Excessos e faltas
Reflexão sobre como os excessos também são nocivos e atentam não apenas contra nossa integridade física, mas também psicológica.O texto publicado foi encaminhado por um usuário do site por meio do canal colaborativo Meu Artigo. Brasil Escola não se responsabiliza pelo conteúdo do artigo publicado, que é de total responsabilidade do autor . Para acessar os textos produzidos pelo site, acesse: https://www.brasilescola.com.
Reflexão parece ser o percurso que leva à libertação, e num mundo oscilante entre as absolutas faltas e os mais escandalosos excessos, onde (com razão) falamos e escrevemos muito sobre as carências de todas as ordens, com pessoas e animais vivendo nas ruas, sem comida ou segurança minimamente garantidora da vida, é importante uma reflexão sobre como os excessos também são nocivos e atentam não apenas contra nossa integridade física, mas também psicológica.
Os exageros nas drogas, lícitas ou ilícitas, na alimentação, são bem conhecidos em suas nefastas consequências, a superabundância cobra seu preço em todos os comportamentos desequilibrados, que alteram a percepção da realidade, da sensibilidade ou mesmo da espiritualidade, que a princípio parecem bons, mas podem levar à exorbitância e até à morte.
A demasiada agressividade, redundando em violências de todas as ordens, que permeiam inclusive certos discursos incompatíveis com suas práticas, com a perigosa característica, segundo Hannah Arendt, de que “os fins correm o perigo de serem dominados pelos meios, que justificam e que são necessários para alcança-los”. Em especial no Brasil, onde o Estado jamais conseguiu em nenhum momento de sua história o monopólio do uso da força, ou o acesso de toda população ao auxílio judicial na resolução dos conflitos, nem demonstrou capacidade de administrar plenamente a justiça; profundamente imerso em crises políticas e com quase ausência de participação popular nas grandes decisões, a falta de vivência democrática não permite a plena expansão do civismo – este se transforma em discurso vazio – e tendemos a perder toda a esperança no presente, postergando tudo para um possível futuro. Que talvez nunca chegue.
Mas, possivelmente, seja no âmbito pessoal a maior perda provocada pelos desregramentos, nas faltas e nos excessos: a ausência total de escolhas provocada pela pobreza, seja ela material ou psíquica, traz miséria e muitas vezes a violência, o crime ou a falta de dignidade humana; a fartura material pode trazer insensibilidade para com o sofrimento alheio, o despropósito de opções também não é produtivo, pesquisas realizadas mostram claramente que em presença de excessivas alternativas, somos levados à inaptidão de seleção, que nos imobiliza.
Até companhias de seguros já sabem que overdose de oferta induz a não efetivação de contratos, pois, se houver muitas empresas com características distintas, a dificuldade de triagem da melhor delas, variável caso a caso pelo perfil e idade de cada cliente, prejudicará a todas. Em muitos países parece estar-se enfrentando crises até em relacionamentos amorosos, o casamento monogâmico está sendo contestado em seu princípio, em grande parte por que muitas pessoas temem perder outras opções de vida ao adota-lo; nas relações saudáveis é raro haver perda, estas costumam vir naturalmente daquelas que podem ser caracterizadas como tóxicas, que fracassam em qualquer modalidade.
No entanto, é nas escolas, espelho de nossa sociedade, onde mais observamos ausências: de qualidade, de recursos, de visibilidade para seus problemas, de um plano efetivo de requalificação para seus professores, de respeito ao trabalho desenvolvido, de consciência de sua importância; e excessos: de discursos políticos em época de eleição, de propostas maravilhosas jamais implantadas, de estudantes repletos de problemas familiares e algumas vezes envolvidos com drogas e outras mazelas, de docentes desestimulados com a abundância de retóricas que substituem a ação.
Como já afirmou o pedagogo Antonio Nóvoa “o excesso dos discursos esconde a pobreza das práticas políticas”.
Por Wanda Camargo – educadora e assessora da presidência do Complexo de Ensino Superior do Brasil – UniBrasil.
Publicado por: Wanda Camargo
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