A REABILITAÇÃO CRIMINAL COMO FORMA DE PROMOVER A RESSOCIALIZAÇÃO DE PRESOS
O texto publicado foi encaminhado por um usuário do site por meio do canal colaborativo Meu Artigo. Brasil Escola não se responsabiliza pelo conteúdo do artigo publicado, que é de total responsabilidade do autor . Para acessar os textos produzidos pelo site, acesse: https://www.brasilescola.com.
RESUMO
Este artigo tem como objetivo fazer um estudo sobre a reabilitação criminal no Brasil, sua relação com a ressocialização, com ênfase nos direitos humanos. A reabilitação criminal é um benefício criado em lei com o intuito de restituir ao condenado o direito de ter seu registro criminal “expurgado” após o cumprimento da pena. A reabilitação criminal não está diretamente ligada à ressocialização, mas está relacionada a ela, pois é um benefício que garante o sigilo dos registros do condenado. O ato de discriminar quem já cumpriu pena e deseja se reinserir na sociedade afeta os direitos humanos e o princípio da dignidade humana. A exclusão social pode ser considerada a pena mais severa que um condenado enfrenta no momento de sua reintegração à sociedade, e essa atitude deve ser coibida como forma de garantir a igualdade social e a humanidade. Sob esta ótica, será abordada também a situação do sistema penitenciário no Brasil, os problemas enfrentados e os possíveis meios para que tais problemas possam ser solucionados.
PALAVRAS-CHAVE: Reabilitação Penal. Ressocialização. Direitos humanos. Exclusão social.
INTRODUÇÃO
O presente artigo visa demonstrar e investigar a reabilitação criminal, suas bases no ordenamento jurídico, eficácia da sua aplicabilidade nos casos concretos e o contexto geral do tema em nosso país. Sob esta ótica, será abordada também a situação do sistema penitenciário no Brasil, os problemas enfrentados e os possíveis meios para que tais problemas possam ser solucionados. Muitas pessoas demonstram-se temerosas quanto à reabilitação criminal e a aplicabilidade das normas penais inerentes ao nosso sistema jurídico, fato que se dá pelo constante noticiário referente aos fortes problemas enfrentados nas penitenciárias brasileiras e pela atuação do Poder Judiciário. Porém, é notório que nosso sistema carcerário não está totalmente falido e possui modelos de reintegração do preso que são referências em diversos países. A Reabilitação Criminal tema central deste trabalho mostra-se como um meio para garantir ao ex-condenado o retorno ao convívio social de modo que seus antecedentes criminais sejam mantidos em sigilo com o intuito de preservar sua dignidade. Para que a reabilitação seja concedida, alguns requisitos devem ser respeitados, portanto, far-se-á necessário a demonstração das etapas a serem cumpridas para a concessão deste benefício jurídico. A busca constante por igualdade social e respeito à dignidade da pessoa humana faz com que a Reabilitação Criminal sofra forte influência dos direitos humanos e dos princípios constitucionais. Desta forma, como base do ordenamento jurídico pátrio, o respeito aos direitos fundamentais das pessoas se faz presente neste instituto jurídico. Sendo assim, a Reabilitação Criminal não poderá ser vista apenas como um benefício social ou jurídico ou como um meio de apagar os antecedentes criminais do indivíduo, tendo em vista que este instituto não possui esta faculdade, a reabilitação é um meio eficaz de garantir o respeito, igualdade e reintegração social aos que cumpriram sua pena sem que sejam discriminados pela sociedade.
