A Ditadura Civil-Militar e a fragilidade da democracia nacional nos dias de hoje
Educação brasileira durante o regime militar, fragilidade na democracia, leis de âmbito nacional e influencias ideológicas.O texto publicado foi encaminhado por um usuário do site por meio do canal colaborativo Meu Artigo. Brasil Escola não se responsabiliza pelo conteúdo do artigo publicado, que é de total responsabilidade do autor . Para acessar os textos produzidos pelo site, acesse: https://www.brasilescola.com.
Para entender a Educação Brasileira durante o regime militar e poder traçar paralelos com a atualidade frágil de nossa democracia, é necessário, mesmo que brevemente, conhecer a Doutrina de Segurança Nacional (DSN) e Doutrina de Interdependência desenvolvidas no seio da Escola Superior de Guerra (ESG), uma versão brasileira da National War College norte-americana. Nesse sentido, segundo escreve o filósofo Dermeval Saviani (2011) e o historiador Nilson Borges (2003), é importante destacar que os principais objetivos propostos na DSN eram o desenvolvimento e a segurança nacional, circunscritos em uma área de atuação resumida ao oceano Atlântico Sul e a américa latina, tendo como liderança mundial os EUA. Dessa maneira, nos anos 1960, sob a ideia de que “não existia mais independência, mas, por outro lado, interdependência”, o Brasil seguiria em uma economia liberal com relativa soberania nacional. Tal raciocínio, aprofundado em um contexto de Guerra Fria, era de que aquilo que era bom para os EUA, automaticamente, também era bom para o Estado Brasileiro.
Nesse contexto, articulado com a ESG e com o Instituto Brasileiro de Ação Democrática (IBAD), surgiu em 1961 o Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais (IPES), que se tornou responsável por realizar ações ideológicas, sociais e político-militares de direita por meio de guerra psicológica nos meios de comunicação de massa, segundo escreveu o historiador René Dreifuss (2006). Sob financiamento de empresários brasileiros e internacionais, o IPES promoveu eventos de discussão sobre projetos educacionais como o Fórum “A educação que nos convém”, em 1968. Luiz Antonio Cunha (2012) aponta que o texto base de tal Fórum considerava que a escola em seu nível primário já deveria preparar o indivíduo para alguma atividade prática. A sua sequência, o ensino médio, seria formadora da mão-de-obra necessária a atender a demanda econômica do país, tendo um caráter de terminalidade quanto aos estudos do indivíduo.
Como é possível perceber, o Fórum “A educação que nos convém”, apontou os caminhos que a educação nacional tomaria nos anos seguintes. A profissionalização do ensino médio se tornou a orientação geral de seu modelo pedagógico identificado ao “saber fazer”, ou seja, identificado ao modelo pedagógico conservador tecnicista. Para o educador Gaudêncio Frigotto (2015), enquanto a Teoria do Capital Humano (TCH) desenvolvida por Theodore Schultz (1971) tornava o estudante uma máquina com valor agregado, de acordo com a formação e o tempo de curso que ele havia cumprido na escola, os lemas “máximo resultado com o mínimo dispêndio” e “não duplicação de meios para fins idênticos” se tornavam uma realidade da política educacional.
Não por acaso, foram celebrados uma série de acordos de cooperação entre a agência estadunidense de Desenvolvimento Internacional (USAID) e o MEC. Surgiram também as Leis de âmbito nacional 5.540/68 e 5.692/71, que interferiam diretamente na formação do ensino superior e médio. A primeira apontava a tendência de criação de cursos de curta duração para atender ao mercado industrial nacional. A segunda, conforme já apontamos, transformava todas as escolas formadoras de nível médio, em verdadeiros cursos habilitação para alguma função técnica (CUNHA, 2012).
Os anos 1980, porém, foram marcados na sua segunda metade pelo processo de abertura política. Neste ambiente de debates, segundo escreve Luiz Fernando Dourado (2011) e Maria de Fátima Almeida (2005), a promulgação da CF/88 trouxe uma série de vitórias para os trabalhadores da educação. São exemplos disso a vinculação de verbas para educação na ordem de 18% da União e 25% dos Estados, Distrito Federal e Municípios, a aposentadoria aos 25 anos para a professora e aos 30 anos para o professor, a valorização dos profissionais da educação e a ideia da educação como direito social.
Os anos 1990, contudo, apresentaram um contexto político internacional diferente com relação a inciativa de uma educação propriamente popular. A queda do muro de Berlim (1989), o progressivo esfacelamento da URSS (que de fato ruiu em 1991) e o fim da Guerra Fria foram considerados marcos do surgimento do neoliberalismo e da Nova Direita (CHAUÍ, 2016). Não por acaso, uma série de discussões internacionais sobre a educação culminam na Conferência Mundial Sobre Educação para Todos, acontecida em Jomtien, Tailândia, em 1990. A Conferência produziu o documento ‘Declaração de Jomtien’, que seguia as convicções dos seus principais financiadores: o Banco Mundial (BM), o Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD) e o Fundo Monetário Internacional (FMI) (ALMEIDA, 2005).
