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A trajetória das Políticas de Educação para Jovens e Adultos no Brasil

Políticas de educação para jovens e adultos no Brasil, qualificação profissional, competências, reformas estruturais na política educacional, a educação e os conflitos sociais.

O texto publicado foi encaminhado por um usuário do site por meio do canal colaborativo Meu Artigo. Brasil Escola não se responsabiliza pelo conteúdo do artigo publicado, que é de total responsabilidade do autor . Para acessar os textos produzidos pelo site, acesse: https://www.brasilescola.com.

A crise internacional do capitalismo iniciada na década de 1970, trouxe de volta, sob nova roupagem, o sistema liberalista, segundo o qual, o Estado não deveria interferir na economia, pois essa movimentar-se-ia conforme as leis naturais do mercado – a oferta e a procura -.

Denominada de (neo) liberalismo, essa ideologia, caracterizando-se pela globalização ou, internacionalização dos mercados e da economia, assentou-se na década de 1980 como um fenômeno político de alcance mundial, visando à recomposição da hegemonia do capital.
Concomitantemente à globalização, foi configurada uma revolução da base científico-tecnológica do processo produtivo, tais como a informação, a microeletrônica, a engenharia genética e novas fontes de energia que concorreram para a ampliação da capacidade mental e intelectual humanas. (FRIGOTTO, 1995)

Sob a orientação das Agências Financeiras que pensam a economia do mundo, os Países periféricos do capital, tiveram que promover um ajuste macroeconômico a fim de conformar suas economias a nova ordem mundial. Esse ajuste econômico-fiscal no Brasil, na década de 1990, produziu mais uma reforma no sistema educacional. Este teria de se “modernizar” adequando seu ensino à “competitividade internacional, incorporando habilidades e competências, novas técnicas e linguagens da informática e da comunicação, abertura ao financiamento empresarial, pesquisas práticas utilitárias, produtividade” dentre outros atributos – o modelo das competências -. (SILVA, 1997).

Tal modelo, contrapondo-se ao da qualificação profissional, emergiu como alternativo na orientação da formação de recursos humanos com foco no trabalho. Sua ênfase não é dada ao saber técnico e sim a habilidade do trabalhador em utilizar os conhecimentos agregados, nas mais variadas situações que ocorrerem em seu posto de trabalho. Nesse sentido "competência designa saber ser, mais do que saber fazer”. De igual modo o ato de “modernizar”, derivado da lógica capitalista, foi conduzido e promovido para a adesão e submissão das sociedades aos seus interesses. É o modelo de modernização que mantém a estrutura econômica brasileira, até hoje, aprisionada, não conduzindo a um processo de mudanças orgânicas que seja extensivo a todas as classes sociais de uma determinada sociedade ou nação.
No contexto das reformas estruturais no aparelho do Estado, a política educacional que há muito vinha sendo debatida no Brasil devido ao baixo índice de proficiência auferido pelos alunos do ensino público, ganha mais um enfoque. À relação existente entre os fatores, renda, evasão e repetência, antes apontada como uma das principais razões para a péssima qualidade do ensino, é acrescida da ineficiência da gestão pública e conseqüentemente da escola pública, aliada a incompetência dos professores. Seriam essas as prováveis causas do baixo rendimento escolar.

Com efeito, a educação que na dinâmica dos conflitos sociais, até então, fora vista como responsável pelo atraso e pela pobreza reinante no País, nesse contexto, passa a ser amplamente valorizada e ideologizada como instrumento capaz de assegurar o desenvolvimento econômico, promovendo a distribuição de renda e a elevação dos padrões de qualidade de vida. Como tal, urge instrumentalizá-la. Ante tal emergência, o modelo das competências foi adotado para todos os graus de ensino – fundamental, médio, técnico-profissional, de jovens e adultos e o superior.

