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Análise de uma conjunção

Clique e entenda um pouco mais acerca do estudo da análise das conjunções.

O texto publicado foi encaminhado por um usuário do site por meio do canal colaborativo Meu Artigo. Brasil Escola não se responsabiliza pelo conteúdo do artigo publicado, que é de total responsabilidade do autor . Para acessar os textos produzidos pelo site, acesse: https://www.brasilescola.com.

O estudo das conjunções, sobretudo nos ensino Fundamental e Médio, de uma maneira geral, tem deixado de lado uma análise calcada no contexto e, no processo de interação verbal entre os indivíduos para se deter em mecanismos que não acrescentam um conhecimento mais amplo ao estudo da língua.

O que os gramáticos normativos tem feito é listar uma infinidade de conjunções vinculadas a uma construção lógica/semântica, como se disso dependesse todo o estudo da análise das conjunções. E quando mencionam as aplicabilidades dessas conjunções valem-se de exemplos canônicos, sem circulação em nossa sociedade, retiradas de autores da Literatura ou já veiculados em outras gramáticas. Dificilmente há discussões críticas acerca de outros empregos, e até mesmo a não aceitação de outras variabilidades.

Logo, o estudo desses elementos fica pormenorizado, restrito a poucos exemplos, e quando o aluno se depara com construções sintáticas diferentes daquelas que ele estudou, fica portanto, com grande dificuldade de perceber as sutilezas semânticas e as nuances sintáticas na construção do enunciado, prejudicando a compreensão do discurso.

Outro dado importante é a ausência dos estudos semânticos nas gramáticas normativas que gera negação da importância de perceber a função de um elemento no âmbito da construção enunciativa, implicando com isso, negar também a possibilidade de haver uma visão funcional e não meramente prescritiva e limitada da língua. Para Bakthin (2003, p.282 – 283).

A língua materna – sua composição vocabular e sua estrutura gramatical – não chega ao nosso conhecimento a partir de dicionários e gramáticas mas de enunciações concretas que nós mesmos ouvimos e nós mesmos reproduzimos na comunicação discursiva viva com as pessoas que nos rodeiam.

Assim, o presente estudo se justifica pelo fato de tratarmos o ensino da Língua Portuguesa com enunciados concretos, isto é, com textos orais e escritos que circulam socialmente, então, pretendemos investigar as diferenças no uso da conjunção adversativa, mas do ponto de vista gramatical e linguístico. O objetivo do presente trabalho é identificar,analisar e comparar as ocorrências da conjunção “mas”, de acordo com a norma padrão da língua (conjunção coordenativa adversativa precedida por vírgulai) e de acordo com outras funções,isto é, a língua tem sentido ( semântica); a língua tem intenção ( pragmática). Para atingirmos aos objetivos propostos, se utilizamos de um corpus oral e um corpus escrito, procurando responder as seguintes perguntas:

Quais as ocorrências da conjunção “mas” no corpus 1 e  2 ?

Quantas ocorrências de conjunção “mas” no corpus 1 e 2 estão de acordo com a norma padrão com relação à pontuação?

Todas as ocorrências expressam o sentido adversativo descrito pela gramática normativa? Se não, que outras funções semântico-pragmáticas as ocorrências de “mas” assumem no corpus 1 e 2?

Observam-se diferenças significativas entre os dois corpora?

No capítulo 1 apresentamos a fundamentação teórica de nosso trabalho com o ponto de vista proposto pelos gramáticos e lingüistas. Fundamentação esta que norteará todas as etapas do presente trabalho. Já no capítulo 2 apresentaremos a análise gramatical, semântico e pragmático de um corpus oral e de um corpus escrito

CAPÍTULO 1

Fundamentação teórica

1.1 Introdução

Uma forma de concepção do “mas” como articulador de enunciados do texto é aquele que aparece descrito nas gramáticas tradicionais. Seja por se pautarem em um ponto de vista linguístico (estudado fora de seu contexto), lógico-semântico (imaginando que a articulação dos enunciados por meio de conectivos cria relações de sentido e explica o uso de cada recurso linguístico) ou filosófico (buscando, através de definições, resposta para o que seria o comportamento padrão de cada mecanismo da língua). Nessa seção, busca-se refletir, de uma forma sumária, sobre o tratamento que é dado por estes estudos ao conectivo adversativo “mas”.

