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As 4 Regras de Newton para o raciocínio em Filosofia Natural (Física)

Analise sobre as 4 regras de Newton para o raciocínio em Filosofia natural.

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CONHECENDO E CONTEXTUALIZANDO AS 4 REGRAS

Isaac Newton foi um filósofo natural – e experimental – (termo do próprio Newton para o que hoje chamamos de Físico) e matemático britânico do século XVII, tendo mudado a história da Ciência não só por suas descobertas, mas, principalmente, por sua filosofia referente ao método científico.

Newton foi uma das fundamentais figuras pensantes na criação da ciência moderna, pois colaborou centralmente com o estabelecimento e o desenvolvimento da ciência natural matematizada e experimentalista, superando o milenar sistema de Aristóteles de Estagira, que formulava um conhecimento natural mais passivo e qualitativo.

Influenciado pelo filósofo e matemático francês René Descartes, que teria fundamentado e justificado a matemática como meio de ordenar e desenvolver o conhecimento natural, Newton constrói sua mecânica centrada na quantificação e dimensionalização dos eventos em observação. A observação dos eventos para Newton, por sua vez, também superará o modelo aristotélico, de uma aproximação passiva para apreensão geral da natureza, propondo uma aproximação ativa, por experimentalismo, como havia buscado, de maneira mais desordenada, Galileu Galilei. Tal noção de experimentalismo chega a Newton por influência de Robert Boyle, filósofo contemporâneo de Newton e cientista considerado o pai da química, que formulou e defendeu o ceticismo científico, dentro do qual se encontra a importância do experimento na prática em prol do conhecer.

Em sua mais importante obra, Princípios Matemáticos de Filosofia Natural, Isaac Newton propõe explicar as forças da natureza através do movimento dos corpos, por meio de princípios matemáticos que relacionam e descrevem o movimento e, por este caminho, apresentam, como implicação necessária, uma força de impulsão ou atração entre os corpos (excluindo as forças repulsivas do magnetismo, previamente estudadas por William Gilbert).

Em “Princípios Matemáticos de Filosofia Natural” Newton apresenta as 3 Leis ou Axiomas do Movimento, além da Lei da Gravitação Universal. Tais 3 Leis de Newton revolucionaram a Ciência, pois de fato descrevem suficientemente aquilo ao qual se propõem e, ainda mais importante, em conjunto a Lei da Gravitação Universal, conseguiram unir finalmente a matemática com a qual Nicolau Copérnico descrevia os eventos celestes, e a física com a qual Galileu explicava os movimentos.

A grande questão é que Newton, em muito, preocupava-se com a metodologia, como intelectual formado por influência de René Descartes e colaboração de Robert Boyle. A preocupação de Newton com a metodologia faz com que, em sua precitada obra, sinta a necessidade de, além de explicar o universo dos movimentos físicos a luz de sua mecânica, explanar como suas Leis mecânicas foram concebidas, isto é, sob quais regras e procedimentos. Assim, no terceiro livro de “Princípios Matemáticos de Filosofia Natural” o pensador esclarece as regras sob as quais gerou sua Ciência.

São 4 as regras que definem o método newtoniano. Vale constar que Newton, por sua época, não fazia distinção entre Filosofia e Física, chamando o que hoje chamamos de Física Clássica de Filosofia Natural (e Experimental). Assim, Newton chama, em seu livro, tais regras, simplesmente, de “Regras para o Raciocínio em Filosofia”, visto que já estava implícito qual ramo da filosofia estava sendo tratado: filosofia natural (que trata da realidade e dos eventos na natureza) e, pela quarta regra, como veremos adiante, podemos acrescentar o adjetivo “experimental” a esta filosofia natural.

Newton enuncia suas 4 regras no início do Livro III do “Princípios Matemáticos de Filosofia Natural”, tendo publicado somente 2 delas (1ª e 2ª) na primeira edição, ainda não exatamente propostas como regras; acrescentou-se a 3ª regra na segunda edição (1713), a qual Newton dedica especial porção de extensão textual para sua explanação; e, enfim, a 4ª (e última) regra, na 3ª edição, publicada em 1726 na Inglaterra.

Na apresentação das 4 regras, Newton primeiramente realiza o enunciado puramente e, posteriormente, explana-as, seja dissertando ou exemplificando. Como precitado no parágrafo anterior, para a 3ª regra, Newton dedica maior empenho, tratando-a, por conseguinte, de maneira mais profunda. Tal aprofundamento na defesa da 3ª regra se dá pelo fato desta regra possuir um caráter não só procedimental físico, mas, também, metafísico e epistemológico; isto é, da maneira como devemos pressupor que o Universo seja fundamentado e de quais limites devemos assumir para nossa possibilidade de conhecimento.

