A ARTE COMO INSTRUMENTO DE AUTOCONHECIMENTO E CURA
De que forma a arte pode impactar a vida do ser humanoO texto publicado foi encaminhado por um usuário do site por meio do canal colaborativo Meu Artigo. Brasil Escola não se responsabiliza pelo conteúdo do artigo publicado, que é de total responsabilidade do autor . Para acessar os textos produzidos pelo site, acesse: https://www.brasilescola.com.
RESUMO
Como a arte pode servir como instrumento de autoconhecimento e cura? Com isto em mente, o presente trabalho tem como objetivo apresentar alguns artistas que usam de sua arte para impactar, informar e ajudar. Além destes artistas que serão brevemente citados, o desenvolvimento da pesquisa toma como referência a médica psiquiatra Dra. Nise da Silveira, reconhecida mundialmente por sua contribuição à psiquiatria, que revolucionou o tratamento mental no Brasil através de técnicas até então jamais imaginadas que consistiam em um atendimento mais humanizado, baseado na arte, na criatividade e no vínculo afetivo entre humanos e animais. A Dra. Nise foi também aluna de Carl Jung, referência no uso de recursos imagéticos, como as mandalas, que possibilitavam ao paciente conhecer melhor sobre si mesmo, suas angústias, crenças, valores e objetivos de vida. Nessas situações, o indivíduo aprendia a administrar seus sentimentos, a lidar com as ideias negativas, a melhorar a autoestima e enxergar seus potenciais, trazendo ainda outros benefícios, indicando a importância e o uso da arte, não somente com o desenvolvimento da criatividade, mas também como caminho para se alcançar maior qualidade de vida, autoconhecimento e cura de diversos diagnósticos.
Trabalhar com Arte e através dela é fator determinante para sensibilizar e gerar reflexão sobre as reais funções da arte e o quanto ela é capaz de libertar e mudar a visão das pessoas em variados aspectos. Como metodologia de pesquisa, foi desenvolvido ainda aulas com alunos autistas e down, utilizando da mandala e de outras atividades artísticas, envolvendo construção, recorte, colagem, origamis e kirigamis, desenho e pintura, propiciando uma reflexão sobre o papel transformador da arte, bem como do poder que ela exerce sobre as pessoas. Quando se une arte, educação e projetos sociais, atinge-se um número enorme de indivíduos, incluindo a população que está à margem da sociedade, eliminando assim preconceitos, e possibilitando a estas pessoas usufruir de seus direitos como cidadãos, lhes dando voz e visibilidade. Não há um consenso quando se quer definir o que seja Arte, porém é certo que é através da arte que o ser humano consegue se desenvolver plena e completamente, adquirindo autoconfiança, aprimorando seu senso estético, de observação e interpretação. A arte realmente liberta e transforma, apresentando-se como ferramenta eficaz à toda e qualquer pessoa que deseja uma evolução enquanto ser humano, que acaba por descobrir um caminho de autoconhecimento e consequentemente, cura de diversos males.
PALAVRAS-CHAVE: Arte. Transformação. Cura. Reflexão. Mandalas.
O PAPEL DA ARTE
O que a arte causa é perfeitamente claro e perceptível a partir do momento em que se têm consciência dos grandes benefícios causados em quem usa desta ferramenta como terapia: sensibilidade aguçada, afinamento da coordenação motora fina e grossa, maior percepção e observação do espaço em que se está inserido, aumento da estima pessoal, o “despertar” de bons sentimentos, e muito mais.
Psicólogos, psicopedagogos, neuropediatras, artistas, educadores e arteterapeutas, entres outros profissionais da educação e saúde, utilizam na atualidade, muita criatividade e muito da arte para eficácia maior de seus atendimentos e conteúdos, o que prova o quão importante é este recurso (a arte) na vida contemporânea.
Conforme Vigotsky a arte não foi inserida no ambiente escolar por acaso, ela tem relação com o nosso organismo. Talvez em decorrência disto, ela foi inserida neste contexto, pois é a partir da Arte que será possível desenvolver a expressão corporal, os sentimentos e aguçar os outros sentidos de nosso organismo. Podemos comparar os artistas que são citados aqui (Mundano, Vik Muniz e Eduardo Srur) como fios condutores para despertar os sentimentos e a transformação das comunidades e pessoas as quais ajudam, consciente ou inconscientemente.
