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O depósito da fé: cânon, sucessão apostólica, tradição e outras considerações

Alguns elementos da fé cristã, como o cânon ou escrituras sagradas, a sucessão apostólica, o papado e o Sola Scriptura versus tradição.

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“Guarda o bom depósito pelo Espírito Santo que habita em nós.” (2Tm 1.14)

“Ó Timóteo, guarda o depósito que te foi confiado, tendo horror aos clamores vãos e profanos e às oposições da falsamente chamada ciência...” (1Tm 6.20)[1]

Em fevereiro de 1980, numa reunião muito tensa, ocorrida numa paróquia católica em São Paulo, que acabou servindo para tratar de meu comportamento cristão desviante aos olhos do meu pároco, na época, por ter sido “influenciado” por ideias protestantes, num dado momento da reunião, perguntei a ele: “padre, devo acreditar na bíblia como única regra de fé e prática?”. Sua reposta foi mais ou menos assim: “Não. Jesus Cristo não deixou um livro, Ele deixou uma igreja. E é esta igreja que está apta para interpretar o que diz a bíblia, considerando conjuntamente sua tradição e/ou Magistério ao lado do Santo Padre através dos tempos”.

Depois de muito tempo, ao ler os conselhos do apóstolo Paulo ao seu discípulo Timóteo (acima) e exposições histórico-teológicas como nos escritos de Justo L. González e outros (constantes na bibliografia abaixo), lembrei-me do fato ocorrido comigo em 1980 e achei por bem escrever e refletir sobre este assunto, considerando alguns elementos da fé cristã como o cânon ou escrituras sagradas, a sucessão apostólica, o papado e o Sola Scriptura versus tradição.

1. O sincretismo do segundo século: ameaça à unidade da igreja pós-apostólica

“Que tem Atenas a ver com Jerusalém? Que tem a academia a ver com a igreja? Que têm os hereges a ver com os cristãos?” (Tertuliano de Cartago)[2]

A Igreja Cristã apostólica termina o primeiro século com todos os apóstolos mortos, com exceção de João, que escreveu o último livro, o Apocalipse, possivelmente no ano 95[3], e que veio a falecer no ano 103, já início do segundo século. O que viriam depois disto seriam muitos debates sobre a definição de “uma mensagem única” de um único corpo comunitário que abraçasse os que iam sendo reconciliados em Cristo e “... edificados sobre o fundamento dos apóstolos...” (Ef 2.20).

Acontece, porém, que os que se convertiam à comunidade cristã traziam em seu bojo uma bagagem cultural muito variada, rica, mas também preocupante, sobretudo, no que diz respeito às interpretações acerca da fé cristã, pois “... o espirito da época [início do 2º século] era radicalmente sincretista. O que muitas pessoas buscavam não era uma doutrina única, mas um sistema que de algum modo combinasse todas as doutrinas, tomando um pouco de cada uma. O que estava em jogo, portanto, não era simplesmente tal ou qual elemento do cristianismo, mas sim a questão fundamental: tinha ou não a nova fé uma mensagem única e em que sentido era única essa mensagem” (GONZÁLEZ: 1995a, p. 94).

Dentro deste sincretismo combinado ou misturado com a fé cristã, dois movimentos principais, o gnosticismo e o marcionismo, antecederam debates sobre o cânon, o credo e a questão da sucessão apostólica.

Não é nosso objetivo discorrer aqui sobre as ideias destes dois movimentos, mas às repostas dadas pela igreja aos mesmos e a outros[4], que por sua natureza, contradiziam os preceitos e as bases da fé cristã, misturando-os a outros elementos religiosos. Mas sinteticamente, salientamos que o gnosticismo, em linhas gerais, defendiam ideias contrárias às deixadas pelos apóstolos – embora até então ainda não compiladas no que vinha a ser o cânon, como veremos abaixo – e que em certa medida serviam para responder ao sincretismo de muitos dos novos catecúmenos. Mas o “conhecimento” (gnosis) que compreendia a base daquele movimento, na verdade, confundia (e muito) os neófitos na fé, assim como exigia uma resposta adequada e muito clara dos mestres cristãos.

O gnosticismo, conforme afirma Beng Hägglund (2003, p. 26), “... era resultado da mistura da religião helenística com o cristianismo”. Os gregos cristãos, ou cristianizados, buscavam sabedoria (1Co 1.22) e nesta tentativa de conciliarem a “gnosis” com as doutrinas cristãs, pendiam-se, muitas vezes, para a heresia. Filósofos contemporâneos (helenísticos) que ajudaram os cristãos na compreensão do Logos, a “Razão” ou “Palavra”, usado por João na introdução de seu evangelho (Jo 1.1-14), ainda no primeiro século, também forneceram argumentos contraditórios quanto “... à tentativa de incluir o cristianismo num sistema geral filosófico-religioso” (Ibidem: p. 27), no segundo século, como o gnosticismo[5]. Elementos com especulações místicas e cosmológicas sobre a doutrina da salvação, dualismo entre o mundo do espirito e o mundo material e até o ascetismo ou a libertinagem, negavam ou confundiam as principais doutrinas cristãs, como a criação, a encarnação, a ressurreição e outras. Desta forma, o gnosticismo precisava ser entendido, para ser evitado, assim como também o seu antídoto, o verdadeiro conhecimento das verdades cristãs. Estas deviam ser bem estudadas, ensinadas, cridas, aceitas e praticadas.

Acontece que a tarefa de estudar e ensinar as verdades cristãs era muito grande, e, ao mesmo tempo, neste caminho entre o ensinar e aprender, poderiam aparecer “falsos mestres”, com a qualidade daqueles que ensinavam a “falsamente chamada ciência” (1Tm 6.20). Não demorou muito, e surgiu, dentre outros, pregador e/ou ensinador como Márciom (ou Marcião). Combinando elementos contrários ao mundo material e ao judaísmo, afirma GONZÁLEZ (2003, p. 99),

Márciom pensava que este mundo era mau, e que seu criador devia ser um deus, se não mau, pelo menos ignorante. Em lugar de inventar toda uma série de seres espirituais, ao estilo dos gnósticos, o que Márcio propôs era muito mais simples. Segundo ele, o Deus do novo Testamento e Pai de Jesus Cristo não é o mesmo Jeová do Antigo Testamento. Há um Deus supremo, que é o Pai de Jesus Cristo, e um ser inferior, que é Jeová. Foi Jeová que fez este mundo (...). Mas Jeová, seja por ignorância ou por maldade, fez este mundo, e nele colocou a humanidade. (...) Jeová é um deus ciumento e arbitrário, que escolhe um povo acima dos demais, e que está constantemente conferindo a conta de quem o desobedece para tomar vingança. Em uma palavra, Jeová é um Deus de justiça.

Para Márciom, o Deus e Pai dos cristãos, está muito acima de Jeová, e é um Deus de amor, o qual enviou Jesus à Terra para nos salvar. E este, por sua vez, não nasceu de Maria, senão seria súdito de Jeová, mas “... apareceu repentinamente, como um homem maduro, na época do imperador Tibério” (Ibidem: p. 99). Márciom foi expulso da igreja quando esteve em Roma por volta de 140, mas mesmo assim, organizou sua própria igreja, que cresceu consideravelmente até por volta do século VI.

