A FUNÇÃO DAS PRAÇAS NAS CIDADES: ESPAÇOS PÚBLICOS COMO VETORES DE QUALIDADE DE VIDA E INCLUSÃO URBANA
Breve análise acerca da função das praças nas cidades contemporâneas, considerando sua importância para a coesão social, o bem-estar urbano e o planejamento sustentável.
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A FUNÇÃO DAS PRAÇAS NAS CIDADES: ESPAÇOS PÚBLICOS COMO VETORES DE QUALIDADE DE VIDA E INCLUSÃO URBANA
RESUMO
As praças urbanas exercem papel fundamental na promoção da qualidade de vida, atuando como espaços públicos de convivência, lazer, saúde e inclusão social. Este artigo tem como objetivo analisar, por meio de uma revisão narrativa da literatura, a função das praças nas cidades contemporâneas, considerando sua importância para a coesão social, o bem-estar urbano e o planejamento sustentável. Foram utilizados oito artigos científicos, publicados entre 2007 e 2024, localizados em bases como SciELO, Springer, Google Acadêmico e repositórios institucionais. Os resultados apontam que praças bem projetadas e acessíveis contribuem para a saúde física e mental da população, fortalecem vínculos comunitários e promovem equidade espacial, especialmente em territórios vulneráveis. No entanto, persistem desafios relacionados à manutenção, segurança, participação popular e distribuição equitativa desses espaços. Conclui-se que o fortalecimento das praças como equipamentos urbanos estratégicos exige políticas públicas intersetoriais, gestão participativa e valorização de sua multifuncionalidade no cotidiano das cidades.
Palavras-chave: Praças urbanas; Espaços públicos; Qualidade de vida; Planejamento urbano; Inclusão social.
ABSTRACT
Urban squares play a fundamental role in promoting quality of life, serving as public spaces for social interaction, leisure, health, and social inclusion. This article aims to analyze, through a narrative literature review, the function of squares in contemporary cities, considering their importance for social cohesion, urban well-being, and sustainable planning. Eight scientific articles published between 2007 and 2024 were used, sourced from databases such as SciELO, Springer, Google Scholar, and institutional repositories. The results indicate that well-designed and accessible squares contribute to the physical and mental health of the population, strengthen community bonds, and promote spatial equity, especially in vulnerable territories. However, challenges remain regarding maintenance, safety, citizen participation, and equitable distribution of these spaces. It is concluded that strengthening squares as strategic urban facilities requires intersectoral public policies, participatory management, and appreciation of their multifunctionality in the daily life of cities.
Keywords: Urban squares; Public spaces; Quality of life; Urban planning; Social inclusion.
INTRODUÇÃO
As praças urbanas constituem elementos essenciais da malha urbana das cidades contemporâneas, exercendo papel fundamental como espaços livres de convivência, sociabilidade, lazer e manifestações culturais. Sua presença está diretamente relacionada à promoção do bem-estar coletivo e ao fortalecimento dos vínculos sociais nas comunidades. Desde a antiguidade, com a ágora grega e o fórum romano, até as modernas centralidades urbanas, as praças têm sido cenários privilegiados da vida pública, lugares de encontro, de trocas simbólicas e de exercício da cidadania (Alberto; Barbosa, 2023). No contexto urbano brasileiro, esse tipo de espaço assume múltiplas funções, sobretudo em localidades onde há carência de áreas verdes e infraestrutura de lazer, especialmente nas periferias e em pequenas cidades (Gomes, 2007).
O processo de urbanização acelerado nas últimas décadas e a predominância do modelo de desenvolvimento centrado na lógica do mercado têm provocado significativas transformações no uso e na configuração dos espaços públicos. Muitas praças, antes marcadas pela centralidade e uso coletivo, passaram a ser negligenciadas pelo poder público, tornando-se, em alguns casos, espaços deteriorados e vulneráveis à insegurança urbana (Qi et al., 2024). A revalorização dessas áreas passa, portanto, por compreender seu papel como suporte físico e simbólico para a construção de vínculos sociais e promoção da coesão comunitária, elemento central para a qualidade de vida urbana e o fortalecimento da democracia (Bovo; Hahn; Ré, 2016).