DESENVOLVIMENTO
O sistema penitenciário brasileiro sofre com a precariedade de instalações dentre vários outros problemas que dificultam que os presos possam ter um tratamento educacional adequado para a eficácia de sua reabilitação. A forma de punição deve ser eficaz e justa, uma vez que o principal objetivo da prisão é recuperar o condenado para que posteriormente ao cumprimento de sua pena, este possa reincorporar-se a sociedade e não mais agir em desacordo com a lei. É notório que no Brasil muitas das instituições são conhecidas como verdadeiras “escolas do crime” devido a uma série de fatores que impedem que o Estado cumpra seu papel ressocializador. A superlotação nas celas, a falta de segurança nas penitenciárias, dentre outros problemas dificultam a recuperação dos presos. Não podemos generalizar todo sistema penitenciário como falido e nem toda lei como ineficaz, o que se espera é que os infratores sejam recolhidos em locais com capacidade de tratamento para que eles não voltem a cometer novos crimes assim que retornarem ao convívio social. Prova de que no Brasil, nem todo sistema penitenciário sofre com a precariedade, é a criação do método APAC (Associação de Proteção e Assistências aos Condenados), nascido em São José dos Campos – SP em 1972 e que hoje se estende por diversas cidades brasileiras e também por outros países. A ideia inicial era evangelizar e dar apoio moral aos presos daquela cidade, primeiramente, a sigla APAC significava “Amando o Próximo Amarás Cristo”. A importância de se falar sobre esse método é demonstrar a dedicação à recuperação e reintegração social dos presos que foram condenados a penas privativas de liberdade. A principal diferença entre a APAC e o Sistema Prisional Comum, é que na APAC os próprios presos (recuperandos) são corresponsáveis pela sua recuperação e têm assistência espiritual, médica, psicológica e jurídica prestada pela comunidade. A segurança e disciplina do presídio são feitas com a colaboração dos recuperandos, tendo como suporte os funcionários, voluntários e diretores da entidade, sem a presença de policiais e agentes penitenciários. Em diversos casos não há necessidade de aprisionar o indivíduo como medida punitiva, a aplicação de penas alternativas que não retiram o condenado do meio social, como prestação de serviço a comunidade, doação de alimentos entre outros meios são suficientes para que aquele que cometeu algum delito de natureza menos grave cumpra sua punição. Essa alternativa ajuda a desafogar o sistema penitenciário da superlotação, pois não há como imaginar que diversos homens vivendo em espaços pequenos em condições precárias possam sair dos presídios recuperados para viver socialmente. A reabilitação criminal tem como principal função ressocializar e dar ao condenado o direito à humanização na transição entre sua vida carcerária e o retorno ao convívio social. Ela auxilia o condenado depois de extinta sua pena a recuperar sua reputação que foi ofuscada pelo delito cometido. Esta fase transitória torna-se o centro das reflexões dos direitos humanos, tendo em vista que parte da sociedade não acolhe ou dá oportunidades de reabilitação a estes indivíduos que já cumpriram sua pena. Consoante ao art.1º da LEP, a pena tem “por objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado”. Para tanto, deverá o Estado ofertar-lhe oportunidades de ressocialização. Observe-se que o Estado democrático não pode impor ao condenado os valores dominantes na sociedade, limitando-se a propô-los ao recluso. E este terá o direito de refutá-los, se entender o caso, recusando adaptar-se às regras fundamentais coletivas. Muitas são as dificuldades encontradas para o reingresso a sociedade, a reabilitação criminal, vista como medida de ressocialização protege sigilosamente as informações negativas do indivíduo, facilitando assim a preservação de seus direitos fundamentais. O caráter sigiloso da reabilitação criminal não pode ser entendido como uma forma de “esconder” a conduta criminosa do indivíduo, mas deve ser visto como um processo de oportunidade para que ele possa retornar ao convívio social após ter cumprido sua pena. Todo instituto jurídico é baseado em princípios norteadores, não diferente, a Reabilitação Criminal, tem como base alguns princípios constitucionais como o da Dignidade da Pessoa Humana e o da Igualdade, ambos com previsão expressa na Carta Magna de 1988. A Dignidade da Pessoa Humana é um direito fundamental de todas as pessoas, não há pressupostos para que o indivíduo a possua, o simples fato de existir já faz com que tenhamos o direito à dignidade. Este princípio é irrenunciável e inalienável, decorre do simples fato da existência do ser humano conforme mencionado, que é a base dos valores morais da sociedade, é característica natural do próprio homem. Certos direitos independem de critérios para que as pessoas o possuam, tratando-se deste princípio o único requisito para