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Internet, fake news e fascismo

Neste ensaio há a correlação da internet com os movimentos revolucionários e a ascensão do neofascismo ao redor do mundo

O texto publicado foi encaminhado por um usuário do site por meio do canal colaborativo Meu Artigo. Brasil Escola não se responsabiliza pelo conteúdo do artigo publicado, que é de total responsabilidade do autor . Para acessar os textos produzidos pelo site, acesse: https://www.brasilescola.com.

Internet: Arma política ou Meio revolucionário?

Neste ensaio há a correlação da Internet com os movimentos revolucionários e a ascensão do neofascismo ao redor do mundo

Sob a perspectiva histórica, ao analisarmos a historiografia mundial encontramos diversas revoluções civis em busca de melhorias sociais e humanitárias ao longo dos séculos, sempre com líderes, pensadores ou um determinado grupo sendo personagens principais, levantando e defendendo pautas recorrentes àquela sociedade. Ao chegarmos no Século XX, mais precisamente na da década de 90, somos apresentados ao que viria a ser um novo meio de revolução: A internet. Meio este que amplia as possibilidades de se obter informação e conhecimento, sendo também uma ferramenta política que ultrapassa as barreiras físicas de emancipação e empoderamento sociocultural. Infelizmente nem todos possuem acesso à internet nos dias de hoje. Segundo a UIT ( União Internacional de Telecomunicações), pouco mais de 3.6 Bilhões de pessoas ainda estão excluídas do mundo online. O estudo sugere que a maioria destas pessoas vive em países menos desenvolvidos. A acessibilidade universal é um tema importantíssimo a ser discutido, mas este texto abordará outro tema.

Levando em consideração o que foi dito, podemos analisar como a internet está presente no nosso cotidiano e qual o impacto da mesma na vida das pessoas (usem elas a internet ou não). A democratização do acesso à internet traz consigo infinitas oportunidades de se obter conhecimento e um elevado nível de formação educacional, seja através de notícias, livros, blogs, cursos ou faculdade online. A Era digital também abre espaço para novas vozes, novos movimentos sociais e revolucionários, principalmente nas redes sociais, onde há a chance de uma única pessoa (ou um grupo) expor suas opiniões e alcançar milhares de outros usuários sem precisar sair de casa (método que cresceu bastante em 2020 devido à Pandemia da Covid-19 e inflamou manifestações ao redor do mundo).

A internet nos dias de hoje está fielmente entrelaçada à política. Temos de exemplo as recentes manifestações democráticas no Chile, Bolívia, Argélia, Cazaquistão, Catalunha, Equador, França, Guiné, Haiti, Honduras, Hong Kong, Iraque, Líbano, Paquistão e Reino Unido. Manifestações estas que tomaram forma primeiramente na Internet à partir do engajamento de grupos (principalmente jovens) insatisfeitos com a política atual de seus respectivos países. Vejamos 2 breves e recentes exemplos à seguir;

Chile

Em 2019, Em maior parte jovens e estudantes chilenos, rebelaram-se contra o sistema Chileno de governo e de educação. Para entender um pouco mais o que se passou no Chile devemos saber que tudo se dá graças ao legado de Pinochet, que em 1973, subiu ao poder graças a um golpe de Estado apoiado pela burguesia chilena, pelos militares e pelos EUA. Militares chilenos, liderados por Pinochet derrubaram o governo socialista de Allende, dando início à uma brutal ditadura militar. Foi um governo ditatorial que matou e perseguiu milhares de pessoas, sendo um dos mais violentos da América Latina. Nos anos seguintes o povo foi afundado cada vez mais em em pobreza e precariedade. O motivo disto é que durante a ditadura de Pinochet e nos anos seguintes, o Chile passou por uma reforma radical em seu modelo socioeconômico, foi implantado o sistema Neoliberal. Ou seja, educação, saúde, alimentação, aposentadoria, etc. Passariam a ser subsidiados pelo setor privado. Isto gerou um sistema de financiamento privado, uma previdência totalmente privatizada e um trabalho desregulamentado com poucas garantias ao povo trabalhador.

Após anos de neoliberalismo enraizado, o sistema começou a ruir, foi apenas no começo dos anos 2000 que os movimentos sociais começaram a tomar forma, principalmente com diversas manifestações estudantis. Mas foi em 2019 com o engajamento jovem que o movimento das massas se intensificou como jamais tinha. Jovens estes com mobilizações online e nas ruas, chamaram a atenção e ganharam o apoio da maior parte do povo. Em meio a um governo de extrema direita, da censura midiática e repressão militar o povo conseguiu manter quase que 1 ano de protestos ininterruptos para que em 2020 fossem escutados e finalmente ocorressem melhorias sociais e o plebiscito para uma nova constituição, finalmente rasgando aquela deixada por Pinochet. Os protestos incluíram manifestações e a destruição de símbolos manchados pela ditadura. Igrejas que acobertavam e eram centro de tortura e detenção foram destruídas e queimadas. Lutas pelo passado às vezes precisam ser materiais e símbolos precisar ser ressignificados.

