Relações Etnicorraciais no Espaço Escolar: uma análise do filme "Vista minha pele"
Clique e confira um estudo sobre as relações etnicorraciais no espaço escolar baseadas no filme "Vista minha pele".O texto publicado foi encaminhado por um usuário do site por meio do canal colaborativo Meu Artigo. Brasil Escola não se responsabiliza pelo conteúdo do artigo publicado, que é de total responsabilidade do autor . Para acessar os textos produzidos pelo site, acesse: https://www.brasilescola.com.
Partindo do conteúdo do filme “Vista Minha Pele”, de direção de Joel Zito Araújo & Dandara, que é uma história invertida da realidade brasileira, onde os negros são a classe dominante e os brancos são os dominados. Os brancos foram os escravizados, e os países europeus são subdesenvolvidos enquanto os países da África são desenvolvidos.
O ambiente escolar é evidenciado no filme, Maria é uma menina branca e pobre e estuda em um colégio particular porque sua mãe é faxineira do colégio e isso lhe rendeu uma bolsa de estudos. E como pertencente a uma minoria branca, ela sofre muito preconceito por parte de seus colegas e seu sonho é ser “Miss Festa Junina” só que ela não faz parte do padrão de beleza imposto pela mídia, ela é branca e o padrão de beleza é negro, ela observa a televisão e a maioria dos atores e atrizes, as autoridades, todos são negros. No decorrer da história seu pai fala que não adianta o poder está nas mãos dos negros. Mas Maria não desiste e com a ajuda de sua amiga Luana, ela toma coragem para vender os votos do concurso. Sua melhor amiga Luana já morou em países pobres e tem outra visão da realidade, e dá todo o apoio necessário para ajudar na realização do sonho de sua amiga. E sua principal concorrente Suely é uma menina negra, dentro dos padrões de beleza da sociedade, e faz de tudo para prejudicar Maria no concurso. O filme é centrado na força que Maria deve possuir para conseguir vencer as barreiras do preconceito. É tanto o desejo é mostrar essa luta contra o preconceito que não mostra quem venceu o concurso, deixando evidente a vontade de mostrar que mais importante do que vencer foi a atitude de Maria de lutar contra os padrões impostos.
Aprendemos no Fascículo III de Antropologia, especificamente no Capítulo7, que a escola, como instituição social, produz e reproduz distinções e desigualdades. O meio escolar refete as diferenças sociais e separa as pessoas de acordo com os critérios dominantes. A escola, em nosso país separou colonizadores e índios, ricos e pobres, brancos e negros, adultos e crianças, meninos e meninas. Desde a colônia foi concebida de modo discricionário, para atender certos grupos da classe dominante. Ao longo da historia, outros grupos encaminharam suas demandas por escolarização e as concepções de educação escolar e de escola foram se democratizando no sentido de universalização do direito de educação pública e gratuita. Aprendemos também que tão ou mais grave que a educação sexista, que como próprio nome já diz, é a distinção de sexo (menino e menina) é a educação racista. Na verdade a criança negra muito cedo percebe que ser negro é fonte de experiências dolorosas. Sente desconforto com a cor da sua pele, mas como não pode mudá-la entra em conflito consigo e com o meio social.
A rejeição que a criança sente fora do contexto social da família, fora do meio negro tende a fragmentar sua auto-estima e a fragilizá-la na interação com os outros. É o que acontecia com Maria, ela não se sentia capaz e transmitia isso aos outros e a partir do momento que ela confiou em si mesma automaticamente conseguiu transmitir isso aos outros.
