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POLÍTICAS PÚBLICAS E EDUCAÇÃO EM ANGRA DOS REIS: A QUESTÃO DO 1/3 DE CARGA HORÁRIA EXTRACLASSE PARA OS DOCENTES

Breve reflexão sobre a questão do 1/3 de carga horária extraclasse para os docentes no município de Angra dos Reis, no Rio de Janeiro.

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POLÍTICAS PÚBLICAS E EDUCAÇÃO EM ANGRA DOS REIS: A QUESTÃO DO 1/3 DE CARGA HORÁRIA EXTRACLASSE PARA OS DOCENTES[1][2]

RESUMO

A qualidade da educação brasileira sempre foi uma preocupação de toda a sociedade. Muitos estudos, leis, artigos e investimentos foram feitos e mesmo assim os resultados ainda estão aquém do desejado. Porém, uma reivindicação antiga dos profissionais da educação permanece, a garantia de 1/3 de carga horária para atividades extraclasse. Este trabalho tem como tema as políticas públicas e educação no município de Angra dos Reis: a questão do 1/3 de carga horária extraclasse para os docentes. O objetivo principal é refletir sobre como a implementação de um projeto de lei municipal garantindo esse direito contribuirá para a melhoria do trabalho docente. O método adotado será o qualitativo, pois a pesquisa terá um caráter exploratório, com foco nos aspectos subjetivos do objeto analisado, sendo a coleta de dados realizada por meio de pesquisa bibliográfica e documental, assim como a legislação federal, estadual e municipal que trate do tema. Embora existam várias questões a serem solucionadas antes da elaboração de um projeto de lei como esse, é possível implementá-lo, pois em outros sistemas de ensino isso já é uma realidade. O impacto desse projeto em outros municípios foi positivo, com melhorias para o planejamento pedagógico e o trabalho docente, sendo esse um exemplo para o município de Angra dos Reis.

Palavras-chave: 1/3 de carga horária; planejamento; qualidade de ensino.

ABSTRACT

The quality of Brazilian education has always been a concern for the whole of society. Many studies, laws, articles and investments have been made and even so the results are still less than desired. However, an old demand from education professionals remains, the guarantee of 1/3 of the extra-class workload. This paper has as its theme public policies and education in the city of Angra dos Reis: the issue of 1/3 extra-class workload for teachers. The main objective is to reflect on how the implementation of a municipal law project guaranteeing this right will contribute to the improvement of teaching work. The method adopted will be qualitative, since the research will have an exploratory character, focusing on the subjective aspects of the analyzed object, with data collection being carried out through bibliographic and documentary research, as well as federal, state and municipal legislation dealing with the theme. Although there are several issues to be solved before the elaboration of a bill like this, it is possible to implement it, because in other education systems this is already a reality. The impact of this project in other municipalities was positive, with improvements in pedagogical planning and teaching work, these being an example for the municipality of Angra dos Reis.

Key words: 1/3 workload; planning; teaching quality.

INTRODUÇÃO.

O 1/3 de carga horária para as atividades extraclasse é um direito e uma reivindicação antiga dos professores em Angra dos Reis, sendo importante a sua implementação para a melhoria da qualidade da educação e das condições do trabalho docente.

Sendo assim, essa pesquisa é importante por analisar o sistema de ensino do município de Angra dos Reis, a importância do 1/3 de carga horária para atividades extraclasses dos professores e como implementá-lo.

Para isso, foi realizada uma pesquisa sobre o município nos sites do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e no Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP). Foi necessária também uma revisão das legislações federal, estadual e municipal sobre o tema, assim como nos planos educacionais de cada nível da federação e na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal sobre os questionamentos feitos. Foram consultados também dois documentos da UNESCO, Educação: um tesouro a descobrir, de Jacques Delors (2003) e Planejamento para a melhoria da qualidade educativa: Materiais de apoio à formação em competências de inspetores da educação em Angola, de Marcelo Souto Simão (2012), buscando ressaltar a importância das atividades extraclasses como: planejamento, a formação continuada, a avaliação e as atividades fora da sala de aula. Buscou-se apoio também na obra de Camila Aparecida Prade Conte (2016), inserida nas Produções Didático-Pedagógicas do Paraná de 2016, volume II, cujo título é Os Desafios da Escola Pública Paranaense na Perspectiva do Professor PDE, possibilitando, assim, a observação de problemas educacionais em comum.