Para Cegalla (1995, p. 267), as conjunções adversativas são as que “exprimem oposição, contraste, ressalva e compensação”. Um dos exemplos dados é o enunciado: “Querem ter dinheiro, mas não trabalham”, no qual, dada a definição apresentada, entre querer ter dinheiro (1) e não trabalhar (2) existiria uma relação de oposição ao contraste.

Para Bechara (2001, p. 321), elas “enlaçam unidades apontando uma oposição entre elas”. O exemplo apresentado é: “Acabou-se o tempo das ressurreições, mas continua o tempo das ressurreições”, no qual, tendo em vista o conceito dado, entre acabar o tempo das ressurreições (1) e continuar o das insurreições (2) aconteceria uma relação de oposição.

Para Cunha e Cintra (2001, p. 580), as conjunções adversativas “ligam dois termos ou duas orações de igual função acrescentando-lhes, porém, uma idéia de contraste”. Um exemplo é: “ Apetece cantar, mas ninguém canta”, no qual, entre cantar (1) e ninguém canta (2) haveria uma relação de contraste.

Embora cada autor construa uma definição com nuances que os diferencia, há entre eles uma tese que considera que o conectivo “mas” estabelece uma relação de oposição ou de contraste entre os enunciados.

1.2. A conjunção “mas” sob o viés funcional

Neves ( 2000, p. 755-770 ) ao apresentar o estudo das conjunções adversativas enfoca especificamente “a coordenação com mas”. A autora analisa a conjunção “mas” sob três pontos principais:

1.2.1 A natureza da relação

Sobre a natureza da relação a autora afirma que o “mas” marca uma relação de desigualdade entre os segmentos coordenados, e por essa características, não há recursividade na construção com mas”. exemplo:

Vocês servem mal, mas a comida é ótima!

1.2.2 O modo da construção

Sobre o modo da construção neves argumenta que “ os seguimentos coordenados por “ mas” podem ser sintagmas, orações e enunciados”. Exemplo.

Ângela riu fraca mas ostensivamente  ( sintagma)

A primeira  ideia que me ocorreu foi Condillac, mas não era uma boa resposta. ( orações).

Se se come bem aqui não sei, mas, que se bebe bem, bebe-se! ( enunciados).

1.2.3 O valor semântico

E sobre o valor semântico a autora afirma: “ nas relações de desigualdade há aspectos especiais  marcados pelo uso do mas. A desigualdade é utilizados para a organização da informação e para a estruturação da argumentação.  

CAPÍTULO 2

Análise dos Corpora

A análise da conjunção “mas” é necessário porque envolve critérios sintáticos, semântico e pragmático dos enunciados. É importante saber distinguir os três pontos de vista no momento da leitura e análise da conjunção “mas”, pois essa conjunção não serve apenas para ligar orações. Elas vão além, ou seja, estão impregnados de significação e dão pistas ao leitor do significado da sentença.Portanto, não há como se ater apenas a um enfoque. Segundo a Gramática Normativa de Celso Cunha, a conjunção “mas”, vem explicada como conjunção adversativa. Mas para Neves, em “Gramática e Usos do Português”, a conjunção “mas”, vem classificada com outros sentidos, não só como uma conjunção adversativa, mas com valores semânticos como:

