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RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO E ERRO DE DIAGNÓSTICO

Análise sobre a responsabilidade civil do médico no âmbito do direito pátrio, tendo-se à lume as possíveis consequências advindas de um diagnóstico erroneamente proferido.

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Introdução

Assim como todos os demais profissionais, o médico, como executor de um ofício, detém de responsabilidades para com seus pacientes, sendo, evidentemente, sujeito de prerrogativas.

Isso porque o médico, no exercício de seu labor, coloca em prática os conhecimentos amealhados ao longo de sua formação, a fim de praticar o bem, melhorar, por certo, a condição de seus pacientes.

Quando se vai ao médico, se espera que sair com respostas, plano de tratamentos, um novo caminho para o que se pretende ver concretizado no futuro para se alcançar a benesse almejada.

A correta nomeação da enfermidade que acomete o paciente permite que esse seja tratado adequadamente, sendo de extrema importância a delimitação daquilo que se busca combater.

Desta feita, o presente artigo abordará a responsabilidade civil do médico no âmbito do direito pátrio, tendo-se à lume as possíveis consequências advindas de um diagnóstico erroneamente proferido.

Para tanto, se utilizará a metodologia da revisão bibliográfica, pelo método dedutivo, mediante a análise de doutrinas, decisões judiciais e artigos acadêmicos sobre o tema, a fiz de propiciar uma rica reflexão e análise ao leitor.

Assim, passar-se-á à análise da responsabilidade civil no campo do ordenamento jurídico brasileiro, seguido da reflexão acerca do direito médico e, após isso, tratar-se-á sobre o erro de diagnóstico e suas repercussões.

Ao fim, espera-se concluir que a despeito das firulas jurídicas, no próprio Código de Ética de sua profissão o direito do médico em pode equivocar-se se encontra mitigado, correndo grave risco de, no futuro, com a responsabilização exacerbada de profissionais por erro de diagnóstico, esses possuírem medo de exercer sua profissão de maneira adequada, tendo-se em vista que cada vez mais são descobertas novas doenças, tornando cada vez mais difícil a nomeação assertiva de determinada doença.

Da Responsabilidade Civil no Ordenamento Jurídico Brasileiro

Tendo à lume que toda a atuação humana gera, por certo, uma responsabilidade, tratou o legislador de cuidar da modalidade de danos civil, dispondo ao ordenamento jurídica certas incumbências àquele que pratica ato ilícito, prejudicando outrem.

Nessa toada, dissertam Pablo StolzeGagliano e Rodolfo Pamplona Filho sobre o que vem a ser responsabilidade em sua doutrina, reverberando o seguinte:

A palavra “responsabilidade” tem sua origem no verbo latino respondere, significando a obrigação que alguém tem de assumir com as consequências jurídicas de sua atividade, contendo, ainda, a raiz latina de spondeo, fórmula através da qual se vinculava, no direito romano, o devedor nos contratos verbais.

A acepção que se faz de responsabilidade, portanto, está ligada ao surgimento de uma obrigação derivada, ou seja, um dever jurídico sucessivo, em função da ocorrência de um fato jurídico lato sensu.

O respaldo de tal obrigação, no campo jurídico, está no princípio fundamental da “proibição de ofender”, ou seja, a ideia de que a ninguém se deve lesar — a máxima neminemlaedere, de Ulpiano— limite objetivo da liberdade individual em uma sociedade civilizada.

Como sabemos, o direito positivo congrega as regras necessárias para a convivência social, punindotodo aquele que, infringindo-as, cause lesão aos interesses jurídicos por si tutelados[2].

De fato, a responsabilidade está ligada à defesa de cada indivíduo, e essa existe para que haja a conformação da convivência social, sem que, em havendolesão de bens jurídicos por si tutelados, restem impunes os famigerados infratores responsáveis.

Indique-se, todavia, que a responsabilidade civil difere da penal, vez que se busca punir com seus dispositivos legais, violações ao direito das Gentes, inerente à seara particular, enquanto o Penal, que diz respeito ao Direito Público, e lesa o direito da sociedade como um todo, e não apenas ao direito de um particular.