As praças também devem ser analisadas sob a ótica das dimensões ambientais, funcionais e estéticas que influenciam diretamente sua atratividade e frequência de uso. Estudos indicam que fatores como conforto térmico, acessibilidade, diversidade de usos, presença de mobiliário urbano e sensação de segurança influenciam positivamente a permanência das pessoas nesses espaços (Guedoudj; Ghenouchi; Toussaint, 2020). Em especial, o uso intergeracional das praças evidencia seu caráter inclusivo, ao permitir a interação entre diferentes faixas etárias e grupos sociais, o que reforça seu potencial como território de integração e pertencimento (Qi et al., 2024; Zhang; Lawson, 2009).
Do ponto de vista da saúde pública e da qualidade de vida, as praças representam locais privilegiados para a promoção de atividades físicas ao ar livre, lazer contemplativo, redução do estresse e estímulo à mobilidade ativa, como o caminhar e o uso da bicicleta. A literatura contemporânea reconhece que o acesso equitativo e bem distribuído a espaços públicos de qualidade está associado a melhores indicadores de saúde física e mental da população urbana (Alberto; Barbosa, 2023). Ademais, o contato com o verde urbano presente nas praças contribui para a mitigação dos efeitos das ilhas de calor, a purificação do ar e o aumento da biodiversidade em centros urbanos densamente construídos (Qi et al., 2024).
No entanto, a efetividade das praças como espaços de convivência depende não apenas de sua configuração física, mas também de políticas públicas de manutenção, segurança e participação social. A ausência de gestão adequada pode transformar esses espaços em áreas de abandono, gerando impactos negativos na percepção de segurança e utilidade por parte da população (Gomes, 2007). Por isso, torna-se necessário refletir sobre diretrizes de planejamento e projeto que considerem as especificidades locais, a escuta ativa da comunidade usuária e o incentivo à apropriação coletiva do espaço, de modo a garantir sua sustentabilidade social, ambiental e urbanística (Alberto; Barbosa, 2023).
Diante desse contexto, o presente artigo tem como objetivo analisar a função das praças nas cidades contemporâneas, enfatizando sua importância como espaços públicos fundamentais para a promoção da qualidade de vida urbana. Por meio de revisão bibliográfica de caráter qualitativo, pretende-se discutir a relação entre o desenho urbano, o uso social das praças e seus impactos sobre a coesão comunitária, a saúde pública e a vitalidade das cidades. Para isso, foram utilizados estudos nacionais e internacionais que tratam da morfologia, funcionalidade, apropriação e planejamento das praças urbanas, a fim de subsidiar reflexões que possam contribuir para o fortalecimento desses espaços como pilares estruturantes das cidades sustentáveis e inclusivas.
METODOLOGIA
Este estudo caracteriza-se como uma pesquisa qualitativa, de natureza exploratória e analítica, fundamentada em revisão bibliográfica sistemática e narrativa. O objetivo foi compreender o papel das praças públicas nas cidades contemporâneas, com foco em seus impactos urbanísticos, sociais e ambientais na qualidade de vida urbana.
A investigação envolveu a seleção e análise crítica de publicações acadêmicas (artigos, livros, dissertações e relatórios), disponíveis entre 2000 e 2024, extraídas de bases como SciELO, Google Acadêmico, Web of Science, SpringerLink e periódicos nacionais da área de Arquitetura e Urbanismo. Os descritores utilizados incluíram: “praças públicas”, “espaço urbano”, “qualidade de vida”, “coesão social” e “urbanismo”.
Foram incluídos estudos com abordagem interdisciplinar e foco nas múltiplas dimensões das praças – morfológica, funcional, histórica e ambiental. Publicações opinativas ou sem revisão por pares foram excluídas. A análise dos dados seguiu uma categorização temática com base na literatura: (i) evolução histórica; (ii) funções urbanas; (iii) planejamento; (iv) sociabilidade e saúde pública; e (v) diretrizes de qualificação.