Uma observação que fazemos é até que ponto uma posição de algum mestre pode ser tida como uma heresia? Citamos acima parte da frase e da defesa (ou ideia) de Tertuliano refutando as heresias dos gregos. E, segundo GONZÁLEZ (2011, p.101), o próprio Tertuliano, apesar de seus “... protestos contra a intromissão da filosofia grega na vida da igreja, e aparentemente sem sequer se dar conta disso, faz repetidas vezes uso de seu pano de fundo estoico”. Daí se vê como a cultura de um povo, inclusive religioso, como o caso dos cristãos, pode estar eivada por costumes e influências contrários ao que, na prática, deveriam ser refutados ou rejeitados. Outra observação, ainda do exemplo do próprio Tertuliano, é o fato de ele ter-se unido ao movimento montanista, fundado por um sacerdote pagão chamado Montano, que se converteu no ano de 155. Mas com o tempo, Montano começou a profetizar, dizendo ter sido possuído pelo Espírito. Juntaram-se a ele duas mulheres, Priscila e Maximila, profetizando[6] nas igrejas e afirmando que uma “nova era” tinha chegado. Por isto mesmo, embora fossem normais suas profecias, a afirmação da chegada de uma nova era recebeu a objeção da igreja. Outra questão, além das práticas de profetizar dos montanistas, foi sua rigorosidade e moralismo que caracterizavam seus modos de viver. E parece ser justamente este último item que chamou a atenção de Tertuliano. Verifica-se então, com Tertuliano, uma voz destoante do (quase) todo dos mestres da época. Por que Tertuliano julgava a influência grega uma heresia para a igreja e não as ideias montanistas? Onde buscar a base para a refutação de alguns pontos de vista doutrinários e aceitação de outros?  Portanto, o gnosticismo dentre outros movimentos sincretistas ou heréticos, e Márciom e Montano, dentre outros falsos mestres (ou não), significaram grandes desafios para os verdadeiros mestres e responsáveis pela conservação da sã doutrina, ou “depósito da fé”, recebido dos apóstolos. Daí, a necessidade de uma reposta que representasse a “mensagem única” e ao mesmo “universal” para a igreja. O cânon, a formulação do Credo Apostólico e a sucessão apostólica, constituíam parte desta resposta.

2. Cânon: o conjunto dos livros sagrados

“Porque tudo que dantes foi escrito para nosso ensino foi escrito, para que, pela paciência e consolação das Escrituras, tenhamos esperança” (Rm 15.4).

“Para ele [Atanásio], como para Clemente, a regra da fé e o conteúdo da Escritura eram idênticos. A tradição, segundo Atanásio, só tem autoridade quando está de acordo com a Escritura. Como ele faz ver claramente em sua carta pascoal de 367, o cânone neotestamentário é definitivo”.[7]

As ideias heréticas de Márcion foram o principal desafio para a definição dos livros que comporiam o cânon, ou seja, “... aquelas obras escritas que se conformam com a regra ou padrão da inspiração e autoridade divinas” (ARCHER: 1984, p. 69). O cânon ou cânone (do grego kanõn, que significa ‘vara reta’, ‘beira reta’, ‘régua’), portanto, passou a significar o conjunto dos livros a ser utilizado pelos cristãos como padrão de fé e doutrina, ou seja, as Escrituras Sagradas, autoritativas, ou numa linguagem protestante fundamentalista ou conservador, por exemplo, como “única e infalível regra de fé e prática”.

Primeiramente, acerca do chamado Antigo Testamento da Bíblia cristã, que é o livro sagrado dos judeus, embora existam diversas versões, faremos referência à Septuaginta (LXX). As suas origens são bastante debatidas. A mais razoável parece ser a que afirma que no reinado de Ptolomeu Filadelfo (285-246 a.C.), este rei

persuadido por seu bibliotecário a obter uma tradução das escrituras hebraicas para a sua biblioteca real, fez um apelo ao sumo sacerdote de Jerusalém, que lhe enviou setenta e dois anciãos a Alexandria, com uma cópia oficial da Lei. Ali, em setenta e dois dias, fizeram uma tradução que foi lida perante a comunidade judaica entre grandes aplausos, e então foi apresentada ao rei. Por causa do número dos tradutores essa tradução se tornou conhecida (um tanto inexatamente) como Septuaginta. A mesma história é contada com detalhes diversos por Josefo. (BIRSALL, J.N. In: DOUGLAS, J. D.: 1979. Op. Cit. Vol. III, p. 1594).

A Septuaginta era o texto sagrado dos judeus que fora popularizado com a expansão do Helenismo e da Língua Grega. Com o tempo, este texto foi vocalizado e acentuado pelos massoretas[8] (transmissores), substitutos dos antigos escribas (os Sopherim), responsáveis pelo texto sagrado. A LXX era composta[9] pelo Pentateuco (Torá), os Profetas (Neviim), os Escritos (Kêtuvim) e os Históricos. E foram as Escrituras utilizadas por Jesus, os apóstolos e os primeiros cristãos. As palavras de Jesus, registradas em Lucas 24.27 – “E, começando por Moisés e por todos os profetas, explicava-lhes o que dele se achava em todas as Escrituras” –, por exemplo, são referências à Septuaginta. Por isso, afirma GONZÁLEZ (1995a, Vol. I, p. 101), “acerca do Antigo Testamento, todos, exceto os gnósticos e os marcionitas, concordavam em que devia fazer parte das Escrituras”. Foi chamada por Irineu (Cf. Eusébio, 5, VIII) de “... Escrituras [e] foram traduzidas [para o grego, no tempo de Ptolomeu] por inspiração divina”.

No século IV e início do V, Jerônimo (340-420) dedicou-se ao árduo trabalho de tradução da Bíblia Septuaginta (Hebraica) para o latim. Mas, juntamente com estes livros, ele encontrou também outros, que ficaram conhecidos como apócrifos ou deuterocanônicos, considerados por ele numa “posição secundária[10]. Entretanto, ele achou por bem inserir estes livros[11] em sua Bíblia, acompanhados de suas notas explicativas, o Prologus Galeatus[12]. Esta versão de Jerônimo foi adotada pelos católicos após o Concílio de Trento (1545 a 1563), contendo, portanto, 73 livros, além de acréscimos nos livros de Ester e Daniel, ao contrário da Bíblia utilizada pelos protestantes que tem 66 livros.

Em segundo lugar, em relação ao Novo Testamento, este é parte exclusiva da Bíblia cristã, não utilizada pelos judeus não cristãos, por razões óbvias, como o fato de eles não aceitarem a pessoa de Jesus como o Cristo ou Messias. E foi, ademais, o resultado de muita discussão para as escolhas dos livros que comporiam esta parte das Escrituras, no decorrer do segundo século. Por esta época (meados do século II), os mestres cristãos decidiram incluir no cânon neotestamentário os quatro Evangelhos (Mateus, Marcos, Lucas e João), chamados por Eusébio (3, XXV), de “a santa tétrade dos Evangelhos”, dentre muitos outros, como os Evangelhos de Tomé, Pedro e Matias, por exemplo. Depois, juntaram-se aos Evangelhos, o livro de Atos e as epístolas paulinas. Estas foram as primeiras a conseguir aceitação geral. “Outros livros, tais como o Apocalipse, a Terceira Epístola de João, e a Epístola de Judas, demoraram mais tempo em ser universalmente aceitos.” (GONZÁLEZ: 1995a, p. 102).

A escolha dos atuais 27 livros[13] “genuínos” ou “canônicos”, bem como seu veredicto como parte do cânon, não foi obra apenas dos homens piedosos cristãos daquela época, mas foi direcionada pelo Espírito Santo. Já pelos fins do século II, estes livros já estavam definidos, mas as discussões acerca de sua canonicidade continuaram. “Essas discussões, sem dar-se por encerradas definitivamente, foram concluídas, a grosso modo [negrito no original], no Oriente (com exceção da Síria) e no Ocidente, pelo fim do século IV. As duas decisivas datas são, para o Oriente, a 39ª carta pascal de Atanásio, em 367, e para o Ocidente, o Sínodo de Roma de 382, e os Concílios africanos de Hipona (393) e de Cartago (367)” (CULLMAN: 1984, p. 117). Atualmente, o cânon do Novo Testamento é aceito pelos três principais segmentos do Cristianismo: Igreja Católica, Igreja Ortodoxa Grega e pelos protestantes.

