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ARGUMENTAÇÃO: A ANÁLISE DO DISCURSO EMPREGADA NA LETRA DA MÚSICA “SOLDADO DO MORRO” DO RAPPER MV BILL

Significados e sentidos escritos na letra da música do cantor e compositor Mv Bill

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RESUMO

O presente artigo tem o objetivo de entender os significados e sentidos escritos na letra da música do cantor e compositor Mv Bill, um ídolo do rap nacional, com o propósito de possibilitar o entendimento da sua tendência afável. Tomado como base sua historiografia e o estudo de caso em utilizar a análise de uma música chamada: “Soldado do Morro”. Os significados e concepções da canção estudada que relata a dimensão objetiva e subjetiva da dialética. Realizou-se uma pesquisa bibliográfica obtendo orientações de autores como ORLANDI (2007), PÊCHEUX (1995) e BRANDÃO (1991). Os aspectos da música e ideologias são elementos constituintes de um discurso direto, na qual a ideia é o convencimento do indivíduo-receptor de que ele pode ser um produtor da história, e não somente um produto social influenciável. A canção preconiza o quadro do desgosto do cantor para com a situação a qual o Brasil vive neste momento, e emprega em sua letra uma rima forte e impactante.

Palavras-chave: Rap; Ideologias; Concepções.

This article aims to understand the meanings and meanings written in the lyrics of the song by singer and composer Mv Bill, an idol of national rap, with the purpose of enabling the understanding of his affable tendency. Based on his historiography and the case study in using the analysis of a song called: “Soldado do Morro”. The meanings and conceptions of the studied song that reports the objective and subjective dimension of dialectics. A bibliographical research was carried out obtaining guidelines from authors such as ORLANDI (2007), PÊCHEUX (1995) and BRANDÃO (1991). The aspects of music and ideologies are constituent elements of a direct discourse, in which the idea is the conviction of the individual-receiver that he can be a producer of history, and not just an influenceable social product. The song portrays the singer's displeasure with the situation in which Brazil is currently living, and uses a strong and impacting rhyme in its lyrics.

Keywords: Rap; Ideologies; Conceptions.

Introdução

Expor o pensamento por meio da linguagem é um desafio para o homem, desde os primórdios dos tempos. Dessa forma, o homem procura estudar o fenômeno da linguagem e sua evolução, fitando-a como ciência e buscar por meio da história explicar essa experiência de tecer e tramar a comunicação humana através da escrita e as outras formas de linguagem que possibilitam a interação social. A elaboração de um discurso conjectura de um processo dialético, ao passo que outros discursos são projetados em seu interior, e desta forma a linguagem trabalha como um instrumento de interação.

As formações imaginárias indicam o lugar em que emissor e recebedor atribuem a si mesmo e ao outro, à imagem que eles fazem de seu próprio lugar e do outro (Brandão: 1991. P. 34). Essa pluralidade de vozes existente no discurso provoca uma ruptura com a homogeneidade, expondo, assim, o caráter heterogêneo do discurso. A comunicação está ligada ao processo de permitir as relações sociais, em que se produz e reproduzem as convicções com o todo seu peso de contradições e harmonias, suas façanhas materiais, culturais e espirituais.

A Análise de Discurso (AD) é um processo que visa à desestruturação, à idealização e à captação incessante de seu objeto, no caso, o discurso. Surgiu com o debate de questões que pleiteiam contra o formalismo hermético da linguagem, no qual foi questionada a negação da exterioridade. A linguagem é gerada por meio de regras formais e estudos discursivos. O ser humano procura ao longo de sua vida tecer meios de comunicação, adquirir conhecimento para possibilitar a divulgação do pensamento através da condição humana.

