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Inconsciente transferencial e inconsciente real- Notas Psicanalítica

Análise sobre o Inconsciente transferencial e inconsciente real.

O texto publicado foi encaminhado por um usuário do site por meio do canal colaborativo Meu Artigo. Brasil Escola não se responsabiliza pelo conteúdo do artigo publicado, que é de total responsabilidade do autor . Para acessar os textos produzidos pelo site, acesse: https://www.brasilescola.com.

O inconsciente transferencial é o inconsciente freudiano porque supõe a ligação entre S1 e S2. S1 ao se enganchar em S2, S1 representa o sujeito para S2. O Simbólico é o campo das representações. A psicanálise nasceu aí, neste mínimo da estrutura simbólica S1 – S2 – o inconsciente transferencial.  Para Lacan o sujeito resulta da conexão entre um significante com o outro para que disso resulte um efeito de sentido. Essa engrenagem está presente numa análise via inconsciente transferencial, cujo sujeito suposto saber mobiliza os significantes no inconsciente. “É pela transferência que se presentifica, mobiliza e lê o inconsciente..”, que se dá mediante a associação livre.  Os sonhos e a histeria. Entre eles há uma conexão que deu início à psicanálise, Freud descobriu o inconsciente e a psicanálise através deles. O sonho é uma formação do inconsciente e, enquanto tal, se presta muito bem para tratar da relação entre o inconsciente transferencial inventado por Freud, o que fez furo no discurso universal, e o último ensino de Lacan, que desde seu início deu repercussão e insistiu em sua virulência. 

Quase um século depois – Lacan: O umbigo do sonho é um furo, contemporâneo ao Seminário 23: o sinthoma que aconteceu nos anos de 1975/76 - último ensino. Observa-se o real, a sexualidade, a morte, a pulsão, o sinthoma, o inconsciente do falasser, não mais o inconsciente estruturado como uma linguagem, mas a ele acrescenta-se o corpo.

A linguagem é um recurso para tentar dar conta da intrusão traumática do significante no corpo, ela é um elucubração de saber sobre lalíngua e foi constituída a partir da maneira que o nascido foi falado pelos seus progenitores, isso faz parte da cicatriz do umbigo no corpo e no simbólico. Por isso, a palavra umbigo carrega em si um furo e um nó, uma marca, um limite: fomos nascidos de um ventre e a partir dele se tece o fio da vida de um falasser. O umbigo é “um lugar no corpo que faz nó” e a marca disso está em algum lugar no sonho, esta foi a audácia de Freud, disse Lacan. 

A elaboração onírica tem por função essencial a realização do desejo. O desejo nunca se articula “a descoberto” nas formações do inconsciente.

“O desejo inconsciente é o que quer aquele, aquilo, que sustenta o discurso inconsciente. Eis porque este aí fala.” (Lacan, Discurso aos católicos), ou seja, o desejo articula-se pela e como linguagem, mas não significa nada, faz a conexão dos significantes existir. Ele é da ordem do recalcado e somente encontra modos de se fazer representar, por exemplo, utilizando-se dos restos diurnos na formação do sonho.

“o furo é tapado no mesmo instante em que é transposto, e nem sequer se atenta para o fato de que, por esse artifício, o próprio barulho serve de proteção ao desejo maior". (Lacan, O engano do sujeito suposto saber)

ào desejo de dormir é herdeiro da pulsação do inconsciente, é defesa contra o inconsciente real.

O sonho tem que ser relatado

O isso que se lê daquilo que dele se diz reduz-se a um único ponto, da busca do sentido isola-se um fora do sentido. Operação de redução, Lacan diz:

“Freud fala dele como de um certo nó, uma rede associativa de formas verbais analisadas e se recortando como tais não pelo que significam, mas por uma espécie de homonímia. É quando uma mesma palavra encontra-se em três cruzamentos das ideias que ocorrem ao sujeito que vocês percebem que o que é importante é aquela palavra, e não outra coisa. É quando vocês encontram a palavra que concentra em torno de si o maior número de filamentos desse micélio que vocês sabem que é ali o centro de gravidade oculto do desejo de que se trata. Para encurtar, é o ponto-núcleo onde o discurso faz furo.” (LACAN, J. Meu ensino, p.37)

Freud metáfora do cogumelo, que nasce de seu micélio (Micélio é a parte vegetativa de um fungo ou colônia bacteriana, que consiste de uma massa de ramificação formada por um conjunto de hifas emaranhadas. É também responsável por carregar nutrientes até onde o fungo necessita e faz processos de simbiose com algumas espécies.) 