tê-lo é possuir condição humana. O princípio da igualdade não proíbe que a lei estabeleça distinções. “Não pressupõe outorga a todos um tratamento uniforme, mas não discriminatório. E a não discriminação não é outra coisa que a justificação do trato desigual”. Bem por isso proíbe “o arbítrio, ou seja, proíbe as diferenciações de tratamento sem fundamento material bastante, que o mesmo é dizer sem qualquer justificação razoável, segundo os critérios de valor objetivo constitucionalmente relevantes. Proíbe a discriminação, ou seja, as diferenciações de tratamento fundadas em categorias meramente subjetivas”. O ato de discriminar o outro fere o princípio da Dignidade da Pessoa Humana, tendo em vista que este é inerente de todo homem e não pode ser violado. Não se pode fazer distinção entre as pessoas pelas condições em que elas vivem, menos ainda pelo fato delas possuírem antecedentes criminais. A sociedade ao recriminar aquele que saiu da prisão está tirando dele seu direito fundamental, desrespeitando sua dignidade e dando a este indivíduo uma segunda condenação posterior a sua prisão. Conforme visto, os direitos fundamentais são tutelados pelo Estado e tem proteção constitucional, eles devem ser garantidos por medidas eficazes de combate a discriminação seja ela por qual motivo for. A sociedade deve oportunizar aos condenados medidas para que eles possam se ressocializar, não fazendo distinção entre essas pessoas pelo fato de que eles estiveram presos por alguma má conduta. A reabilitação criminal é um direito que deve ser respeitado e garantido como uma forma de ressocialização gradativa, aquele que pleiteá-la e posteriormente ver aceito seu pedido de reabilitação, estará recebendo a oportunidade de reaver sua moral, que foi abalada pelo delito cometido, sendo novamente respeitada com o auxílio deste benefício que mantém em sigilo seus antecedentes criminais. A pena vista por um olhar jurídico/social exerce a função de ressocializar e reeducar o apenado, desta forma se pode observa que o princípio da dignidade da pessoa humana está intimamente ligado ao direito penal e aos demais princípios. O Brasil é signatário da Convenção Americana de Direitos Humanos e em seu artigo 5º que trata da integridade pessoal, alínea 6 podemos observar em seu texto que “As penas privativas de liberdade devem ter por finalidade essencial a reforma e a readaptação social dos condenados”, sendo assim, a função essencial de manter o indivíduo preso é transformar de forma benéfica o seu comportamento para que este possa retornar a sociedade dignamente. O princípio da Dignidade da Pessoa Humana é o respaldo para que aqueles que cometeram e pagaram por seus crimes possuam uma nova chance, sendo vistos sem discriminação como cidadãos e não como ex-presidiários. A Reabilitação criminal não pode ser avaliada por um princípio isoladamente, conforme mencionado no início deste capítulo, além do princípio da Dignidade da Pessoa Humana há outro inerente a este instituto jurídico, que é a Igualdade com previsão no caput do artigo 5º da Constituição Federal de 1988: Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direto à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes (BRASIL, 1988). Aquele que já cumpriu sua pena não poderá ser tratado de forma desigual aos demais cidadãos, tal conduta gera responsabilidade a quem praticar atos discriminatórios. Sobre este fato, Alexandre de Moraes menciona que: “Finalmente, o particular não poderá pautar-se por condutas discriminatórias, preconceituosas ou racistas, sob pena de responsabilidade civil e penal, nos termos da legislação em vigor.” Embora diversos fatores sejam considerados importantes para diferenciação do indivíduo como idade, sexo, entre outros, o que não se pode violar e diferenciar é o direito que todos têm como o direito a dignidade. Humberto Ávila, em sua obra sobre a Teoria dos Princípios conclui que: “Os sujeitos devem ser considerados iguais em liberdade, propriedade, dignidade. A violação da igualdade implica a violação a algum princípio fundamental." Todos devem ser aceitos independente de sua condição, seja ela financeira, racial, física, psíquica e conforme tratado aqui, por ser um ex-presidiário. A função da pena é “castigar” o indivíduo de acordo com a conduta cometida, sendo assim, cumprida a sentença penal condenatória, não há que se discriminar aquele que já cumpriu sua dívida com o Estado e com a sociedade em geral. Violar um princípio fundamental é tirar do indivíduo uma garantia que ele adquire com o simples fato de existir. O ato discriminatório é a mais pura forma de violação desses direitos. Qualquer pessoa, independentemente de sua conduta deve ter seus direitos fundamentais respeitados. Aqueles que agiram em confronto com a lei e que já cumpriram sua pena, não diferente dos demais merecem tratamento isonômico para que possam ter a oportunidade de ressocializar-se com a sociedade novamente.