‘’ O neoliberalismo nasceu e vai morrer no Chile.’’
- Autor desconhecido 

Bolívia

Também em 2019, no fatídico dia das eleições Bolivianas, os candidatos Evo Morales (que tentava se reeleger pela quarta vez) e Carlos Mesa protagonizavam o que parecia ser apenas mais uma disputa pela presidência. Segundo todas as pesquisas, o único candidato capaz de ameaçar a quarta reeleição de Evo era Carlos Mesa. Evo havia vencido as três últimas eleições no primeiro turno, e tudo indicava que venceria pela quarta vez. Porém, a Organização dos Estados Americanos (OEA), convocada pelo próprio Governo Boliviano para auditar as eleições, deu seu relatório apontando ‘’irregularidades nas eleições’’. Logo mais, após investigações foi descoberto que o órgão internacional corroborou para a falsa narrativa de que houve fraude nas eleições bolivianas. Isto fomentou o espírito de um golpe partindo dos militares, milicianos e fundamentalistas, que sequestraram, agrediram e humilharam pessoas ligadas ao MAS (Movimento ao Socialismo), partido do Evo. Após isto, Evo anuncia sua ‘’renúncia’’ e sai da disputa presidencial, exilando-se para proteger a si mesmo, sua família e o povo Boliviano. Este foi o começo da ascensão de um governo de extrema direita na Bolívia.

O povo boliviano é formado principalmente por trabalhadores, camponeses e por uma maioria indígena. Sendo assim, é um povo com origem humilde, considerado por muitos o país mais pobre da América Latina. Logo, a classe trabalhadora boliviana não consegue levar adiante seus interesses através de regimes nacionalistas burgueses. É lamentável que a América Latina de modo geral tenha uma elite econômica que não saiba conviver com a democracia e a inclusão social dos mais pobres. Milhares de trabalhadores e jovens responderam com corajosa resistência ao golpe, tomando as ruas de La Paz e o bairro da classe trabalhadora de El Alto, onde queimaram delegacias e enfrentaram as forças de segurança. Um ano após o golpe, em 2020, pudemos ver como o Governo de extrema direita tratou com descaso o povo, agravou a fome, pobreza e negou auxiliar devidamente o povo durante a Pandemia. Após o aumento das insatisfações e manifestações e chegando a época de novas eleições (que o governo adiou por duas vezes para se manter no poder e conter a revolução do povo), ocorreram novas eleições e o atual governo perdeu nas urnas e o MAS voltará ao poder, democraticamente, após o golpe.

‘’Recuperamos a democracia e a esperança”
- Primeiras palavras de Luis Arce após a vitória.

Entretanto, da mesma maneira em que a Internet contribui positivamente na vida dos indivíduos, ela é uma faca de dois gumes e pode ser utilizada de forma negativa se cair nas mãos erradas. Por exemplo, podemos observar como nas duas últimas décadas grupos de extrema direita (res)surgiram ao redor do mundo impulsionados pelas ‘’fake news’’ e pelo anonimato virtual e como isto refletiu em diversos países na hora de escolherem seus novos Presidentes e políticos. Além disto podemos observar casos menores como linchamentos virtuais, cyberbullying, assédios sexuais, pirataria etc.

‘’A extrema-direita não ascenderia sem fake news. Ou não teria toda essa representatividade. O que eles fazem? Oferecem soluções simples para problemas muito complexos. Essas soluções se espalham através das fake news. Nós sabemos que as notícias falsas sempre existiram, mas com as redes sociais elas ganharam novas características. Em primeiro, se tornaram muito complexas, difíceis de serem desmascaradas. Em segundo, elas conseguem se propagar em uma velocidade muito mais rápida. Por último, são muito sensacionalistas, então as contrainformações são menos fortes.’’
- Branco di Fátima, Autor do livro ‘’ Dias de Tormenta: os movimentos de indignação que derrubaram ditaduras, minaram democracias no mundo e levaram a extrema-direita ao poder no Brasil ‘’

Há uma nova onda de Neofascismo se espalhando rapidamente pelo mundo de uma maneira jamais vista. Atentados violentos com motivação relacioanda à ideais nazifascistas mostram que estes movimentos jamais desaparecram por completo após a 2a guerra mundial. Na América Latina criaram-se condições políticas favoráveis para o surgimentos destes movimentos. Países como México, Argentina, Chile, Bolívia e Brasil tiveram uma base expressiva. Pesquisas indicam que a Argentina é atualmente o país latino americano onde há a maior quantidade de sites neofascistas ativos na internet.

