso”. 

Ao apresentar como o “quadro atual que produz, reforça e dissemina discursos que legitimam a desumanização de grupos sociais inteiros, assim como intensificam o descarte de pessoas marcadas como diferentes ou antagônicas, os autores trazem para o debate uma leitura que propõe a perspectiva daqueles que estão fora do jogo social, e que compartilham as ”representações simbólicas estereotipadas” (Ibdem) que demarcam diferenças entre os “cidadãos de verdade” e os “não cidadãos”.

“Desprovidos”, “desfavorecidos”, “desprivilegiados”, “pauperizados”, “marginalizados”, “excluídos”, “carentes”., “Sujeitos de segunda classe”. Assim são classificados aqueles cujos os direitos civis, sociais e políticos não são reconhecidos. Exemplo de “tantas intervenções políticas e projetos de caridade que consideram assumir a “cidadania” de territórios onde não existe cidadania (Fernandes, Souza & Barbosa, 2018). Lembramos durante as discussões deste texto das ações “de cidadania” promovidas pelas gigantes Firjan e Globo  onde um dos serviços prestados era a emissão de documento de Identidade e Carteira de Trabalho. Na ditadura, o sujeito vadio era o homem que andava a noite sem carteira de trabalho. O “não cidadão”. O vagabundo. “Cancer urbano”. O “não virtuoso”.

Mesmo com esse cenario aterrador Fernandes, Souza & Barbosa (2018) nos apresentam um possível - para alguns utópico -  caminho de superação dessas diversidades, o reconhecimento das potencialidades.

Os autores descrevem o reconhecimento do “poder inventivo dos grupos marcados pela desigualdade social”. O reconhecimento como resposta contra as hegemônicas aqui é chamada pelos autores de Paradigma da potencia”. Eles abordam que: 

o Paradigma da Potência ilustra o poder inventivo das Periferias: manifesta-se em estratégias inovadoras de existência e soluções criativas na resolução de conflitos, assim como na produção cultural, no acúmulo de repertórios estéticos e em modos de trabalho centrados em convivências plurais.(Fernandes, Souza & Barbosa, 2018)

Dessa forma os autores consideram que a incorporação das “dimensões simbólica que continuadamente ignoradas por parâmetros hegemônicos” são de extrema importância para o acessos cidade e a participação sejam ampliados para esses sujeitos subalternizados e monstrualizados. Os autores entendem que através do reconhecimento dessas potencialidades é possível haver uma expansão da democracia e assim políticas , práticas e o exercício de direitos à cidade fora da logico burguesa.

Discutir a cidadania pela otica da “não cidadania” foi um exercício necessário para a vida academica das alunas e alunos da disciplina aplicada por Clapp. A leitura e debate desse texto tirou a todos nos do lugar e análise comum e  recorrente as leituras sobre o tema. Poder pensar a cidadania, a democracia e a modernidade pela perspectiva daqueles que nao esta “plenamente inscritos” como sujeitos de direitos expandiu nossa compreensão sobre o como se dá às relações sociais no brasil.  

Conclusão

Esse trabalho final de disciplina não teve a intenção em descrever minuciosamente o conceito de cidadania conforme os autores aqui anunciados apresentaram.  Aqui, o objetivo principal foi registrar a forma inteligente como Clapp promoveu o encontro desses autores com as alunas e os alunos da eletiva ““Sujeitos Sociais, Cidadania e Democracia”. As articulações, dialogos, percepções apresentadas nesse breve ensaio foram baseadas nas discussões em sala de aula, por tanto são coletivas. Apenas às registro como forma de coroação desse semestre tão precioso, em que uma turma repleta repleta de doutorandas e doutorandos recebeu esta mestranda que vos relata esse ensaio.

Os textos profundos, de debates tão profundos, mediados por Clapp foram, aula após aula, surpresas positivas, que instigavam e alimentavam nosso aporte intelectual. Aqui uma nota se faz importante: a condição, a mediação,impecavel e precisa da professora Andréia Calpp Salvador.

Clapp é uma docente semigual. Singular. Unica.

Ela nos provoca a participação ao propor relações entre a teoria e a prática - éisso não  écoisa fácil de se fazer. Atenta, sempre nos “trazia de volta” ao que dizem os conceitos. Provocadora, sempre nos propunha que articulassemos um diálogo dos autores lidos com nossos objetos de pesquisa.

Alguns de nós saíram com capitulos interios escritos com base nos conceitos distutidos em aula.Outro sairam com acrescidos de saber, de aporte teotico e inteletualpromovio pelos ricos e profundos debates. Todos saímos com um sentimento de gratidão e felicidade em ter cursado essa disciplina “fora da casinha”  e de termos sido agraciados com a companhia da professora Andréia Clapp Salvador, que nos mostrou que o espaço universitário pode ser um lugar de aquisição de saber sem as reproduções arcaicas e ultrapassadas de conteúdos engessados e hierarquia onde o professor ensina e o aluno aprende.

Referências

COUTINHO, Carlos Nelson. Cidadania e Modernidade. Perspectivas, São Paulo, 22: 41;59. 1999. 

FERNANDES, F., SILVA, S.J., BARBOSA, J. O.OParadigma da Pôtencia e a Pedagogia da Convivência. Revista Periferias, 1(1), 2018.

PAIVA, A. R. (2016). Cidadania, reconhecimento e ação afirmativa no ensino superior. Civitas: Revista De Ciências Sociais, 15(4), e127-e154. https://doi.org/10.15448/1984-7289.2015.4.23251

SCHWARCZ,  Lilia Moritz;  BOTELHO, André. Cidadania, um projeto em construção: minorias,  justiça e direitos. Claro Enigma,  1a.  São Paulo, 2012.

Como citar este artigo:

Moura, I O E. Afinal, o que é  Cidadania? Brasil Escola, Portal UOL, online, 2024.


Publicado por: Ivana de Oliveira Eugênio de Souza Moura

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