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A REVOLTA DO JUAZEIRO: INTERVENÇÃO FEDERAL E O SIMBOLISMO DO PADRE CÍCERO NO SERTÃO CEARENSE

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Introdução

A Revolta do Juazeiro, ocorrida no sertão cearense em 1914, foi um evento marcante na história política do Brasil. A revolta foi desencadeada pela intervenção do governo federal na política dos estados durante a Primeira República. Neste contexto, o Padre Cícero Romão Batista emergiu como um símbolo de resistência e liderança para os revoltosos. Este artigo científico tem como objetivo analisar os principais eventos, causas e consequências da Revolta do Juazeiro, bem como o papel desempenhado pelo Padre Cícero nesse movimento.

Abstract

The Juazeiro Revolt took place in the hinterlands of Ceará in 1914, stemming from the intervention of the federal government in state politics and featuring the prominent figure of Padre Cícero. During the First Republic, Brazilian politics were dominated by oligarchic groups that held power in their respective regions. The transition to a republican system in Brazil also led to the establishment of a federalist state, wherein each state enjoyed certain powers and autonomy in decision-making, albeit under central government control. To secure the necessary political support for governing the country, President Campos Sales devised the so-called "politics of the governors," granting autonomy to oligarchic groups in each state in exchange for their support in electing a president favorable to their interests.

Em 1914, o Brasil estava sob a presidência do Marechal Hermes da Fonseca. Sob o seu governo, foi implementada a "política das salvações", que expandiu ainda mais os limites dos monopólios de poder estruturados pela política dos governadores. Com essa medida, o presidente ganhou a capacidade de interferir na política dos estados e impedir que grupos de oposição assumissem posições indesejáveis, como os governos estaduais.

Como consequência dessa medida, Hermes da Fonseca procurou impedir que oligarquias opositoras no estado do Ceará assumissem o controle do governo estadual. Esses grupos eram liderados pelo senador José Gomes Pinheiro Machado, que, apesar de estar baseado na parte mais ao sul do país, exercia uma influência significativa sobre os coronéis do Norte e Nordeste. Essa ação causou insatisfação entre os políticos cearenses, tendo como figura proeminente o Padre Cícero Romão Batista liderando a oposição.

O conflito entre Padre Cícero e o presidente teve início em 1911, quando ele procurou manter a família Acioly no poder na política do Ceará. No entanto, o governo nacional interveio em 1912 e os retirou do cargo. No entanto, Padre Cícero ainda ocupava os cargos de prefeito de Juazeiro do Norte e vice-governador do estado.

Foi em 1914 que o coronel Marcos Franco Rabelo, o interventor federal nomeado, começou a perseguir Padre Cícero, destituindo-o de seus cargos e ordenando sua prisão. Essa medida foi imediatamente recebida com desaprovação dos grupos oligárquicos do Ceará, que, liderados por Floro Bartolomeu, organizaram um batalhão composto por jagunços (trabalhadores rurais armados) e romeiros para defender Padre Cícero.

A expedição ordenada pelo Interventor Franco Rabelo seguiu em direção a Juazeiro do Norte para prender o padre, mas encontrou uma imensa muralha cercando a cidade. Essa defesa era conhecida como o "Círculo da Mãe de Deus" e foi construída em apenas sete dias. Foi suficiente para repelir as tropas do governo, que tiveram que recuar e reunir reforços.

Ao longo de vários confrontos, a vitória permaneceu com o grupo de rebeldes organizados em Juazeiro do Norte. Floro Bartolomeu então viajou para o Rio de Janeiro em busca de apoio, enquanto os rebeldes se dirigiram a Fortaleza com o objetivo de depor o interventor. No Rio de Janeiro, eles obtiveram o apoio de Pinheiro Machado, e em Fortaleza, Franco Rabelo foi realmente removido do poder.

Após a revolta e a deposição do interventor no Ceará, o presidente Hermes da Fonseca convocou novas eleições para o governo estadual, resultando na eleição de Benjamim Liberato Barroso como governador e no retorno do Padre Cícero como vice-governador.

Devido ao seu envolvimento nesses eventos políticos, Padre Cícero foi excomungado pela Igreja Católica no final da década de 1920. No entanto, sua influência no Ceará e na região Nordeste garantiu que sua imagem como homem santo permanecesse intacta. Até os dias atuais, ele é venerado pela população local e continua a atrair milhares de pessoas para Juazeiro do Norte.

Desenvolvimento

Contexto histórico da Primeira República e a política dos governadores

A Primeira República, também conhecida como República Velha, foi um período da história brasileira que se estendeu de 1889 a 1930. Esse período foi marcado pela transição do regime monárquico para o republicano e pelas profundas mudanças políticas, econômicas e sociais que o país vivenciou. A política da Primeira República era dominada por grupos oligárquicos que detinham o poder em suas respectivas regiões. Essas oligarquias eram compostas por grandes proprietários de terra, cafeicultores e membros da elite agrária.