O pensamento é o diálogo interior que a alma sustenta com ela mesma (Auroux: 1998, p. 34). O homem não criou apenas a linguagem, elaborou maneiras para representá-la por meio de sinais e símbolos.  A invenção da escrita cooperou de maneira fundamental para a comunicação e para o desenvolvimento da linguagem como ciência. Para Auroux (1998, p. 76), a história revela que nas civilizações em que houve aparecimento de um saber linguístico, este nasceu incontestavelmente depois de a escrita ter sido uma técnica dominada.

A abordagem adotada para com este artigo no sentido da análise da mídia sera o estilo musical chamado rap, e foi escolhida a letra da música “Soldado do Morro”, do cantor e compositor brasileiro Mv Bill. A música faz parte do seu álbum Traficando Informação, Gênero Rap, Hip Hop, lançado em 1999.

O artigo tem o objetivo de descrever e analisar o valor discursivo descrito na letra da música do cantor Mv Bill intitulada Soldado do Morro. Desse modo, pode-se observar se existe a preocupação do autor em continuar descrevendo todas as trágicas situações vividas nas periferias brasileiras e demonstrar de forma compreensível seus valores.

Desenvolvimento

Um dos pioneiros da Análise do Discurso (AD) francesa foi Michael Pêcheux, que concedeu uma grande base teórico-metodológica para o progresso da AD. Pêcheux baseia-se em Saussure, considerando, nele, o ponto de origem da ciência linguística. Os estudos de Saussure consideraram a língua como um sistema (emissor, código, receptor, mensagem e referente), o estatuto de objeto dos estudos linguísticos, excluindo-se a fale desse campo.  A AD é baseada em três linhas: linguística, marxismo e a psicanalise.

Interroga a linguística pela historicidade que ela deixa de lado, questiona o materialismo perguntando pelo simbólico e se demarca da psicanalise pelo modo como, considerando a historicidade, trabalha a ideologia como materialmente relacionada ao inconsciente sem ser absorvida por ele. (ORLANDI, 2007, p.20).

Para Ferdinand Saussure, a linguagem é social e individual; psíquica; psico-fisiológica e física. A língua é definida como a parte social da linguagem e que só um indivíduo não é capaz de mudá-la. Para Saussure, é um ato individual de vontade e inteligência. (SAUSSURE, 1995, p.22).

Os estudos de Pêcheux abordaram, de forma distinta, o entendimento da Ciência da Linguagem. Os debates sobre língua e linguagem divergiam de seus pensamentos. O estruturalismo (negação do sujeito e da situação) e a gramática gerativa transformacional (GGT) argumentada por Noam Chomsky preenchiam um espaço significativo de discordância em relação aos estudos da linguagem.

Dentro da Análise do Discurso, existe o interdiscurso que é definido como aquilo que se fala antes em outro lugar, isto é, o que se chama de memória discursiva. Segundo algum estudioso da AD não existe discurso desprovido de ideologia, tal como não há discurso que não apresente ou tenha a inscrição de outros já que todos apresentam perspectiva de suas relações com outros discursos.  

Na concepção de Michel Pêcheux, as proposições, expressões e palavras modificam de sentido segundo as posições sustentadas pelas pessoas que a empregam, sentidos que são determinadas em referência às formações ideológicas, nas quais se inscrevem estas posições. Dessa forma, uma formação discursiva sempre corresponde a uma dada formação ideológica.

Ainda Conforme Orlandi:

[...] a compreensão procura a explicitação dos processos de significação presentes no texto e permite que se possam “escutar” os outros sentidos que ali estão, compreendendo como eles se constituem. (ORLANDI, 2007, p. 26).

A AD é uma área da linguística que tem o objetivo de estudar a língua em movimento, enquanto produz sentido na pratica. Procura compreender não somente a palavra, mas também, o contexto social, o espaço em que ocorre o discurso e seus possíveis resultados. Sendo possível afirmar que a ideologia vem de uma pratica social, desse modo não é subjetiva, é um mecanismo que cria evidências e naturaliza sentidos para o sujeito a partir da posição em que ocupa.