A metodologia permitiu construir uma visão crítica e comparativa, articulando contribuições nacionais e internacionais, e destacando práticas aplicáveis ao contexto urbano brasileiro, especialmente em cidades de pequeno e médio porte.
FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
Origem e Significado das Praças Públicas
As praças públicas remontam à Antiguidade, sendo herdeiras diretas da ágora grega e do fórum romano, espaços que articulavam vida cívica, religiosa e comercial. Nessas culturas, a praça não era apenas um lugar de encontro, mas o próprio palco da vida política e da democracia direta, representando o coração da cidade. Segundo Gomes (2007), a praça é um espaço ancestral que expressa a gênese do conceito ocidental de urbano. No contexto europeu medieval e moderno, esses espaços continuaram sendo pontos de confluência social e arquitetônica, com funções multifacetadas: desde mercados até locais de manifestações públicas e cerimônias religiosas.
No Brasil, o surgimento das praças está diretamente ligado à urbanização colonial e à implantação do modelo de cidade luso-brasileira. A conformação dos largos em frente às igrejas – como os adros paroquiais – foi o embrião das praças urbanas brasileiras. Esses espaços se tornaram referências de centralidade, onde se instalavam os principais edifícios civis, religiosos e administrativos, além do comércio local. De acordo com Marx (1980), citado por Gomes (2007), a praça se desenvolveu como um “logradouro público por excelência”, intimamente ligada à expressão da vida coletiva e religiosa nos centros urbanos coloniais.
Com o tempo, o conceito de praça passou a abranger aspectos formais e simbólicos da urbanidade. Para Robba e Macedo (2002), o uso e a acessibilidade são premissas essenciais na definição de uma praça contemporânea, entendida como espaço livre urbano, voltado ao lazer e à convivência, e livre da circulação de veículos. Essa concepção valoriza o caráter democrático da praça, resgatando sua função originária como espaço de acesso público universal, de fruição estética e de interação social entre diferentes grupos e classes sociais.
O significado da praça evoluiu para além da função estética ou de lazer, incorporando dimensões identitárias, culturais e políticas. Casé (2000) a define como a “síntese da cultura urbana de uma comunidade”, sendo um local onde se cristalizam memórias, pertencimentos e narrativas coletivas. Em cidades brasileiras, praças como a da Sé (São Paulo) ou a dos Três Poderes (Brasília) assumem papel simbólico e institucional, refletindo ideologias e projetos de poder, além de manterem a função de cenário para manifestações e atos de resistência.
A partir do século XX, especialmente após os anos 1960, estudos urbanos passaram a reconhecer as praças como espaços de sociabilidade ativa e de dinâmicas cotidianas. Para Alberto e Barbosa (2023), esses locais são simultaneamente físicos e simbólicos, sendo integradores do tecido urbano, receptores de atividades diversas e catalisadores de interações sociais. Sua permanência na estrutura das cidades representa uma constante em meio às transformações impostas pela verticalização, privatização e fragmentação urbana.
A compreensão histórica da praça é, portanto, fundamental para entender sua atual função no espaço urbano contemporâneo. Mais que locais de passagem ou decoração paisagística, as praças são artefatos culturais e urbanísticos cuja existência revela a luta por espaço público de qualidade, democrático e acessível. Sua evolução evidencia não apenas mudanças formais na cidade, mas também transformações nos modos de vida, nas relações sociais e nas políticas de gestão urbana.
Funções Sociais, Ambientais e Estéticas
As praças públicas cumprem diversas funções simultâneas e complementares no espaço urbano, sendo reconhecidas como equipamentos coletivos que articulam o social, o ambiental e o estético. Do ponto de vista social, as praças se configuram como espaços de encontro, convivência e interação entre indivíduos e grupos de diferentes idades, classes e culturas. Conforme Hahn, Bovo e Ré (2016), esses espaços reforçam o sentimento de pertencimento e identidade coletiva, pois se constituem como territórios de significação simbólica e de expressão das práticas cotidianas das comunidades locais. São lugares de lazer democrático, onde crianças brincam, jovens se reúnem e idosos encontram oportunidade para o convívio e a socialização.