Devido a sua importância, a pesquisa busca refletir sobre como a implementação de um projeto de lei municipal garantindo 1/3 de carga horária para atividades extraclasse contribuirá para a melhoria do trabalho docente e como implementá-lo, mesmo com todas as dificuldades enfrentadas pelo município e os questionamentos jurídicos apresentados.

ANGRA DOS REIS: BREVE HISTÓRICO E SISTEMA DE ENSINO.

UM BREVE HISTÓRICO.

O município de Angra dos Reis situa-se no litoral sul do estado do Rio de Janeiro, em uma região conhecida como Costa Verde. Tem uma área aproximada de 813,210 km² e uma população estimada de 203.785 pessoas, com densidade demográfica de 205,45 habitante/km². Possui um produto interno bruto per capita (PIB per capita) de R$ 51.893,01 e um índice de desenvolvimento humano municipal (IDHM) de 0,724 (IBGE, 2010, 2011, 2019. s/p).

Antigo entreposto comercial, que fazia a ligação entre a Vila de São Vicente e a de São Sebastião do Rio de Janeiro, teve o seu primeiro povoado, localizado onde atualmente é o bairro da Vila Velha, elevado à categoria de vila em 1608. De 1617 a 1624, houve o abandono dessa localidade com a migração da população para onde é hoje o centro do município (ANGRA, 2015. p. 5).  

No ano de 1728, começa a construção do “caminho novo”, interligando o interior de São Paulo e de Minas Gerais a Angra dos Reis, impulsionando o desenvolvimento e o crescimento da região. Já o desenvolvimento urbano só aconteceu quando a Angra se tornou uma importante rota para o tráfico de escravos e para o escoamento do café do Vale do Paraíba, no século XIX. Foi também nesse período, em 1835, que a antiga vila foi elevada à categoria de cidade (ibidem, p. 6).

Já no século XX, vários eventos transformaram a cidade. A construção de um ramal ferroviário, ligando a estrada de ferro D. Pedro II ao porto de Angra dos Reis, a construção do Estaleiro BRASFELS, a abertura da Rodovia BR 101 (Rio-Santos), a construção da Usina Nuclear de Angra I e a construção do Terminal Petrolífero da Baía da Ilha Grande (TEBIG). Ressalta-se ainda que no ano de 1969 o município foi declarado área de segurança nacional, que durou até 1985, quando terminou o regime militar e iniciou-se a redemocratização do país.

Esses eventos também desencadearam uma série de problemas ambientais e disputas pela posse de terras e de moradias na cidade, problemas esses que não foram superados até hoje. Surgiram vários bairros sem planejamento, sendo feitas muitas construções em locais irregulares, como encostas e beiras de rios, que em períodos de fortes chuvas ocasionaram tragédias com vítimas fatais, como em 2003 e 2009.

SISTEMA DE ENSINO

O município de Angra dos Reis possui um total de 39.752 matrículas, sendo 6.048 na Educação Infantil, 21.740 no Ensino Fundamental, 6.195 no Ensino Médio, 1.547 na Educação Profissional Técnica de Nível Médio, 4.767 na Educação de Jovens e Adultos (EJA) e 910 na Educação Especial. Ressalta-se que o mesmo aluno pode estar em mais de uma categoria. A tabela abaixo possibilita uma visão mais detalhada das informações.

Tabela 1: total de matrículas da educação básica

Número de Matrículas da Educação Básica.

 

 

Etapa de Ensino.

Educação Infantil

Pré-escola

4.174

Creche

1.874

Total

6.048

Ensino Fundamental

Anos Iniciais

12.430

Anos Finais

9.310

Total

21.740

Ensino Médio

Propedêutico

5.650

Normal/Magistério

260

Técnico Integrado

285

Total

6.195

Educação Profissional Técnica de Nível Médio.

Associada ao Ensino Médio

545

Curso Técnico Concomitante

493

Curso Técnico Subsequente

509

Total

1.547

Educação de Jovens e Adultos.

Ensino Fundamental

2.273

Ensino Médio

2.494

Total

4.767

Educação Especial.

Classes comuns

865

Classes exclusivas

45

Total

910

Total

 

 

39.752

Fonte: Sinopse Estatística da Educação Básica 2019.