Em seu discurso Pêcheux afirma que:

[...] a ideologia fornece evidencias pelas quais todo mundo sabe o que é um soldado, um operário, um patrão, uma fábrica, uma greve, etc., evidencias que fazem com que uma palavra ou um enunciado queira dizer o que realmente dizem. O discurso mais do que transmissão de informação é efeito de sentidos entre os locutores. [...] (Pêcheux, 1997, p.160).

A Análise do Discurso recusa as concepções de linguagem que a limitam como expressões do pensamento ou como instrumento de comunicação. O discurso é o ponto de ajuste dos processos ideológicos e dos fenômenos linguísticos.  A AD se mostra uma disciplina não acabada, está em constante mudança em que o linguístico é o lugar, o espaço que gera a materialidade, a espessura às ideias temáticas na qual o homem se faz sujeito – um ser concreto, histórico, mensageiro do discurso social.

A linguagem passa a ser um sistema de regras formais com os estudos discursivos. É atribuído valor à linguagem simbólica, com a divisão política dos sentidos, sendo que o sentido é instável.  O objeto de estudo deixa de ser a frase, e se concentra no discurso, buscando entender palavra por palavra na explanação, como uma continuidade fechada em si mesma.

Conforme Benveniste (2005, p.286), é na (e pela) linguagem que o homem se constitui como sujeito, por isso a linguagem não se configura em um utensilio ao bel prazer do homem. A partir dos estudos de Benveniste que é dada a noção de subjetividade com valor linguístico, isto é, a eficácia do homem de posicionar-se com sujeito. O sujeito apodera-se do pronome EU para designar a consciência de si.

Enfatizar a Análise

O rap teve seu início no final da década de 70 nos Estados Unidos, surgiu como uma expressão da juventude negra das periferias norte americanas. Espalhou-se rapidamente até chegar aqui no Brasil na década de 80. As músicas sempre falavam sobre a consolidação de uma identidade positiva e refletiam os problemas sociais vividos por pessoas das periferias das grandes cidades.

Para os cantores, o rap era a forma de fazerem suas denúncias sobre os problemas de suas comunidades. O estilo musical trazia para eles a diversão, prazer e, consequentemente, o desabafo das dificuldades vividas diariamente. No Brasil, o rap não está restringido somente a realidade dos negros, ganhou caráter denunciativo e, sobretudo, em fazer críticas sociais

Para Kehl (2010, p.684), as armas dominantes dos rappers em suas mensagens são: sua consciência, palavra e atitude. É dessa forma que os músicos chamam a atenção do seu público para a mudança de atitude, pensamento e, principalmente, a fazer suas escolhas individuais de forma consciente.

Um dos nomes do rap brasileiro destaca-se: MV Bill. Nesse contexto, utilizaremos uma de suas canções chamada “Soldado do Morro”, canção que trata da inclusão social e do retrato social do Brasil. Em 1990, o rapper Alex Pereira Barbosa – conhecido como MV Bill; nasceu, cresceu, e vive até hoje na Cidade de Deus, uma comunidade do Rio de Janeiro que, atualmente, é um dos aglomerados mais violentos da cidade.

MV Bill foi codiretor e coprodutor do filme Falcão: Meninos do Tráfico[2], consequentemente, após o sucesso transformou-se em um livro de grande sucesso e em seguida lançou mais dois livros chamados Falcão: Mulheres do Tráfico[3]e Cabeça de Porco[4]. Depois de idealizar estes trabalhos, MV Bill obteve uma visão mais realista das grandes periferias, com a experiência obtida ao longo da vida, o rapper vem lançando seus raps.

Seu talento consolidou cinco trabalhos: CD Mandando Fechado (1998); CD Declaração de Guerra (2002); CD Falcão: o Bagulho é Doido (2006); DVD Despacho Urbano (2009) e o CD Causa e Efeito (2010) (RIGHI, 2001, p. 149).

