AS EXIGÊNCIAS DA METODOLOGIA BILÍNGUE X AS ATIVIDADES PROPOSTAS EM UM LIVRO DIDÁTICO CUJA METODOLOGIA É DITA BILÍNGUE
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RESUMO
O objeto de estudo dessa pesquisa são as atividades e recursos dos livros PES Junior Book four (2022) e PES Workbook (2022) do 4º ano do Ensino Fundamental, tendo em vista o domínio satisfatório das quatro habilidades linguísticas para Listening, Reading, Writing e Speaking em um contexto bilingue. Esta é uma pesquisa do tipo bibliográfica e teve como objetivo principal investigar como o material aborda o ensino para o desenvolvimento das quatro habilidades (Listening, Reading, Writing e Speaking) para o efetivo domínio da língua inglesa. Este estudo está embasado nas teorias de Krashen (1982), Dulay (1982), Ellis (1987) e Brown (2006). Os resultados demonstram que os materiais PES Junior Book four (2022) e PES Workbook (2022) abordam, de maneira tímida, as quatro habilidades em língua inglesa e, por isso, não possibilitam uma comunicação fluente e efetiva em língua inglesa por meio de qualquer uma das quatro habilidades.
Palavras chave: Bilinguismo; materiais; habilidades em língua inglesa.
Muito se usa, atualmente, os termos bilíngue e bilinguismo. Mas, o que estes termos significam de fato? Grosjean (2013) apresenta múltiplos significados, conforme lê-se abaixo.
As palavras “bilingue” e “bilinguismo” possuem muitos significados dependendo do contexto a qual são utilizadas. Podem incluir o conhecimento e uso de duas ou mais línguas, a apresentação de informação em duas línguas, a necessidade de duas ou mais línguas, o reconhecimento de duas ou mais línguas e assim por diante (GROSJEAN, 2013, p.5).
O ensino bilíngue trata de uma abordagem surgida a partir da premissa de que o aprendizado da língua está intrinsecamente ligado a vivência cotidiana e intermitente no idioma alvo, como maneira de adaptar-se à realidade a fim de simular um ambiente onde nativos desenvolvem suas atividades rotineiramente. Nesta perspectiva, professores e equipes de apoio devem trabalhar no sentido maximizar o uso da língua estrangeira – doravante L2 - e minimizam o uso da língua materna – doravante L1 -, provocando, assim, uma gama de estímulos sensoriais no aluno, condicionando-o a manter sua comunicação nos limites dos objetivos pedagógicos.
Ainda nessa perspectiva, e com base nas pesquisas do linguista Krashen (1995) e a teoria de aprendizado-aquisição do idioma, levando-se em conta o aprendizado como um processo consciente e sistemático, e a aquisição como um processo inconsciente e natural, aprender uma nova língua requer planejamento, onde o aluno será exposto aos assuntos de maneira gradativa e o aprofundamento vai se dando de acordo com seu progresso. Nesse viés, observa-se que o processo de aprendizagem se inicia com assuntos básicos, progressivamente, para somente depois usar-se o que foi aprendido para alcançar novas habilidades, enquanto o processo de aquisição ocorre naturalmente frente a exposição do aprendiz à língua.
No entanto, nesse contexto imersivo, é vital que as mensagens possuam significado conforme afirmam Krashen e Terrell (1995, p 55): “Language is best taught when it is being used to transmit messages, not when it is explicit taught for conscious learning” [1]. Ou seja, para Krashen e Terrell (1995), a língua será melhor ensinada quando esta for utilizada com a finalidade para a qual foi criada, isto é, para comunicação - desde que essa comunicação tenha sentido e significado para os aprendizes. Ainda nessa perspectiva, faz-se necessário que todo o processo de aprendizado permita que o aluno desenvolva seu conhecimento de maneira que este não seja afetado por qualquer tipo de ansiedade ou pressão pois, somente assim, a interferência do “filtro afetivo”, ou seja, a resistência causada por desconfortos, medos e inseguranças, não afetará a aquisição da língua.
De acordo as ideias de Krashen (1995), “ensinar diálogos não é equivalente a prover o estímulo para a aquisição da língua, mas, sim, um substituto de curto prazo”. Ou seja, o desenvolvimento da oralidade do estudante não será construído com base na repetição de diálogos e expressões. Porém, essa metodologia contribuirá para o desenvolvimento de vocabulário e estruturas que proverá, ao falante, melhor desenvoltura oral, sobretudo, alunos que necessitam expressar-se oralmente antes dessa habilidade emergir do que é escutado e lido, de acordo com a input hypothesis de Krashen que afirma que:
Falar não é necessariamente essencial para a aquisição da língua. Nós adquirimos a língua a partir do que escutamos (ou lemos) e entendemos e não a partir do que falamos. Para a Input Hypothesis, a melhor forma de ensinar a falar é focando na escuta (e leitura) e a fluência na fala irá emergir sozinha (KRASHEN E TERRELL, 1995, p. 56).