Com relação aos docentes, o município dispõe de um total de 1.761, sendo 372 da Educação Infantil, 1.182 do Ensino Fundamental, 448 do Ensino Médio, 171 da Educação Profissional Técnica de Nível Médio, 271 da Educação de Jovens e Adultos e 1.062 da Educação Especial. Ressalta-se que os docentes podem fazer parte de mais de uma categoria.

Tabela 2: Número de docentes da Educação Básica

Etapa de Ensino

Total

Educação Infantil

Ensino Fundamental

Ensino Médio

Educação Profissional Técnica de Nível Médio.

Educação de Jovens e Adultos.

Educação Especial.

 

372

1.182

448

171

217

1.062

1.761

Fonte: Sinopse Estatística da Educação Básica 2019.

O total de estabelecimentos de ensino no município é de 130, sendo 88 os que atendem a Educação Infantil, 106 o Ensino Fundamental, 27 o Ensino Médio, 7 a Educação Profissional Técnica de Nível Médio, 16 a Educação de Jovens e Adultos e 100 a Educação Especial. Lembrando que o mesmo estabelecimento pode oferecer mais de uma Etapa de Ensino e que não inclui estabelecimentos com turmas exclusivas de Atividade Complementar ou Atendimento Educacional Especializado (AEE).

Tabela 3: Total de estabelecimentos de ensino no município

Etapa de Ensino.

Total

Educação Infantil

Ensino Fundamental

Ensino Médio

Educação Profissional Técnica de Nível Médio.

Educação de Jovens e Adultos.

Educação Especial.

 

88

106

27

7

16

100

130

Fonte: Sinopse Estatística da Educação Básica 2019

Para finalizar, o total de turmas da Educação Básica de Angra dos Reis é de 1.818, sendo 376 as da Educação Infantil, 1.041 do Ensino Fundamental, 230 do Ensino Médio, 71 da Educação Profissional Técnica de Nível Médio, 119 da Educação de Jovens e Adultos e 609 da Educação Especial.

Tabela 4: total de turmas da educação básica

Total de Turmas da Educação Básica

 

 

Etapa de Ensino.

Educação Infantil

Pré-escola

260

Creche

116

Total

376

Ensino Fundamental

Anos Iniciais

672

Anos Finais

369

Total

1.041

Ensino Médio

Propedêutico

211

Normal/Magistério

8

Técnico Integrado

11

Total

230

Educação Profissional Técnica de Nível Médio.

Associada ao Ensino Médio

19

Curso Técnico Concomitante

23

Curso Técnico Subsequente

10

Curso Técnico Misto

19

Total

71

Educação de Jovens e Adultos.

Ensino Fundamental

76

Ensino Médio

43

Total

119

Educação Especial.

Classes comuns

601

Classes exclusivas

8

Total

609

Total

 

 

1.818

Fonte: Sinopse Estatística da Educação Básica 2019

1/3 DE CARGA HORÁRIA PARA PLANEJAMENTO: O QUE DIZ A LEGISLAÇÃO?

A Lei n° 9.394/96, lei de diretrizes e bases da educação, em seu artigo 67, inciso V, assegura aos profissionais da educação período reservado a atividades extraclasses, incluído na carga horária.

Art. 67. Os sistemas de ensino promoverão a valorização dos profissionais da educação, assegurando-lhes, inclusive nos termos dos estatutos e dos planos de carreira do magistério público:

(...)

V – período reservado a estudos, planejamento e avaliação, incluído na carga de trabalho; (BRASIL, 1996, online).

Já a lei n° 11.738, de 16 de julho de 2008, que institui o piso salarial profissional nacional para os profissionais do magistério público da educação básica, em seu artigo 2°, parágrafo 4, afirma que:

Art.(...)

§ 4° Na composição da jornada de trabalho, observar-se-á o limite máximo de 2/3 (dois terços) da carga horária para o desempenho das atividades de interação com os educandos (BRASIL, 2008, online).  