A política dos governadores foi uma estratégia adotada durante a Primeira República para garantir a governabilidade do país. Nesse sistema, o presidente da República concedia autonomia aos governadores estaduais, permitindo que esses líderes locais exercessem amplo controle sobre a política de seus estados. Em troca, os governadores se comprometiam a apoiar o presidente nas eleições presidenciais e a manter a estabilidade política no país. Essa troca de favores entre o presidente e os governadores foi fundamental para a consolidação do poder das oligarquias regionais e para a estabilidade do regime republicano.

Os governadores, por meio dessa política, exerciam controle sobre os poderes executivo e legislativo dos estados, indicando seus aliados políticos para os cargos-chave. Essa prática resultava na concentração de poder nas mãos de poucos grupos políticos e na perpetuação de uma estrutura de poder oligárquica. Dessa forma, a política dos governadores, embora tenha contribuído para a estabilidade política durante a Primeira República, também reforçou a exclusão política e a falta de representatividade para grande parte da população brasileira.

No entanto, essa estratégia política gerava uma série de problemas, como a corrupção e o nepotismo, além de dificultar a participação política de grupos não alinhados com as oligarquias. Essa falta de abertura política contribuiu para o fortalecimento do poder local e a perpetuação de práticas clientelistas e autoritárias. A política dos governadores foi um dos principais pilares da Primeira República, moldando a dinâmica política do país e estabelecendo as bases para as tensões e conflitos que surgiriam ao longo desse período.

A política das salvações e a ampliação do poder do presidente na política dos estados

Durante a Primeira República no Brasil, a política das salvações foi uma medida implementada com o objetivo de fortalecer o poder do presidente e ampliar sua influência sobre os estados. Essa política consistia em estender os limites de intervenção do governo federal na política local, permitindo que o presidente interferisse diretamente na indicação de governadores e em outras decisões políticas dos estados.

Com a política das salvações, o presidente adquiriu maior controle sobre a composição dos governos estaduais, podendo nomear interventores federais para atuarem como representantes do governo central nos estados. Esses interventores tinham o poder de destituir governadores e impor medidas que fossem do interesse do presidente, garantindo assim uma maior centralização do poder político.

Essa ampliação do poder do presidente na política dos estados gerou uma série de tensões e conflitos com as oligarquias regionais. O presidente passou a exercer um papel determinante na escolha dos governadores, interferindo nas disputas políticas locais e impedindo a ascensão de opositores. Isso resultou em insatisfação por parte das oligarquias e em resistência aos interventores federais, o que culminou em conflitos e revoltas em diversos estados brasileiros, como foi o caso da Revolta do Juazeiro no Ceará, em 1914.

Em suma, a política das salvações representou um marco na consolidação do poder presidencial durante a Primeira República. Essa medida contribuiu para a ampliação da influência do presidente sobre os estados, mas também gerou tensões e conflitos com as oligarquias locais, evidenciando a centralização do poder político e as disputas pelo controle dos governos estaduais.

A tentativa do presidente Hermes da Fonseca de impedir a ascensão de oposicionistas no governo do estado do Ceará

Durante o governo de Hermes da Fonseca, presidente do Brasil na Primeira República, houve uma clara tentativa de impedir a ascensão de oposicionistas ao controle do governo do estado do Ceará. O presidente, utilizando-se da política das salvações, ampliou seus poderes e interferiu diretamente nos assuntos políticos dos estados, visando garantir a lealdade de seus aliados e evitar que adversários políticos ocupassem cargos importantes.

No caso específico do Ceará, grupos oposicionistas liderados pelo senador José Gomes Pinheiro Machado, mesmo baseados no extremo sul do país, exerciam grande influência sobre os coronéis do Norte e Nordeste. Esses grupos representavam uma ameaça ao controle político do presidente e de suas alianças regionais.

Como resposta, Hermes da Fonseca adotou medidas para impedir que esses oposicionistas assumissem o governo do estado do Ceará. Essas ações incluíram intervenções diretas, nomeando interventores federais e exercendo pressão política sobre as oligarquias locais, a fim de manter o controle dos cargos políticos do estado alinhados aos seus interesses. Essa interferência do presidente gerou insatisfação entre os políticos cearenses e desencadeou a Revolta do Juazeiro, liderada pelo emblemático Padre Cícero Romão Batista.

A figura do Padre Cícero como líder e símbolo da Revolta do Juazeiro

O Padre Cícero Romão Batista desempenhou um papel fundamental como líder e símbolo da Revolta do Juazeiro, ocorrida em 1914 no sertão cearense durante a Primeira República. O padre era uma figura muito influente na região, exercendo não apenas um papel religioso, mas também político e social. Sua posição de destaque na revolta foi resultado de seu envolvimento em questões políticas e de sua defesa dos interesses do povo sertanejo.

Padre Cícero era conhecido por sua atuação em prol dos menos favorecidos e dos camponeses, que encontravam na figura do padre um líder e protetor. Sua popularidade na região e sua capacidade de mobilizar as massas foram fundamentais para a organização e sucesso da Revolta do Juazeiro. Ele se tornou o símbolo da resistência contra a interferência do governo federal na política local e da luta contra as oligarquias dominantes.