Sobre a diferença entre as responsabilidades Civil e Penal, leciona Carlos Roberto Gonçalves[3] que:

Quando coincidem, a responsabilidade penal e a responsabilidade civil proporcionam as respectivas ações, isto é, as formas de se fazerem efetivas: uma, exercível pela sociedade; outra, pela vítima; uma, tendente à punição; outra, à reparação – a ação civil aí sofre, em larga proporção, a influência da ação penal.

Venosa conta que “o estudo da responsabilidade civil é parte integrante do direito obrigacional, sendo a reparaçãodos danos algo sucessivo à transgressão de uma obrigação, dever jurídico ou direito”[4]. Assim sendo, a responsabilidade civil por determinados atos está intrinsecamente ligada à obrigação que cabe aos indivíduos como membros de uma mesma sociedade, sujeitos, assim, de direitos e obrigações.

Deveras, alguns dos princípios da responsabilidade civil são: Princípio da dignidade humana, princípio da solidariedade, princípio da prevenção e princípio da reparação integral.

No que concerne à responsabilidade civil no âmbito pátrio, esta pode ser perquirida com ou sem a existência de culpa, contudo, sempre irá pressupor a presença do dano e do nexo causal entre o ato e a ocorrência deste, qual seja: o ato ilícito.

A responsabilidade de reparação de dano está principalmente explicito ao Código Civil nos artigos 186 e 927:

CC, Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

CC, Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.

Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.

Ou seja, a responsabilidade por determinado ato, no campo civilista, necessita do ato ilícito, sendo que esse pode consistir tanto em violação de direito, quanto em dano causado aos demais membros da sociedade.

Em contraposição a isso, entendem Nelson Rosenvald e Felipe Braga Neto[5]:

Atos lícitos também geram responsabilidade civil?
A resposta é afirmativa. Embora muito menos comum, os atos lícitos, conformes ao direito, podem, da mesma maneira, em certos casos, empenhar dever de reparação. Os atos em estado de necessidade, por exemplo, embora lícitos (Código Civil, art. 188, II), podem ensejar responsabilidade civil.

O dano é efetivamente a mácula sofrida pela vítima da ação ou da omissão, e este deve efetivamente ser algo que causa prejuízo à parte que o sofre. Sem o dano, não há lógica em responsabilizar a pessoa do ato, vez que inexistirá, no caso, o resultado que legitima a existência da responsabilidade civil.

Necessário indicar que, além do ato ilícito, deve-se investigar qual foi a ação que o causou. Assim, deve ser possível a verificação correta do nexo causal.

O nexo causal consiste no liame entre a ação e o resultado, com a efetivação de determinado prejuízo. Ou seja, há a verificação de concorrência de determinado ato para aquele resultado.

Melhor dizendo, se constatar-se que se aquela ação não tivesse sido realizada o dano não existiria, comprovada estará, por certo, o nexo causal entre o dano e o resultado.

Em que pese falar-se em ação, o dano pode ser causado também pela inércia, ou seja, pela omissão, a inação em determinada situação. Isso é bem evidenciado ao artigo 186 do Diploma Material Civilista, que reverbera a frase omissão voluntária.

A culpa, por seu turno, pode ou não existir, vez que determinadas pessoas, pela posição que ocupam na relação jurídica, por vezes deverão ser responsabilizadas, independentemente da indicação de sua culpa no resultado danoso.

Não há na responsabilidade civil a necessidade de que a pessoa tenha a vontade de lesionar a vítima, não se verificando o dolo, mas somente a culpa.

De fato, o dolo é desnecessário, vez que o ato pode ter sido praticado por negligência, ou, ainda, imprudência.

Como aduz o doutrinador Ricardo Fiuza acerca do ato ilícito, esse é praticado “em desacordo com a ordem jurídica, violando direito subjetivo individual[...]”[6], este causa a mácula patrimonial ou moral a outrem, originando, assim, o dever de repará-lo.