Ressalta-se ainda a constitucionalidade do trecho citado da lei do piso salarial através do julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4167/2008, no qual os estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Mato Grosso do Sul e Ceará e o Sindicato dos Servidores e Empregados Públicos do Município de Fortaleza (Sindifort) questionavam a constitucionalidade da lei do piso nacional dos profissionais do magistério. Segundo a ementa:

CONSTITUCIONAL. FINANCEIRO. PACTO FEDERATIVO E REPARTIÇÃO DE COMPETÊNCIA. PISO NACIONAL PARA OS PROFESSORES DA EDUCAÇÃO BÁSICA. CONCEITO DE PISO: VENCIMENTO OU REMUNERAÇÃO GLOBAL. RISCOS FINANCEIRO E ORÇAMENTÁRIO. JORNADA DE TRABALHO: FIXAÇÃO DO TEMPO MÍNIMO PARA DEDICAÇÃO A ATIVIDADES EXTRACLASSE EM 1/3 DA JORNADA. ARTS. 2º, §§ 1º E 4º, 3º, CAPUT, II E III E 8º, TODOS DA LEI 11.738/2008. CONSTITUCIONALIDADE. PERDA PARCIAL DE OBJETO.

3. É constitucional a norma geral federal que reserva o percentual mínimo de 1/3 da carga horária dos docentes da educação básica para dedicação às atividades extraclasse (BRASIL, 2011, online).

Citar-se-á também a Resolução nº 2/2009, do Conselho Nacional de Educação, através da Câmara de Educação Básica – CNE/CEB, no art. 4º, inc. VII, que reafirma a orientação quanto à necessidade da garantia de um período destinado a atividades extraclasses, também chamadas de horas-atividades. Assim...

Art. 4º As esferas da administração pública que oferecem alguma etapa da Educação Básica, em quaisquer de suas modalidades, devem instituir planos de carreira para todos os Publicada no DOU de 29/5/2009, Seção 1, p. 41 e 42. seus profissionais do magistério, e, eventualmente, aos demais profissionais da educação, conforme disposto no § 2º do artigo 2º desta Resolução, dentro dos seguintes princípios:

VII - jornada de trabalho preferencialmente em tempo integral de, no máximo, 40 (quarenta) horas semanais, tendo sempre presente a ampliação paulatina da parte da jornada destinada às atividades de preparação de aulas, avaliação da produção dos alunos, reuniões escolares, contatos com a comunidade e formação continuada, assegurando-se, no mínimo, os percentuais da jornada que já vêm sendo destinados para estas finalidades pelos diferentes sistemas de ensino, de acordo com os respectivos projetos político-pedagógicos (BRASIL, 2009, p. 1-2).

Além da legislação federal e do julgamento da suprema corte garantindo a constitucionalidade da lei, a legislação municipal, através da lei n° 3.357, de 02 de julho de 2015, que institui o Plano Municipal de Educação, em sua meta 14, que busca...

Assegurar a valorização dos profissionais da educação básica das redes públicas, garantindo condições dignas de trabalho, autonomia pedagógica e equiparação do seu rendimento base aos demais profissionais públicos municipais com escolaridade equivalente, de forma imediata.

Estratégia

14.9. Garantir 1/3 da carga horária para planejamento, conforme lei nº 11782/2008, a todos os profissionais do magistério da rede municipal de ensino, imediatamente após a aprovação deste PME (ANGRA DOS REIS, 2015, p. 24).

Portanto, juridicamente, o caminho está pavimentado para a garantia desse importante direito dos profissionais da educação, faltando somente a sua implementação por meio de projeto de lei municipal.

AS ATIVIDADES EXTRACLASSE: O PLANEJAMENTO, A AVALIAÇÃO, A FORMAÇÃO CONTINUADA E AS ATIVIDADES FORA DA SALA DE AULA

O trabalho docente vai muito além de ministrar aulas nas escolas para os alunos. Ele inclui uma série de atividades intra e extraclasses como: planejamentos das aulas, dos bimestres, semestres, anual; elaboração e debate do Projeto Político-Pedagógico e de muitas outras atividades; escolha e aplicação do sistema de avaliação, das provas e sua correção; a formação continuada, seja por meio de cursos, palestras, seminários, pós-graduações ou outros estudos; atividades fora da sala de aula ou da escola, como passeios, visitas programadas, entre outras; pesquisas; reuniões; debates; e muitas outras atividades. Aqui serão abordadas somente quatro. O planejamento, a avaliação, a formação continuada e as atividades com alunos fora da sala de aula.