"ponto-núcleo onde o discurso faz furo", o centro de gravidade oculto do desejo = nó de desejos sexuais, infantis e recalcados, presente em todo sonho, também por ele denominado "umbigo do sonho".

Apesar do sentido adquirido pela interpretação do sonho, chega-se a um limite, a um furo, a um nó, que isola algo que se conserva fora de toda e qualquer interpretação, fora-do-sentido, que leva a dormir mesmo que acordado. Trata-se do mesmo furo que faz de cada ser falante, do parlêtre, um delirante, pois este furo requer a construção de uma fantasia para o neurótico ou de um delírio propriamente dito, no caso da psicose porque todos os falasseres necessitam de uma defesa contra o real.

O real se dá no fracasso do funcionamento da elaboração onírica, fracasso do recalque. 

“Suspeito que a interpretação dessa parte ainda não avançou o bastante para revelar todo o seu sentido oculto – Cada sonho tem pelo menos um ponto em que ele é insondável, um umbigo, por assim dizer, com o qual ele se vincula ao desconhecido.” (A interpretação dos sonhos - Nota de rodapé, p. 143 , Cia das Letras)

“Com frequência, até mesmo nos sonhos mais bem interpretados há um ponto que temos de deixar obscuro, pois na interpretação percebemos que ali há um novelo de pensamentos oníricos que não é possível desembaraçar, mas que também não contribui muito para o conteúdo do sonho. Esse, então, é o ‘umbigo’ do sonho, o ponto em que ele assenta no desconhecido. Os pensamentos oníricos que encontramos na interpretação têm de permanecer geralmente inconclusos e ramificar em todas as direções na emaranhada rede de nosso mundo de pensamentos. O desejo do sonho surge então de um ponto mais denso desse tecido, como o cogumelo de seu micélio.” (Cap VII p.575) 

Quando já não tem nenhum impacto de sentido

Perspectivas do Seminário 23 de Lacan. O sinthoma Miller trabalha o último texto de Lacan nos Outros escritos “Prefácio à edição inglesa do Seminário 11”:

“Quando o esp de um laps, o espaço de um lapso, já não tem nenhum impacto de sentido (ou interpretação), só então temos certeza de estar no inconsciente.” (Outros escritos, p.567)

Quando já não tem mais nenhum impacto indica o fim de um processo, como um limite do inconsciente intérprete com as repetições das mesmas ficções, quando o sentido foge, como também o limite possível da interpretação de um sonho. Lá se cai, se chega ali. Só se chega ao inconsciente real pelo inconsciente transferencial.

Por isso, o umbigo do sonho tem uma relação com o recalque primordial, aquilo que não é passível de ser dito e que está na raiz da linguagem: “... há uma urverdrängung, um recalcamento que jamais é anulado. É da natureza mesma do simbólico comportar esse furo. É esse furo que viso, e onde reconheço a própria urverdrängung.” (Seminário 23, p.41)

O nó borromeano e o furo

O último ensino de Lacan - fundamentado estrutura, diferente da estrutura da falta, a do enlace dos 3 registros RSI. O nó borromeano é uma representação da estrutura do homem e não do sujeito. Fundamentada na estrutura do furo.

“Triplicidade resulta de uma consistência que só é afetada pelo imaginário, de um furo fundamental proveniente do simbólico, e de uma ex-sistência que, por sua vez, pertence ao real e é inclusive sua característica fundamental.” (S23, 36) Isso está baseado neste fundamento: “A linguagem está ligada a alguma coisa que no real faz furo” (S23, 31), ou seja, não se trata somente de significantes, campo da falta-a-ser. 

Uma reta, corda, que passa por um furo e por cima de outra e depois por baixo e assim sucessivamente.