CONCLUSÃO
A reabilitação criminal é um importante instrumento para ressocialização dos ex-apenados, porém, temos em nosso país um sistema penitenciário falho que necessita ser restaurado. Apesar dos problemas enfrentados nas penitenciárias brasileiras, alguns meios de execução das penas têm se mostrado eficaz auxiliando os presos a se reintegrarem de forma digna. A reabilitação criminal vai além da esfera penal atingido um caráter social, o auxílio da sociedade, família e Estado são a base para que os ex-apenados possam retornar a sociedade tendo seus direitos fundamentais respeitados. Infelizmente ainda existe a discriminação por parte de algumas pessoas em relação aos presos, mesmo depois de cumprida a pena parte da sociedade marginaliza esses indivíduos tirando deles a oportunidade de ressocialização, o fato é que muitas dessas pessoas, sem essas oportunidades acabam sendo reincidentes ao crime. Nosso sistema jurídico é norteado por princípios constitucionais basilares ao Estado, dentre eles estão o princípio da dignidade da pessoa humana e o princípio da igualdade ambos com previsão expressa em nossa atual Constituição Federal. A forte busca pela não violação aos direitos fundamentais inerentes os homens trouxeram para este instituto jurídico a influência dos direitos humanos em prol da igualdade e da não descriminalização. As pesquisas a bibliografias voltadas ao direito penal aos princípios fundamentais e também aos direitos humanos auxiliaram na realização deste trabalho para formular uma análise crítica ao sistema penitenciário brasileiro, ao papel desenvolvido pelo Estado, sociedade e família no auxílio à reabilitação do condenado.
REFERÊNCIAS
ÁVILA, Humberto. Teoria dos Princípios, da definição à aplicação dos princípios jurídicos. – 11 ed. – São Paulo: Malheiros, 2020.
BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal, volume 1: parte geral/ Cezar Roberto Bitencourt. – 13. ed. atual. – São Paulo: Saraiva, 2018.
CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal, volume 1, parte geral: (arts. 1º a 120)/ Fernando Capez. – 15. Ed. – São Paulo: Saraiva, 2015.
CERVINI, Raúl. Os processos de descriminalização / Raúl Cervini: I tradução Eliana Granja. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2019.
COSTA JÚNIOR, Paulo José da, Curso de direito penal. – São Paulo: Saraiva, 1997.
Criminologia e os problemas da atualidade/ Alvino Augusto de Sá, Sérgio Salomão Shecaira organizadores. - - São Paulo: Atlas, 2018.
FALCONI, Romeu. Reabilitação Criminal. – São Paulo: Ícone, 2019. – (Elementos de Direito).
JESUS, Damásio de. Direito penal, volume 1: parte geral/ Damásio de Jesus. – 32. ed. – São Paulo: Saraiva, 2015.
LEAL, César Barros. Prisão: Crepúsculo de uma era. – Belo Horizonte: Del Rey, 2018.
LOPES, Mauricio Antonio Ribeiro. Princípios políticos do direito penal.- 2. ed. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1999. – (Série princípios fundamentais do direito penal moderno; v. 3).
MINHOTO, Laurindo Dias. Privatização de Presídios e Criminalidade, A Gestão da Violência no Capitalismo Global. – São Paulo: Editora Max Limonad, 2019.
MIRABETE, Júlio Fabbrini. Manual de direito penal, volume 1: parte geral, arts. 1º a 120 do CP/ Júlio Fabbrini Mirabete, Renato N. Fabbrini. – 27. ed. ver. e atual. até 4 de janeiro de 2015. – São Paulo: Atlas, 2015.
MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional / Alexandre de Moraes. – 27. ed. - São Paulo: Atlas, 2015.
Publicado por: CLEANDRO DOS SANTOS CARVALHO
O texto publicado foi encaminhado por um usuário do site por meio do canal colaborativo Meu Artigo. Brasil Escola não se responsabiliza pelo conteúdo do artigo publicado, que é de total responsabilidade do autor . Para acessar os textos produzidos pelo site, acesse: https://www.brasilescola.com.