Para compreender a forma como é encarada a questão educacional no País - relegada a um plano inferior -, a continuidade da adoção de políticas equivocadas para o seu sistema de ensino, carece-se de uma reflexão acerca de tais políticas. Principalmente as políticas direcionadas para a educação de jovens e adultos – objeto deste texto. Faz-se necessário portanto, uma retrospectiva para recompor a memória acerca das ações dirigidas a educação popular no Brasil, sob o formato de campanhas populares, programas ou projetos cujos impactos focalizaram determinadas regiões ou subgrupos sociais. Buscar evidenciar as intenções e interesses polítcos-ideológicos, econômicos e sociais, subjacentes a essas ações. Assinalar as diferentes concepções do desenvolvimento da nação gerando os conflitos ideológicos, políticos, conceituais, teóricos e metodológicos entre os vários segmentos das classes sociais, as técnicas sociais, o espaço e o contexto que determinaram historicamente o processo do pensar e fazer a educação de jovens e adultos, no País.
A história registra que no Brasil Colônia não houve uma tentativa séria de promover um acordo político e social que complementasse a formação do Estado Nacional tendo como base um projeto Educacional para seu povo. O modelo econômico – extrativista, latifundiário e escravocrata – não exigia mão-de-obra qualificada. Tampouco havia necessidade de formação de competentes exércitos para defesa ou para conquista. Por sua origem colonial Portuguesa, não foi influenciada pelas revoluções liberais do século XVIII. A educação aqui chegada, trazida pelos jesuítas, não pretendeu sequer se ocupar da competência da população em geral. Visava sobrteudo a difusão da fé católica, a conquista de novos “soldados de batina”, a reprodução das relações de dominação e de facilitação do processo de acumulação de capital por meio do trabalho escravo. Visualizava, sobretudo, a formação de uma nova geração católica e sua provável atuação como multiplicadores junto aos seus adultos. Em decorrência, as primeiras ações de educação da população adulta – o ensino do ler e do escrever -, inicialmente de indígenas e posteriormente de escravos, foram realizadas pelos jesuítas por meio da catequese. 

  "Sem a concorrência do protestantismo e com as injunções políticas  e  econômicas da condição colonial, a educação jesuítica reproduziu no Brasil o espírito da Idade Média, com o aprisionamento do homem ao dogma da tradição escolástica, a sua submissão à autoridade e à rígida ordenação social, avesso ao livre exame e à experimentação. Em contraste, portanto, ao homem de livre-pensamento, de visão igualitária e espírito associativo, confiante no conhecimento como instrumento de transformação do mundo natural". (OLIVEIRA, 2006)

Temendo que ação da Companhia jesuítica pudesse se transformar num “Estado dentro do Estado” o Ministro Português - Marquês de Pombal -, promoveu a expulsão dos jesuítas de Portugal e de suas colônias, em 1759, e com eles extinguiu-se também o único sistema de educação do Brasil. A ênfase das reformas Pombalinas nesse período foi dada à educação superior com vistas a superar o atraso lusitano em relação a outros Países da Europa.

No período imperial, a despeito de uma série de debates acerca da adoção de políticas que possibilitassem estruturar a educação nacional, tal não aconteceu. Proclamou-se muito a importância da inserção das ditas “camadas inferiores” – homens e mulheres pobres livres, negras e negros escravos livres e libertos -, no sistema formal de ensino, sem, entretanto, viabilizar-se uma ação efetiva nesse sentido. A instrução popular, longe de se constituir um direito, realizou-se de forma precária e improvisada tendo a filantropia como uma grande aliada, à proporção que se dava a partir de associações de intelectuais, redes de aprendizagens informais, práticas de leitura e de escrita entre as quais os escravos também se inseriam.

O ato adicional do Imperador em 1934 conferiu às Províncias o direito de legislar sobre a instrução pública - exceto o ensino superior -. Foi omissa quanto à educação popular. Até porque no período imperial a grande maioria da população vivia e trabalhava no campo submetida a oligarquia rural, e não via na instrução uma forma de ascensão social.

"O ensino para adultos parecia assumir um caráter de missão para aqueles que se propusessem, na medida em que os professores que ensinavam durante o dia não receberiam nenhum salário ou gratificação a mais para abrir aulas noturnas. (...) tinha como uma de suas finalidades a “civilização” das camadas populares consideradas, principalmente as urbanas, no século XIX, como perigosas e degeneradas". (SOARES; GALVÃO, 2005).