O planejamento tem muitas definições, desde elaborar planos, estratégias, elaborar objetivos e meios de alcançá-los, coordenar e articular recursos para atingir determinados resultados, entre vários outros. Contudo, Souto et al. (2012, p. 6) nos oferecem uma bela definição de planejamento:

Planejar não se reduz à elaboração de planos formais, mas a uma reflexão sobre as possibilidades de ação frente a um determinado cenário. Não se trata de uma reflexão contemplativa ou de uma análise desinteressada da realidade. O ator que planeja nutre a intenção de intervir sobre a realidade que o rodeia, para atingir um objetivo específico. Essa reflexão pode ser mais ou menos sistemática e pode ou não culminar na elaboração de um documento. Contudo, não é a existência de um documento físico denominado “plano” o que caracteriza a presença do planejamento. Se por um lado o documento “plano” é um dos registros materiais deste processo, o que define a presença do planejamento é o desenvolvimento de uma prática reflexiva que orienta a ação. Neste sentido, o planejamento se apresenta como uma alternativa à improvisação.

Portanto, o planejamento dos docentes exige tempo e dedicação, muito além do preenchimento de um documento físico denominado plano de aula, embora ele também seja importante. Além de ser uma reflexão sobre a ação, o planejamento tem como foco evitar a improvisação, melhorando substancialmente a qualidade do ensino e do trabalho docente como um todo.

Já o processo de avaliação é um dos mais importantes na educação e não se resume a somente elaborar provas e corrigi-las para diagnosticar o desempenho dos alunos ou se os objetivos estão sendo alcançados. Se não for bem elaborada, a avaliação pode se tornar um elemento a mais no fracasso escolar e também um mecanismo de exclusão social. Assim sendo, é de extrema importância que se dedique tempo e estudos sobre esse processo, reduzindo o fracasso escolar e a exclusão social, garantindo assim o pleno desenvolvimento dos alunos e de suas aptidões.

A formação continuada dos profissionais da educação e principalmente dos docentes é imprescindível para a melhoria da qualidade da educação. Segundo Delors (2003, p. 159-160), “De uma maneira geral, a qualidade de ensino é determinada tanto ou mais pela formação contínua dos professores do que pela sua formação inicial.” Além de melhorar a qualidade do ensino, a formação continuada valoriza o trabalho dos docentes, aumenta sua motivação e permite que estes reflitam sobre as suas próprias práticas. Da LDB aos planos de educação, sejam eles nacionais, estaduais ou municipais, é uma das metas dos sistemas de ensino garanti-la.

Outras atividades importantes para o processo de ensino e aprendizagem, que requerem tempo, dedicação e planejamento dos professores, são as atividades fora da sala de aula e da unidade escolar. Sabe-se que a educação não ocorre somente nas salas de aula, nas leituras e exercícios dos livros didáticos ou das explicações dos conteúdos. É necessário que os alunos tenham outras experiências para a aprendizagem ocorrer. Desse modo, visitas a museus, exposições, outras unidades de ensino, parques, centros de pesquisas, ou ainda atividades na escola, mas fora da sala de aula como oficinas, exposições ou jogos interclasses, exigem dos professores um bom planejamento, que necessita de tempo para ser elaborado.

Percebe-se assim que os professores necessitam de tempo para a realização de várias atividades que não estejam em contato com os alunos, mas que são importantes para o processo de ensino e aprendizagem dos mesmos. Sem o 1/3 de carga horária para essas e outras atividades, muitos professores e professoras acabam levando trabalho para casa, sobrecarregando-os(as), ou fazendo às pressas entre um intervalo e outro entre as aulas e sem os recursos necessários. Desse modo, a qualidade das atividades fica prejudicada e o processo de ensino e aprendizagem como um todo também. Qualquer sistema de ensino que queira melhorar a qualidade da educação precisa melhorar as condições de trabalho dos docentes e incluir tempo remunerado para os mesmos poderem realizar outras atividades inerentes ao seu trabalho além das aulas.

POR QUE E COMO O MUNICÍPIO DEVERIA IMPLEMENTÁ-LO?