Já na Europa, segundo o relatório ‘’À sombra da pandemia: a última chance da Europa’’, publicado por um grupo de institutos de pesquisa alemães, a Alemanha têm o maior número de casos de violência de Extrema Direita em toda a Europa. De janeiro a agosto de 2019, o governo alemão contabilizou 12.493 delitos “politicamente motivados” pela extrema direita, dos quais 542 foram crimes violentos. Além disso, apenas em 2016, registraram-se 988 ataques a centros de acomodação para solicitantes de refúgio no país. Mas o avançado da extrema direita não é um fenômeno apenas alemão, houveram atentados em outros países da Europa, América do Norte, Canadá, Austrália e Nova Zelândia. Desde 2014, 27 ataques de extrema direita ocorreram na Alemanha, Canadá, Estados Unidos, Nova Zelândia, Reino Unido e Suécia. Ao menos 84 pessoas foram mortas somente em 2020.

‘“Existem muitas razões para [o avanço desses movimentos extremistas de direita], incluindo as plataformas sociais e o mundo digital. As ideias se espalham mais facilmente e informam os atos de violência, ou pelo menos os aspectos performáticos e execução desses atos’’
-Julian Junk, do Instituto de Pesquisa da Paz em Frankfurt (HSFK) em entrevista à BBC News Brasil

Estes violentos movimentos de extrema direta se aproveitam da revolução criada pelas mídias sociais para espalhar suas mensagens, ideologias e narrativas para além de suas fronteiras, ultrapassando barreiras físicas como citado no começo deste texto. Aplicativos de mensagens, redes sociais e fóruns na internet também permitem que membros destes grupos se conectem no mundo real com indivíduos com ideais semelhantes. Vale ressaltar que todo este conjunto de propagação de ideias, terrorismo virtual e fake news fazem com que governantes pautados nestes ideais ganhem visibilidade e sejam eleitos. Temos claros exemplos nos Estados Unidos, Hungria, França, Áustria, Reino Unido, Polônia, Rússia, Brasil, Noruega, Espanha, Suíça, Dinamarca, Turquia, Filipinas e Itália. Países que elegeram representantes de (ou propensos à) Extrema Direita em eleições recentes.

Há algum meio de conter a propagação das fake news e a ascensão de movimentos e ideologias de extrema direita? Se sim, quais são estes meios?

Não há uma resposta exata e não será um processo fácil que acontecerá de um dia para o outro, pelo contrário, tudo indica que estas produção de falsas informações aumentará com o passar do tempo, então levará um bom tempo para livrar a sociedade deste atual mal ou fazer com que sejam menos frequentes. Para começar, devemos ter e incitar o senso crítico, nos atentar às fontes das notícias, assim, evitando passar adiante notícias falsas por desinformação. Devemos estar sempre buscando mais de uma fonte para formarmos nossas opiniões. A ‘’educação virtual’’ é um processo que deve vir da imprensa, dos meios midiáticos, dos professores, dos pais, do círculo de amigos. De acordo com o Instituto de Tecnologia de Massachusetts, notícias falsas espalham-se 70% mais rápido do que as verdadeiras e alcançam muito mais pessoas. Segundo a empresa de cibersegurança Kaspersky em parceria com a empresa CORPA, 70% dos países latinos não sabem identificar ou não têm certeza se conseguem diferenciar o que é fake news, ou não. Os brasileiros ficaram em 6º lugar entre os demais países, com 62%.

Por fim, aqui estão algumas dicas importantes para não cair em fake news daqui pra frente;

1) Não leia só o título

2) Verifique o autor

3) Veja se conhece o site

4) Observe se o texto contém erros ortográficos

5) Olhe a data de publicação

6) Saia da bolha da rede social

7) Tome cuidado com o sensacionalismo

8) Atente-se à Bibliografia

Referências

Onde o populismo de direita está no poder no mundo?
https://www.dw.com/pt-br/onde-o-populismo-de-direita-est%C3%A1-no-poder-no-mundo/a-46065697

5 países que embarcaram na rota autoritária da extrema-direita em 2019
https://www.cartacapital.com.br/mundo/5-paises-que-embarcaram-na-rota-autoritaria-da-extrema-direita-em-2019/

A Serpente na rede: extrema-direita, neofascismo e internet na Argentina
http://eeh2008.anpuh-rs.org.br/resources/content/anais/1212504757_ARQUIVO_TextoCompleto-Chang.pdf

Por que a extrema-direita cresce em todo o mundo I: a insegurança
https://jornalistaslivres.org/por-que-a-extrema-direita-cresce-em-todo-o-mundo-i-a-inseguranca/