No final do século XIX ocorreram as transformações mais importantes do Brasil: a decadência do regime escravocrata com a substituição da mão-de-obra escrava pela assalariada; introdução de inovações técnicas nos principais setores da economia; aperfeiçoamento dos métodos de cultivo do café no oeste paulista aumentando a produção; dinamização do mercado interno aumentando as perspectivas de novos empreendimentos em vários setores.

Às mudanças econômicas somavam-se mudanças sociais gerando novos interesses e reivindicações. As cidades cresciam e as camadas médias urbanas começavam a ganhar alguma representação social. Foram essas camadas que contestaram o sistema eleitoral, exigindo o fim das eleições indiretas e censitárias. Nas eleições de 1876 somente 0,25% da população votante possuía o segundo grau. A Lei Saraiva em 1881 reformou o sistema eleitoral atendendo parcialmente as reivindicações. Essa Lei, que restringia o voto do analfabeto, foi incorporada à carta constitucional de 1891 – a da República -.

A partir daí o critério de renda anteriormente exigido como requisito para o alistamento de eleitores foi substituído pelo de domínio da leitura e da escrita, evidenciando, não só, a instrução como um meio de ascender socialmente, como também, modificando a concepção acerca do analfabeto, que naquela conjuntura era visto como uma pessoa atrasada, incapaz, ignorante e incompetente. Até porque, por ocasião da proclamação da República, o Brasil possuía cerca de 14 milhões de habitantes e destes, 85% se constituía de analfabetos. Os adultos considerados letrados tinham em média 04 (quatro) anos de estudos. Tais dados expressavam uma realidade que causava vergonha à sociedade intelectualizada, principalmente em relação a outros Países do mundo.
De igual modo, quando da abolição da escravatura apenas 0,9% dos libertos eram alfabetizados. E, tanto a abolição quanto a República, sintomas de uma mesma realidade, só se tornaram viáveis, quando as forças sociais em que estava assentado o sistema de dominação se deslocaram da velha oligarquia rural para a emergente burguesia agrária cafeeira. Talvez ou até por isso mesmo, uma e outra não propiciaram uma ruptura com a reprodução da ideologia [1] das relações de dominação, possibilitando assim, as condições de reprodução de igual ideologia, indispensável à submissão da numerosa classe trabalhadora, às condições de trabalho livremente explorado (ALENCAR; CAPRI; RIBEIRO; 1985).