Entendamos, então, as 4 Regras para o Raciocínio em Filosofia (Natural e/ou experimental) de Newton. Para iniciar, vamos ler, somente ler, os enunciados das 4 regras:

  • REGRA I
  • Não devemos admitir mais causas para as coisas naturais do que aquelas que forem verdadeiras e suficientes para explicar as suas aparências.
  • REGRA II
  • Portanto, aos mesmos efeitos naturais devemos, na medida do possível, atribuir as mesmas causas.
  • REGRA III
  • As qualidades dos corpos que não admitirem nem aumento nem diminuição de grau, e que se concluir pertencerem a todos os corpos ao alcance de nossos experimentos, devem ser tomadas como sendo as qualidades universais de todos os corpos.
  • REGRA IV
  • Na filosofia experimental devemos encarar as proposições inferidas a partir dos fenômenos por indução geral como sendo precisamente ou aproximadamente verdadeiras, a despeito de quaisquer hipóteses contrárias que possam ser imaginadas, até que ocorram outros fenômenos, pelos quais elas podem ser tornadas mais precisas ou suscetíveis de exceções. Devemos seguir esta regra, de que o argumento por indução não pode ser evitado por hipóteses.

(Recomenda-se que o leitor repita a leitura das 4 Regras ao menos 3 vezes, para melhor situar o conteúdo geral de cada uma)

AS 4 REGRAS SINGULARMENTE – ARGUMENTO E LIGAÇÃO

Primeiramente, busquemos compreender cada regra em sua singularidade, para compreender sua essência expositiva, porém, não sem apresentar razoavelmente a ligação e geração entre as regras quando necessário.

Qual a preocupação da primeira das regras? A limitação das Causas no mundo natural. Perceba que o texto da primeira regra é incisivo, realizando 2 pontos somente, um de clareza e outro de distinção (apresentação bastante cartesiana). O primeiro ponto é tornar claro que a causa, em si, deve ser verdadeira, o segundo, distinguir que, não é causa de determinado evento aquilo que está além da suficiência para explicação deste evento. Ou seja, a Regra 1 define a limitação das Causas por: verdade, quanto a si, e suficiência, quanto ao evento.

Newton explana a Regra 1 embasando-se na metafísica dos filósofos que o influenciaram. Diz Newton, dissertando em justificativa à primeira regra:

“É com esse objetivo que os filósofos dizem que a Natureza não faz nada em vão, e quando o menos já basta, o mais é em vão; pois a Natureza se agrada da simplicidade, e não lhe cabe a pompa das causas supérfluas.”

Assim, a primeira regra pode ser dada como um velho (medieval) princípio filosófico, porém, aplicado a busca pelas Causas na natureza: o princípio da parcimônia.

A segunda regra, mesmo em análise singular, necessita da compreensão da primeira, isto, pois, qual o objetivo da segunda regra? Partindo da (de)limitação das Causas, estabelecer, também, a (de)limitação dos Efeitos. É evidente que a segunda regra é logicamente dependente da primeira quando o texto dela, que segue do findar da primeira, inicia-se com “Portanto”. Tal dependência ocorre, pois, o embasamento da primeira, que a natureza é simples e não há causas em vão (parcimônia), é, também, a justificativa do posicionamento da segunda: mesmos efeitos, mesmas causas – simplicidade.

A segunda regra não define que para os mesmos efeitos haverão as mesmas causas exata e definitivamente, como podemos observar em seu texto quando diz “na medida do possível”, pois, aí, Newton está salvaguardando a limitação de nossa capacidade de extrair conhecimento dos fenômenos, frente a complexidade da realidade.

Newton explana a Regra 2 exemplificando, na natureza, que efeitos similares são oriundos de causas similares. Perceba que, para a Regra 2, Newton não justifica, somente exemplifica, e isto ocorre, pois, como explicado anteriormente, a justificativa da Regra 2, seu embasamento teórico, encontra-se na explanação da Regra 1. Vejamos, enfim, o que exemplifica Newton para a Regra 2:

“Tal como, por exemplo, para a respiração no homem e nos animais; a queda das pedras na Europa e na América; a luz do fogo de cozinhar e do Sol; a reflexão da luz na Terra e nos planetas.”

Assim, partindo do estabelecido na primeira Regra e do princípio que a justifica (parcimônia), a segunda regra nos diz, em resumo, que Efeitos similares devem ter Causas similares.

Antes de partirmos para a terceira regra, leiamos as Regras 1 e 2 seguidas de suas respectivas explanações, a justificativa/embasamento filosófico para a primeira e a exemplificação para a segunda. Note como tudo agora deve ficar mais claro e encaixado:

REGRA I

[Postulado da regra:]Não devemos admitir mais causas para as coisas naturais do que aquelas que forem verdadeiras e suficientes para explicar as suas aparências. [Justificativa:]É com esse objetivo que os filósofos dizem que a Natureza não faz nada em vão, e quando o menos já basta, o mais é em vão; pois a Natureza se agrada da simplicidade, e não lhe cabe a pompa das causas supérfluas.

REGRA II

[Postulado da regra:]Portanto, aos mesmos efeitos naturais devemos, na medida do possível, atribuir as mesmas causas. [Exemplificação:] Tal como, por exemplo, para a respiração no homem e nos animais; a queda das pedras na Europa e na América; a luz do fogo de cozinhar e do Sol; a reflexão da luz na Terra e nos planetas.