As observações de Krashen (1995) apontam para a importância da necessidade do contato entre o estudante e a língua alvo, sempre tendo em foco que esse contato deve ser feito através da compreensão do aprendiz, e que qualquer exposição incompreensível à língua, ou seja, que não demonstre significados para o ouvinte, será invalidada e não trará resultados.
O estudo consciente e sistemático da língua, normalmente realizado através da gramática, deve agir como suporte para a aquisição, e não deve tomar maior parte do processo de aprendizado, pois para Krashen e Terrell (1995, p.58), a longo prazo, os alunos irão demonstrar maior precisão gramatical, caso o foco inicial seja em habilidades comunicativas. Os alunos devem, então, utilizar a consciência gramatical quando há tempo disponível, e o foco deve ser as estruturas - isso normalmente ocorre na escrita, pois é durante a produção textual que há uma análise mais detalhada da língua e suas estruturas.
Dentro do conceito de aprendizagem-aquisição, observa-se que o ensino bilingue produz um ambiente onde o aluno é exposto à língua alvo, de maneira sistêmica e imersiva, bem como há a introdução de métodos auxiliares como: Imagens, áudios, ludicidade, etc. Assim, é construído o proposto na input hyothesis, ou seja, a sala de aula é a fonte de absorção para alunos de línguas, um lugar onde eles podem obter estímulos necessários para a aquisição da língua (KRASHEN e TERRELL,1995, p. 59). No entanto, alguns desses estímulos serão incompreensíveis para parte da sala, já que, alguns alunos não dispõem do vocabulário necessário.
Segundo Dulay (1982), crianças com idade inferior a 10 anos, que tem contato suficiente com a língua alvo, quase sempre alcançam proficiência ao nível nativo. O ensino de inglês nas fases iniciais da vida estudantil se mostra promissor devido à capacidade de absorção e aquisição da língua que as crianças possuem. Nesse período, é de extrema necessidade que os alunos estejam expostos à língua de maneira que consigam entender os estímulos orais, visuais e escritos a fim de formarem uma sólida base na língua, com compreensão das mensagens passadas e conhecimento prévio para uso de sentenças de maior complexidade.
Durante os primeiros estágios da vida estudantil, o uso de técnicas lúdicas e a postura amigável diante do aluno promovem um ambiente de estudo favorável ao desenvolvimento da língua. Krashen e Terrell (1995, p.60) afirmam que “a exigência de um estímulo do interesse do aluno contribuirá na construção de uma sala de aula relaxada”. Isto quer dizer que é importante compreender que a qualidade do estudo é diretamente proporcional à motivação do estudante, bem como inversamente proporcional à sua ansiedade e desconforto, fatores esses que fortalecem o “filtro afetivo”, ou seja, bloqueiam a absorção e aprendizado da língua.
Gardner e Lambert (1959 apud Dulay 1982, p.47) apontam as diferenças entre a motivação integrativa e instrumental - motivações que predominam no desejo de aprendizado de uma língua. Motivação integrativa é o desejo de aprender uma língua com a finalidade de participar da vida da comunidade falante, enquanto a motivação instrumental consiste no interesse em aprender a nova língua em decorrência do uso prático da língua, como conseguir um emprego.
A maneira como o aluno encara os progressos e frustrações durante seu processo de aprendizado é afetada pelos seus objetivos e expectativas com o que é ensinado. Dessa maneira, o aluno não só deve ser motivado, mas também deve estar ciente de suas metas e usos reais do idioma.
O filtro afetivo consiste na parte do sistema de processamento interno que subconscientemente abriga a linguagem adquirida pelo o que os psicólogos chamam de afeição: os motivos do aluno: motivos, necessidades, atitudes e estado emocional. O filtro é a primeira e principal barreira que a língua encontra antes de ser processada (DULAY, 1982, p. 46).
O filtro afetivo pode ser um grande empecilho na aprendizagem e aquisição da língua, pois pode surgir tanto por conta de fatores fora de sala, como por fatores internos à sala de aula. A utilização da língua em sala deve, não somente obedecer ao aprendizado ou comunicação, mas deve ser um objeto de motivação e que, por vezes, seja, para o aluno, algo inovador e divertido, que traga novas experiencias e visões diferentes de sua realidade. Em um ambiente imersivo, ou seja, onde o aluno se vê rodeado pela língua alvo, a exposição incessante à linguagem incompreensível poderá causar estresse e aversão à língua, pois logo o aluno se sentirá frustrado por não entender grande parte do que é falado em sala. É de extrema importância que em sala que a maneira como os assuntos são expostos obedeçam às capacidades dos alunos, principalmente em métodos imersivos como Natural approach e o Método direto.