Cada experiência de racismo vivenciada, reforça a idéia de que ser negro não é bom, ser negro é estar em situação de desvantagem nas relações sociais. Contraditoriamente, no meio negro, a cor não é uma linha, nem um critério de inclusão e expulsão. No meio negro a criança vivencia experiências inclusivas, interações positivas, afirmativas. Essa possibilidade, entretanto, entra em choque com a situação econômica e social da grande maioria de crianças negras. Pertencendo às camadas mais pobres da população vivem em situação precária e vulnerável e de maior risco. A pobreza as expõe ao abandono e à violência. As famílias negras, sob a pressão dissociativa das carências sociais, econômica, culturais, educacionais tendem a ter seus arranjos organizacionais profundamente afetados e muitas vezes destroçados, deixando as crianças em graves carências institucionais. Com esse pensamento de que no caso que branco não é bom, Maria sonhava com um mundo diferente onde as pessoas da sua cor participassem ativamente da sociedade. Mas sempre era advertida pelo seu pai que branco não tinha vez nesse mundo, o que deixou implícito que Maria cresceu ouvindo isso do seu pai o que a desencorajava profundamente. Outro fato de extrema relevância no que concerne as diferenças sociais e econômicas é que os professores de Maria a olhavam a com pena, e por sua condição etnorracial e financeira julgavam muitas vezes que ela não tinha nem o que comer.
Muitas famílias conseguem manter seus arranjos organizatórios, mas o trabalho mantém os adultos afastados, esgarçando as redes de proteção, deixando a criança vulnerável. É da beira desse perigoso abismo que a escola infantil resgata crianças pequenas, oferecendo-lhes a oportunidade de educação a que tem direito.
É grande a dificuldade de se pensar que crianças de zero a seis anos possam ser submetidas a situações constrangedoras e humilhantes na escola infantil. Entretanto, através do estudo que Eliane Cavalleiro fez sobre racismo, preconceito e discriminação em uma escola municipal de São Paulo, e através de nosso conhecimento de mundo, sabemos que o racismo existe mas sempre tem um tom silencioso. De acordo com Cavalleiro as crianças atingidas, por sua vez, também aprendem que o silêncio é a saída socialmente mais confortável, embora pessoalmente dolorosa e que, para uma criança pequena, é profundamente cruel. A autora ressalta que o silêncio dos adultos facilita novas ocorrências, reforça e legitima práticas discricionárias, reproduz o racismo no interior da escola e o atualiza. Na verdade, nossa sociedade tem preconceito de ter preconceito, e se temos dificuldades de reconhecer a discriminação em pessoas adultas, essa dificuldade ganha maiores proporções com as crianças.
E nós como educadores infantis, devemos assumir uma postura de vigília contra o racismo, porque como o próprio autor diz se tivermos essa postura, garantimos a nós mesmos um avanço na sua formação humanística, garante a si próprio uma visão mais generosa de si e dos outros, na medida em que se abre ao princípio do pluralismo, deslocando a epistemologia da unidade para a diversidade. Ao assumir esta postura, de modo crítico e persistente, estamos nos reeducando no que concerne à diversidade e ao direito à diferença. Estamos reconfigurando nossa percepção e reformulando nossos conceitos. Assumindo essa postura de reeducação, colocamo-nos na perspectiva da educação permanente pensada e vivida. E os professores que superam pré-conceitos, ensina tolerância, ensina o respeito ao outro, ensina o reconhecimento da diferença e, sobretudo, alinha-se ao esforço de construção de uma sociedade mais justa. Essas palavras do autor soaram dentro de mim como um eco, como um compromisso que devo ter com as crianças que a mim foram confiadas para ensinar.
Em suma, ressalto que os conhecimentos adquiridos tanto no filme “Vista minha pele” quanto no fascículo são de fundamental importância para a formação do educador, principalmente no que tange as relações etnicorraciais. Reitero que esse filme deveria ser utilizado em sala de aula, ele traz a tona uma reflexão muito grande sobre preconceito e racismo, faz com que tenhamos atitude de empatia, de nos colocar no lugar dos outros. No final do filme a atriz que fez a Maria se emocionou e disse que nunca tinha pensando o mundo dessa forma proposto pelo filme, e que ela se sentiu excluída dos outros colegas e que foi uma experiência muito ruim.
Por Maria Madalena Cardoso Macedo Gomes - Graduada em Jornalismo pela Universidade do Estado de Mato Grosso, especialista em Gestão Pública Municipal pela UAB/UNEMAT. E graduanda em Pedagogia pela Universidade do Estado de Mato Grosso.
Publicado por: Maria Madalena Cardoso Macedo Gomes
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