A função ambiental das praças urbanas é cada vez mais valorizada diante dos desafios impostos pelas mudanças climáticas, pelo adensamento urbano e pela carência de áreas verdes. Alberto e Barbosa (2023) destacam que esses espaços livres contribuem diretamente para a melhoria do microclima urbano, ajudando a reduzir as ilhas de calor, ampliar a permeabilidade do solo, proporcionar sombreamento e favorecer a biodiversidade. Além disso, o contato com a vegetação presente nas praças tem efeitos comprovadamente positivos na saúde mental da população, contribuindo para a redução do estresse, da ansiedade e da sensação de isolamento, sobretudo em grandes cidades.
Esteticamente, as praças atuam como elementos qualificadores da paisagem urbana, compondo a estrutura visual das cidades. Seu desenho paisagístico, a disposição do mobiliário urbano, a presença de espelhos d’água, esculturas, flores e árvores influenciam diretamente a experiência estética dos usuários. A atratividade visual desses espaços desempenha um papel fundamental na sensação de bem-estar dos frequentadores, além de contribuir para a valorização do entorno. Guedoudj, Ghenouchi e Toussaint (2020) afirmam que a harmonia entre os componentes físicos e a vivência social nas praças é essencial para fomentar a permanência e a apropriação positiva do espaço público.
Outro aspecto importante é a multifuncionalidade das praças, que permite a realização de diversas atividades, formais e informais, como feiras, apresentações culturais, rodas de conversa, práticas esportivas, passeios e eventos cívicos. Essa versatilidade torna a praça um espaço altamente adaptável às necessidades locais, o que reforça sua importância como equipamento urbano de uso múltiplo. Qi et al. (2024) destacam que praças bem projetadas e geridas, com acessibilidade universal, infraestrutura adequada e segurança, favorecem práticas coletivas que fortalecem a coesão social e a vitalidade urbana.
No entanto, é importante ressaltar que a plena realização das funções sociais, ambientais e estéticas das praças depende de uma gestão pública eficaz e participativa. O abandono desses espaços, a falta de manutenção, a ausência de segurança e a má qualidade do mobiliário comprometem sua utilização e favorecem a estigmatização das praças como locais de risco. Gomes (2007) observa que, em muitos contextos urbanos brasileiros, a negligência do poder público transforma as praças em áreas marginalizadas, afastando os usuários e dificultando sua apropriação pela coletividade.
Dessa forma, reconhece-se que as praças urbanas, ao congregarem múltiplas funções e significados, representam um dos pilares do espaço público democrático. Sua concepção e uso refletem valores sociais, culturais e ambientais da sociedade, sendo, portanto, espaços estratégicos para a promoção da equidade urbana, da saúde coletiva e da convivência pacífica. É fundamental, nesse sentido, que o planejamento urbano contemporâneo incorpore políticas públicas que assegurem a preservação, requalificação e ampliação dessas áreas, garantindo sua relevância no cotidiano das cidades sustentáveis.
Praças, Planejamento Urbano e Qualidade de Vida
O planejamento urbano contemporâneo reconhece as praças como elementos estruturantes da cidade, essenciais para a composição de uma malha urbana equilibrada, acessível e humanizada. A presença e a distribuição equitativa desses espaços livres refletem o compromisso do poder público com a qualidade de vida da população. Conforme apontam Alberto e Barbosa (2023), as praças são instrumentos fundamentais para mitigar os efeitos negativos da urbanização intensiva, ao proporcionar áreas de respiro em meio à densidade construída, espaços de socialização e contato com a natureza. Sua integração ao sistema urbano deve ser guiada por critérios técnicos e sociais, que considerem as necessidades reais da população e o contexto socioespacial de cada localidade.