O estudo da língua por meio do método direto tem grandes semelhanças com o bilinguismo. A exposição de conteúdo é situacional, o seja, tudo o que é estudado gira em torno de algo que se encaixa em uma situação real, como, por exemplo, viagens ou supermercado. O ponto principal nesses modos é a “aversão” à tradução, pois é necessário que o estudante conecte os significados à sua respectiva maneira oralizada na língua alvo e, progressivamente, seja capaz de aplicar a autocorreção, ou seja, o falante terá noções gramaticais que o permitirá analisar o que é oralizado. De acordo com Larsen e Anderson (2011), os professores que se utilizam desse método acreditam que seus estudantes precisam associar diretamente significados com a língua alvo. Nesse ponto, é fundamental o papel do professor e sua postura diante do aluno.
De que forma o livro PES Junior Book 4 (2022) propõe o desenvolvimento da habilidade oral em inglês (speaking)
O livro apresenta apenas falas que não constituem um diálogo com profundidade e não aponta ideias de como o aluno pode dar continuidade a conversa e constituir um diálogo fluído, também não conta com imagens que podem ser norteadoras na execução dessa atividade e que chamem a atenção dos alunos para a prática.
Dessa maneira, as atividade não apresenta as propostas necessárias para que o aluno realmente desenvolva a fala como sugere Michelon (2003, p.5) ao dizer que o processo de desenvolvimento da fala em segunda língua precisa estar no mínimo parcialmente ligada ao contexto de fala da língua alvo e acontece quando há exposição direta à língua alvo ou quando há a interação com a L2 (segunda língua) de forma frequente (DÕRNYEI, 1990, apud MICHELON, 2003, p.5).
Sendo assim, há pouquíssima informação que, de fato, leve ao desenvolvimento da fala, pois é evidente que não há a preocupação em trazer o estudante para o contexto real da língua alvo, já que não estimula o aluno a continuar o diálogo e não apresenta ao aluno uma situação da vida real onde esse diálogo poderia ocorrer, nem tampouco oferece imagens ou áudios que o ajude a imaginar essa situação.
Levando-se em conta a fala de Michelon (DÕRNYEI, 1990, apud MICHELON, 2003, p.5), a atividade proposta no material não tem grande impacto na aquisição da língua, e é de pouco proveito para o desenvolvimento visto que essa prática está condicionada ao uso de material extra que traga maiores recursos.
De que forma o livro PES Junior Book 4 propõe o desenvolvimento da habilidade escuta (listening)
O material trata da habilidade de escuta por meio de diálogos que são reproduzidos em sala. Nas atividades, os alunos não possuem uma transcrição do que é falado no áudio. Sendo assim, eles são expostos apenas à forma verbalizada das palavras, e devem escutar atentamente ao que é reproduzido. Considerando que algumas palavras não fazem parte do vocabulário dos alunos e que não há transcrições do diálogo, o entendimento é prejudicado e, por mais que os alunos escutem, não haverá compreensão da mensagem que os participantes passam.
Brown (2006, p. 5) afirma que “podemos ajudar os estudantes a escutar mais efetivamente, caso dediquemos certo tempo ensinando-os sobre o propósito da atividade. Uma maneira de fazê-lo é utilizando um diálogo simples”. Escutar um diálogo de maneira aleatória não trará grandes resultados para os alunos, pois se estes não possuem motivação ou mesmo compreensão da atividade, logo não empreenderão esforços para manter o nível de atenção. É necessário que haja não somente uma introdução ao que será trabalhado, mas também motivações para encorajar o aluno à atenção e à apropriação do mesmo para uso posterior em situações que simulem a realidade de uso.
De que forma o livro PES Junior Book 4 propõe o desenvolvimento da habilidade a escrita (writing)
A competência da escrita é trabalhada no livro através da produção de frases. Os alunos devem completar as frases de acordo com os exemplos expostos, dando continuidade ao vocabulário trabalhado em classe. Os exercícios consistem em uma atividade de baixa complexidade, que exige, apenas, associação - já que alguns oferecem imagens para auxiliar o aluno.
