Uma “invenção” chamada Nordeste
Como o nordeste era uma região próspera no início da colonização, como é o nordeste hoje, porque ocorreu a decadência econômica,...O texto publicado foi encaminhado por um usuário do site por meio do canal colaborativo Meu Artigo. Brasil Escola não se responsabiliza pelo conteúdo do artigo publicado, que é de total responsabilidade do autor . Para acessar os textos produzidos pelo site, acesse: https://www.brasilescola.com.
Palco do início da colonização brasileira, durante muito tempo o Nordeste brasileiro foi a região economicamente e politicamente mais próspera do Brasil. Só que não o Nordeste como conhecemos hoje, com essa divisão geograficamente conhecida. Na verdade nesse período de apogeu e prosperidade o Nordeste não era classificado como “Nordeste”. Com o declínio da produção açucareira e o crescente interesse do mercado internacional pelo café, essa região e seu produto gerador de riqueza, a cana-de-açúcar, perderam espaço para o sul do país produtor de café.
Essa situação de decadência econômica enfrentada pela região levou ao desespero vários senhores de engenho que viam seus interesses econômicos ruir dia após dia. Assim foi até o início do século XX, quando o Nordeste como região geográfica foi criado, embasado num discurso de ser esta uma região carente de investimentos (entenda-se ajuda). Essa criação do Nordeste construiu uma imagem de uma região marcada pela necessidade de ajuda oriunda das outras regiões economicamente mais desenvolvidas, pelo fato de sermos “pobrezinhos” e “marginalizados”, quando na verdade não somos assim por que “Deus quis”.
Essa edificação é o resultado do trabalho das nossas elites. Só para esclarecer parte do jogo de interesses envolto nessa construção é só observar a divisão territorial do Nordeste no período que vai de 1941 a 1988 e veremos os contornos que tomou a divisão regional. Cabe lembrar que foi na década de 60 que surgiu a SUDENE, com investimentos financeiros na região, e não há como negar o interesse, principalmente da Bahia, nas verbas oriundas desse órgão.
Fruto do bem elaborado plano das elites parasitárias, hoje o que temos é uma região marcada por uma enorme desigualdade social, e cabe fazermos uma reflexão sobre a seguinte questão: por que será que temos uma das elites mais ricas do país e em contra-posição uma miséria quase absoluta da população? Esse é o resultado do bem elaborado plano político dos nossos dirigentes membros da elite.
Ainda há quem acredite na idéia de um Nordeste hegemônico (em vários aspectos), mas será isso verdade? Não, não somos uma região hegemônica. Para chegarmos a essa conclusão não é necessário ser um especialista em economia, ou geografia, ou cultura. É só observar e veremos que somos culturalmente diferentes, da Bahia ao Maranhão e o mesmo pode ser observado em outros aspectos, como o econômico, o educacional e o social. Quem já não ouviu falar na cultura nordestina? Essa idéia também se trata de uma construção, que devemos a ilustres como José Lins do Rêgo, Graciliano Ramos e outros, que “surpreendentemente” têm suas raízes nas famílias elitizadas da região.
A criação do nordeste e da figura do nordestino foi minuciosamente pensada a partir de uma série de temáticas que unidas compõe o que somos caracterizados hoje. O nordestino é imagem de sua própria terra, ou seja, somos vistos como o resultado do cruzamento infeliz das raças, como culturalmente ligados a terra e ao passado rural, enfim somos tudo o que representa o atraso, o dependente, o necessitado de ajuda. A construção da nossa imagem é bastante visível nas obras literárias da década de 30, que disseminam uma imagem do nordeste seco e miserável, e que as pessoas quando chegam aqui se deparam é a ausência dos urubus, das mulheres de barriga inchada, dos menininhos peladinhos e buxudinhos. Esse discurso tornou-se eficaz, uma vez que plantou “dentro de cada um de nós” a sementinha do complexo de inferioridade, a idéia de que realmente somos inferiores e dependentes do que vem de fora, de que somos infelizes por nossa condição de vítimas da “sorte”.
Alguns dados do Banco Mundial apontam um greve problema no Nordeste. Sabemos que o volume de verbas que a região recebe é elevado, e que poderiam mudar essa imagem se estas fossem investidas em educação, saúde, desenvolvimento tecnológico entre outras áreas, só que na verdade, apenas quatro de cada cem reais que são recebidos pelo nordeste chegam de fato na comunidade, os outros noventa e seis reais tomam um caminho “desconhecido”.
Toda essa imagem que foi historicamente construída, que nos relega ao segundo plano, que nos enquadra num conjunto de estereótipos e preconceitos, precisa ser combatida. Como disse o Professor Jorge Quintino Souza: “O nordeste não é uma região para ser defendia, é uma região para ser atacada, o nordeste é preciso ser destruído, não o nordeste empírico, mas o nordeste enquanto construção” e cada um de nós podemos e devemos fazer isso.
Precisamos desconstruir esse Nordeste enquanto invenção, esse Nordeste criado para a não mudança. Enquanto não fizermos isso, estaremos reproduzindo esta maquinaria de imagens e discursos das elites. Mudar isso é possível, e para isso é preciso inventar novas formas de pensar e enxergar o nordeste, é preciso inverter a pirâmide, enfim, é preciso atitude.
*Síntese construída com base na palestra: A invenção do Nordeste: uma desconcertante análise, ministrada pelo Professor Jorge Antonio Quintino de Souza, Mestre em História pela Universidade Federal de Pernambuco – UFPE, na ocasião da realização da IX SEMPESQ – Semana de Pesquisa da Universidade Tiradentes (Campus Itabaiana) em setembro de 2007.
Caio César Santos Gomes - Graduado em História pela Universidade Tiradentes (UNIT); Pós-graduando em Ensino de História: novas abordagens pela Faculdade São Luís de França (FSLF)
Publicado por: Caio César Santos Gomes
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