3. O papel dos bispos na sucessão apostólica

“Olhai, pois, por vós e por todo o rebanho sobre que o Espírito Santo vos constituiu bispos, para apascentardes a igreja de Deus, que ele resgatou com seu próprio sangue” (At 20.28).

Sobre a “mensagem única” dos e para os cristãos, vimos que sua base, com o tempo, passou a ser o cânon. Mas quem eram ou são os líderes responsáveis para ensinar ou transmitir esta mensagem?

Sobre a sucessão apostólica, esta tem sido objeto de muita discordância para os cristãos daquela época e ainda hoje. Quem estava no lugar dos apóstolos uma vez que estes já tinham morrido? Os hereges, a exemplo dos líderes dos movimentos vistos acima, queriam para si esta primazia, afirmando ter recebido os verdadeiros ensinos de Jesus passados a eles por algum apóstolo e através de uma “tradição secreta”, enquanto outros mestres afirmavam possuir o evangelho original e os verdadeiros ensinos de Jesus.

Em tais circunstâncias, o argumento da sucessão apostólica assumiu especial importância. O que este argumento dizia era simplesmente que, se Jesus tinha algum ensino secreto para comunicar aos seus discípulos, o mais lógico seria supor que confiaria tal ensino aos próprios apóstolos a quem confiou a direção da igreja. E, se tais apóstolos por sua vez tinham recebido algum segredo, seria de se esperar que o transmitissem não a algum estranho, mas às mesmas pessoas a quem confiaram a direção das igrejas que iam fundando (GONZÁLEZ: 1995a, p. 105-106).

Mas os que iam fundando igrejas e, consequentemente, tornando-se os líderes destas comunidades, negavam ter recebido alguma “tradição secreta” dos apóstolos de Jesus. E quem eram estes líderes destas novas igrejas: Bispos? Anciãos? Presbíteros? Diáconos?  E suas igrejas eram apostólicas, no sentido de ser continuadora da mensagem dos apóstolos?

Na Igreja Apostólica (até aproximadamente o ano 100), segundo o historiador Robert Hastings NICHOLS (1985: p. 24-25), são conhecidos os oficiais responsáveis pelo “ministério da pregação e ensino”, como os apóstolos, os profetas e os mestres (ou doutores), e os oficiais responsáveis pelo “ministério dos negócios da igreja”, como os anciãos, os presbíteros e os diáconos. Anciãos, presbíteros e bispos eram termos sinônimos, e “... tinham o encargo do pastorado, da disciplina e dos negócios econômicos. (...) Presidiam à Mesa do Senhor e pregavam quando não estava presente algum apóstolo, profeta ou mestre. Esses oficiais eram escolhidos pelo povo porque revelavam os dons e a vocação do Espírito Santo para esse trabalho” (Ibidem: p. 24).

Esse modelo de governo da igreja cristã, no entanto, vai mudando aos poucos a partir do século II. Tendo a sinagoga judaica como modelo, surge o clericalismo, sistema que diferencia pessoas com cargos eclesiásticos, de pessoas leigas ou comuns da igreja. O clericalismo começa com a distinção entre bispos e presbíteros e também com a ênfase na ideia de sacerdócio distinto do leigo, desconhecida no primeiro século. Agora, bispos, presbíteros e diáconos ocupam lugares distintos em relação aos demais membros da igreja.

Líderes cristãos do segundo século, como Clemente, Policarpo, Inácio e Barnabé, que ficaram conhecidos como pais apostólicos, foram os imediatos seguidores dos apóstolos e ouviram destes, instruções para a igreja. Estavam, portanto, em posições altamente privilegiadas e autorizadas para dar suas opiniões acerca do que era ou não uma heresia ou matéria de fé cristã. Mas apesar desta proximidade com os apóstolos percebem-se diferenças consideráveis entre eles.

Inácio[14], bispo de Antioquia, só para dar um exemplo, escreve sete cartas[15] a caminho de Roma em direção ao seu martírio. E em todas as suas cartas dá grande ênfase à pessoa do bispo como um representante da igreja. “O cargo de bispo desenvolveu-se a ponto de distinguir-se do colégio dos anciãos. Segundo Inácio, o bispo era o símbolo da unidade cristã e o portador da tradição apostólica. As congregações, em vista disso, eram admoestadas a aterem-se firmemente a seus bispos e a lhes obedecerem.” (HÄGGLUND, Op. Cit., p. 19).

O historiador Andrew MILLER, depois de descrever as posições enfáticas de Inácio sobre o cargo de bispo[16], como sucessor da tradição dos apóstolos, em suas cartas, afirma: “... que ele era um cristão piedoso e cheio de zelo religioso, ninguém pode duvidar, mas que estava grandemente enganado nesta e em outras questões também não resta dúvida (...). indubitavelmente, Inácio ansiava pelo bem-estar da igreja, e temendo os efeitos das ‘divisões’ às quais se refere, é provável que tenha pensado que um governo forte, nas mãos de líderes, seria o melhor meio de preservá-la da invasão dos erros”. (Op. Cit., p. 192). O historiador reconhece que já neste momento, muitos bispos, portadores de posições privilegiadas, tinham deixado que a voz do Espírito Santo tivesse primazia na liderança da assembleia e com isto, “... à medida que a voz da inspiração se torna cada vez mais silenciosa na igreja, ouvimos a voz dos novos mestres gritando e exigindo que as maiores honras e o supremo lugar sejam concedidos aos bispos” (Ibidem: p.191).

Vimos então que nesta altura do século II os bispos[17] já são vistos como sucessores dos apóstolos e, portanto, autoridade máxima na igreja. Mas o episcopado como autoridade centralizada e individual apareceu antes no Oriente, e ainda no primeiro século. Aliás, era muito comum as igrejas asiáticas reivindicarem para si a força de sua tradição ligada a algum apóstolo, entrando em atritos constantes com Roma nesta questão. O primeiro ponto alto da discussão sobre a autoridade do bispo de Roma sobre os demais, fora da Itália, aparece no final do segundo século e início do terceiro, quando o bispo Vítor I (193-202) passa a “... interferir nas dioceses de outras igrejas fora da Itália. Ele sentiu ter autoridade para excomungar as igrejas da Ásia Menor.” (R. J. STURZ. In: ELWELL, Vol. III: 1990, p. 92). E ainda que a questão que levou o bispo de Roma a se contrapor às igrejas da Ásia – como a discordância em relação à data da Páscoa[18] –, tenha prevalecido no Concílio de Niceia (325), os bispos asiáticos nunca cederam ou capitularam com Roma. Mas aqui neste concílio, há um interlocutor estranho, a nosso ver, em matéria eclesiástica e que deveria, pela sua natureza, estar fora destas discussões teológicas, que era a pessoa do imperador. “O imperador Constantino considerava-se bispo e até bispo dos bispos, em assuntos formais ou mesmo doutrinários. Sem sua permissão, não se podia reunir um sínodo. Sua atuação preparou o caminho para que o bispo de Roma se tornasse episcopum episcoporum. A mudança do governo para Constantinopla também contribuiu para fortalecer o bispo de Roma, levando para longe a interferência do imperador. Com sua independência relativa, Roma exerceu o papel de árbitro entre as igrejas” (Ibidem: p. 92).

