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Análise comparativa entre as Constituições de 1937 e 1946

Uma análise comparativa entre as Constituições de 1937 e 1946.

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ESTADO NOVO E CONSTITUIÇÃO DE 1937

O movimento golpista de 1930 daria a Getúlio Vargas poderes e prerrogativas inimagináveis.

Após impedir que Luís Carlos Prestes assumisse a presidência, o Governo Provisório inauguraria uma nova fase na história republicana do país, encerrando a chamada Primeira República e com ela, a influência das oligarquias, ou como caracterizou Carvalho, um “Estado oligárquico liberal”[2], uma vez que não se poderia afirmar se havia, de fato, alguma representação de liberalismo por aqui.

De início, Vargas assumira a presidência como resultado de um golpe, portanto, sua permanência era inconstitucional. A situação seria contornada por meio da realização de uma eleição direta e sua permanência se daria até 1938[3]. Bem ou mal, que a modernização do Brasil começara nesse momento[4], levanto a questão: a troco de que ocorrera essa modernização?

O temor de uma “ameaça comunista” permeou a política brasileira durante muitos anos, alimentando narrativas sobre um “inimigo vermelho”. Para conter essa narrativa, deu-se início à aplicação do chamado Plano Cohen, que, resumidamente, “descreveria um pretenso plano comunista para derrubar o governo”[5], o último passo para a permanência de Getúlio Vargas no poder. A oposição não ficaria parada, manifestando-se na figura de Armando de Salles Oliveira, lança um manifesto aos chefes militares para que estes intervenham e interrompam o golpe. O caso é que, essa ação acelerou ainda mais o transcurso do golpe, adiantando-o do dia 15 para o dia 10 de novembro de 1937[6] e implantando a ditadura do Estado Novo.

O qualitativo “novo”, nas palavras de Araújo:

representava o ideal político de encontrar uma “via” que se afastasse tanto do capitalismo liberal quanto do comunismo, [...] doutrinas políticas que competiam entre si no sentido de oferecer uma nova alternativa política e econômica para o mundo[7].

A Constituição de 1937, a quarta Constituição republicana e que vigorou de 1937 a 1946, ratificaria as característica centralizadoras, autoritárias e corporativistas do regime estadonovista, seguindo os moldes totalitários da Itália de Mussolini, da Alemanha de Hitler, de Portugal de Salazar, da Espanha de Franco e, sobretudo, da Polônia de Pilsudzki, cujo país inspiraria sua alcunha: polaca[8]. Além do seu caráter centralizador, ela seria mais um instrumento elaborado para conter uma imaginária intentona comunista, corroborada pelo Plano Cohen.

Em seu texto, a Constituição previa alguns dispositivos, dentre eles:

a realização de um plebiscito a fim de legitimá-la, - o que não aconteceu, justificado pelo estado de guerra mundial de 1939 a 1945 -; Adoção de uma política populista e de aproximação das massas ao consolidar as Leis do Trabalho (CLT) e instituição do salário mínimo, porém reduz os direitos individuais; Proibição da realização de greves por serem declaradas recursos antissociais nocivos ao capital e ao trabalho; Prefeitos passaram a ser nomeados pelos Governadores, e caso isso não ocorresse, interventores eram nomeados diretamente pelo “presidente”; Dissolução do Congresso; Eliminação da Justiça Federal; Instituição da Pena de Morte, dentre outras medidas[9].

Getúlio vê seu governo ruir quando a FEB retorna vitoriosa da Itália. Inicia-se, então, o processo de abertura política quando do seu afastamento pelas Forças Armadas, em outubro de 1945. Assumindo transitoriamente a presidência da República, o presidente do STF José Linhares, levou adiante a realização das eleições previstas para o mesmo ano, - conforme Ato Adicional decretado pelo próprio Vargas -, cuja vitória sagrou o general Eurico Gaspar Dutra como presidente da República.

DUTRA, A DEMOCRACIA E A CONSTITUIÇÃO DE 1946

Como vimos anteriormente, a deposição de Getúlio Vargas abriu caminho para a democratização. Através da realização das eleições em 1945, após os anos ditatoriais do Estado Novo, uma eleição despertaria novamente o interesse na população.

O que sabemos, é que mesmo com a vitória nas eleições, Dutra não era o “querido” na disputa para a presidência. Segundo Boris Fausto:

A campanha de Eduardo Gomes atraiu setores da classe média dos grandes centros urbanos, levantando a bandeira da democracia e do liberalismo [...] Dutra não entusiasmava ninguém, chegando a cogitar na substituição de seu nome por alguém que tivesse maior apelo eleitoral”[10].

Ou seja, enquanto candidato, a imagem de Dutra estava associada à imagem de Getúlio Vargas, enquanto a imagem do brigadeiro Eduardo Gomes, estava associada ao antigetulismo. Observando por esse espectro, é possível compreender os fatores que, reunidos, encaminharam Dutra à vitória.

Após a posse, Dutra tratou de distanciar sua imagem da imagem de Getúlio. Durante o Estado Novo, buscou-se uma aproximação com regimes totalitários, sobretudo a Alemanha, por representar um Estado forte, que havia se reestruturado após Primeira Guerra Mundial. Com Dutra ocorreria justamente o contrário: o Brasil fortalecido, após lutar ao lado dos Aliados contra o Eixo na Segunda Guerra Mundial, alinhou-se e aliou-se, política e ideologicamente aos Estados Unidos. Neste momento, observamos no período, a propagação do American way of life, personificando a dissociação entre o governo varguista e o governo Dutra.