A liderança carismática e a devoção popular a Padre Cícero contribuíram para que ele se tornasse uma figura emblemática não apenas durante a revolta, mas também ao longo da história do Ceará e do Nordeste. Mesmo após a revolta, mesmo após sua excomunhão pela Igreja Católica na década de 1920, sua imagem como homem santo e defensor do povo permaneceu intacta. Até os dias atuais, Padre Cícero é venerado pela população da região e sua cidade, Juazeiro do Norte, atrai milhares de peregrinos em busca de sua proteção e intercessão.

O confronto entre o interventor Marcos Franco Rabelo e os revoltosos cearenses

O confronto entre o interventor Marcos Franco Rabelo e os revoltosos cearenses durante a Revolta do Juazeiro, em 1914, foi um episódio marcante na história do Ceará e da Primeira República. Rabelo, nomeado pelo governo federal, buscava controlar a região e reprimir a resistência liderada pelo Padre Cícero e seus seguidores. Enquanto isso, os revoltosos cearenses, liderados por figuras como Floro Bartolomeu, organizaram uma defesa em Juazeiro do Norte para proteger o padre e resistir à intervenção do governo.

A expedição liderada por Rabelo rumou para Juazeiro do Norte com o intuito de prender o Padre Cícero, mas encontrou uma forte resistência. Os revoltosos haviam construído uma muralha defensiva chamada "Círculo da Mãe de Deus", que cercava a cidade e impediu a penetração das tropas governamentais. Essa barreira defensiva foi construída em apenas sete dias e se mostrou eficaz para repelir os ataques iniciais.

Ao longo de vários combates, os revoltosos cearenses conseguiram manter a vitória em Juazeiro do Norte, frustrando os esforços do interventor. Floro Bartolomeu, líder rebelde, empreendeu uma viagem ao Rio de Janeiro em busca de apoio político, enquanto os revoltosos avançaram em direção a Fortaleza com o objetivo de depor Rabelo. No Rio de Janeiro, conseguiram o apoio de José Gomes Pinheiro Machado, importante político e líder influente na região. Em Fortaleza, o interventor Marcos Franco Rabelo foi finalmente deposto, selando a vitória dos revoltosos cearenses na luta contra a intervenção federal e garantindo a retomada do controle político local.

A resistência e a vitória dos revoltosos em Juazeiro do Norte

A resistência e a vitória dos revoltosos em Juazeiro do Norte durante a Revolta do Juazeiro em 1914 são episódios marcantes na história do Ceará e da Primeira República. Liderados pelo carismático Padre Cícero, os revoltosos se organizaram em uma defesa firme contra a intervenção do governo federal, representada pelo interventor Marcos Franco Rabelo.

Ao cercar Juazeiro do Norte com o chamado "Círculo da Mãe de Deus", uma muralha defensiva construída em tempo recorde, os revoltosos conseguiram repelir os avanços das tropas do governo. Essa muralha, erguida em apenas sete dias, mostrou-se eficaz ao proteger a cidade e frustrar as investidas iniciais do interventor. A resistência determinada dos revoltosos cearenses demonstrou sua disposição em lutar pelo controle político e resistir às interferências externas.

A vitória dos revoltosos em Juazeiro do Norte foi um marco significativo na revolta. A liderança firme de Padre Cícero, aliada à mobilização popular e ao apoio de figuras políticas influentes, como José Gomes Pinheiro Machado, garantiu a força necessária para enfrentar o interventor e suas tropas. A derrota de Rabelo em Fortaleza, culminando em sua deposição, consolidou o triunfo dos revoltosos cearenses e marcou um ponto de inflexão na Revolta do Juazeiro. Essa vitória reafirmou a resistência do povo e a importância do protagonismo local na luta contra a intervenção do governo federal. A busca por apoio político no Rio de Janeiro e a deposição do interventor em Fortaleza. As eleições e o retorno do Padre Cícero ao posto de vice-governador. A excomunhão do Padre Cícero pela Igreja Católica e sua posterior veneração pela população.

Conclusão

A Revolta do Juazeiro foi um importante episódio da história política do Brasil, ocorrido em 1914. Marcada pela intervenção do governo federal na política dos estados, essa revolta teve como símbolo e líder o Padre Cícero Romão Batista. O evento evidenciou a resistência das oligarquias locais às interferências do poder central e demonstrou a força política e a devoção popular em torno do Padre Cícero. Apesar de excomungado pela Igreja Católica, sua influência perdurou e sua imagem como homem santo continua atraindo peregrinos e devotos até os dias atuais. A Revolta do Juazeiro representa um capítulo significativo da história do Ceará e do Brasil, destacando a luta pelo poder político e as dinâmicas regionais durante a Primeira República.

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http://www.historiabrasileira.com/brasil-republica/revolta-de-juazeiro/

http://www.onordeste.com/onordeste/enciclopediaNordeste/index.php?titulo=Floro+Bartolomeu


Publicado por: João Paulo dos Santos

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