  • Contraste entre positivo e negativo, ou vice-versa. Exemplo: Será que pé gasta? Diz de quem trabalha em salina gasta. Mas eu não; agora sou jornalista. (VI). Contrastando: ( (pé) de quem trabalha em salina gasta) positivo – (mas eu não (gasto) ) negativo.
  • Nega-se a sequência mas, a recolocação natural também é negada: Experimentou calcular se estaria perto ou longe daquilo que acontecia em algum lugar. Mas parava, e de novo o silêncio do sol se refazia e o desorientava. (M).
  • Envolvendo gradação. Na ordem do argumento mais fraco para o mais forte (que é, então, negado): E, continuando a andar, por vezes o vento lhe trazia um clamor vago, uma reivindicação mais intensa. Era um alarmante de vida que delicadamente alertou o homem. Mas com o qual ele nada soube fazer como se visse uma flor se entreabrir e apenas olhasse. (M) ( = o alarme alertou o homem, mas não passou disso). E então, não me causava de chutar o freguês. Malhar, malhava; mas agora, com aquele bicho gordo eu não podia. (DM) (= malhava, o freguês, mas não chegava a vencê-lo).
  • Enunciado hipotéticos interrogativo. É sugerido um novo argumento para consideração, muito frequentemente por um enunciado hipotético interrogativo. O argumento anterior, embora admitindo é considerado insuficiente: - E se a danadinha batesse com a língua nos dentes? Não! A pequena não era boba, era até bem sabida, logo se via. Mas se começasse a achacá-lo? – estremeceu. (DM).
  • Contraposição em direção independente. No segundo membro coordenado, é enunciado um argumento ainda não considerado. O argumento anterior, embora admitido (= “ainda assim”), é considerado menos relevante do que o que vem acrescentado: Gostaria de ver o Zico na Gávea até a morte, mas reconheço que ele tem direito a este último contrato milionário. (PLA).

As ocorrências apresentadas no corpus 1 oral, da conjunção “mas”:

2.1 Análise do Corpus 1

“mas é possível dar essa contrapartida que os trabalhadores estão pedindo?”

Neste caso é sugerido um novo argumento para consideração, muito freqüente por um enunciado hipotético interrogativo.

mas um acordo não seria...”

Nega-se a subseqüência, mas há uma recolocação, isto é, vem expresso um evento que substitui a subsequência natural eliminada.

“da maneira como esse assunto ta sendo introduzido... ele ta fechando muito as portas... né... o próprio Nildo aqui defendeu que não é bem o que tem saído na imprensa... mas também não é o bem só isso que tem saído na imprensa que pode ser saída para o problema da crise do emprego... nós temos... agora mesmo... no Jornal das 10... nós acabamos de ver acordo que a Volkswagen Taubaté ta propondo...”

Este caso envolve gradação na ordem do argumento mais fraco para o mais forte (que é, então, negado).

“mas que serão respostas depois...nesse período os empresários... no período de progresso... o grande crescimento... você ta...”

Neste caso a conjunção “mas” marca contraste entre positivo e negativo, ou vice-versa.

“mas a... a.... a.... indústria.... o comercio... os bancos tão pagando em todas... houve um período em que o banco de horas era muito a favor da empresa... neste momento o banco de horas pode ser feito dando crédito ao trabalhador.”

Este caso envolve gradação, na ordem do argumento mais fraco para o mais forte.

2.2  Análise do Corpus 2

“Garantia, mesmo, não há nunca, mas existe o conforto relativo de saber que até agora...”

“Há ações do governo, mas não se pensa em pacote...”

“... medidas administrativas foram tomadas aqui e ali, mas ninguém propôs remédios testados antes, ou pior...”

Nestas três frases a conjunção “mas” vem marcando contraste entre positivo e negativo ou vice versa.

“O presidente Luiz Inácio Lula da Silva diz que a taxa de juro é um absurdo, mas segura no cargo o presidente do Banco Central, que mantém os juros no nível que estão; joga no vermelho...”

Neste caso há contraposição em direção independente. No segundo membro coordenado, é enunciado um argumento ainda não considerado. O argumento anterior, embora admitido (= “ainda que”), é considerado menos relevante do que o que vem acrescentado.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BAKHTIN, Mikhail. Estética da Criação Verbal: Os Gêneros do discurso. 4.ed. São Paulo: Editora Martins Fontes, 2003.

BECHARA, Evanildo. Moderna Gramática Portuguesa. 37. ed. Rio de Janeiro: Editora Lucerna, 2001.

CEGALLA, Domingos Paschoal. Novíssima gramática da Língua Portuguesa. 38. ed. São Paulo: Editora Nacional, 1995.

CUNHA, Celso & Cintra, Lindley. Nova Gramática do Português Contemporâneo. 3. ed. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 2001.

NEVES, Maria Helena de Moura. Gramática de usos do português. São Paulo: Ática Anesp, 2000.


Publicado por: Ricardo Santos David

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