Durante a primeira guerra mundial a indústria nacional deu um expressivo salto por causa do processo de substituição das importações - produção no País, dos produtos industrializados impossíveis de serem importados naquele período -. Os acontecimentos no Brasil pós-guerra desencadearam uma configuração na organização sócio-cultural e o enfraquecimento da sociedade “agro-patriarcal” de economia baseada no cultivo do café. O período foi marcado pelo gradativo declínio agrícola e o surgimento de condições propícias à industrialização no contexto do avanço da hegemonia norte-americana e da criação do ideário socialista. Com a revolução de 1930 dá-se uma renovação política agregando-se ao aparelho do estado frações de classe dominante até então excluídas do poder.
Emergem nesse cenário novos estratos sociais dos quais são parte uma camada média de intelectuais, militares com grande prestígio, a emergente burguesia industrial, os emigrantes europeus, frações da oligarquia regional e toda massa de trabalhadores assalariados. Todas essas classes e segmentos de classes sociais caracterizaram-se pela divergência de interesses, origens e posições. Essas contradições promovem e intensificam a insatisfação reinante.
Tas insatisfações conduzem a uma mobilização em prol da educação; difundiu-se o ensino como um instrumento capaz de evitar a convulsão social. A nova sociedade brasileira passou a exigir uma mão-de-obra especializada, atribuindo ao Estado o dever de prover o ensino da imensa classe trabalhadora; de preparar o cidadão como força produtiva eficaz, construtora da riqueza da nação, através do ensino público obrigatório e gratuito. Naquele contexto o cenário nacional era palco de uma “intensa efervescência” política, econômica, social e cultural – na literatura, nas artes, na música e na medicina -, fortalecendo a movimentação pela educação. Através desse nacionalismo educacional a burguesia urbano-industrial busca, por meio da difusão do ensino, ampliar suas bases de representação eleitoral. Almeja a recomposição do poder político segundo o ideário da democracia liberal.
A luta contra o analfabetismo - que naquele momento era visto como o causador de todas as mazelas nacionais -, passa a se constituir preocupação constante na sociedade e nos meios educacionais. Suscita intensas campanhas jornalísticas, seja pela consciência de que a superação do analfabetismo poderia colocar o País em pé de igualdade frente a outros Países, seja porque elevaria o volume dos “votos de cabresto”, seja porque o surgimento de novas forças sociais poderia produzir um “entusiasmo pela educação”. (CURY, 1988)
No Plano internacional o ideário liberal ganhava o papel de reconstrutor social, expressada no plano educacional na pedagogia pragmática da Escola Nova tomando por base o pensamento do norte-americano John Dewey. No País, esse ideário desperta o entusiasmo e otimismo pedagógicos dos profissionais de educação que passam a difundir os ideais e princípios da Escola Nova. Nesse campo se fizeram algumas iniciativas como a do Estado de São Paulo, parcialmente executada por Sampaio Dória com o propósito de combater o analfabetismo e de integrar os imigrantes; a da Bahia, por Anísio Teixeira a do Ceará, de Minas Gerais e do Distrito Federal (FAUSTO, 1999).
As várias tentativas de reformas no âmbito dos Estados, faz o governo de Getúlio Vargas compor um sistema educacional mais estruturado, a partir da coalização e aglutinação das tendências vigentes. Esse sistema estava voltado para o atendimento das demandas surgidas em razão da emergência do capitalismo no Brasil. Para tanto, Vargas, juntamente com seu ministro de educação Francisco Campos, convidam os pioneiros defensores da escola nova para elaborar um Manifesto – Manifesto dos Pioneiros da Escola Nova -, que serviu de fundamento para formulação da política educacional brasileira. (CUNHA, 1981).
A partir daí desencadeou-se um conflito ideológico entre os pioneiros da escola nova composto por frações da classe dominante e a intelectualidade católica, também da classe dominante. Pretendiam os dois segmentos, interferirem nos rumos educacionais brasileiros, através de suas idéias – novas de uns, conservadoras de outros -. Mas, tais idéias, defendidas tanto pelos escolanovistas, quanto pelos católicos, não eram assentadas em análises acerca das reais necessidades existentes no Pais. Não evidenciava os problemas e as questões sociais da época, como as grandes diferenças entre as classes sociais, resultado do legado histórico e naquele momento agravada pela emergência do capitalismo no Brasil. Evidenciava sim, um projeto de desenvolvimento compatível com os interesses de cada grupo.
A despeito dos embates e movimentos em favor da educação, durante a regência do Estado Novo no País, pouco foi feito oficialmente quanto ao anafalbetismo. Ações pontuais, tímidas ou isoladas foram a marca nesse regime. Daquele período em diante muitos governantes se sucederam e de igual modo muitas mobilizações e campanhas nacionais. Essas campanhas tinham como características comuns o período de duração, a aferição dos índices estatísticos, o otimismo e a euforia do momento. Entretanto, uma vez aferidos e avaliados os seus resultados, verificava-se a queda nos índices qualitativos e quantitativos. Mesmo assim, a educação popular oficial continuou sendo formatada à base de campanhas, que, no decorrer do tempo foram renovadas, substituídas, modernizadas ou incorporadas por outras.

Paralelas às campanhas oficiais de alfabetização, despontaram no País vários movimentos de educação e cultura popular através de organizações da sociedade civil, no período populista desenvolvimentista. Diferentemente das demais iniciativas para a alfabetização esses movimentos fundamentaram-se na Teoria do Conhecimento do Educador Paulo Freire que, à época, Professor da Universidade de Recife, presidia a Comissão de Cultura popular. Os fundamentos de Paulo Freire tinham o caráter de pesquisa, conservava as peculiaridades e diversidades regionais e socioculturais, valorizava e aprimorava a cultura popular, buscando conscientizar a população acerca da realidade. Considerava o analfabeto como produtor do conhecimento e partícipe do processo de transformação dessa realidade. Além da conscientização da população alvo, visava sua inclusão e participação dos analfabetos na vida política nacional e, consequentemente a reversão do quadro socioeconômico e político existente. (SOARES GALVÃO, 2005).

