Os direitos sexuais e reprodutivos no Brasil a partir da Constituição cidadã
De acordo com Carrara e Viana, foi somente com o processo de abertura política é que se tornou clara a construção de uma pauta especificamente centrada nos direitos das mulheres.O texto publicado foi encaminhado por um usuário do site por meio do canal colaborativo Meu Artigo. Brasil Escola não se responsabiliza pelo conteúdo do artigo publicado, que é de total responsabilidade do autor . Para acessar os textos produzidos pelo site, acesse: https://www.brasilescola.com.
Sérgio Carrara e Adriana Viana
Os direitos sexuais e reprodutivos são temas que começaram a ganhar força nos anos de 1960, contudo devemos observar que a luta pelos direitos das mulheres já se iniciava no século XIX e na primeira metade do século XX, período em que o movimento de mulheres já lutava pela igualdade, educação e pelo direito ao voto.“Os direitos sexuais e reprodutivos constituem um aspecto essencial dos direitos da pessoa humana, que deve ser traduzido na melhoria da qualidade de vida das populações e, devem ser garantidos aos indivíduos (homens e mulheres) de todas as classes sociais. Ao passo que são direitos humanos, são universais devendo ser concebidos globalmente, de forma equitativa e equilibrada, acordando-lhes a mesma importância, tendo sempre em conta as particularidades nacionais, históricas e as especificidades sócio-culturais e religiosas(…).” Fonte: IPPF – Carta sobre os Direitos em Matéria de Sexualidade e de Reprodução - Tradução e Compilação: Conceição Fortes (Consultora IEC)
Sérgio Carrara e Adriana Viana no presente texto, nos elucidam de forma brilhante sobre a centralidade da constituição de 1988 na configuração dos direitos sexuais e reprodutivos no Brasil e, avaliam seu impacto na arquitetura jurídico-política do país, analisando o contexto no qual foi formulada. De acordo com Carrara e Viana, “a chamada “constituição cidadã” espelhou a configuração de forças existentes entre diferentes movimentos sociais, que buscavam transportar para a esfera pública questões antes consideradas do ambito da vida privada.” Logo, “a carta de 1988 deve ser considerada como marco fundamental, a partir do qual sexualidade e a reprodução se instituiram como campo legítimo de exercício de direitos no Brasil. (…) é em torno dela que da perspectiva da sociedade civil, são organizadas as demandas por tais direitos e, da perspectiva do Estado, são geradas políticas públicas, instrumentos legais e decisões judiciais para responder a tais demandas.”Carrara e Viana destacam ainda, que para falarmos em direitos reprodutivos e principalmente em direitos sexuais presumi-se percorrer a trajetória do movimento de mulheres e especificamente do movimento feminista, pois as articulações impulsionadas por militantes e organizações feministas em conjunto com movimentações mais abrangentes pela democratização do país desempenharam papel decisivo na inscrição de demandas pela igualdade de gênero na estrutura jurídico-normativa do país.Segundo os autores, foram trazidas a baila, a cena política, discussões sobre a complexidade das relações de gênero e, sobre a importância da sexualidade e da reprodução como temas vitais para a construção da autonomia das mulheres em relação as decisões que envolvem seus próprios corpos.[1]Vale a pena ressaltar o tópico referente aos órfãos da chamada “Constituição cidadã”segundo Carrara e Viana, que esclarecem que no Brasil nos idos de 1970[2], a representação social segundo a qual a homossexualidade aparecia como misto de imoralidade, desonra, pecado e doença começou a ser criticada publicamente pelos primeiros grupos ativistas homossexuais, essa crítica desenvolveu-se em paralelo às discussões em torno dos direitos reprodutivos das mulheres, e, como elas articulou-se inicalmente nas universidades e no âmbito da contracultura. Carrara e Viana nos esclarecem que a construção de direitos das minorias sexuais se faz na direção do combate as situações envolvendo discriminação de gays, lésbicas, travestis e transexuais, seja pela promulgação de dispositivos que proibam diretamente a discriminação seja por tentativas de estender a tais grupos direitos civis e sociais consagrados aos heterossexuais, [3] e, ainda, segundo eles, mesmo que as chamadas minorias sexuais sejam consideradas “órfãs” da constituição de 1988, o impacto da nova carta para elas não é insignificativo devido ao número de importantes decisões que , baseadas em seu “espírito”, vêm sendo tomadas por juízes e tribunais.De acordo com Carra e Viana, é interessante ressaltar que mesmo recorrendo aos princípios mais gerais instituídos pela constituição de 1988, a emergência de demandas de sujeitos não contemplados por ela[4], expõe os pressupostos naturalizados e naturalizantes relativos a sexo/gênero incorporados a nova carta, assim como seu viés profundamente heterossexista.Segundo os autores, no que diz respeito a elaboração de políticas públicas ou de leis infra constitucionais, é possível identificar como linhas mestras da constituição para esses temas, a promoção da equidade de gênero e a não discriminação de grupos e indivíduos, além da concepção de saúde como direito universal[5]. Muito embora tenhamos percorrido um árduo caminho,e, ainda temos muito o que percorrer, a situação das chamadas minorias sexuais e das mulheres no Brasil pode ser considerada bem melhor do que em outros países do mundo, e, em comparação com o que tínhamos há 20 anos atrás evoluímos muito. Precisamos considerar que desde a década de 1970, o Brasil viveu momentos políticos e econômicos diferentes, que fatalmente afetaram as políticas públicas, de saúde, entretanto podemos afirmar que houve avanços significativos.
[1] De acordo com Carrara e Viana, foi somente com o processo de abertura política é que se tornou clara a construção de uma pauta especificamente centrada nos direitos das mulheres; Os autores ressaltam os “marcos” dos anos de 1980 pela busca efetiva da equidade de gênero, com destaque para as temáticas da “violência contra a mulher” e da “saúde da mulher”, as iniciativas[1]tomadas foram fundamentais para a introdução do princípio da igualdade de gênero (art. 5,I) no processo de elaboração da constituição federal de 1988.
[2]são marcos desse momento o surgimento de uma imprensa homossexual politicamente engajada, com a criação por um grupo de intelectuais do Rio de janeiro e São Paulo do jornal O lampião da esquina (1978), e a organização na cidade de São Paulo do grupo somos em 1979, primiero grupo de ativistas homossexuais do Brasil.
[3]para Carrara e Viana, um grande complicador foi a não inclusão de uma cláusula na constituição de 1988 sobre a não discriminação por orientação sexual, pois os trabalhos da assembléia nacional transcorreram em um período de reestruturação do movimento homossexual brasileiro,
[4]como é o caso de travestis e transexuais.
[5]A conversão de tais linhas em políticas concretas, decisões judiciais, leis,decretos etc. , se dá, em certos momentos pela especificação de situações e/ou sujeitos, que mesmo não claramente designadas no texto contitucional , dele podem valer-se para alcançar certos “direitos”.Em outros o que aparece é a defesa de princípios constitucionais como forma de impedir procedimentos discriminatórios ou ainda, de expandir, por homologia, benefícios sociais a sujeitos que não seriam previamente por eles contemplados.
Publicado por: Bianca Wild
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