Por meio da arte é possível desenvolver a percepção e a imaginação para aprender a realidade do meio ambiente desenvolver a capacidade critica permitindo analisar a realidade percebida e desenvolver a criatividade de maneira a mudar a realidade que foi analisada (BARBOSA, 2009, p. 21).
Ainda citando Vygotsky, alguns de seus estudos concluíram que quando estamos envolvidos no ato criativo, este deve ser espontâneo e não pode ser simplesmente recriado. O educador ou mediador da arte não pode contribuir para este momento de espontaneidade e nem deve interferir de modo a eliminar o que deve ser espontâneo. No máximo pode auxiliar organizando o processo de criação e intervindo para oferecer condições para que seu aluno possa buscar dentro do conhecimento apreendido, concepções, identificações e associações anteriores como base para sua criação.
Conforme Fabio Bertacini: “O contágio das pessoas só existe na medida em que o artista e as pessoas, encontram aqueles momentos infinitamente pequenos, detalhistas, dos quais se forma a obra de arte. A vida. Esses momentos só podem ser encontrados quando o homem se entregar ao sentimento. [ ... ] Só o sentimento encontra tudo isso (BERTACINI, 2006).”
Voltando às ideias de Vygotsky, o autor afirma que a arte “amplia a personalidade, enriquece-a com novas possibilidades, predispõem para a reação concluída ao fenômeno, ou seja, para o comportamento tem por natureza um sentido educativo” (VYGOTSKY, 1999, p. 325).
Diante de tantos estudos e vivências artísticas, é possível pensar que a arte é parte fundamental da existência humana, em constante equilíbrio com os fatores biológicos, sociais e econômicos. Quando estamos em contato com a arte nos tornamos pessoas melhores, menos alienadas, passando a ver o mundo de uma forma diferente, considerando novas ações de vida e almejando novas possibilidades para um futuro inovador. E neste momento em que vivemos uma fato inédito deste milênio (a pandemia que assustou e vem assustando tantas pessoas) fica ainda mais evidente o quão necessária a arte se torna para que se encontre algum equilíbrio mental.
A arte é uma importante ferramenta de reflexão, e é a partir dela que o homem pode transformar-se interna e externamente.
Através das artes temos a representação simbólica dos traços espirituais, materiais, intelectuais e emocionais que caracterizam a sociedade ou o grupo social, seu modo de vida, seu sistema de valores, suas tradições e crenças. A arte, como uma linguagem representacional dos sentidos, transmite significados que não podem ser transmitidos através de nenhum outro tipo de linguagem, tais como as linguagens discursivas e científicas (BARBOSA, s/d).
“... o arte-educador democratiza a arte, sem perder de vista os desafios de sua própria formação continuada, pois de certo modo ele é também é um aprendiz” (AZEVEDO apud BARBOSA, 2009, p. 337).
Nise da Silveira e Carl Jung
Nise da Silveira foi uma médica psiquiatra brasileira, nascida em fevereiro de 1905 em Maceió/AL que, indignada com os recursos até então utilizados para ‘tratar’ pessoas com transtornos neurológicos ou mentais, estudou e trabalhou diferentes métodos de tratamento, totalmente diferentes dos usuais. Ela criticava tratamentos violentos como o eletrochoque, camisa de força e a insulinoterapia, entre outros tratamentos agressivos, comuns em seu tempo. Admiradora do trabalho de Carl Jung, foi aluna no “Instituto Carl Gustav Jung” em dois períodos: de 1957 a 1958, e de 1961 a 1962. Lá recebeu supervisão em psicanálise de Marie-Louise von Franz, assistente de Jung.
Aluna e admiradora do trabalho de Jung, Nise revolucionou o tratamento psiquiátrico no Brasil, tendo seu trabalho grande relevância para a história da luta antimanicomial no país, ao introduzir terapias alternativas, onde colocava seus pacientes em contato direto com expressões artísticas, especialmente a modelagem e a pintura. Ela defendia formas mais humanizadas de tratamento, quebrando padrões, utilizando da Arte para manutenção da saúde mental e tornando-se pioneira da reforma psiquiátrica. Nise quebrava todos os paradigmas ao, além da terapia com arte, chamar seus pacientes pelo nome (ou mesmo citá-los como clientes), como forma de estreitar laços e confiança, além de incentivá-los a cuidar de animais domésticos, como cães e gatos.