Uma reta é feita de infinitos pontos, mas basta localizar dois pontos que com ela se faz círculo, que por sua vez tem um furo.

A reta infinita – “podemos supor que ela tenha o ponto no infinito, isto é, que faça círculo”.(S23, 132)

É preciso uma reta infinita para que o furo possa existir borromeanamente (26). “A reta infinita sai do furo. Qual a função desse furo? O furo é o que a experiência mais simples, a do anel, nos impõe ... ele é a linha de um círculo. Para que tudo isso seja pensável é preciso ainda dar corpo a esse círculo, isto é, consistência, que o imaginemos suportado por alguma coisa de físico.” (S23, 81) 

Falso furo

S23,p.113 – “Em um círculo há um furo. Que se possa, com um círculo, acrescentando-lhe outro, fazer esse furo que consiste no que passa no meio e que não é nem o furo de um, nem o furo do outro, eis o que chamo de falso-furo”. 

Furo real

“Se alguma coisa, reta ou círculo, atravessa esse falso-furo, este, se assim podemos dizer, é verificado. A essência da cadeia borromeana repousa na verificação do falso-furo, no fato de que essa verificação o transforma em real.” Ou seja, é preciso 3 círculos enlaçados borromeanamente para que o furo seja real.

O sonho e a pulsão – ciframento do gozo

O pulsional está ligado aos orifícios do corpo, que pelo furo se traça uma borda, diferentemente do furo do Simbólico. No entanto Lacan também os aproxima (o furo pulsional e o furo do Simbólico) quando localiza o ponto que se perde o fio da meada, o limite pelo qual o Simbólico se encontra reverberado, algo do indizível se encontra na pulsão, ali ela se opacifica totalmente, donde o objeto a é o objeto perdido de Freud e Lacan mostra sua estrutura de furo. Do furo resta um percurso, cujo objeto é sempre qualquer, outro, cuja lógica é ser revestido de suas consistências, enformados de oral, anal, olhar e voz. 

Um sonho

“Eu estou em uma escola, mas não há ninguém. Circulo nos locais vazios, em seguida vejo a palavra INDOLEANCE em grandes letras.”

Eu não compreendo o que isso quer dizer: é uma palavra que não existe!

Analista: Muito bem, é o programa. (de gozo)

In-doléance – o contrário de doléance (dor-queixa, reivindicação, problema) - indolência (indolence) – ausência de dor e de paixão

Letra  - Faz escutar ao mesmo tempo a dor-queixa e seu contrário, a queixa tornada indolor na mesma palavra.

A dor-queixa (deixada só) se escreve como gozo princeps, sento todo negativado pelo equívoco que dispensa e dispersa o sentido.

Outra cena -  infância: Dicionário!. Indoleance – fora do dicionário do Outro

Este sonho configura o tratamento possível de seu gozo – deixar o sentido que faz sua dor. 

Pensamentos contraditórios  se justapõem e se condensam (Freud). Suas fórmulas articulam de uma só vez o desejo e sua interdição, o gozo e a defesa.

Como decifrar sem nutrir o sentido e seu gozo voraz? Lacan: apostar no deciframento do signo e na contingência (Introdução à edição alemã de um primeiro volume dos Escritos, Outros escritos)

O sentido é ineliminável, mas pode ser atenuado, desviado, pluralizado, reinventado pelo signo e pela letra.

Sonho de Claire: 

O sintoma, que não cessava de se escrever, aloja-se em Outra cena. Esse deslocamento no inconsciente é um ciframento: o gozo nomeia-se e, ao mesmo tempo, abre-se à contingência e aos traços insólitos. 

Com o sonho se faz nó borromeano porque ele não é sem o furo, sem seu umbigo, ele é uma de suas maneiras. Por isso, ao construí-lo e interpretá-lo, a orientação lacaniana segue e dá consistência à leitura de Freud: não há sonho sem o umbigo, não há inconsciente sem o furo do recalque primordial.

Há efeito de sentido e um efeito de furo.  O real não fala, está do lado do gozo, mas o que do lado do amor, como a transferência, isso fala.

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Publicado por: Douglas Manoel Antonio de Abreu Pestana dos Santos

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