Como visto anteriormente, são vários os benefícios e vantagens para o trabalho dos professores em dedicar um tempo para as atividades extraclasses, ou “horas-atividade”. Ao proporcionar melhores condições de trabalho aos docentes, a qualidade da educação melhora substancialmente. Ressalta-se que a qualidade da educação é um princípio que está na Constituição, na LDB, nos Planos de Educação dos entes federados, em instituições internacionais e no discurso de especialistas.

Uma mudança dessas só pode ser feita mediante um projeto de lei municipal, por iniciativa do chefe do executivo, como expresso na Lei Municipal n° 1.857, de 05 de outubro de 2007, que institui o plano de cargos, carreiras e remuneração do magistério da rede municipal de ensino de Angra dos Reis. Em seu Art. 24:

Art. 24. A política de Cargos, Carreiras e Remuneração de todos os servidores do Magistério compete ao Executivo Municipal.

Parágrafo único. A gestão de Cargos, Carreiras e Remuneração, mencionada no caput deste artigo, compete à Secretaria Municipal de Administração juntamente com a Secretaria Municipal de Educação, Ciência, Tecnologia e Inovação – SEC (ANGRA DOS REIS, 2007, online).

Um dos principais desafios à implantação de um projeto de lei dessa natureza é a despesa pública que ela criará, devido à contratação de mais profissionais para a garantia de 800 horas de carga horária dos estudantes estabelecidas pela LDB. Analisando ambos os quadros abaixo, percebe-se que o total de turmas é superior ao total de profissionais disponíveis, exceto nos anos finais. Mas nessa etapa do ensino fundamental são necessários 9 professores por turma, ou seja, também há carências de docentes. Se a rede ainda não supriu as suas carências de professores, fica ainda mais difícil destinar 1/3 da carga horária dos atuais docentes para atividades extraclasse.   

Tabela 5: total de turmas da educação básica

Total de Turmas da Educação Básica

 

 

Etapa de Ensino.

Educação Infantil

Pré-escola

260

Creche

116

Total

376

Ensino Fundamental

Anos Iniciais

672

Anos Finais

369

Total

1.041

Total

 

 

1.417

Fonte: Sinopse Estatística da Educação Básica 2019.

Tabela 6: números de docentes da educação básica

Número de docentes da Educação Básica.

 

 

Etapa de Ensino.

Educação Infantil

Pré-escola

225

Creche

157

Total

372

Ensino Fundamental

Anos Iniciais

577

Anos Finais

663

Total

1.182

Total

 

 

1.554

Fonte: Sinopse Estatística da Educação Básica 2019.

Embora o desafio seja grande, isso não impede que o município implemente essa meta que estipulou em seu plano de educação. Através de concurso para novas contratações ou aumento da carga horária dos docentes para 40 horas, como feito em outros municípios, pode ser um possível caminho. Outro seria a implantação gradativa nas etapas da educação básica. Primeiro seria garantido aos professores da Educação Infantil. Depois aos professores do Ensino Fundamental, anos iniciais e por último para os anos finais, conforme a disponibilidade das receitas, que se dariam através do remanejamento no orçamento municipal ou de negociações com os próprios profissionais da educação, onde estes renunciariam a aumentos salariais para que essa verba fosse utilizada para novas contratações. Desse modo, suas condições de trabalho melhorariam, a qualidade da educação aumentaria e a população teria garantido o seu direito a uma educação de qualidade. Seja como for, esse tema deverá ser amplamente debatido, e não esquecido, por todos os envolvidos, na busca de uma solução conjunta.

CONCLUSÕES

O sistema de ensino de Angra dos Reis é amplo e complexo, o que requer bastante planejamento para a implementação de qualquer mudança, principalmente uma tão ampla como a garantia de 1/3 de carga horária para atividades extraclasse. Mesmo assim, esse desafio deve ser superado, pois a qualidade da educação e a melhoria das condições de trabalho dos professores são princípios da educação expressos nas constituições federal e estadual, na lei orgânica do município, assim como na LDB, na lei do piso e em todos os planos de educação dos entes federados.

Os impactos nos orçamentos devem ser resolvidos através de ampla negociação com todos os envolvidos, visto que os orçamentos públicos são uma construção coletiva que expressa as prioridades de um grupo social. Considerando-se que a educação deve ser sempre uma prioridade, por estar relacionada tanto com o presente quanto com o futuro que se quer alcançar, não deveria ser um tema postergado.