4. O “primado” de Roma, o papado

“As instruções que te dei... devem ser seguidas com afinco. Zela para que os bispos não se metam em assuntos seculares, a não ser quando seja necessário para defender os pobres” (Gregório, o Grande)[19]   

O bispo de Roma, considerado agora “bispo dos bispos”, a partir de Vitor I, reivindica também a posição de “sucessor de Pedro”, com Leão I (440-461). Mas, neste momento, o império já estava dividido e Roma estava preste a cair nas mãos dos “bárbaros”, principalmente os hunos, sob o governo de Átila[20]. O certo é que com Leão, chamado também de “Leão I, o Grande”, e os bispos de Roma ou (agora) papas, que lhe sucedem, estes conseguiram manter certa estabilidade em Roma, após sua desintegração pelos bárbaros, e assim prossegue por toda a Idade Média.

Mas é do norte da África – a África Latina –, com o bispo de Cartago, Cipriano (248-258), que surgiu a expressão “papa” para um bispo, a partir da posição dele em que toda a igreja deveria se reunir em torno de um único bispo. Este, segundo Cipriano, tinha o poder e era o portador do Espírito Santo. Não havia, portanto, para ele, diferença entre a autoridade do bispo e a do Espírito Santo. “Com o correr do tempo, no entanto, suas ideias contribuíram para que os bispos de Roma reivindicassem o ‘primado’. Essa reivindicação começou a ser feita na época de Cipriano e, subsequentemente, resultou na doutrina papal – que o papa é o vigário de Cristo na terra” (HÄGGLUND: Op. Cit., p. 92). Posteriormente, o bispo Estêvão (254-257) concluiu que o bispo de Roma era sucessor do apóstolo Pedro, e, portanto, “... tinha a supremacia sobre todos os demais bispos. Reivindicou esse poder para si mesmo e dramatizou sua reivindicação exigindo a obediência dos outros bispos, e designando pessoalmente bispos na Gália e na Espanha. Reivindicava a ‘cátedra de Pedro’ com fundamento na sucessão e fala do ‘primado’ do bispo de Roma” (Ibidem: p. 92).

O fundamento teológico inicial usado pelo clero católico para a defesa de que o papado tenha sua origem na pessoa do apóstolo Pedro é o texto de Mateus 16.16-19[21]. Sobre a questão se o “ és Pedro”, expressão dita por Jesus, refere-se à “pedra” sobre a qual a igreja está edificada, não quero me aprofundar aqui, mas o certo é que com o tempo, a passagem em referência foi usada para dar sustentação ao papado como “primado de Pedro”. No entanto, como destaca o teólogo católico Eduardo HOONAERT (Op. Cit.), este texto de Mateus não dá base para se chegar a esta conclusão. Ele cita Eusébio, que a exemplo de outros teólogos comprometidos com a “ideologia imperial romana” forçaram a interpretação do texto de Mateus, isolando o verso 18 de seu contexto, e dando um significado diferente às palavras de Mateus. “Trata-se, conforme o historiador[22], de um elogio de Jesus dirigido a Pedro. Quando este afirma que Jesus não é um profeta entre outros, mas o ungido de Deus, ele mostra que Jesus não segue a tradicional maneira de agir dos profetas do antigo testamento, que ameaçavam e intimidavam as pessoas falando da ira de Deus por causa dos pecados e da necessidade de penitência. Pedro entende que Jesus, que não ameaça nem condena, mas aponta para o reino de Deus, a graça, a misericórdia, o perdão, é diferente.[23]

Além de isolar o verso 18 dos demais para dar outra interpretação ao texto de Mateus, Eusébio também, segundo Hoornaert, redigiu listas de sucessivos bispos das principais cidades do império, “... na tentativa de adaptar o sistema cristão ao modelo sacerdotal romano.” E, ao fazer isto, em referência aos bispos de Roma, como Lino e Anacleto, por exemplo, “ninguém sabe donde Eusébio tirou esses nomes, trezentos anos após os acontecimentos.” Por isto, Eusébio é tido como um historiador suspeito. A despeito de sua grande erudição, mesmo assim a suspeita por parte dos historiadores devia-se também ao fato de que “... Eusébio capitulou diante do poder imperial (...), era homem de caráter débil que, ao se ver rodeado da pompa do Império, se dobrou diante dela, e se pôs a servir aos interesses do imperador mais que aos de Jesus Cristo” (GONZÁLEZ: 1995b, p. 47).

Desta forma, no inicio do século IV, principalmente após o Edito de Milão (313), que estabeleceu a tolerância religiosa aos cristãos, e o Primeiro Concílio de Niceia (325), que dentre outras medidas, estabeleceu a doutrina papal, além da proclamação do Cristianismo como sendo a religião oficial do império (380), por Teodósio I, vemos uma igreja oficial chamada Igreja Católica Apostólica Romana, mas ao mesmo tempo a não aceitação desta supremacia de Roma por parte de vários grupos.

Em resumo, o formato da Igreja Católica que se segue daí por diante, já se define por volta do final do século IV,

com sua organização de hierárquica completa, o clero exercendo demasiado domínio espiritual sobre o povo, os concílios criando leis eclesiásticas, o culto impressionante e cheio de mistérios, seus dogmas autoritários e a condenação, como hereges, dos cristãos que não concordam ou não se conformam com eles. Além disso, foi aceita a doutrina de Agostinho a respeito de Igreja Católica. Ele cria que os primeiros bispos da igreja foram escolhidos pelos apóstolos. Estes receberam de Jesus os dons do Espírito Santo para cuidarem da igreja e legarem esses dons aos seus sucessores, os primeiros bispos, que receberam seus encargos numa sucessão regular, possuindo, todos eles, desde o primeiro, a plenitude desses dons do Espírito (...) Agostinho ensinava que a verdadeira igreja se caracterizava por seus bispos possuírem a legitima sucessão apostólica. Somente na Igreja Católica, a Igreja desses bispos, havia salvação (NICLHOLS: 1995, pp. 52-53).

Bem, a igreja ocidental e papal, vê o seu poder aumentado ainda mais com a aliança que faz com os francos, principalmente a partir da coroação de Carlos Magno em 800. “... Os papas romanos sempre mais elevam o tom da voz e, por conseguinte, as relações com os patriarcas orientais (principalmente com o patriarca de Constantinopla) se tornam sempre mais tensas” (HOONAERT), culminando com o chamado Cisma do Oriente, em 1054. Agora, se têm: Igreja Católica do Ocidente, sob a autoridade do papa, e Igreja Ortodoxa do Oriente, sob a autoridade do patriarca.

Devemos, a partir deste momento, distinguir, além da igreja cristã romana ou papal, da igreja do oriente, também a presença de vários movimentos, considerados heréticos pela igreja oficial, como o donatismo, o nestorianismo, o monofisismo, petrobrussianos, cataritas, valdenses, albigenses e outros.

Estes movimentos eram realmente heréticos? E sob o ponto de vista de quem, eram vistos como tal?

Na verdade, movimentos heréticos, supõem-se que sejam seguidores de práticas doutrinárias contrárias à ortodoxia cristã, como o marcionismo e gnosticismo, como vimos acima, ocorridos na igreja pós-apostólica, por exemplo.  Mas o que se vê na Idade Média não era bem assim. Desviar-se dos rumos que a igreja tinha tomado significava, sim, para esta, um tipo de heresia, e, portanto, sujeito às penas da Inquisição, mas o (pseudo) herético entendia estar, através de suas práticas religiosas, defendendo a verdade cristã, uma vez que a igreja oficial tinha desviado o foco de sua verdadeira missão. “A ideia [de heresia] foi definida de um ponto inquisitorial, e não teológico. A ‘heresia’ era definida em termos de desafios à autoridade da igreja, da perspectiva daqueles que estavam sendo desafiados” (MCGRATH. Apud: CARVALHO: 2017, p. 140). Desta forma, o conceito de heresia na Idade Média deixou de ser um desvio da verdadeira ortodoxia cristã, propriamente dita, e passou a ter rotulação jurídica, ou seja, a heresia era entendida “... em termos de rejeição da autoridade eclesiástica, especialmente da autoridade papal” (Ibidem: p. 140). Em outras palavras, vendo como um protestante do século XXI, muitos daqueles movimentos que eram tratados como heréticos, eram na verdade, defensores da verdadeira ortodoxia.

