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Gestão Escolar (Participativa?)

A gestão escolar participativa é um exercício de cidadania que possibilita ao coletivo escolar. Entenda!

O texto publicado foi encaminhado por um usuário do site por meio do canal colaborativo Meu Artigo. Brasil Escola não se responsabiliza pelo conteúdo do artigo publicado, que é de total responsabilidade do autor . Para acessar os textos produzidos pelo site, acesse: https://www.brasilescola.com.

A educação atual, marcada vigorosamente pelos princípios do capitalismo na pós-modernidade, está em crise. A educação, os valores éticos e morais, assim como a solidez do casamento e da família, estão perdendo espaço para novas formas de comportamento ditadas pelas leis do mercado.  E é justamente na escola que essa crise parece aflorar com maior evidência: nunca se discutiu tanto a falta de limites no comportamento dos alunos, o desrespeito na sala de aula e sua desmotivação; nunca houve tantos professores cansados e depressivos; nunca a frustração esteve tão presente na vida escolar. E a educação escolar é vista pelo aluno como algo enfadonho, comprometendo o aprendizado dos conhecimentos e tornando a tarefa do professor um esforço sobre-humano para ensinar ao menos o mínimo, já que boa parte de sua energia é destinada a impor limites.

Mas, para que se entenda a escola e os seus problemas é preciso que se entenda antes a sociedade onde ela acontece. A última metade do século passado assistiu a mudanças sem precedentes na forma do homem pensar e executar suas idéias. Ao lado de uma imensa sofisticação tecnológica dos meios de comunicação, a mundialização da economia (globalização) alterou significativamente o modo de se pensar a sociedade e a educação. Muitos defendem que este é um novo período da história: a pós-modernidade.

O ser humano pós-moderno se encontra mergulhado num mundo que proclama a si mesmo como redentor da humanidade pelo alastramento da comunicação. Entretanto, para além das aparências, não abdica da exploração econômica, da injustiça e da desigualdade. Referindo-se à assim chamada sociedade do conhecimento, Duarte (2003, p. 35-36) faz a seguinte citação:

Reconheço (...) que o capitalismo do final do século vinte e início do século vinte e um passa por mudanças e que podemos sim considerar que estejamos vivendo uma nova fase do capitalismo. Mas isso não significa que a essência da sociedade capitalista tenha se alterado, isso não significa que estejamos vivendo uma sociedade radicalmente nova, que pudesse ser chamada de sociedade do conhecimento. A assim chamada sociedade do conhecimento é uma ideologia produzida pelo capitalismo, (...) uma ilusão que cumpre uma determinada função: (...) a de enfraquecer as críticas radicais ao capitalismo e enfraquecer a luta por uma revolução que leve a uma superação radical do capitalismo, gerando a crença de que essa luta teria sido superada pela preocupação com outras questões “mais atuais”, tais como a questão da ética na política e (...) pelo respeito às diferenças.

Na pós-modernidade, um contínuo surgimento de conceitos inéditos e provisórios destitui as grandes crenças do passado em nome de um questionável relativismo onde as éticas, os fatos e a própria realidade parecem estar num verdadeiro corredor da morte. Todas as sociedades sempre consumiram, mas aquilo que caracteriza a sociedade contemporânea é a ênfase dada ao consumo. O perfil pós-moderno do modo de produção capitalista caracteriza um período onde as mudanças tecnológicas são tão amplas e rápidas que transgridem a capacidade humana de pensá-las, senti-las e ponderar sobre elas. Há uma ética narcisista, onde os seres humanos perderam, principalmente nos grandes centros urbanos, o sentido do outro. As pessoas se tornaram indiferentes umas às outras na marcha rumo ao consumismo.

Segundo Frigotto (1996), os autores pós-modernos criticam o que chamam de “metanarrativas”, onde estariam incluídos o marxismo e o socialismo científico. É ao relativismo substituindo a verdade. Na pós-modernidade a escola busca a formação do professor “prático-reflexivo”, centrado na subjetividade, em suas experiências pessoais, nas suas “competências”, um profissional que no mesmo momento se torna tanto mais tecnicamente competente, quanto mais politicamente inoperante e adaptado. O professor “treinado” para saber “como” ensinar, não deve se preocupar com “o que” ensinar.