O jurista também afere ser necessário a perquirição de alguns elementos essenciais para que se configure o ato ilícito:

Para que se configure o ato ilícito, será imprescindível que haja: a) fato lesivo voluntário, causado pelo agente, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência;

b) ocorrência de um dano patrimonial e/ou moral, sendo que pela Súmula 37 do Superior Tribunal de Justiça serão cumuláveis as indenizações por dano material e moral decorrentes do mesmo fato;

c) nexo de causalidade entre o dano e o comportamento do agente[7].

Imperiosas tais assertivas, vez que ditarão a existência ou não da responsabilidade do agente na reparação ou indenização do dano.

A divisão, no entanto, da responsabilidade com ou sem culpa, é denominada pela doutrina como responsabilidade subjetiva eobjetiva, respectivamente.

Dessa forma, alguns sujeitos, em razão da natureza da atividade desenvolvida, serão responsabilizados pelo dano, sem que seja necessária a averiguação da culpa deste no evento danoso.

Os autores Pamplona Filho e Gagliano[8] aferem que a prática de atividade de determinado risco[9], por exemplo, pode gerar a obrigação de indenizar, por buscar, principalmente, o lucro:

Todavia, a sua prática com finalidade lucrativa tem, sim, um risco embutido, que não pode ser transferido para terceiros, se eles não concorreram exclusivamente para os danos ocorridos.

Assim, abstraída a ocorrência de alguma excludente de responsabilidade, a responsabilização deverá ser objetiva pelos danos causados nessa atividade, se o evento danoso era potencialmente esperado, em função da probabilidade estatística de sua ocorrência.

Com efeito, seja qual for a modalidade de responsabilidade imputada ao agente, certo é que atualmente cada vez mais fala-se em imputação civil patrimonial ou extrapatrimonial, conforme bem indica Ricardo Fiuza[10]:

Os novos inventos, a intensidade da vida e a densidade das populações aproximam cada vez mais as pessoas, intensificando suas relações, o que acarreta um aumento vertiginoso de motivos para a colisão de direitos e os atritos de interesses, do que surge a reação social contra a ação lesiva, de modo que a responsabilidade civil tornou-se uma concepção social, quando antes tinha caráter individual.

Evidentemente, com a ocorrência do evento danoso, presente está a obrigação de indenizar, vez que esta constitui-se em consequência daquela.

Da Responsabilidade Civil do Médico

Em que pese louváveis os avanços da medicina, ao passo que melhoraram as chances dos pacientes de ter um tratamento adequado de suas enfermidades, acabou por gerar um imenso leque de possibilidades de profissionais dessa área, que tem que se desdobrar para ficar à par das atualizações, no intuito de dar o andamento correto às diversas situações que se deparam no exercício de seu ofício.

Carlos Roberto Gonçalves aborda em sua doutrina o fato de que há, evidentemente, uma relação contratual entre o médico e seu paciente, quando esse realiza um atendimento em sua clínica, ou seja, é consolidada a compreensão que tal relação tem natureza contratual[11].

No entanto, apesar dessa conjectura, o não cumprimento da obrigação do médico, como, por exemplo, a cura de um doente ou mesmo a realização de recursos adequados à satisfação do direito do cliente, não guia este à uma responsabilidade objetiva, ou seja, não se presume a culpa deste[12].

Isto posto, não necessariamente a responsabilidade de cunho contratual será presumida, pois isso irá depender de como o devedor, de fato, se comprometeu ao alcance de determinado resultado. Nos termos da doutrina de Carlos Roberto Gonçalves, mencionando René Savatier[13],é “o que sucedena responsabilidade do médico, que não se compromete a curar, mas aproceder de acordo com as regras e os métodos da profissão”.

Conforme pontua Tartuce, nos casos em que se é prometido, e, de certa forma, comercializado determinado resultado, pode ser compreendido pela responsabilização do médico, independentemente de sua culpa, contudo, esse afirma que há uma tendencia em reverter tal forma de apesar a respeito do dueto obrigação de resultado-responsabilidade objetiva, não se chegando objetivamente a uma conclusão binária, lógico-intuitiva, que chegue à dedução de que a obrigação de resultado deve gerar uma responsabilidade sem culpa. O autor menciona ainda que há quem entenda que não se pode presumir que o médico-cirurgião estético oferece uma obrigação de resultado[14].