Através de seu trabalho com Arte, conseguiu comprovar a eficácia do mesmo, além de oferecer melhor qualidade de vida aos seus pacientes, descobrindo ainda diversos talentos ocultos, que jamais seriam descobertos se não fosse a ousadia e coragem desta psiquiatra ao introduzir um tratamento novo, diferenciado e tão certeiro. A psiquiatra destacou-se por usar a arte como uma forma de expressão que deu voz aos conflitos internos vivenciados principalmente pelos esquizofrênicos, que tiveram suas obras expostas ao redor do mundo.
Em paralelo, temos o renomado psiquiatra e psicoterapeuta suíço, Carl Gustav Jung, fundador da psicologia analítica, que é um dos principais nomes quando se fala em Arteterapia.
Jung foi um grande estudioso da filosofia, das artes, mitologias e religiões, sendo considerado um dos maiores intelectuais do século XX. Sempre interessou-se pelo inconsciente, a vida interior do homem e os arquétipos. Usou a sí mesmo como matéria prima de suas descobertas – suas experiências e suas emoções – que são descritas no livro “Memórias, Sonhos e Reflexões”.
Seu trabalho desenvolveu-se através de diversas técnicas e, foi ele quem se aprofundou no estudo das Mandalas como abordagem terapêutica, trabalhando a simbologia das mandalas para expandir a definição e torná-la relevante para a vida espiritual e psicológica do ocidente moderno. Nise da Silveira, através de seu trabalho com a arte, também surpreendeu-se ao ver que muitos de seus pacientes, ao criarem suas artes, partiam normalmente de um círculo, que é a representação inicial das mandalas.
Jung também estudou profundamente as mandalas, conectando-as à representação simbólica da mente humana com as funções de conservação da ordem psíquica, que são as tomadas de consciência, integridade e criação. Ao introduzi-las a seus paciente, Jung percebeu que alguns verdadeiramente desenvolviam um real autoconhecimento, capaz de provocar algo realmente terapêutico em seu interior e, a ideia de Jung era que, através da pintura regular das mandalas, uma pessoa poderia criar um diálogo entre seu “eu verdadeiro” e seu “ego”, favorecendo a escuta de sua voz interior.
“... eu sabia que ao encontrar a mandala como uma expressão de si mesmo, tinha alcançado o que foi para mim, o melhor”. (Carl Gustav Jung)
Mesmo sem saber, Carl Jung também colaborou claramente com a criação da Arteterapia e do uso e divulgação do trabalho com as mandalas no mundo terapêutico, além de oferecer amplo material de estudo e auxílio para compreensão do conceito, contribuindo ainda para tornar seu estudo e conhecimento acessível ao público ocidental e a todos os interessados e profissionais envolvidos com desenvolvimento pessoal e social, além de autoconhecimento.
Núcleo de Atenção e Orientação Terapêutica ao Trabalho (NAOTT)
O NAOTT É um projeto assistencial, mantido com recursos da prefeitura da cidade e a colaboração de empresários e moradores, oferecendo atendimento psicossocial para pessoas com deficiência, preparo dos participantes para o mercado de trabalho e realização de atividades remuneradas dentro da própria instituição, através de atividades diversificadas, sendo a Arte uma das principais ferramentas, já que os alunos têm aulas de dança circular, jiu-jitsu, música, viola caipira, artes visuais e artesanato. Possuem ainda assistência de psicólogo e de terapeuta ocupacional, atendimento odontológico e aulas de reforço pedagógico, além de produzir ainda em uma horta alimentos que são consumidos em refeições oferecidas pela Prefeitura.
O NAOTT é um local que privilegia e reconhece a arte como um instrumento de transformação social, ao utilizar dos recursos e aulas citadas acima. Por esta razão, a necessidade de reconhecer e apresentar a instituição e o projeto neste trabalho (desenvolvido com grande carinho e atenção) e que tem como intuito, levar mais pessoas a reflexão de onde a arte pode chegar e o quanto pode alcançar.
Na instituição há mais de 16 anos, a coordenadora do NAOTT Nadir Marques da Silva ressalta a importância do trabalho desenvolvido no Núcleo. “A gente vê que o projeto não se perde. Tem um começo, meio e fim”, explicou. “O começo é acolher, o meio é tratá-los e o fim é o começo para eles… se inicia uma nova vida”. E tudo isso através do acolhimento, da atenção, do atendimento profissional e da Arte que, neste caso, entra como terapia, desenvolvimento e autoconhecimento.