Embora alguns destes movimentos se distanciavam, em alguns pontos, dos princípios pós-apostólicos, o cânon, o certo é que demonstravam, na prática, grande descontentamento com a igreja oficial do ocidente. E em resposta a isto, vemos, por exemplo, a atuação do Tribunal da Inquisição, criado por Inocêncio III, em 1209, para conter o impulso e crescimento destes movimentos. E o papa, no Ocidente, até à Reforma Protestante, no século XVI, continua com grande poder, não só em matéria eclesiástica, como também politica, contradizendo a instrução do papa Gregório, o Grande, de não se “meterem em assuntos seculares”, a não ser que fossem em prol dos pobres, mas este é um debate que deixaremos para outro momento.

5. Sola Scriptura (protestante) versus tradição (católica)

“A Bíblia, toda a Bíblia e nada mais do que a Bíblia, é a religião da igreja de Cristo. (...) Defender a Bíblia? Seria o mesmo que defender um leão. Simplesmente dê liberdade à Bíblia. Ela defenderá a si mesma.” (Charles H. Spurgeon)[24]

“O depósito da fé é confiado pelos Apóstolos a toda a Igreja. Todo o povo de Deus, mediante o sentido sobrenatural da fé, conduzido pelo Espírito Santo, e guiado pelo Magistério da Igreja, acolhe a Revelação divina, compreende-a cada vez mais e aplica-a à vida.”[25]

A interpretação e definição da maioria dos dogmas cristãos[26] coincidem com os pontos de vista tanto de católicos, quanto de ortodoxos e protestantes, porque são verdades bíblicas bem fundamentadas. Mas, as repostas para muitos deles são encontradas na tradição, desenvolvidas por mestres cristãos, cujas obras chegaram até nós.  De modo geral, “até mesmo os protestantes evangélicos, por mais inclinados que ainda sejam para descobrir este fato, devem reconhecer que a tradição antecedeu e formou o cânon das Escrituras registradas, e que seu próprio modo de entender as Escrituras e, consequentemente, sua própria vida comunitária, foram moldadas por tradições especificas, consciente ou inconscientemente” (VAN ENGEND. J. In: ELLWELL: 1990, Vol. III, p. 546). Textos bíblicos com referências à tradição (p.e., 2Ts 2.15 e 3.6, 1Co 11.2, Cl 2.6, 1 Tm 3.16 etc.) são exemplos de preceitos herdados dos “nossos pais” e que (no caso) o apóstolo Paulo exortava seu rebanho a recebê-los e guardá-los. E é a esta tradição que alguns chamam de “depósito da fé”, ou seja: “... o poder do testemunho apostólico (...) é que aquilo que foram chamados a transmitir não era dos homens, mas de Deus” (Ibidem, p. 546). Depois da fixação do cânon por volta do século IV, seus escritos (A.T. e N.T.) “... continham tradição apostólica autêntica” (Ibidem, p. 547). Neste sentido, os pais da igreja, após a definição do cânon, fizeram uma distinção mais clara entre a tradição e as Escrituras. Daí, afirmações como as de Atanásio e Clemente (acima) defendendo que a tradição – à posteriori – deve estar de acordo com as Escrituras.

Reconhecemos, à nossa maneira, a atuação de um “magistério” na Igreja, representado pelos mestres dedicados ao ensino (Rm 12.7), que, guiados pelo Espírito Santo (Jo 16.13), nos (nós, cristãos de modo geral) ensinam e orientam, acerca das verdades cristãs, algumas delas até polêmicas, mas que são esclarecidas para tomadas de decisões tidas como fidedignas frente aos desafios da vida e da sociedade. E para isto, não podemos contar com “indoutos e inconstantes” (2Pe 3.16) que torcem as Escrituras. J. VAN ENGEND (Op. Cit., p. 548) afirma, em relação à história do cristianismo medieval, que “a Igreja Ortodoxa Oriental veio a definir a tradição como a totalidade do testemunho da igreja, baseada nas Escrituras, mas expressa principalmente nos sete concílios ecumênicos, nos escritos dos pais e no culto litúrgico”, enquanto a igreja ocidental passou a dar “... ênfase cada vez maior no papado (e não nos concílios) como o porta-voz normativo para a tradição apostólica” (Ibidem: p. 548). Daí, alguns teólogos católicos romanos postularem “... a tradição como uma fonte separada e não escrita, transmitida pela sucessão apostólica, especialmente através de um papado infalível”. (Ibidem: p. 548).

No século XIV, o teólogo inglês John Wycliffe (1330-1384), depois de entrar em choque com o papa e bispos proprietários de terras na Inglaterra, deixou de brigar por estas questões temporais e passou a “... criticar os dogmas centrais do catolicismo medieval. Rejeitou todas as cerimônias e organizações não mencionadas especificamente na Bíblia, condenou a transubstanciação, renunciou o poder sacramental do sacerdócio e negou a eficácia da missa. Além disso, desconsiderou toda a estrutura dos rituais, cerimônias e ritos que permeavam a igreja, baseado não somente no fato de serem falsos como também por interferirem na adoração verdadeira de Deus” (CLOUSE, R. G. in: ELWELL, Op. Cit., Vol. III, p. 651). Defensor da “doutrina de domínio”, em que os cristãos são diretamente responsáveis diante de Deus, pelo que fazem na qualidade de “mordomos” ou “inquilinos” de Deus aqui na Terra, defendia que cada cristão conhecesse a Bíblia para saber a vontade de Deus. Para Wycliffe, “... as Sagradas Escrituras eram o único padrão da fé e a única fonte da autoridade” (Ibidem: p. 651). Por este motivo, deu início à tradução da Bíblia Vulgata para o inglês, obra que foi terminada por seus seguidores[27], após sua morte (1384) e disponibilizada à população inglesa, em 1388.

O principal expoente das ideias de Wycliffe foi o tcheco John Huss (1372-1415), que por insistir em continuar lutando pela espiritualidade da igreja à revelia do clero, e defender o sacerdócio universal dos crentes, foi levado ao Concílio de Constança (1414). Ele não acreditava que seria condenado. “Recusou-se a reconhecer que as acusações contra ele fossem verídicas, a não ser que fossem comprovadas pelas Escrituras. Mesmo assim, foi condenado como culpado e queimado[28] à estaca, em 6 de julho de 1415” (KUBRICHT, P. In: ELWELL, Op. Cit., Vol. II, p. 281).

No século seguinte, em 31 de outubro de 1517, com a fixação de suas 95 Teses na porta da igreja, onde era pároco, em Wittenberg, na atual Alemanha, Martinho Lutero, por causa da importância de sua atitude, acaba dando início ao Grande Cisma no seio da igreja cristã no ocidente, a chama Reforma Protestante. Depois de Lutero, João Calvino e outros reformadores, procuraram levar adiante a ideia de que a Bíblia devia estar nas mãos e na língua de cada povo. Não queremos nos ocupar aqui sobre o assunto da Reforma, propriamente dito, mas apenas afirmar “... que os reformadores do século XVI tentaram construir uma teologia calcada na Bíblia, mas em diálogo com os chamados pais da igreja, que eram aqueles escritores autorizados nos primeiros seis ou sete séculos” (Franklin Ferreira)[29]. Embora, neste diálogo, em caso de discordâncias, as conclusões destes (pais) estavam abaixo do cânon.