Contudo, a regra geral da natureza da responsabilidade dos profissionais liberais no exercício de seu labor é que ela não será automaticamente objetiva, sobre isso narra o artigo 14, §4º do Código de Defesa do Consumidor:

CDC. Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

§ 4° A responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação de culpa.

Silvio Venosa menciona que a negligência, a imprudência e a imperícia, apesar de serem cometidas em um ato voluntário, originam um resultado involuntário. Deve-se aferir, assim, a previsibilidade e a falta do devido cuidado em certa atitude[15].

O jurista expõe que enquanto na negligência falta a devida atenção na prática de um ato, na imprudência o agente é afoito, precipitado, sem estudar com calma as consequências prejudiciais que podem ser previstas na realização daquela ação[16]. Nas palavras de Sílvio de Salvo “É imperito aquele que demonstra inabilidade para seu ofício, profissão ou atividade [...] é imperito [...] o médico que administra a droga errada e danosa ao paciente, por exemplo”[17].

Deveras sobre a produção da prova da negligência ou da imprudência, entende Carlos Roberto Gonçalves[18]que essa constitui, por certo, em verdadeiro dissabor à vítima, e que deve ser evidentemente produzida por aquele que têm mais conhecimento técnico no assunto. Ou seja, entende o autor que se deve haver a inversão do ônus da prova nesses casos:

A prova da negligência e da imperícia constitui, na prática, verdadeiro tormento para as vítimas. Sendo o médico, no entanto, prestador de serviço, a sua responsabilidade, embora subjetiva, está sujeita à disciplina do Código de Defesa do Consumidor, que permite ao juiz inverter o ônus da prova em favor do consumidor (art. 6º, VIII).

Deve ser lembrado, ainda, que a hipossuficiência nele mencionada não é apenas econômica, mas precipuamente técnica. O profissional médico encontra-se, sem dúvida, em melhores condições de trazer aos autos os elementos probantes necessários à análise de sua responsabilidade.

Desta feita, vê-se que a responsabilidade do médico, como profissional liberal, deve ser aferida mediante a verificação de culpa, podendo essa ser originada de um ato negligente ou imperito.

Destarte, sobre a dificuldade de se praticar a medicina, tendo-se em vista que os recursos são extremamente caros e, por vezes, escassos, debate Vera Lúcia Espinoza Giampaoli[19]. Essa ainda conta que, ainda que o médico haja corretamente, não pode escolher muitas vezes seu corpo clínico, não podendo se recusar a exercer o ofício em entidades cujas condições não são dignas nem ao paciente, nem ao profissional da saúde, que labora em condições inadequadas.

Assim, em sendo debatida a responsabilidade civil do médico, importante mencionar que, em sendo o atendimento realizado em instituição pública ou particular, caberá a esta a responsabilidade objetiva pela reparação dos danos que podem vir a ser sofridos, ao passo que o médico, por sua vez, apenas responde mediante culpa.

Do Erro de Diagnóstico

O erro de diagnóstico nada mais é que um erro médico. A falha profissional que macula o exercício do ofício, nesse caso, é delimitar com exatidão qual é realmente a doença que acomete o cliente.

Os escritores Pablo StolzeGagliano e Rodolfo Pamplona Filho[20] reverberam em sua doutrina sobre a responsabilidade civil do médico e as implicações legais de seu erro:

Estabelecida a premissa de que a responsabilidade civil do médico, como atividade profissional (liberal ou empregatícia), é subjetiva, vem a lume a questão do erro médico.

De fato, a prestação de serviços médicos não consiste em uma operação matemática, em que o profissional pode afirmar, de forma peremptória, que curará o indivíduo, dada a sua condição, em regra, de obrigação de meio.