O golpe da extrema-direita na Bolívia
https://jacobin.com.br/2019/11/o-golpe-da-extrema-direita-na-bolivia/

O que há de comum nos protestos?
https://brasil.elpais.com/brasil/2019/11/29/opinion/1575064337_508588.html?%3Fssm=TW_BR_CM&hootPostID=bb34355562af15629911db9ebf53e742

As tensões da pandemia reativam protestos na América Latina
https://www.cartacapital.com.br/mundo/as-tensoes-da-pandemia-reativam-protestos-na-america-latina/

América Latina: Chile e Bolívia prometem outubro quente de mobilizações e golpismo
https://revistaopera.com.br/2020/10/05/america-latina-chile-e-bolivia-prometem-outubro-quente-de-mobilizacoes-e-golpismo/

Após golpe da extrema direita e de militares, esquerda vence eleições na Bolívia
https://cartacampinas.com.br/2020/10/apos-golpe-da-extrema-direita-e-de-militares-esquerda-vence-eleicoes-na-bolivia/

Investigação aponta que OEA manipulou dados para acusar fraude em eleição na Bolívia
https://www.brasildefato.com.br/2020/03/13/investigacao-aponta-que-oea-manipulou-dados-para-acusar-fraude-em-eleicao-na-bolivia

COMO O GOLPE NA BOLÍVIA ABRIU CAMINHO PARA UM OPORTUNISTA DE EXTREMA DIREITA
https://theintercept.com/2019/11/12/golpe-bolivia-caminho-ultraconservadorismo/

O que está acontecendo no Chile: breve comentário sobre a luta de classes no país
https://revistaopera.com.br/2020/11/01/o-que-esta-acontecendo-no-chile-breve-comentario-sobre-a-luta-de-classes-no-pais/

A revolução dos jovens do Chile contra o modelo social herdado de Pinochet
https://brasil.elpais.com/brasil/2019/11/23/internacional/1574543096_923129.html

O que há de controverso na Constituição do Chile, que agora o país quer mudar
https://www.bbc.com/portuguese/internacional-50396727

A rebelião de massas no Chile abriu uma situação revolucionária?
https://www.brasildefato.com.br/2019/10/24/a-rebeliao-de-massas-no-chile-abriu-uma-situacao-revolucionaria

O extremismo de direita que cresce no mundo e assusta a Alemanha
https://www.bbc.com/portuguese/internacional-53197469

‘A extrema-direita não ascenderia sem fake news’, diz autor de livro sobre ativismo político na internet
https://www.diariodepernambuco.com.br/noticia/viver/2019/12/a-extrema-direita-nao-acenderia-sem-fake-news-diz-autor-de-livro-so.html

‘Fake news’ se espalham 70% mais rápido que as notícias verdadeiras, diz MIT
https://www.jornaldocomercio.com/_conteudo/2018/03/geral/615457-fake-news-se-espalham-70-mais-rapido-que-as-noticias-verdadeiras-diz-mit.html

Maioria dos brasileiros não sabe identificar fake news; estudo provou isso
https://www.uol.com.br/tilt/noticias/redacao/2020/02/13/pesquisa-que-mostra-que-os-brasileiros-nao-sabem-identificar-fake-news.htm

Estudo da ONU revela que mundo tem abismo digital de gênero
https://news.un.org/pt/story/2019/11/1693711#:~:text=Atualmente%2C%204%2C1%20bilh%C3%B5es%20de,continuam%20exclu%C3%ADdas%20da%20comunica%C3%A7%C3%A3o%20online.

O neoliberalismo nasce e morre no Chile
https://esquerdaonline.com.br/2019/10/27/o-neoliberalismo-nasce-e-morre-no-chile/

O golpe na Bolívia apoiado pelos EUA
https://www.wsws.org/pt/articles/2019/11/14/pers-n14.html

Chile em chamas: o modelo neoliberal em crise em toda a região
https://www.opendemocracy.net/pt/democraciaabierta-pt/chile-em-chamas-modelo-neoliberal-em-crise-em-toda-a-regiao/

As feridas abertas do neoliberalismo chileno
http://www.epsjv.fiocruz.br/noticias/reportagem/feridas-abertas-do-neoliberalismo-chileno

Neoliberalismo precisa da violência
https://www.brasildefato.com.br/2019/09/11/neoliberalismo-precisa-da-violencia-diz-historiadora-sobre-46-anos-do-golpe-no-chile


Publicado por: Vitor Amoroso

O texto publicado foi encaminhado por um usuário do site por meio do canal colaborativo Meu Artigo. Brasil Escola não se responsabiliza pelo conteúdo do artigo publicado, que é de total responsabilidade do autor . Para acessar os textos produzidos pelo site, acesse: https://www.brasilescola.com.