A terceira regra, como precitado, posiciona o autor metafisicamente, ou, no mínimo, epistemologicamente, pois apresenta sua posição quanto ao que podemos postular sobre determinados corpos, ou melhor, o que podemos postular sobre os corpos que não temos acesso para experimentação neles próprios. Tal posição epistemológica do autor, Newton, é que, é possível ampliar para corpos pressupostamente iguais aos experimentados, características daqueles que utilizamos nos experimentos.

O objetivo da terceira regra é conciliar a limitação da capacidade de experimentação do cientista com a finalidade de universalização dos conhecimentos científicos. Tal conciliação é feita por meio da aceitação de que se pode atribuir universalidade à determinada qualidade de um todos os corpos dados por iguais no Universo.

Enquanto a terceira regra visa principiar epistemologicamente o sistema Newtoniano, a quarta regra objetiva normatizar o procedimento lógico de construção deste conhecimento da natureza. Na quarta regra Newton toma uma decisão entre a especulação e a indução, optando pela indução.

Induzir, neste caso newtoniano, é, partindo do que foi aferido pela observação do fenômeno em estudo, alcançar conclusões lógicas. A indução deve ser feita em detrimento, e preferência, de hipóteses. Isto é, pela quarta regra, é mais válido gerar novas ideias acerca do Universo por meio das que já possuíamos, de maneira mais bruta, pela sua observação, do que pela especulação pura para formulação de hipóteses. Assim, o lugar da hipótese no sistema newtoniano passa a ser somente o preenchimento temporário de áreas que ainda não podem ser edificadas por indução, geralmente pela falta de observação/experimentação do fenômeno em questão.

AS 4 REGRAS EM CONJUNTO – UMA CADEIA LÓGICA

Agora, tendo compreendido as Regras, em suas singularidades expositivas e argumentativas, compreendamos a construção desta cadeia lógica que edifica o conjunto de Regras, ou seja, busquemos um entendimento quanto a relação entre as Regras e classificação da cada uma, não por si, mas para com o conjunto.

Para entender a edificação do sistema lógico das regras é necessário, primeiramente, discernir do que trata, em que objeto foca, a proposta de cada enunciado das regras. Quanto ao objeto central da proposta de cada regra, em ordem lógica e textual, encontramos: a Causa, para a Regra 1; o Efeito, para a Regra 2; a Universalização, para a Regra 3; e a Indução, para a Regra 4.

Desta maneira, a Regra 1 apresenta como formular Causas, a Regra 2, partindo da 1, como regular/limitar os Efeitos das/pelas Causas. A Regra 3, partindo da experimentação particular (possível pelas regras 1 e 2) propõe como universalizar a conclusão particular. A Regra 4, fechando a cadeia de raciocínio, define, inclusive para os procedimentos acionados pelas regras anteriores, como devem ser geradas as proposições que definirão os conhecimentos (Leis e Teorias) exprimidos deste processo metodológico.

Logo, as Regras 1 e 4 são as mais independentes, pois não dependem, logicamente, de nenhuma outra. Isto, pois: 1) é partindo da regra 1 que é possível gerar a 2, ainda que a 2 acrescente ao sistema por si só (não sendo corolário da 1), não pode ser colocada como singular, e a 3ª regra, por sua vez, necessitará das regras 1 e 2, pois é partindo do que elas estabelecem que é posto o problema a ser formulado e regrado na 3ª e, desta linha de pensamento não surge a 4ª; 2) assim, a Regra 4 não tem necessidade lógica das demais e, ainda, por sua vez, define a conduta (posicionamento) a ser empregada em todas as outras.

Ou seja, a Regra 1 é axiomática ao sistema de regras; a Regra 4 é regulamentadora deste sistema. A Regra 1 é o princípio, a Regra 4 é a norma. A regra 2 é a articuladora (liga o princípio – regra 1 – a todo o sistema), a regra 3 é a justificadora (pelo experimentalismo e pela noção do limite do alcance dos experimentos).

A Regra 2 é a articuladora da cadeia de regras, pois ela liga a Regra 1, que é o princípio, à Regra 3 e à Regra 4, tanto indiretamente, no que tange ao seu conjunto conteudístico com a Regra 1 possibilitar o discurso da Regra 3, quanto diretamente, no que se refere a ser uma necessidade de postulação para que as regras 3 e, inclusive, a 4, possam existir com sentido.

Bibliografia:

NEWTON, Isaac. Mathematical Principles of Natural Philosophy. Trad. Motte, A./Cajori, F. Chicago, 1952.

MARCONDES, D. Textos Básicos de Filosofia e História da Ciência: A Revolução Científica. Rio de Janeiro: Zahar, 2016.

https://archive.org/details/Principia.Livro.1.2.3-Isaac.Newton

COHEN, A/WESTFALL R. S. Newton: textos, antecedentes e comentários. Parte 2: Método Científico. Trad. Vera Ribeiro. Rio de Janeiro: Editora UERJ/Contraponto, 2002.

Por Rafael Ferreira Martins


Publicado por: Rafael Ferreira Martins

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