Por isso, a prova do elemento anímico (culpa) é tão importante quanto a da conduta humana equivocada, no que diz respeito aos deveres gerais como cidadão e aos específicos da atividade profissional.

Expondo pensamento semelhante a este, aduz Sawntzy Junior que “a prática da medicina, por ser uma atividade humana, está necessariamente limitada em seus conhecimentos, e exposta a resultados eventualmente adversos e inesperados”[21].

O autor também conta que no decorrer dos séculos a medicina foi um dos ramos da ciência que mais se desenvolveu, e, atrelados a isto, desenvolveram-se de maneira progressiva os regramentos para as demandas danosas[22].

Deveras, não há dúvidas de que a escolha por determinado tratamento não necessariamente é binária, contudo, como se viu anteriormente, o erro médico, em detrimento da aferição de culpa, pode ser configurado mediante a verificação de uma das três atitudes:

Erro médico é o mau resultado ou resultado adverso decorrente de ação ou da omissão do médico.  [...]

O erro médico pode se verificar por três vias principais. A primeira delas é o caminho da imperícia decorrente da "falta de observação das normas técnicas", "por despreparo prático" ou "insuficiência de conhecimento" [...]. É mais frequente na iniciativa privada por motivação mercantilista. O segundo caminho é o da imprudência e daí nasce o erro quando o médico por ação ou omissão assume procedimentos de risco para o paciente sem respaldo científico ou, sobretudo, sem esclarecimentos à parte interessada. O terceiro caminho é o da negligência, a forma mais frequente de erro médico no serviço público, quando o profissional negligencia, trata com descaso ou pouco interesse os deveres e compromissos éticos com o paciente e até com a instituição. O erro médico pode também se realizar por vias esconsas quando decorre do resultado adverso da ação médica, do conjunto de ações coletivas de planejamento para prevenção ou combate às doenças[23].

Assim, as três modalidades de erro médico apresentadas pelo autor podem, de fato, ocasionar em um erro de diagnóstico, principalmente a imperícia e a negligência.

Outrossim, outro importante ponto referenciado por Sawntzy, é o fato de que, muitas das vezes, não é possível a reparação dos danos desencadeados pela conduta inadequada do médico com o desfazimento desses, mas apenas com a reparação. Isso pode ocasionar em outros dissabores para o cliente, como transtornos físicos e emocionais[24].

Tendo isso à lume, certo que o erro de diagnóstico gera, quando impossível de desfazimento, grande abalo moral à vítima.

A judicialização de casos oriundos de erro de diagnóstico está à ordem do dia nos tribunais, sendo recorrentemente supedâneo a judicialização da prestação de serviços médicos.

Pois bem, em que pese imensa litigiosidade do tema, e tendo restado claro que o médico pode ser responsabilidade civilmente pelo erro de diagnóstico, nos resta apontar alguns julgados onde se foi realizada a assumpção do fato à norma.

Dessa forma, abaixo constam transcritos algumas ementas recentes, de diferentes partes do Brasil, onde houve a perquirição da responsabilidade civil do médico, na condição de profissional liberal.

Passemos, primeiramente, à verificação da compreensão dada pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo na análise do tema:

AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS - ERRO MÉDICO - AUTORA QUE ALEGA TER HAVIDO NEGLIGÊNCIA MÉDICA DOS RÉUS NO ATENDIMENTO A ELA PRESTADO, JÁ QUE RECEBEU O DIAGNÓSTICO EQUIVOCADO DE DOENÇA DA QUAL NÃO PADECIA, QUANDO, EM VERDADE ESTAVA GRÁVIDA - SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA - INSURGÊNCIA DA AUTORA - NÃO ACOLHIMENTO - RESPONSABILIDADE CIVIL SUBJETIVA DO PROFISSIONAL LIBERAL - LAUDO PERICIAL CONCLUSIVO NO SENTIDO DE QUE HOUVE OBSERVÂNCIA DA REGRA TÉCNICA PROFISSIONAL PRECONIZADA E QUE NÃO HOUVE DANO À PACIENTE, NEM AO RECÉM-NASCIDO - CULPA NÃO COMPROVADA- PROVA DOS AUTOS QUE NÃO INDICAM NEGLIGÊNCIA MÉDICA OU FALHA DO ATENDIMENTO PRESTADO À PACIENTE - RECURSO DESPROVIDO (TJ SP, Apelação Cível nº 10387854420198260100, Relator Marcus Vinicius Rios Gonçalves, publicação em 31/01/2022, 6ª Câmara de Direito Privado)[25]