A literatura destaca que o planejamento eficiente das praças deve considerar parâmetros como localização, acessibilidade, conectividade, visibilidade, segurança e diversidade de usos. Qi et al. (2024) apontam que a boa performance social dos espaços públicos está relacionada à sua capacidade de promover encontros e estimular interações espontâneas entre diferentes grupos sociais. Assim, praças inseridas em áreas centrais ou em locais de passagem tendem a ter maior potencial de uso, especialmente quando articuladas com transporte público, comércio de proximidade e equipamentos comunitários. A localização estratégica amplia a visibilidade e o uso contínuo do espaço, reduzindo a ociosidade e aumentando a sensação de segurança urbana.
Outro aspecto relevante é o papel das praças no combate à segregação socioespacial, uma vez que sua presença pode democratizar o acesso a áreas de lazer e cultura, especialmente em bairros periféricos e em pequenas cidades. Estudos como o de Hahn, Bovo e Ré (2016) evidenciam que, mesmo em contextos urbanos de menor escala, as praças exercem papel estruturador, concentrando serviços, comércio e atividades comunitárias, o que fortalece o tecido urbano local e evita deslocamentos excessivos. O planejamento urbano deve, portanto, incorporar a lógica das centralidades múltiplas, garantindo que todas as regiões urbanas disponham de espaços públicos bem planejados, seguros e acolhedores.
A qualidade das praças está diretamente relacionada à promoção da saúde e do bem-estar da população. Esses espaços favorecem práticas físicas como caminhadas, jogos e exercícios ao ar livre, além de contribuírem para a saúde mental, ao oferecerem locais de descanso, contemplação e lazer. Guedoudj, Ghenouchi e Toussaint (2020) reforçam que o conforto ambiental, a presença de áreas verdes e a possibilidade de múltiplos usos ampliam a atratividade das praças e incentivam sua permanência, o que fortalece os laços sociais e o uso contínuo dos espaços urbanos. Nesse sentido, a boa qualidade das praças reflete uma cidade que cuida de seus cidadãos e promove a vida em comunidade.
No entanto, muitos municípios brasileiros ainda enfrentam desafios significativos para incorporar a lógica do planejamento participativo e sustentável na concepção de seus espaços públicos. Gomes (2007) observa que grande parte das praças existentes foi implantada sem planejamento adequado, e sua manutenção carece de diretrizes claras e orçamentos específicos. Isso compromete a qualidade do espaço e a segurança dos usuários, desestimulando seu uso e contribuindo para sua degradação. É necessário, portanto, que os planos diretores municipais incorporem de forma efetiva diretrizes voltadas à preservação, ampliação e qualificação das praças, com metas objetivas e indicadores de desempenho.
Além disso, o planejamento urbano deve ser sensível às transformações sociais, ambientais e culturais do território, promovendo praças que atendam às novas demandas da vida urbana contemporânea. Isso inclui desde a inserção de tecnologias sustentáveis e mobiliário inteligente até o estímulo à apropriação comunitária do espaço, por meio de processos participativos e educativos. Alberto e Barbosa (2023) enfatizam que a ressignificação das praças passa por um planejamento integrado e intersetorial, que considere a saúde urbana, o direito à cidade, a justiça ambiental e a inclusão social como princípios orientadores. Assim, as praças podem consolidar-se como espaços estratégicos para a construção de cidades mais justas, resilientes e humanas.
Coesão Social, Saúde Pública e Inclusão
As praças urbanas são reconhecidas como importantes vetores de coesão social, pois oferecem oportunidades para encontros intergrupais, fortalecendo laços comunitários e promovendo o senso de pertencimento. Qi et al. (2024), em revisão sistemática sobre espaços públicos e coesão social, demonstram que a presença de praças bem planejadas, acessíveis e seguras favorece a convivência entre diferentes faixas etárias, etnias, gêneros e classes sociais. Esses espaços contribuem para reduzir a fragmentação urbana ao incentivar o contato cotidiano entre moradores, promovendo a confiança mútua e a solidariedade. Assim, praças funcionam como mediadoras da vida pública e do capital social, fundamentais para a construção de comunidades mais resilientes.