A instauração da hegemonia militar no País extingue esses movimentos dando lugar a mais uma campanha de massa, o Movimento Brasileiro de Alfabetização – Mobral -, paralelo ao sistema institucional de educação, nos mesmos moldes de campanhas anteriores, exceto, pela ausência de ´”conteúdo crítico e problematizador”. Propunha a erradicação do analfabetismo e, sobretudo, difundir a ideologia do regime reinante. Resultou em mais um insucesso,à proporção que não erradicou o analfabetismo, como se propunha.

O processo de redemocratização em 1985, e a promulgação da carta constitucional correspondente, não foram capazes de garantir o direito à educação assegurada por àquela, ao segmento da população de jovens e adultos. Processando-se essa, mais uma vez, de forma descentralizada e com a participação de iniciativas da sociedade civil. Atualmente sob a égide da apologia ao empreendedorismo privado, às parcerias público-privadas e ao Estado mínimo - principalmente quando se trata da prestação de serviços básicos para a população -, o ensino para jovens e adultos legitima-se como um subsistema do ensino institucionalizado.
Ao incorporar novos agentes ou grupos de provimento, quer seja, mantendo um sistema de parceria, quer seja, mediante contrato, convênio ou outros, sua prestação foi delegada a organizações privadas ou civis, às quais atribui-se a condição de prestadoras de serviços públicos. Para tanto, abdica-se de alguns requisitos legais, como transparência, publicidade, participação da sociedade e outros que dão legitimidade ao serviço público. A minimização do financiamento estatal aos serviços básicos, concomitantemente às exigências de novos agregados à qualificação profissional, tem ensejado a mercantilização da educação. Especialmente nas lacunas não preenchidas pelo governo.
Como a fração da população constituída por jovens e adultos que demandam um lugar na educação geralmente se encontra num patamar mais baixo de renda, a iniciativa privada não encontrou mercado nesse segmento populacional. Sua participação se faz na condição de agente da esfera produtiva através de suas fundações ou de parcerias público-privadas (DI PIERRO,2001).

A conclusão a que se pode chegar é que embora se tenha buscado a democratização do saber, passando-se por discussões, conflitos ideológicos, projetos de integração, de construção de identidade do povo brasileiro, e sucessivas reformas no ensino, essa democratização não chegou. A cada contexto histórico reformulam-se os discursos, referendam-se as intenções de desenvolvimento nacional com “inclusão” e o Brasil chega ao século XXI trazendo em sua bagagem os piores índices estatísticos. Se junta ao índice de analfabetismo, o índice dos analfabetos funcionais produzidos pela precariedade da educação brasileira oficial e seu baixo nível de qualidade do ensino. Atualmente mensura-se a prestação do serviço oficial de educação em termos quantitativos e não qualitativos.
Decorridos mais de quinhentos anos de história, a nação brasileira ainda não tem um projeto de educação que possa ser realmente de todos. Educação no verdadeiro sentido da palavra, educação para a vida, para a capacidade crítica, para a transformação dos indivíduos em cidadãos livres e construtores de seu próprio saber. Porque o crescimento de uma pessoa passa, necessariamente, pelo seu desenvolvimento intelectual. Esse é o bem maior, a maior prestação que a ela o Estado pode oferecer, porque a vida é uma sucessão interminável de escolhas. O homem está sempre se defrontando com a necessidade de decidir: por isto ou por aquilo; ir ou ficar; aceitar ou recusar; transigir ou intransigir; parar ou continuar; persistir ou desistir; ser ou não ser... Os exitosos serão aqueles que souberem decidir melhor, entre as várias alternativas que se apresentam cotidianamente. Para isso, precisarão de conhecimento e inteligência, fundamentalmente.
Confrontando-se a realidade de hoje com a realidade histórica, não se evidencia a existência de uma ruptura na práxis educacional. As funções, manifestas ou latentes inerentes à estrutura de ensino permanecem as mesmas. O interesse do Estado ainda repousa na manutenção do status quo, dispensando à educação sua indiferença e indulgência. Ignorando, simplificando e reduzindo a educação dos “excluídos” a um problema menor, uma dívida social que deve ser reparada - como defendem alguns -.
As políticas públicas para a educação de jovens e adultos estiveram sempre atreladas ao projeto de desenvolvimento econômico e social do Brasil, propalando-se a intenção de integrar esse segmento populacional à vida da nação. Até aqui tais políticas massificadas, padronizadas e estrategicamente formuladas, trazendo subjacentes a negação das contradições sociais, regionais e da diversidade étnica e cultural existentes, se mostraram ineficientes e ineficazes em sua pretensão. O caminho apontado por Paulo Freire assinala com perspectivas mais favoráveis nesse campo. Porque somente identificando e reconhecendo os problemas sociais e as especificidades econômicas e sociais e a diversidade cultural é que se tornam visíveis os potenciais existentes para a transformação da realidade, focalizando a ação dos sujeitos integrados em sua própria cultura.