Neste caso colacionado, vê-se que, em que pese o diagnóstico erroneamente efetuado, não houve comprovação do fator subjetivo, ou seja, o médico, apesar de errar, procedeu à técnica correta para proceder ao diagnóstico que, apesar de todos os cuidados, foi erroneamente exarado.

Por meio deste, então, possível se afirmar que, em que pese ter havido o equívoco, esse não foi praticado por imprudência ou imperícia, isentando o profissional liberal da saúde, desta forma, à responsabilidade de indenizar a paciente.

No caso a seguir, julgado pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, apesar do erro de diagnóstico dado pelo médico, não houve a caraterização de sua culpa e, em que pese o dano, que está consubstanciado inclusive na cirurgia equivocada, este não foi responsabilizado civilmente pelo ocorrido:

APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. ERRO MÉDICO. DIAGNÓSTICO E CIRURGIA. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA DOS PROFISSIONAIS LIBERAIS. PRESCRIÇÃO NÃO IMPLEMENTADA. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA CULPA DO PROFISSIONAL MÉDICO. DEVER DE INDENIZAR QUE NÃO SE RECONHECE. RECURSO PROVIDO. PEDIDOS INICIAIS IMPROCEDENTES. (TJRS. Apelação Cível nº 70055716427, Relator Maria Claudia Cachapuz, Quinta Câmara Cível, Julgado em: 08/04/2015)[26]

No caso abaixo, apreciado pelo Tribunal de Justiça da Bahia, também houve a verificação de inexistência de culpa do médico, que comprovou ter agido com prudência no atendimento do paciente:

APELAÇÕES SIMULTÂNEAS. CIVIL, PROCESSUAL CIVIL, E DEFESA DO CONSUMIDOR. AÇÃO INDENIZATÓRIA. RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO. ALEGATIVA DE ERRO DE DIAGNÓSTICO. DECISÃO DE PRIMEIRO GRAU QUE RECONHECEU A OCORRÊNCIA DE DANO MATERIAL, MORAL E ESTÉTICO COM BASE NA TESE DA PERDA DE UMA CHANCE. PRELIMINARES DE NULIDADE INÉPCIA DA INICIAL, ILEGITIMIDADE PASSIVA AFASTADAS. NEXO CAUSAL QUE NÃO RESTOU DEMONSTRADO. AUSÊNCIA DE CULPA DO PROFISSIONAL LIBERAL. INEXISTÊNCIA DOS PRESSUPOSTOS CARACTERIZADORES DE RESPONSABILIDADE CIVIL. ATENDIMENTO MÉDICO PRESTADO COM PRUDÊNCIA E RESPONSABILIDADE. ILÍCITO NÃO EVIDENCIADO. APELOS DOS RÉUS CONHECIDOS E PROVIDOS. APELO DA AUTORA CONHECIDO E IMPROVIDO. (TJBA. Apelação Cível nº 05680866020148050001, Relator: LidivaldoReaiche Raimundo Brito, Primeira Câmara Cível, Publicado em 09/05/2019)[27]

Comprova-se da leitura dos referidos julgados que nem sempre o médico que forneceu diagnóstico errado ao paciente será responsabilizado pelo dano sofrido por este, uma vez que deverá ser comprovado que o profissional liberal agiu com culpa na ocorrência daquele resultado.

Conclusões

O campo da responsabilidade civil e suas especificidades é extremamente extenso, sendo, por vezes, exaustivamente debatido e conjecturado pelos juristas. A responsabilidade civil do médico, por sua vez, quando da efetivação de diagnóstico equivocado, entoa grandes discussões, e ricas reflexões que são feitas, principalmente, no âmbito na análise dos casos em concreto.