O sola scriptura (somente as Escrituras), um dos princípios criados pelos reformadores na época, baseados em decisões de concílios eclesiásticos antigos, em documentos e debates, veio contrapor a “infalibilidade papal” enquanto destacava a supremacia das “escrituras” sobre a tradição. Para os protestantes em geral, e especialmente para Lutero, no conceito de Escritura, “... há a ideia que a Bíblia pode ser entendida por si mesma, agindo cada pessoa como seu próprio intérprete. As interpretações da tradição ou do clero não são necessárias para a correta compreensão da Bíblia (...). É por esta razão também que a Escritura – sem o acréscimo de mandamentos humanos e opiniões doutrinarias – é o único fundamento da fé” (HÄGGLUND: 2003, p. 189).   

Mas não é perigoso deixar a Bíblia nas mãos de todo mundo e permitir que cada um se torne, por si próprio, o seu intérprete? Os reformadores correram este risco. E, com o tempo, posso afirmar que por causa desta atitude, as vantagens foram muito maiores do que os seus prejuízos. Mas é preciso ressaltar que por conta disto, temos hoje, no Brasil, os chamados “evangélicos” que fazem leitura errada, literal, interpretações e aplicações da bíblia muito diferentes do seu contexto, há também aqueles pastores que não possuem as mínimas condições para o exercício do ministério da palavra, além da prática de pequenas (ou grandes) heresias (falsificações do verdadeiro sentido da Palavra de Deus) ou até mentiras em nome da bíblia e por aí afora. Cabe, porém, diferenciar os protestantes provenientes da Reforma, incluindo entre eles, os carismáticos ou pentecostais que defendem o sola scriptura, dos demais que levam apenas o nome de “evangélicos”, como os neopentecostais, por exemplo, cuja prática e ritos são muito diferentes dos primeiros, como já nos ocupamos[30] em outro momento. Daí, os constantes debates, às vezes até tolos, entre católicos e “evangélicos” acerca de diversos dogmas. Mas, à guisa destes debates, posso afirmar que o cânon cristão, as Escrituras, é o caminho mais seguro. Pois (repito) como dizia Wycliffe, mesmo antes do protestantismo, as Sagradas Escrituras são “único padrão da fé e a única fonte da autoridade”, e é esta verdade que os protestantes resolveram aceitar e adotar.

Em visita recente do papa Francisco à Suécia, por conta das comemorações dos 500 anos da Reforma Protestante, neste ano de 2017, ele afirmou que "Lutero deu um passo decisivo colocando a palavra de Deus nas mãos do povo[31]. Pelo que sabemos da posição da Igreja Católica, a Palavra de Deus não é somente a que está escrita. Acreditamos, então, que ao falar assim, o papa esteja se referindo à parte ou revelação escrita que foi deixada para os cristãos. Neste caso, concordamos com ele também que a Palavra de Deus nas mãos do povo, incluindo católicos, protestantes, ortodoxos e outros, com certeza, é a melhor ferramenta para que todos tenham esperança, (Rm 15.4) por meio de seus ensinamentos.

Considerações finais

O conselho paulino sobre o “bom depósito” (2Tm 1.14) que já era guardado por Paulo, também devia sê-lo por parte de seu discípulo Timóteo e, por extensão, toda a comunidade dos cristãos. E este depósito habitava neles (Paulo e Timóteo) por intervenção do Espírito Santo, recebido por eles a partir do momento que ambos creram no Evangelho de Cristo. Por isso, a fé, misturada com a ação do Espírito Santo constitui o “depósito” ou patrimônio da fé confiado a Paulo e demais apóstolo, a Timóteo e demais seguidores dos apóstolos, e demais ministros cristãos no decorrer dos tempos.

Para que os cristãos tivessem um manual a ser seguido em matéria de fé, foi compilado o cânon sagrado no segundo século, que serviria como “divisor de água” entre a verdade e as mentiras ou heresias, digo como protestante, obviamente.

No decorrer dos tempos, o bispado, o papado e a igreja de Roma, com base nas ideias de alguns “pais da igreja” e até imperadores, achavam que eram as autoridades responsáveis e competentes para ministrar/ensinar acerca deste depósito da fé, com a “certeza” de que as portas do inferno não os venceriam.  Ou seja, uma fé válida tem que ser católica romana. E estar fora da Igreja Católica é estar fora da verdadeira igreja ou agência transmissora desta fé.

Acontece que os bispos e o papado começaram desde cedo, digo, já por volta do século III, a criar dogmas que distanciaram do manual dos cristãos, as Escrituras. Por isto, surgem, com o tempo, diversos movimentos de resistência à igreja católica, principalmente o Cisma do Oriente, no século XI, e a Reforma Protestante, no século XVI.

O tempo passou e pensemos numa situação hipotética: se algum cristão ou estudioso do cristianismo, porventura, tivesse vivido no final do século I, por exemplo, e ressuscitasse hoje, e, ao entrar num tempo católico, em qualquer lugar do mundo, acompanhasse alguma procissão ou fosse à alguma romaria, perceberia uma religião bem diferente do monoteísmo e formas de cultos herdados dos judeus e dos apóstolos. Mas, ao mesmo tempo, se ao contrário, essa pessoa fosse fazer passeios ou visitas às igrejas ditas evangélicas no Brasil, perceberia um cenário bem diferente, mesmo porque, são tantas que nem daria para fazer isto em todas elas. Mas perceberia que muitas pregações e formas de culto não variavam muito do que presenciara quando estava vivo.

Bem, ao citar a Igreja Católica como tendo um modelo único em qualquer lugar do mundo, estou me referindo à grande estrutura hierárquica e histórico-teológica que esta igreja tem e que por isso conseguiu manter-se (quase) unida por tanto tempo, ao passo que em apenas cinco séculos de existência, o protestantismo – cisma cristão do Ocidente – se esfacelou em milhares de “igrejas”, servindo, inclusive, como munição ao clero católico para rechaçar estas igrejas “heréticas”. Mas, o certo é que apesar do grande número de igrejas ou denominações, principalmente aquelas que citamos acima, como herdeiras diretas do protestantismo do século XVI, sua teologia varia pouco.

Penso que seria ótimo, mas ao mesmo tempo, utópico, pensar numa igreja única, embora este conceito é bem diferente para os protestantes. A Igreja Católica conseguiu manter-se “única” até hoje porque punia os contradizentes e “heréticos”. E se dependesse dela, as outras não existiriam, mesmo hoje, com os novos modos de pensar a fé. Mas, se cheguemos até aqui, guardemos conosco o “... depósito da fé até àquele Dia” (2Tm 2.12). Soli Deo Gloria!

Referências bibliográficas:

ARCHER Jr., Gleason L. Merece confiança o Antigo Testamento? São Paulo: Vida Nova, 3ª edição, 1984.

CARVALHO, César Moisés. Pentecostalismo e pós-modernidade: quando a experiência sobrepõe-se à Teologia. Rio de Janeiro: CPAD, 2017.

CULLMAN, Oscar. A formação do Novo Testamento. São Leopoldo (RS). Sinodal, 1984.

DOUGLAS, J. D. (Editor Organizador). O Novo Dicionário da Bíblia, Volumes I, II e III. São Paulo: Vida Nova, 1979. 