A escola não é e nem pode ser entendida como um lugar desconectado da vida real. Os diferentes conflitos encontrados no interior da escola são o reflexo da sociedade onde essa escola acontece e também da recusa dos profissionais da educação em aceitar este fato. O mesmo pensamento pós-moderno que pulverizou as relações sociais pulveriza também os relacionamentos no interior da escola.  Pensar o mundo de hoje é pensar o mundo da danação; um mundo do descartável, onde as próprias pessoas são vistas como peças provisórias e, portanto, substituíveis. O “ficar” substituiu o namoro; as mensagens do Orkut e MSN virtualizaram as relações e revogaram o contato, o encontro, o abraço, o aperto de mãos; e a informação trazida pela TV e pela internet (geralmente ideológica) quer, finalmente, substituir o conhecimento veiculado na escola.

Uma escola cuja preocupação maior está em educar para a atuação no mercado de trabalho ou para a aprovação em concursos vestibulares só pode ter seu trabalho analisado em função da classe social a quem satisfaz com essa ação. A escola democrática não é aquela que faz o que o aluno quer, mas a que o possibilita refletir sobre si mesmo, sobre a sociedade onde existe e sobre as possibilidades de transformação de sua realidade social. Na sociedade de desigualdades em que vivemos as contradições sociais serão reproduzidas no interior da escola. Nem por isso a escola deve deixar de ser um instrumento importante no processo de transformação desta mesma sociedade.

A transformação de uma sociedade não depende unicamente da elaboração de planos ou projetos pedagógicos. As lutas sociais se desenvolvem no terreno econômico e político da sociedade. Mas está justamente aí a necessidade da escola como elemento que coloca à disposição dos sujeitos sociais as informações necessárias para que possam transformar a sociedade. Como cita Gadotti, "A educação, não é certamente a alavanca da transformação social. Porém se ela não pode fazer sozinha a transformação, (...) esta não se consolidará sem ela" (Gadotti, 1980, p.63). Nas palavras de Saviani (1989, p.66),

(...) se os membros das camadas populares não dominam os conteúdos culturais, eles não podem fazer valer seus interesses, porque ficam desarmados contra os dominadores, que se servem desses conteúdos culturais para legitimar e consolidar sua dominação. Em suma, o dominado não se liberta se não vier a dominar aquilo que os dominantes dominam.

Por isso, como considera Paro:

Se queremos uma escola transformadora, precisamos transformar a escola que temos ai. E a transformação dessa escola passa necessariamente por sua apropriação por parte das camadas trabalhadoras. É nesse sentido que precisam ser transformados o sistema de autoridade e a distribuição do próprio trabalho no interior da escola. (PARO, 2001, p. 10)

Paro reafirma os anseios e esperanças depositados por tantos pais e educadores numa escola pública verdadeiramente promotora de uma sobrevivência digna para todos, como elemento indispensável ao resgate da sensibilidade humana, à formação de consciências críticas e à construção de uma sociedade igualitária, justa e democrática.

Vê-se comumente o poder  autoritário do Estado se instalando na direção da escola, dentro de um modelo clássico de administração  que não permite a participação, o compartilhar de idéias,  a liberdade para  expressar-se e a democracia nas  decisões. A participação é muitas vezes, limitada, controlada e puramente formal, causando assim a acomodação das pessoas que não se mobilizam e ficam esperando serem orientadas, coagidas a aceitar passivamente as decisões das “autoridades competentes”.

A democratização da escola e a participação na gestão escolar não são doações, são direitos. A Constituição Federal – Capítulo da Educação, art. 206, inciso VI - afirma que a gestão democrática do ensino público deve ser na forma da lei. A Lei é a LDB (Lei Nº. 9.394, de 20 de dezembro de 1996.), Art. 3, inciso VIII, segundo a qual o ensino será ministrado com base na gestão democrática do ensino público, na forma desta Lei e da legislação dos sistemas de ensino. A gestão escolar participativa é um exercício de cidadania que possibilita ao coletivo escolar (pais, alunos, funcionários, professores) participar nos processos decisórios que acontecem no interior da escola. Para Weffort (1995, p. 99),

(...) a escola que se abre à participação dos cidadãos não educa apenas às crianças que estão na escola. A escola cria comunidade e ajuda a educar o cidadão que participa da escola, a escola passa a ser um agente institucional fundamental do processo da organização da sociedade civil.