Por corolário, independentemente de o procedimento ser de meio ou de resultado, não necessariamente o profissional será responsabilizado civilmente à indenização por não ter atingido o esperado pelo paciente, isso não só é reverberado pela legislação, mas também pela doutrina, e confirmado pela jurisprudência.

Desta feita, certo é que a responsabilidade subjetiva do médico, na condição de profissional liberal, dá grande respaldo ao executor desse labor, trazendo segurança de que, em que pese ter cometido um equívoco, se o fez tomando todas as medidas de precaução para que este não ocorresse, por ele não será responsabilizado.

Conclui-se então que resta consagrada a segurança jurídica nas relações contratuais existentes entre médico e paciente, posto que, ao passo que este poderá ser ressarcido em sendo o caso de não ter o profissional da medicina agido com o devido zelo, aquele também resta respaldado que, ao exercer seu labor e, o fazendo corretamente, não poderá ser responsabilizado por dano suportado por seu paciente em decorrência de determinado diagnóstico erroneamente dado.

Referências

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Edson Aparecido Ferreira Cardoso[1]


[1] Pós-graduando em Direito Médico e Hospitalar pela Escola Paulista de Direito, Graduado em Direito pela Universidade Metodista de Piracicaba.

[2]GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil: Responsabilidade Civil. 17. ed. rev. atual. e aum. São Paulo: SaraivaJur, 2019, p. 853/854.

[3]GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: Responsabilidade Civil. 14. ed. São Paulo: Saraivajur, 2019, p. 49.

[4]VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: Obrigações e Responsabilidade Civil. 17. ed. São Paulo: Atlas LTDA, 2017, p. 391.

[5]FARIAS, CRISTIANO CHAVES DE; ROSENVALD, NELSON; BRAGA NETO, FELIPE PEIXOTO. Curso de Direito Civil: Responsabilidade Civil. 4. ed. rev. atual. e aum. Salvador: Juspodium, 2017, p. 165.

[6]FIUZA, Ricardo (coord.). Código Civil Comentado. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 114.

[7]Idem.

[8]GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil: Responsabilidade Civil. 17. ed. rev. atual. e aum. São Paulo: SaraivaJur, 2019, p. 200.

[9] Um exemplo concreto deste conceito dado pelo autor, é a seguinte jurisprudência: APELAÇÕES CÍVEIS. CIVIL, PROCESSO CIVIL E CONSUMIDOR. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. DANO MORAL. PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA. REJEIÇÃO. ERRO DE DIAGNÓSTICO. CRIANÇA. PROFISSIONAL LIBERAL. CONDUTA NEGLIGENTE. RESPONSABILIDADE CIVIL SUBJETIVA. HOSPITAL E PLANO DE SAÚDE. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. RISCO DA ATIVIDADE. FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS VERIFICADA. NEXO CAUSAL ENTRE OS DANOS E A FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. EXISTÊNCIA. DEVER DE INDENIZAR CONFIGURADO. QUANTUM INDENIZATÓRIO. PROPORCIONALDADE E RAZOABILIDADE. ESPECIFICIDADES DO CASO CONCRETO. SENTENÇA MANTIDA. APELOS NÃO PROVIDOS. (TJDF. SEGREDO DE JUSTIÇA. Relator Getúlio de Moraes Oliveira, 7ª Turma Cível, Publicação em 14/01/21). Disponível em: https://tj-df.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/1153273824/206004820158070001-segredo-de-justica-0020600-4820158070001. Acesso em: 10 de junho de 2022.

[10]FIUZA, Ricardo (coord.). Código Civil Comentado. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 492.

[11] GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: Responsabilidade Civil. 14. ed. São Paulo: Saraivajur, 2019, p. 345.

[12]Idem.

[13]SAVATIER, René. Traité de laresponsabilitécivileendroitfrançais. Paris, 1951, p. 346.