No Brasil, o Executivo Federal, alinhado com as resoluções internacionais firmadas na Declaração de Jomtien, atuou no sentido derrubar a proposta de inciativa popular de uma LDB e aprovar uma nova proposta que atendesse mais fortemente ao interesse de grupos privados. Promulgada a Lei 9.394 em 20 de dezembro de 1996, o educador Roberto Leher (2012) afirmou que as décadas seguintes foram de embates entre as entidades de classe e as coalizões empresariais que passaram a disputar o aparelho educacional brasileiro com grande influência. A partir de 2015, com o aumento do poder dessas coalizões, setores da economia nacional apoiados por meios de comunicação de massa passaram a defender a mudança de governo e uma radicalização das políticas neoliberais. Efetivado o golpe de 2016, assumiu junto ao governo Temer um bloco político com intuito de estancar os diversos gastos sociais, o que de fato ocorreu com a PEC 241/16, que congelou pelo prazo de 20 anos as verbas para a educação asseguradas na CF/88, enquanto mantinha ativo o pagamento dos serviços e dos juros da dívida pública.
Semelhante a política educacional adotada na Ditadura civil-militar, o governo implementou uma reforma educacional de orientação neotecnicista e a prematura entrada dos jovens no mercado de trabalho. Assim, a Lei n.º 13.415/17 reformulou a estrutura do Ensino Médio oferecendo formação em cinco itinerários, que no final, tem apenas a intenção de diminuir a pressão atual pelo ensino superior, segundo nos explica o professor Luiz Antonio Cunha (2017). De fato, o recém eleito governo federal afirmou que gasta demais com educação. Por sua vez, o seu ministro da educação afirmou que as universidades públicas devem ser reservadas para uma elite intelectual. Os jornais têm apontado uma articulação do governo para acabar com a vinculação de receitas para a educação básica e a proposta de reforma da previdência posta à mesa acaba com o regime especial de aposentadoria para os professores. Tal como acontecera no passado, surgiram vários novos institutos que divulgam valores liberais entre os empresários e políticos, bem como surgiram uma infinidade de páginas, sites e vídeos pela internet, se encarregam de influenciar ideologicamente o povo brasileiro a aceitar tais mudanças.
Em tempo, vale ressaltar que essa reedição das políticas públicas educacionais adotadas durante a ditadura civil-militar devem realmente ser implementadas no atual governo, acompanhando, tal como foi feito durante a Guerra Fria, do enfraquecimento da democracia no bloco econômico latino-americano e de um novo alinhamento de forma submissa dos interesses do Estado brasileiro aos dos EUA. Contudo, devemos apontar que entre os anos 1960 e 1980 tivemos uma ditadura militar com apoio civil de empresários, mas que, porém, nos anos 2010, diante da perseguição que intelectuais, artistas e professores vem sofrendo, temos uma frágil democracia que se mantém “até quando os militares quiserem”, como afirmou o militar reformado e presidente da República, Jair Bolsonaro.
ALMEIDA, Maria de Fátima (2005). Política Educacional brasileira na Década de 1990. Cadernos de História da Educação - nº. 4 - jan./dez.
CHAUI, Marilena (2016). A nova classe trabalhadora brasileira e a ascensão do conservadorismo. IN: JINKINGS, Ivana; DORIA, Kim; CLETO, Murilo (orgs). Por Que Gritamos Golpe?: Para entender o impeachment e a crise política no Brasil. São Paulo Boitempo.
CUNHA, Luiz Antonio (2012). Educação, Estado e Democracia no Brasil, São Paulo/Niterói/Brasília: Cortez/EDUFF/Flacso-Brasil, 1ª edição 1991; 6ª edição 2009.
CUNHA, Luiz Antonio (2017) Ensino Médio: Atalho Para O Passado. Educ. Soc., Campinas, v. 38, nº. 139, p.373-384, abr.-jun., 2017
DREIFUSS, RENÉ (2006). 1964: A conquista do Estado – ação política, poder e golpe de classe. Petrópolis. Editora Vozes.
FRIGOTTO, Gaudêncio (2015). A produtividade da escola improdutiva 30 anos depois: regressão social e hegemonia às avessas. Revista Trabalho Necessário. Ano 13, Nº 20.
LIBÊNEO, José Carlos (2012). O dualismo perverso da educação brasileira: escola do conhecimento para os ricos, escola do acolhimento social para os pobres. Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 38, n. 1, p. 13-28, 2012
SAVIANI (2011). História Das ideias pedagógicas no Brasil. Campinas: Autores Associados.
Por Fábio Souza Lima.
Publicado por: FÁBIO SOUZA LIMA
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