[1] “A ideologia se refere, (...) à expressão, no plano das idéias, de uma visão histórica degradada”. Essa degradação, processo próprio da ideologia, sobre-simplifica o real, através da elaboração feita pela classe dominante. Esta sobre-simplificação se traduz na produção de “falsas identificações” do discurso com o real, dentro do quadro de um pensamento não dialético.
E “a falsa consciência não é mais do que o pensamento não dialético na escala dos grupos sociais” é a própria “des-realização da percepção do mundo”, introjetada pela classe dominante em todas as classes. Essa “reificação ideológica” favorece a resistência à mudança e sua determinação de classe implica na deformação do real e na visão fragmentária e parcial das coisas. (GABEL, Apud CURY, 1988, p. 5).

REFERÊNCIAS

ALENCAR, F.; CARPI, L.; RIBEIRO, M. V. História da Sociedade Brasileira. 3. ed. Rio de Janeiro: Copyright, 1986.

CUNHA, Célio. Educação e Autoritarismo no Estado Novo. São Paulo: Cortez, 1981.

CURY, Carlos Roberto Jamil. Ideologia e Educação Brasileira . 4. ed. São Paulo: Cortez – Autores Associados, 1988.

DI PIERRO, Maria Clara. Descentralização, Focalização e Parceria: uma análise das tendências nas políticas públicas de educação de jovens e adultos. Educação e Pesquisa, vol. 27, nº. 2, jul.-dez./2001 p. 321-327. São Paulo.

FAUSTO, Boris. História do Brasil. 6. ed. São Paulo: Ed. da USP : Fundação para o Desenvolvimento da Educação, 1999.
FREIRE, Paulo. Educação como prática da liberdade. 22. ed. Rio de Janeiro : Paz e Terra, 1996.
FREITAG, Bárbara. Escola, estado e sociedade. 3. ed. São Paulo: Cortez, 1979
FRIGOTTO, Gaudêncio. Educação e a Crise do Capitalismo Real. São Paulo: Cortez, 1995

OLIVEIRA, M. M. Os empresários de educação básica e a nova divisão de trabalho da educação nacional. In: NEVES, L. (Org.). O empresariamento da educação: novos contornos do ensino superior no Brasil dos anos 1990. São Paulo: Xamã, 2002c.

SILVA, Tomaz Tadeu da. A "nova" direita e as transformações na pedagogia da política e na política da pedagogia. In: SILVA, T. T. da ; GENTILI, P. A. A. Neoliberalismo, Qualidade Total e Educação. Petrópolis: Vozes, 1997.

SOARES, Leone; GALVÃO, Ana Maria de O. Uma História da Alfabetização de Adultos no Brasil. In: STEPHANOV, M; BASTOS, M. H. C. História e Memória da Educação no Brasil – século XX . Petrópolis: Vozes, 2005.


Publicado por: Eunice Oliveira dos Santos Cavalcante

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