[14]TARTUCE, Flávio. Manual de Responsabilidade Civil. Rio de JAneiro: Forense, 2018, p. 446.

[15]VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: Obrigações e Responsabilidade Civil. 17. ed. São Paulo: Atlas LTDA, 2017, p. 410.

[16] Acerca disso também, extrai Gagliano e Pamplona Filho em sua doutrina: “Outro tema menos polêmico diz respeito às formas pelas quais a culpa, entendida em sentido estrito, se manifesta. Nesse sentido, teríamos: a) negligência — é a falta de observância do dever de cuidado, por omissão. Tal ocorre, por exemplo, quando o motorista causa grave acidente por não haver consertado a sua lanterna traseira, por desídia; b) imprudência — esta se caracteriza quando o agente culpado resolve enfrentar desnecessariamente o perigo. O sujeito, pois, atua contra as regras básicas de cautela. Caso do indivíduo que manda o seu filho menor alimentar um cão de guarda, expondo-o ao perigo; c) imperícia — esta forma de exteriorização da culpa decorre da falta de aptidão ou habilidade específica para a realização de uma atividade técnica ou científica. É o que acontece quando há o erro médico em uma cirurgia em que não se empregou corretamente a técnica de incisão [...]. Interessante notar que, pela dicção do art. 186 do Código Civil, a impressão que se tem é a de que o legislador não previu a ação “dolosa”, e, além disso, ao tratar da ação “culposa”, apenas considerou a “negligência e a imprudência”, esquecendo-se da “imperícia””. (GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil: Responsabilidade Civil. 17. ed. rev. atual. e aum. São Paulo: SaraivaJur, 2019., p. 195).

[17]VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: Obrigações e Responsabilidade Civil. 17. ed. São Paulo: Atlas LTDA, 2017, p. 410.

[18]GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: Responsabilidade Civil. 14. ed. São Paulo: Saraivajur, 2019, p. 346/347.

[19] GIAMPAOLI, Vera Lúcia Espinoza. DIREITOS E RESPONSABILIDADES DO MÉDICO. In: DIREITOS E RESPONSABILIDADES DO MÉDICO. [S. l.: s. n.], 2021, p. 169.

[20] GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil: Responsabilidade Civil. 17. ed. rev. atual. e aum. São Paulo: SaraivaJur, 2019., p. 298.

[21] SAWNTZY JUNIOR, DONN THELL FREWYD. O DIREITO MÉDICO E OS ATOS MÉDICOS COMO FORMA PROTETIVA ÀS DEMANDAS LITIGIOSAS CÍVEIS: RESPONSABILIDADE CIVIL SUBJETIVA DO MÉDICO. Orientador: Profa. Msc. Patrícia Fontanella. 2017, p. 31.

[22] Idem.

[23] GOMES, Júlio Cézar Meirelles. Erro Médico: Reflexões. Revista Bioética, Online, p. 2 Online, 5 jul. 2022. Disponível em: https://revistabioetica.cfm.org.br/index.php/revista_bioetica/article/view/459. Acesso em: 10 jun. 2022.

[24] SAWNTZY JUNIOR, DONN THELL FREWYD. O DIREITO MÉDICO E OS ATOS MÉDICOS COMO FORMA PROTETIVA ÀS DEMANDAS LITIGIOSAS CÍVEIS: RESPONSABILIDADE CIVIL SUBJETIVA DO MÉDICO. Orientador: Profa. Msc. Patrícia Fontanella. 2017, passim.

[25] Disponível em: https://tj-sp.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/1366832926/apelacao-civel-ac-10387854420198260100-sp-1038785-4420198260100. Acesso em: 07 de junho de 2022.

[26] Disponível em: https://tj-rs.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/181135694/apelacao-civel-ac-70055716427-rs. Acesso em: 10 de junho de 2022.

[27] Disponível em: https://tj-ba.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/706920158/apelacao-apl-5680866020148050001. Acesso em: 10 de junho de 2022.


Publicado por: EDSON APARECIDO FERREIRA CARDOSO

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