CONCLUSÃO
Analisando o trabalho de alguns artistas e dos psicanalistas Nise da Silveira e Carl Jung, é possível notar o poder transformador da arte, que ultrapassa a beleza, a estética e a expressão, e entra como terapia, cura, conhecimento, crescimento pessoal e autoconfiança através das ferramentas artísticas (pintura, desenho, teatro, colagem, recorte, etc...). Quando é apresentado o Projeto Pimp my Carroça do artivista urbano Thiago Mundano, reconhecemos a visibilidade e atenção direcionada aos catadores de recicláveis, e o quão grande tornou-se o projeto com a união de pessoas sensibilizadas com a causa e outros artistas dispostos a “colorir” e valorizar as carroças que são utilizadas como instrumento de trabalho desses trabalhadores até então totalmente desvalorizados pela sociedade, que transitavam como se fossem invisíveis. Na arte como mediadora, e na sequência, uma breve apresentação do trabalho realizado pelo artista Vik Muniz, é enfatizando o documentário “Lixo Extraordinário” onde se tem uma observação sobre sua mediação no Jardim Gramacho e a sua influência impactante junto às pessoas do lixão, verificando-se no comportamento e palavras dos catadores diante da arte de Vik, a mudança de pensamentos e tantos outros requisitos que foram transformando-os e levando-os para um mundo repleto de novas perspectivas, novos sonhos e muitas conquistas através da arte.
Ao fazer uma breve descrição do trabalho dos psicanalistas Nise da Silveira e Carl Jung, há um convite a todos para uma grande reflexão e posicionamento, mostrando que trabalhando a arte como terapia, é possível atender de forma mais humanizada a todos que necessitam de uma atenção maior, com intervenções que despertam, conscientizam, educam e transformam a vida de muitos.
A abordagem sobre Arteterapia onde são citados Nise e Jung, foca em pacientes com distúrbios relacionados a transtornos mentais, no entanto, ao conhecer mais profundamente os estudos de Carl Jung, e os benefícios da Arteterapia, nota-se facilmente que este tipo de terapia não tem um público exclusivo ou limitado, como se conheceu no início, mas é de grande importância para todas as pessoas, atendendo à uma diversidade de público, tratando distúrbios relacionados a ansiedade, pânico, insegurança, e transtornos neurológicos e mentais, incluindo algumas psicopatologias.
O artigo é finalizado com o trabalho do Núcleo de Atenção e Orientação Terapêutica ao Trabalho (NAOTT), que mostra que a arte é transformadora ao dar uma nova perspectiva à pessoas deficientes, através de trabalhos manuais que auxiliam no tratamento, preparam indivíduos dando-lhe mais independência, valorização e criatividade, inserindo-os na sociedade de maneira bela e efetiva.
Nota-se o poder de transformação social da arte, bem como seu uso como instrumento de Autoconhecimento e Cura, comprovando-se que o indivíduo tem nas mãos a possibilidade de criar suas oportunidades e suas vontades. O conhecimento é algo que não pode ser retido e a arte é capaz de enriquecê-lo, fazendo os sentimentos e expressões da alma se exteriorizarem, enriquecendo este elemento essencial para a vida.
Dificuldades existem e são diversas, porém a determinação e confiança se fazem necessárias e, ao analisar o posicionamento dos citados, é possível perceber que não vale a pena somente olhar os problemas, mas focar em uma solução provando que com a arte é mais que possível se alcançar objetivos, e assim poder avançar rumo a um mundo melhor. [ ... ]
Encerro este trabalho com muito carinho e satisfação por ter cada dia mais certeza do quanto a arte é indispensável e o quanto sua atuação na sociedade serve como um elemento positivo e indispensável. E a terapia com Arte não é somente prazer e recreação, embora também seja, mas principalmente, área de conhecimento, instrumento de cura, amplitude da mente e do ser humano.
Concluo assim que a Arteterapia, foco deste artigo, não só pode como deve ser utilizada como uma ferramenta de transformação da sociedade, através da terapia com arte, em que todos os locais devem tê-la como um instrumento de cura, maior valorização e visibilidade, que podem ser obtidas através do empenho e dedicação de artistas-mediadores, psicólogos e psiquiatras, educadores, pais e sociólogos que, em suas práticas médicas, ativistas, empáticas e educativas, têm a consciência da importância da arte e de seu trabalho para o local onde atuam, mesmo existindo dificuldades variadas, já que nem sempre são dirigidos recursos para que este trabalho efetivamente ocorra.
REFERÊNCIAS
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Publicado por: Diana Farias de Graaff
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