ELWELL, Walter. A. (Editor). Enciclopédia Histórico-Teológica da Igreja Cristã, Vol. I, II e III. São Paulo. Vida Nova, 1990.

GONZÁLEZ, Justo L. Cultura & Evangelho: o lugar da cultura no plano de Deus. São Paulo: Hagnos, 2011.

_________, Justo L. E até aos confins da Terra: uma história ilustrada do Cristianismo, Vol. 3 – A era das trevas. São Paulo: Vida Nova, 1995c.

_________, Justo L. E até aos confins da Terra: uma história ilustrada do Cristianismo, Vol. 2 – A era dos gigantes. São Paulo: Vida Nova, 1995b.

_________, Justo L. E até aos confins da Terra: uma história ilustrada do Cristianismo, Vol. 1 – A era dos mártires. São Paulo: Vida Nova, 1995a.

HÄGGLUND, Bengt. História da Teologia. Porto Alegre: Concórdia, 2003.

HOORNAERT, Eduardo. Como entender o Papado: alguns subsídios de ordem histórica. Disponível em: . Acesso em: 29/06/2017.

MILLER, Andrew. A História da Igreja, Vol. 1. São Paulo: Depósito de Literatura Cristã, 2011.

NICHOLS, Robert Hastings. História da Igreja Cristã. São Paulo: Casa Ed. Presbiteriana: 1985.

Notas: ​

[1] As referências bíblicas utilizadas neste artigo são da versão Almeida Revista e Corrigida: YouVersion, ARC-95.

[2] Apud HÄGGLUND: 2003, Op. Cit., p. 43.

[3] Em outro trabalho nosso, Cristianismo e História (1): de sua origem ao fim do primeiro século, verificamos que João foi o último apóstolo a escrever, o Apocalipse, c. do ano 95. Este livro foi o último a ser escrito, o último na ordem dos livros do Novo Testamento e também está ente os últimos a ser escolhidos para compor o cânon neotestamentário. 

[4] Ainda no primeiro século, os apóstolos, como Paulo, por exemplo, (Gálatas 5 etc.) tiveram que orientar a igreja acerca de movimentos sectários que misturavam a fé cristã com princípios judaicos e/ou outros elementos. Um destes movimentos foi o ebionismo (pobres), que teve origem na congregação de Jerusalém, transferida para o leste do Jordão por volta do ano 66, que fazia este tipo de confusão: mistura da lei mosaica com elementos cristãos. Por isso, “... repudiavam a interpretação paulina da lei, e recusavam aceitar suas epístolas” (HÄGGLUN, Op. Cit., p. 25.)  

[5] Enquanto o Helenismo, junção da cultura grega com outras do mundo oriental (mesopotâmica, egípcia, persas...), propagada por Alexandre, o Grande, e que influenciou muito o mundo romano, ao mesmo tempo em que foi útil para a propagação do cristianismo, foi perigoso no sentido de conciliação da cultura pagã grega com os princípios cristãos. Isto exigiu muito dos apologistas, como Tertuliano, por exemplo, ao repetir: “que tem Atenas a ver com Jerusalém?”, ou seja, Atenas representava a cultura pagã, a Academia, enquanto em Jerusalém nascera a Igreja de Cristo. E González (Op. Cit., p. 88) afirma que “Tertuliano escreveu estas linhas porque (...), em seu tempo circulavam muitas tergiversações do cristianismo, e ele estava convencido de que estas heresias se deviam ao fato de que alguns haviam tratado de combinar a fé cristã com a filosofia pagã”. E como já vimos, o gnosticismo era uma destas heresias.

[6] GONZÁLEZ (1995a, p. 125) afirma que “... nessa época [final do segundo século e início do terceiro] ainda continuava a prática de permitir a quem recebesse esse dom que profetizasse nas igrejas”.

[7] In: HÄGGLUND (Op. Cit., p. 67). 

[8]  “Os massoretas eram os estudiosos que deram ao texto do Antigo Testamento sua forma final, entre 500 e 950 d.C. Receberam este nome porque conservaram por escrito a tradição oral (ou ‘massora’) no que diz respeito a vocalização e acentuação certa do texto, e o número de ocorrências de palavras raras e ortografias pouco comuns. Receberam o texto consoantal [sic] sem vocalização, da parte dos Sopherim, e intercalaram os pontos vocálicos que deram a cada palavra sua pronúncia e forma gramatical exatas” (ARCHER Jr. Op. Cit., p. 65).

[9]  “Embora o conteúdo do cânon protestante seja o mesmo do cânon hebraico, a divisão e a ordem dos livros são diferentes. Eis a divisão e ordem do cânon hebraico: O Pentateuco (Torá): Gênesis, Êxodo, Levítico, Números, Deuteronômio. Os Profetas (Neviim): Anteriores: Josué, Juízes, 1 e 2 Samuel, 1 e 2 Reis. Posteriores: Isaías, Jeremias, Ezequiel e Profetas Menores. Os Escritos (Kêtuvim): Poesia e Sabedoria: Salmos, Provérbios e Jó. Rolos ou Megilloth (lidos no ano litúrgico): Cantares (na páscoa), Rute (no pentecostes), Lamentações (no quinto mês), Eclesiastes (na festa dos tabernáculos) e Ester (na festa de purim). Históricos: Daniel, Esdras, Neemias e 1 e 2 Crônicas” (Cf. ARCHER: 1984, p. 70-71). Disponível em: . Acesso em: 06/07/2017.

[10] Uma Bíblia de versão católica que tenho (Editora Ave Maria, 1978) traz a seguinte Nota de Jerônimo após Ester 10.3: “Traduzi com toda a fidelidade o que se acha no texto hebraico. As passagens que seguem [Ester 10.4 a seguir], encontrei-as apenas na edição ‘vulgata’ (isto é, ‘divulgada’) em língua e caracteres gregos e as coloquei aqui no fim do livro, marcados – como é nosso costume – com o óbelo, quero dizer, o sinal distintivo à margem”. Esta é a primeira nota, dentre outras, de Jerônimo sobre o livro de Ester. Segundo os editores da referida Bíblia, “... a edição ‘vulgata’ de que fala São Jerônimo, é a antiga versão itálica, usual naquele tempo”. Há também nota de Jerônimo no livro de Daniel, referente aos capítulos 13 e 14 de sua versão latina.

[11] Os livros apócrifos ou deuterocanônicos, constantes na Bíblia Católica são: Tobias, Judite, 1º e 2º Macabeus, Sabedoria, Eclesiástico e Baruc.

[12] Embora Archer (Op. Cit. P. 76) ao comentar sobre as notas e os livros acrescidos por Jerônimo destaca que ele os tinha em posição secundária, parece que esta atitude foi uma recomendação de Agostinho de Hipona, com o qual Jerônimo teve várias divergências. GONZÁLEZ (1995b, p. 160-161) afirma sobre uma carta de Agostinho destinada a Jerônimo sugerindo ele acrescentar “... notas que mostrem claramente em que pontos tua versão [de Jerônimo] difere da Septuaginta, cuja autoridade é inegável... Além disso não vejo como, depois de tanto tempo, alguém possa descobrir nos manuscritos hebraicos alguma coisa que tantos tradutores e bons conhecedores da língua hebraica não tenham visto antes”. 

[13]  O Novo Testamento, composto de 27 livros, pode ser dividida em: Evangelhos (Mateus, Marcos, Lucas e João), Livro Histórico (Atos dos Apóstolos), Epístolas Paulinas (Romanos, 1ª e 2ª Coríntios, Gálatas, Efésios, Filipenses, Colossenses, 1ª e 2ª Tessalonicenses, 1ª e 2ª Timóteo, Tito e Filemon), Epístolas Gerais ou Católicas (Hebreus, Tiago, 1ª e 2ª  Pedro, 1ª, 2ª e 3ª João e Judas) e Livro Profético (Apocalipse).