A pesquisa realizada por Tsang (1996), confirmou que ”a exposição de estudantes à leitura demonstrou ganhos significantes em conteúdo e uso da língua e aprimoramento na escrita como um todo” (OSHCHEPKOVA; ALKHALDI, 2018, p.175, tradução nossa). Isso quer dizer que quanto mais o aluno lê – nesse caso, em inglês – mais aptidão ele alcançará na produção escrita.
Assim, para que o aluno tenha uma boa desenvoltura na escrita faz-se necessário que este seja exposto a leituras que ampliem vocabulário, estruturas gramaticais e compreensão de ideias.
De que forma o livro PES Junior Book 4 propõe o desenvolvimento da habilidade da leitura (reading)
A leitura é trabalhada no livro através de pequenos textos que abordam os conteúdos estudados na unidade. Eles contam, também, com imagens que contextualizam a discussão proposta para facilitar a compreensão dos alunos. As estruturas gramaticais apresentadas nos textos são de baixa complexidade e contam com palavras que fazem parte da própria unidade de estudo.
“A leitura expande o horizonte de uma pessoa e fornece uma boa gama de conhecimento. [...] Ler a respeito de um tópico na língua estrangeira também ajudará a melhorar o vocabulário em determinado assunto mais rapidamente” (OSHCHEPKOVA; ALKHALDI, 2018, p.177, tradução nossa[2]). A leitura desempenha papel fundamental na aquisição da L2, pois expõe o estudante a uma gama de estruturas e vocabulários pertencentes a determinado assunto. Assim, faz-se necessário que o aluno seja exposto regularmente a textos sobre assuntos variados e que sejam desafiados a compreenderem textos cada vez mais complexos, na medida do nível do conhecimento da língua inglesa em que estão, a fim de que alcance a maturidade de leitor na língua.
CONCLUSÃO
Esta pesquisa foi realizada com a finalidade de investigar se o material didático Junior Book 4 garante que os alunos de uma escola, que se intitula bilingue, sejam expostos de maneira sistemática às quatro habilidades para desenvolverem competências para ler, escrever, ouvir e falar, bem em língua inglesa, isto é, como se estivessem em aprendizado real de comunicação em inglês.
Também foi possível constatar que o desenvolvimento da habilidade da fala não é trabalhado de maneira aprofundada; da mesma forma os alunos não são incentivados a conversarem entre si, exercitando uma comunicação de maneira autônoma em inglês, mas são expostos à atividades de repetições, ou se utilizando de diálogos e fala extremamente curtos, que não simulam uma situação real.
Verificou-se, ainda, após a análise dos dados, que a escrita é abordada sutilmente, e as atividades propostas não constituem práticas que visem o desenvolvimento da escrita independente, para que o aluno seja capaz de expressar suas ideias e/ou fatos de sua vivência proficientemente. As atividades normalmente sugerem exercícios em que o aluno deve completar lacunas ou repetir o que está exposto em exemplos. Sendo assim, as atividades não promovem a prática da escrita adequada em inglês.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALKAHADI, Ali; OSHCHEPKOVA, Tamara. HOW TO DEVELOP WRITING SKILLS IN A FOREIGN LANGUAGE? European Journal of Foreign Language Teaching Kuwait. Volume 3. Disponível em: www.oapub.org/edu.
BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Brasília: MEC, 2017.
BROWN, Steven. Teaching Listening. New York: Cambridge Press, 2006
DULAY, Heide; BURT, Marina; KRASHEN, Stephen. Language two, Nova York. Oxford University Press. 1982.
ELLIS, Rod. Second language acquisition, Hong kong. Wyvern Typesetting. 1997.
Larsen-Freeman, D., & Anderson, M.. Techniques and Principles in Language Teaching. Oxford: OUP. 2011
MICHELON, Dorildes. A motivação na aprendizagem da língua inglesa. Revista Língua&Literatura, 2003.
PEARSON EDUCATION. Junior Book 4. England. Pearson Education Limited. 2022.
PEARSON EDUCATION. Junior Book 4 (Workbook). England. Pearson Education Limited. 2022.
Tsang, M.C. (1996) Financial Reform of Basic Education in China. Economics of Education Review, 15, 423-444. http://dx.doi.org/10.1016/S0272-7757(96)00016-7
[1] A língua é melhor ensinada quando é usada a fim de transmitir mensagens e não quando é explicitamente ensinada por aprendizagem consciente (KRASHEN & TERRELL, 1995, p 55, tradução nossa).
[2] “Reading broadens a person’s horizon and gives a huge amount of knowledge. [..] Read about a topic in the foreign language, also, will, rapidly, improve the vocabulary in a matter” (OSHCHEPKOVA; ALKHALDI, 2018, p.177, tradução nossa[2]).
Publicado por: Daniel Sotero Fortes Carvalho
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