A presença de equipamentos urbanos de qualidade em praças — como bancos, áreas sombreadas, espaços para jogos, brinquedos e pistas de caminhada — estimula práticas saudáveis e fortalece a saúde pública. De acordo com Alberto e Barbosa (2023), as praças urbanas favorecem estilos de vida ativos e contribuem para a prevenção de doenças crônicas não transmissíveis, como hipertensão, diabetes e obesidade, por meio do estímulo à atividade física ao ar livre. Além disso, a possibilidade de convívio em ambientes abertos e arborizados está associada à melhoria da saúde mental, à redução do estresse e ao aumento da sensação de bem-estar. Esses efeitos tornam-se ainda mais relevantes diante do contexto pós-pandemia, em que o espaço público ganha importância estratégica na promoção da saúde coletiva.
Do ponto de vista da inclusão social, as praças se apresentam como espaços democráticos, de uso gratuito, que acolhem práticas culturais, esportivas e religiosas diversas. No entanto, sua efetiva função inclusiva depende de políticas públicas que garantam acessibilidade universal, iluminação adequada, segurança e manutenção constante. Guedoudj, Ghenouchi e Toussaint (2020) demonstram que o sentimento de pertencimento ao espaço público está diretamente relacionado à percepção de conforto, à disponibilidade de usos múltiplos e à ausência de barreiras físicas e simbólicas que possam excluir determinados grupos sociais. Assim, as praças não apenas devem ser acessíveis no plano físico, mas também no plano simbólico e relacional.
Em pequenas cidades, onde as opções de lazer são limitadas, a função inclusiva das praças é ainda mais evidente. Hahn, Bovo e Ré (2016) destacam que esses espaços representam o principal ponto de encontro da comunidade, sendo palco de festas populares, atividades escolares, feiras e manifestações culturais locais. A praça assume, nesse contexto, um papel central na vida social do município, integrando diferentes gerações e fortalecendo a identidade cultural local. Quando bem cuidada, torna-se referência de pertencimento e orgulho para os moradores, configurando-se como um espaço de valorização da memória coletiva e da vida cotidiana.
Contudo, a coesão social proporcionada pelas praças pode ser comprometida por processos de estigmatização e marginalização, como o abandono pelo poder público, a presença de usuários de drogas, a insegurança e a falta de manutenção. Gomes (2007) alerta que, em muitos bairros populares, as praças são deixadas à margem das políticas de urbanização e passam a ser vistas como espaços perigosos ou “resíduos urbanos”. Esse processo de degradação impede a apropriação comunitária e rompe a lógica do espaço público como lugar de inclusão e encontro. Para reverter esse cenário, é necessário um esforço conjunto entre poder público, comunidade e agentes sociais para ressignificar esses espaços e reinseri-los como ativos na rede de suporte social da cidade.
A consolidação das praças como instrumentos de saúde pública, inclusão e coesão social exige abordagens integradas de planejamento, gestão participativa e políticas públicas intersetoriais. A valorização desses espaços como bens comuns implica reconhecer sua centralidade na vida urbana e sua contribuição para os direitos fundamentais à cidade e à saúde. Conforme defendem Qi et al. (2024), repensar o desenho, a função e a gestão das praças urbanas é uma estratégia eficaz para enfrentar os desafios da fragmentação urbana, da desigualdade de acesso e da vulnerabilidade social. Ao garantir praças inclusivas, seguras e ativamente utilizadas, as cidades caminham na direção da sustentabilidade urbana e da equidade social.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
A revisão da literatura permitiu identificar que as praças urbanas cumprem papel multifuncional no cotidiano das cidades, sendo valorizadas tanto por seus atributos físicos quanto por sua capacidade de promover interações sociais e vínculos comunitários. Os estudos analisados convergem na ideia de que praças bem projetadas, acessíveis e integradas ao tecido urbano estimulam práticas de convivência, lazer, contemplação e atividade física. Qi et al. (2024) destacam que a diversidade de usos e a convivência entre diferentes grupos sociais nas praças contribuem para a coesão social e o fortalecimento do sentimento de pertencimento. Esse resultado indica que, mais do que espaços de lazer, as praças funcionam como plataformas de cidadania ativa.