[14] Inácio de Antioquia nasceu por volta do ano 30 ou 35 e passou para a história com o codinome “portador de Deus”, com base em informações da tradição de que ele fora aquele menino posto por Jesus no meio dos discípulos que o rodeavam, querendo saber quem era maior no Reino dos céus, conforme registrado em Mateus 18.1-3 e Lucas 18.15-17. Foi preso e martirizado no ano 107, em Roma, que era governada na época, pelo imperador Trajano (98-117). Cf. GONZÁLEZ: 1995a, pp. 66-67.

[15] Suas cartas foram: aos Efésios, Magnésia, de Trales, Romanos, Filadélfia, Esmirna e Policarpo. Provavelmente, estas cartas tenham sido escritas por um amanuense, também cristão, em Esmirna, onde Inácio esteve durante uma pausa da viagem.

[16] Um resumo das admoestações de Inácio (Cf. MILLHER, 2011, p. 191-192): – à igreja em Éfeso, “Tomemos cuidado, irmãos, para não nos colocarmos contra o bispo, a fim de que estejamos sujeitos a Deus”; – aos magnésios: ‘Eu vos exorto a cuidadosamente fazer todas as coisas em divina harmonia: seus bispos presidindo como se estivessem no lugar de Deus...”; – aos trálios: “Enquanto estiverem sujeitos ao bispo de vocês da mesma forma que ao Senhor, me parece que estarão vivendo, não à maneira dos homens, mas de acordo com Jesus Cristo, que morreu por vocês”; – aos filadélfios: “Eu clamei enquanto estava no meio de vocês, falei em alta voz: ‘Obedeçam ao bispo, ao presbitério e aos diáconos’... Nada façam sem o bispo; mantenham seus corpos como templos de Deus, amem a unidade, fujam das divisões, sejam seguidores de Cristo, como Ele é do Pai”.

[17] “... a ênfase na autoridade dos bispos na sucessão apostólica surgiu durante o século segundo, como um modo de responder ao desafio das heresias. Enquanto a maior parte dos cristãos vinha de um contexto judaico, o perigo das heresias foi menor. Mas à medida em que foi aumentado o número dos gentios entre os cristãos, foi aumentado também a multiplicidade de doutrinas, e se foi fazendo necessária a centralização da autoridade” (GONZÁLEZ: Op. Cit., p. 155).

[18] Cf. Eusébio (5, XXIV), depois de receber uma carta do bispo asiático Polícrates destacando a sua discordância e a de outros bispos da região, com Roma, em relação ao dia da Páscoa, o bispo Vítor, de Roma “... logo se empenhou em desligar da unidade comum as igrejas de toda a Ásia, juntamente com as igrejas adjacentes, considerando-as heterodoxas. E ele publica anunciando por meio de cartas e proclama que todos os irmãos de lá estão excomungados”.

[19]  Apud GONZÁLEZ (1995c, p.61)

[20] González (1995c, p. 64), afirma que os hunos, em 452, invadem a Itália, mas Leão I vai até o acampamento de Átila e consegue demovê-lo da decisão de invadir Roma. Numa “... época em que a Itália e boa parte da Europa Ocidental estavam atoladas no caos, o papado preencheu o vazio, proporcionando certa estabilidade. Esta foi a principal razão por que os papas da Idade Média alcançaram um poder que os patriarcas de Constantinopla, Antioquia ou Alexandria nunca tiveram.” 

[21]E Simão Pedro, respondendo, disse: Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo. E Jesus, respondendo, disse-lhe: Bem-aventurado és tu, Simão Barjonas, porque não foi carne e sangue quem to revelou, mas meu Pai, que está nos céus. Pois também eu te digo que tu és Pedro e sobre esta pedra edificarei a minha igreja, e as portas do inferno não prevalecerão contra ela. E eu te darei as chaves do Reino dos céus, e tudo o que ligares na terra será ligado nos céus, e tudo o que desligares na terra será desligado nos céus”.

[22] Hoornaert faz referência a John Meyendorff, autor de The Primacy of Peter (O primado de Pedro)...

[23] HOORNAERT, E. (Op. Cit. -?-).

[24] C. H. Spurgeon (1834-1892), pastor e pregador batista, grande conhecedor e defensor da Palavra de Deus, fez parte de uma segunda geração de protestantes reformados, chamado “o último dos puritanos”.

[25] COMPÊNDIO do Catecismo da Igreja Católica. Disponível em: . Acesso em 26/07/2017.

[26] Por dogmas, queremos dizer às “proposições doutrinárias” ou máximas que expressam o ponto de vista oficial e universal dos cristãos, como por exemplo, os CREMOS, que são parte do Credo Apostólico ou os cinco “solas” (somente) que sintetizam os credos teológicos básicos dos reformadores.

[27] Os seguidores de John Wycliffe ficaram conhecidos como lolardos. Eram padres/religiosos que “... não faziam votos nem recebiam consagração formal, mas dedicavam sua vida a ensinar o Evangelho ao povo. Estes pregadores itinerantes espalharam os ensinos de Wycliffe pelo interior da Inglaterra, agrupados dois a dois, de pés descalços, usando longas túnicas e carregando cajados nas mãos”. Disponível em: . Acesso em: 28/07/2017.

[28] Há uma frase, atribuída a John Huss, dita no momento de sua morte: “Vocês hoje estão queimando um ganso (Hus significa ‘ganso’ na língua boêmia), mas dentro de um século, encontrar-se-ão com um cisne. E este cisne vocês não poderão queimar”. Este cisne que não seria queimado, muitos entendem que seria uma profecia que se cumpriu com Martinho Lutero, 102 anos depois de sua morte, quando este afixou as 95 Teses na igreja de Wittenberg, na Alemanha (1517). Disponível em: . Acesso em: 28/07/2017.

[29] Comentário feito pelo teólogo Franklin Ferreira, em recente palestra com o nome “Sola Scriptura: o fundamento da fé”. Disponível em: . Acesso em: 29/07/2017.

[30]Considerando os cristãos resultantes da Reforma Protestante do século XVI e suas ramificações, ficamos com a definição dada por Mendonça, de que podemos considerar protestantes ‘... aquelas igrejas que se originaram da Reforma ou que, embora surgidas posteriormente, guardam os princípios gerais do movimento. Estas igrejas compõem a grande família da Reforma: luteranas, presbiterianas, metodistas, congregacionais e batistas’ (MENDONÇA: 2005, p. 51). Mas os anglicanos e os batistas preferem ser chamados ‘evangélicos’, ao invés de ‘protestantes’, e como eles guardam os princípios da Reforma, não há necessidade de se ‘... criar uma categoria à parte. São integrantes do protestantismo chamado tradicional ou histórico, tanto do ponto de vista teológico como eclesiológico” (Ibidem, p. 51). As igrejas surgidas como divisões destes cinco ramos, provenientes da Reforma, ditas acima, são chamadas por Mendonça de ‘sub-ramos’ e, por generalidade, também são protestantes, pois seus membros professam uma crença individual, inspiram-se na Bíblia, através de uma interpretação direta e pessoal, embora, via de regra pelo viés literal e fundamentalista. In: AMORIM. Alcides Barbosa de. Fundamentalismo protestante: dificuldades de interação e diálogo com a cultura brasileira (Monografia). São Paulo: Faculdade Teológica Batista, 2015, pp. 32,33.

[31]  Disponível em: . Acesso em: 29/07/2017.


Publicado por: Alcides Barbosa de Amorim

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