Para que isso aconteça é necessário que o poder seja descentralizado do Estado e transferido oficialmente para as unidades escolares. E, na escola, que ele seja transferido da direção da escola para a comunidade escolar. A direção funcionando como um mediador das relações entre os diversos segmentos escolares, que administra com a comunidade e não a comunidade escolar. Através da descentralização do poder criam-se relações sociais opostas às relações autoritárias e celebra-se a democracia enquanto forma prática de autonomia e tomada de decisão dentro da escola. Segundo Gadotti (1995, p 202)

(...) descentralização e autonomia caminham juntos. A luta pela autonomia da escola insere-se numa luta maior pela autonomia no seio da própria sociedade. Portanto, é uma luta dentro do instituído, contra o instituído, para instituir outra coisa. A eficácia dessa luta depende muito da ousadia de cada escola em experimentar o novo caminho de construção da confiança na escola e na capacidade dela resolver seus problemas por ela mesma, confiança na capacidade de autogovernar-se.

Também é fato que a escola não pode substituir a função da família. Enquanto tenta fazer o papel da família, ela deixa de lado seus próprios afazeres. As falhas causadas pela não-participação dos pais na vida de seus filhos sugerem a possibilidade da criação de mecanismos na escola que possam trazer a comunidade escolar para dentro da escola, com atividades pedagógicas que, além do aluno, exigem a participação da família. (WERNECK, 2001, p.91). No rumo destas ponderações, Bastos (2002, p. 58) nos diz que:

[...] a escola necessita da adesão de seus usuários (não só de alunos, mas também de seus pais ou responsáveis) aos propósitos educativos a que ela deve visar, e que essa adesão precisa redundar em ações efetivas que contribuam para o bom desempenho do estudante.

A escola pública brasileira precisa de novas estratégias que garantam um mínimo de qualidade, que assegure a efetividade do desempenho da escola. Essas estratégias de mudança precisam ser integradoras e certamente podem ser iniciadas com a aproximação entre as famílias e a escola. Uma comunidade escolar propriamente dita sem dúvida, surgirá dessa integração. Como cita Werneck “São boas as escolas que estão em sintonia com a comunidade”. Nas palavras de Paro (2001, p. 27), “Se a escola não participa da comunidade, por que irá a comunidade participar da escola?”. Como toda ação democrática a gestão escolar participativa é um caminho que se faz ao caminhar.

O jogo de xadrez, as aulas de dança de salão ou de pintura em tela, por exemplo, sugerem a possibilidade de sua utilização como estratégia de ação pedagógica para a efetivação de uma gestão participativa com atividades extra-curriculares no contra-turno e/ou em fins de semana, que alem do educando acople ainda a participação de seus pais, professores e funcionários, levando-os a conhecer e refletir sobre o comportamento dos alunos na escola, bem como reconhecerem sua importância no papel de educar em parceria com a escola. Rappaport et al. (2002) afirmam que, Quando as relações familiares privilegiam a resolução dos conflitos por meio do diálogo e onde há uma troca afetuosa entre pais e filhos, a criança e o adolescente sofrerão menos as influências negativas dos conteúdos dos meios de comunicação, em especial os da televisão.

Referências

BASTOS, João Baptista (org). Gestão Democrática – O Sentido da Escola. 3 ed. DP&A. Rio de Janeiro, 2002.

BRASIL. Constituição Federal. Brasília: Imprensa Oficial, 1988.

DUARTE, Newton. Sociedade do Conhecimento ou Sociedade das Ilusões. Autores Associados.  Campinas, 2003.

FRIGOTTO, Gaudêncio. Os Delírios da Razão: crise do capital e metamorfose conceitual no campo educacional. In:GENTILI, Pablo (org) Pedagogia da Exclusão: crítica ao neoliberalismo em educação. Vozes. 2 ed. Petrópolis, 1996,

GADOTTI, M.. Educação e poder. Editora Moraes. São Paulo, 1980.

PARO Vitor H. Gestão Democrática da Escola Pública. 3. ed. São Paulo: Ática, 2001.

RAPPAPORT, C. R. Socialização. In: RAPPAPORT, C. R.; FIORI, W. R.; DAVIS, C. (Coords.). Psicologia do desenvolvimento: a idade escolar e a adolescência. EPU. São Paulo, 2002.

SAVIANI, Demerval. Escola e democracia. Cortez, Editores Associados. São Paulo, 1989.

WEFFORT, Francisco. Escola, participação e representação formal. In: L. Z. da Silva e J. C. de Azevedo (Org.). Paixão de Aprender II. Vozes. Petrópolis, 1995.

WERNECK, Hamilton. Como Encantar os Alunos da Matrícula ao Diploma. 3. ed. DP&A. Rio de Janeiro, 2001.


Publicado por: Giancarlo

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