As pesquisas também demonstram que a atratividade das praças está diretamente relacionada à qualidade de seu ambiente construído. Guedoudj, Ghenouchi e Toussaint (2020) ressaltam que elementos como arborização, conforto térmico, mobiliário urbano adequado, proximidade e segurança são determinantes para a permanência dos usuários. Praças que carecem desses elementos tendem a ser evitadas pela população, perdendo sua função social e tornando-se espaços subutilizados. Essa observação reforça a importância do planejamento urbano baseado em diagnósticos locais e na escuta ativa das comunidades, para que os projetos atendam às reais demandas do território.
Outro ponto amplamente discutido nas fontes consultadas é o impacto das praças na saúde pública. Estudos como os de Alberto e Barbosa (2023) evidenciam que a presença de áreas verdes e espaços livres qualificados favorece a prática de atividades físicas, o bem-estar mental e a redução do estresse, sobretudo em contextos urbanos densos e ruidosos. Ao promover estilos de vida ativos e oferecer alternativas ao sedentarismo e à reclusão, as praças se consolidam como instrumentos de prevenção em saúde. Isso reforça a necessidade de articulação entre as políticas de planejamento urbano, saúde coletiva e meio ambiente.
As desigualdades no acesso às praças também foram identificadas como uma problemática recorrente nas cidades brasileiras. Segundo Gomes (2007), bairros periféricos e áreas de baixa renda são frequentemente desprovidas de praças bem estruturadas, ou enfrentam situações de abandono e insegurança. Isso evidencia um desafio para a equidade urbana e para o direito à cidade. A concentração de investimentos em áreas centrais contribui para a reprodução da exclusão socioespacial, enquanto a ausência de espaços públicos de qualidade nas periferias compromete a qualidade de vida de parcelas vulneráveis da população.
O papel das praças em cidades de pequeno e médio porte também merece destaque. Conforme Hahn, Bovo e Ré (2016), em municípios com população reduzida, a praça muitas vezes representa o único espaço público de lazer e encontro da comunidade. Sua relevância simbólica e funcional é acentuada nesses contextos, o que exige políticas de valorização e preservação desses espaços como parte do patrimônio urbano e cultural local. Essa dimensão é frequentemente negligenciada nas diretrizes de desenvolvimento urbano, que tendem a privilegiar capitais e regiões metropolitanas.
Por fim, os dados analisados apontam que o sucesso das praças como espaços de promoção da qualidade de vida depende da articulação entre projeto físico, gestão participativa e manutenção contínua. A literatura é unânime ao afirmar que a simples presença física da praça não é suficiente: é preciso assegurar que ela seja vivida, apropriada e cuidada pela população e pelo poder público. A ausência de políticas integradas compromete o potencial transformador desses espaços. Assim, reforça-se a necessidade de que as praças sejam concebidas como instrumentos estratégicos de inclusão, sustentabilidade e democracia urbana.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
As praças urbanas, historicamente inseridas no coração das cidades como espaços de encontro, troca e celebração, permanecem atuais e indispensáveis no contexto das metrópoles contemporâneas e das cidades de menor porte. Ao longo desta pesquisa, observou-se que esses espaços públicos desempenham funções cruciais que extrapolam o lazer, atuando como dispositivos urbanísticos promotores da saúde pública, da coesão social, da inclusão e da valorização ambiental. Seu potencial de impacto positivo na qualidade de vida é vastamente reconhecido pela literatura científica analisada, o que reforça a necessidade de políticas públicas voltadas à sua preservação, qualificação e gestão participativa.
Os resultados da revisão evidenciam que a qualidade física e funcional das praças é determinante para sua apropriação pela população. A presença de infraestrutura adequada, acessibilidade universal, segurança, arborização e diversidade de usos são fatores essenciais para estimular a permanência dos usuários e promover relações de pertencimento ao território. Quando bem cuidadas, as praças se tornam verdadeiros centros de convivência intergeracional e intercultural, favorecendo a construção de vínculos afetivos e identitários com o espaço urbano.