Sobre a Constituição de 1946, a quinta Constituição republicana e que vigorou até 1967, afastou-se da anterior ao adotar um perfil liberal-democrático, em alguns pontos, porém, permaneceu com o modelo corporativo. Definiu-se o Brasil como uma República Federativa, acabando com a centralização da Era Vargas, estabelecendo a tripartição dos Poderes – Executivo, Legislativo e Judiciário[11] -, bem como o equilíbrio entre eles, definindo e delimitando suas funções, poderes e prerrogativas. A Constituição estava atenta ao cenário internacional do pós guerra. Restabeleceu o sistema bicameral, ou seja, composição do Congresso Nacional por Câmara dos Deputados e Senado.

No contexto social, afastou os retrocessos da Constituição de 1937 ao banir a pena de morte e o retornar com o direito à greve[12], mas controlada pelo Estado. No aspecto da cidadania, o direito ao voto foi conferido aos brasileiros maiores de 18 anos, alfabetizados, de ambos os sexos. No campo dos direitos políticos, estabeleceu a igualdade entre homens e mulheres, um expressivo avanço se comparamos com a Constituição de 1934, que determinava a obrigatoriedade do voto apenas às mulheres que exercessem função pública remunerada. Estas e outras medidas importantes para a época, que, certamente oferecem dados para estudos mais densos, além de informações sobre o contexto sócio-político no qual está inserida.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ARAÚJO, Maria Celina Soares D’. O Estado Novo. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2000.

CAMPOS, Flávio de; CLARO, Regina. Oficina de História 3. – 1. Ed. – São Paulo: Leya, 2013.   

CARVALHO, José Murilo de. Cidadania no Brasil. O longo Caminho. 3ª ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002.

_______________________ . O pecado original da República: debates, personagens e eventos para compreender o Brasil. Rio de Janeiro: Bazar do Tempo, 2017.

COSTA, Marcos. A história do Brasil para quem tem pressa. – 1. Ed. – Rio de Janeiro: Valentina, 2016.

FAUSTO, Boris. História do Brasil. – 14. Ed. Atual. Ampl., 2 reimpr. – São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2015.

MASSON, Nathalia. Manual do Direito Constitucional – 6. ed. Ver. ampl. e atual. – Salvador: JusPODIVM, 2018.

MENDES, Gilmar Ferreira. Curso de Direito Constitucional. – 12. Ed. rev. e atual. – São Paulo: Saraiva, 2017. – (Série IDP)

NAPOLITANO, Marcos. 1964: História do Regime Militar Brasileiro. São Paulo: Contexto, 2014.

TAVARES, André Ramos. Curso de direito constitucional. – 18 Ed., São Paulo: Saraiva Educação, 2020.

FONTES

Constituição de 1937. Disponível em:  . Último acesso 16 abril 2020.

Constituição de 1946. Disponível em: . Último acesso 16 abril 2020.

Texto da Constituição de 1937. Disponível em: . Último acesso: 17 abril 2020.

Texto da Constituição de 1946. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao46.htm>. Último acesso 17 abril 2020.


[1] MASSON, Nathalia. Manual do Direito Constitucional – 6. ed. Ver. ampl. e atual. – Salvador: JusPODIVM, 2018, p. 72.

[2] CARVALHO, José Murilo. O pecado original da República: debates, personagens e eventos para compreender o Brasil. Rio de Janeiro: Bazar do Tempo, p. 153.

[3] COSTA, Marcos. A história do Brasil para quem tem pressa. – 1. Ed. – Rio de Janeiro: Valentina, 2016, p. 110.

[4] CARVALHO, op. cit., p. 153.

[5] CARVALHO, José Murilo de. Cidadania no Brasil. O longo Caminho. 3ª ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002, p, 106.

[6] FAUSTO, Boris. História do Brasil. – 14. Ed. Atual. Ampl., 2 reimpr. – São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2015, pp. 311-312.

[7] ARAÚJO, Maria Celina Soares D’. O Estado Novo. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2000, p. 8.

[8] Disponível em: <http://www.fgv.br/cpdoc/acervo/dicionarios/verbete-tematico/constituicao-de-1937>. Último acesso em 16 abril 2020.

[9] Disponível em: <http://www.fgv.br/cpdoc/acervo/dicionarios/verbete-tematico/constituicao-de-1937>. último acesso em: 16 abril 2020.

[10] FAUSTO, Op. Cit., p. 339.

[11] Constituição de 1946. Disponível em: <http://www.fgv.br/cpdoc/acervo/dicionarios/verbete-tematico/constituicao-de-1946>. Último acesso 16 abril 2020.

[12] TAVARES, André Ramos. Curso de direito constitucional. – 18 Ed., São Paulo: Saraiva Educação, 2020, p. 155-156.

[13] NAPOLITANO, Marcos. 1964: História do Regime Militar Brasileiro. São Paulo: Contexto, 2014, p. 17.


Publicado por: Fabiano Marques Granado

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