Desde 1996, com a LDB, passando pela Lei do Piso em 2008, e pelo PME de 2015, percebe-se a necessidade, por parte dos formuladores de políticas públicas, do tempo para professores realizarem múltiplas atividades, além das aulas ministradas. Atividades essas muito importantes, tanto para os docentes, quanto para os alunos e para a sociedade em geral, pois garantir as melhorias de condições do trabalho docente deve ser um objetivo a ser perseguido por toda a sociedade e deve ser sempre uma prioridade.

Embora questões econômicas devam ser observadas nos orçamentos públicos, devido aos princípios que devem ser respeitados, como os expressos na Lei de Responsabilidade Fiscal, essas devem estar a favor da Educação e não contra. O dinheiro aplicado na educação não deve ser visto como gasto, mas como investimento de longo prazo, necessário em uma sociedade tão desigual como a nossa. É preciso garantir condições de inclusão dos mais pobres. Meios para que estes possam vencer as condições de pobreza e miséria extrema. E a educação, com certeza, é um meio bastante eficiente de garantir essas condições.

REFERÊNCIAS

ANGRA DOS REIS. Lei nº 1.857, de 05 de outubro de 2007. Plano de Cargos, Carreiras e Remuneração do Magistério da Rede Municipal de Ensino de Angra dos Reis. Angra dos Reis–RJ: 2015. Disponível em: <https://www.angra.rj.gov.br/downloads/STDP/PCCR/LEI%201857-2007.pdf>. Acesso em: 05 abr. 2020.

ANGRA DOS REIS. Lei nº 3.357, de 02 de julho de 2015. Plano Municipal de Educação. Angra dos Reis–RJ, 2015. Disponível em: <https://www.angra.rj.gov.br/downloads/SEC/cme/Plano%20Municipal%20de%20Educacao.pdf>. Acesso em: 02 abr. 2020. 

BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília–DF: Presidência da República, [2016]. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm>. Acesso em: 04 abr. 2020.  

______. INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE). População estimada: IBGE, Diretoria de Pesquisas, Coordenação de População e Indicadores Sociais, Estimativas da população residente com data de referência 1⁠ºde julho de 2019. Disponível em: <https://cidades.ibge.gov.br/brasil/rj/angra-dos-reis/panorama>. Acesso em: 02 abr. 2020.

______. INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE) População no último censo: IBGE, Censo Demográfico 2010. Disponível em: <https://cidades.ibge.gov.br/brasil/rj/angra-dos-reis/panorama>. Acesso em: 02 abr. 2020.

______. INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE) Densidade demográfica: IBGE, Censo Demográfico 2010, Área territorial brasileira. Rio de Janeiro: IBGE, 2011. Disponível em: <https://cidades.ibge.gov.br/brasil/rj/angra-dos-reis/panorama>. Acesso em: 02 abr. 2020.

______. MEC. RESOLUÇÃO Nº 2, DE 28 DE MAIO DE 2009. Brasília: INEP, 2009. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/dmdocuments/resolucao_cne_ceb002_2009.pdf>. Acesso em: 05 abr. 2020.
______. MEC. INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS ANÍSIO TEIXEIRA. Sinopse Estatística da Educação Básica 2019. Brasília: INEP, 2020. Disponível em: <http://download.inep.gov.br/informacoes_estatisticas/sinopses_estatisticas/sinopses_educacao_basica/sinopse_estatistica_educacao_basica_2019.zip>. Acesso em: 03 de abr. de 2020.

______. Lei Federal nº 9394 de 20 de dezembro de 1996Lei de Diretrizes e Bases da Educação. Brasília–DF: Presidência da República, [1996]. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9394.htm>. Acesso em: 03 abr. 2020.

______. Lei Federal nº 11.738 de 16 de julho de 2008 Lei do Piso Salarial do Magistério. Brasília–DF: Presidência da República, [2008]. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2008/lei/l11738.htm>. Acesso em: 03 abr. 2020.

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DENILSON PEREIRA FURTADO[3]


[1] DOI: 10.5281/zenodo.15713450

[2] Artigo de comunicação científica submetido como requisito para a aprovação em 7° Seminário de Práticas Educativas.

[3] Bacharel em Administração e Licenciando em Pedagogia.


Publicado por: Denilson Pereira Furtado Máximo

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