Também ficou evidente que as praças atuam como vetores de saúde urbana, contribuindo para estilos de vida mais ativos, a redução do estresse, a promoção do bem-estar e a mitigação dos efeitos ambientais nocivos, como as ilhas de calor. Dessa forma, sua função transcende o campo da arquitetura e do urbanismo, alcançando dimensões da saúde coletiva, da sustentabilidade e da justiça espacial. Sua relevância é ainda mais acentuada em territórios vulneráveis, onde a escassez de equipamentos públicos torna a praça o principal – e às vezes único – espaço de uso coletivo.
Por outro lado, a pesquisa revelou desigualdades persistentes na distribuição e manutenção das praças nas cidades brasileiras. Enquanto algumas regiões concentram investimentos e iniciativas de revitalização, outras enfrentam abandono, insegurança e ausência de políticas integradas. Tal realidade denuncia a necessidade urgente de uma abordagem mais equitativa no planejamento urbano, que considere a praça como um direito urbano e um bem comum a ser protegido e universalizado.
Nesse sentido, recomenda-se que os gestores públicos, urbanistas e planejadores incorporem, de forma efetiva, diretrizes para criação e requalificação de praças em seus instrumentos normativos e planos diretores. A participação da comunidade no desenho, uso e cuidado desses espaços deve ser promovida como estratégia de gestão democrática e de valorização dos saberes locais. Projetos urbanos que dialogam com as especificidades culturais e sociais dos territórios tendem a gerar maior apropriação e sustentabilidade a longo prazo.
Por fim, destaca-se a importância de ampliar os estudos empíricos e interdisciplinares sobre as praças urbanas, com foco em diferentes realidades regionais e escalas urbanas. Investigações futuras podem aprofundar o entendimento sobre os impactos das praças na saúde mental, na segurança pública, na educação ambiental e na inclusão digital. Consolidar as praças como espaços de cidadania, diversidade e resiliência urbana é um dos maiores desafios – e oportunidades – para a construção de cidades mais justas, humanas e sustentáveis.
REFERÊNCIAS
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GOMES, Marcos Antônio Silvestre. De largo a jardim: praças públicas no Brasil – algumas aproximações. Estudos Geográficos, Rio Claro, v. 5, n. 1, p. 101–120, 2007. Disponível em: http://cecemca.rc.unesp.br/ojs/index.php/estgeo. Acesso em: 10 jul. 2025.
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HAHN, Fábio André; BOVO, Marcos Clair; RÉ, Tatiane Monteiro. A praça como objeto de estudo de uma pequena cidade. Fronteiras: Revista de História, Dourados, v. 18, n. 31, p. 431–456, 2016. Disponível em: https://ojs.ufgd.edu.br/FRONTEIRAS/article/view/5478. Acesso em: 10 jul. 2025.
QI, Jie; MAZUMDAR, Suvodeep; VASCONCELOS, Ana C. Understanding the relationship between urban public space and social cohesion: a systematic review. International Journal of Community Well-Being, v. 7, p. 155–212, 2024. DOI: https://doi.org/10.1007/s42413-024-00204-5. Acesso em: 10 jul. 2025.
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ROBBA, Fábio; MACEDO, Silvio Soares. Praças brasileiras. São Paulo: Edusp, 2002.
Publicado por Maria Eduarda de Sá Siqueira e Souza[1]
[1] Discente de Arquitetura e Urbanismo da UniFap - Centro Universitário Paraiso Ceará.
Publicado por: Maria Eduarda de Sá Siqueira e Souza

O texto publicado foi encaminhado por um usuário do site por meio do canal colaborativo Meu Artigo. Brasil Escola não se responsabiliza pelo conteúdo do artigo publicado, que é de total responsabilidade do autor . Para acessar os textos produzidos pelo site, acesse: https://www.brasilescola.com.