Diferentemente dos outros rappers, MV Bill resolveu ter a sigla MV (Mensageiro da Verdade), para se diferenciar e conseguir mostrar a realidade brasileira para os jovens negros que habitam as periferias. O rapper utiliza verdade para mostrar que sua ideologia é fundamentada na demonstração da mensagem verídica.

Análise da Letra Soldado do Morro

A canção retrata a história de um jovem que mora na periferia e por não ter muitas alternativas em sua vida se torna um soldado do tráfico de drogas, achando que conseguiria escapar da condição ruim que tem diante da sociedade.

Minha condição é sinistra/ não posso dar rolé, não posso ficar de bobeira na pista/ na vida que eu levo eu não posso brincar/ eu carrego uma nove e uma HK/ pra minha segurança e tranquilidade do morro/ se pá, se pam, eu sou ais um soldado morto/ vinte e quatro horas de tensão/ ligado na polícia, bolado com os alemão. [...] qualquer roupa agora eu posso comprar/ tem um monde de cachorra querendo me dar/ de olho grande no dinheiro esquecem do perigo/ a moda por aqui é ser mulher de bandido

Neste trecho da música, pode-se ver o tormento ético-político que vem da condição de horror, insegurança e tensão diária na vida dos jovens, que participam do tráfico de drogas nas periferias. Relata que a segurança do morro e dele mesmo o “soldado”, é garantida por ele e suas armas de grosso calibre. A morte é um fato que todos eles sabem que pode acontecer a qualquer momento para quem fica de “bobeira na pista”.

A calvário ético-político descreve a vivencia do dia a dia das questões sociais fundamentais em cada período da história, principalmente a dor que surge da situação social de ser olhado como uma pessoa inferior e um inútil da sociedade. O autor denuncia a condição de debilidade e de pouco valor vivida pelo personagem, que por achar outra alternativa acaba se relacionando com o tráfico de drogas.

Ao mesmo tempo em que a vida de “soldado do morro” é tensa, perigosa e cheia de aflição, tem a afirmação que ela também é boa pode se justiçar em “condição sinistra” passa a ideia de que pertencer ao tráfico de drogas a pessoa adquire status sociais “qualquer roupa agora eu posso comprar”, mostra que trabalhando para o tráfico ele consegue comprar as roupas da moda e ser uma pessoa diferente na comunidade e consegue se destacar para com as mulheres que são tratadas como “cachorras ”, pois elas somente se interessam por quem trabalha no tráfico.

Várias vezes me senti menos homem/ desempregado e meu moleque com fome/ é muito fácil vir aqui me criticar/ a sociedade me criou, agora manda me mantar/ me condenar e morrer na prisão/ virar notícia de televisão/ seria diferente se eu fosse mauricinho, criado a sustagem e leite ninho/ colégio particular, depois faculdade/ não, não é essa minha realidade/ sou caboquinho comum, com sangue no olho, com ódio na veia soldado do morro [...] já pedi esmola, já me humilhei/ fui pisoteado só eu sei o que eu passei/ eu to ligado, não vai justificar/ meu tempo é pequeno não sei quanto vai durar [...] depois de muito tempo, sem vaga no momento/ a mesma história todo dia é foda/ é isso tudo que gera revolta.

Aqui, o autor relata o fato de estar sem emprego e se sente humilhado e envergonhado por ser mais um “desempregado” e seu filho estar com fome “o moleque com fome”, ele como pai gostaria de poder dar a sua família uma vida digna e conseguir comprar os bens materiais consumidos pela sociedade, essa situação faz com que ele se sinta “menos homem”.

Para (Vitalle, 2002, p.118), “A vergonha é um sentimento moral que nos inibe limita a nossa ação, encolhe nosso corpo e pode nos reduzir ao silencio, nos excluir”. Nesse aspecto, o “soldado do morro” é uma pessoa submetida à escravidão pelo ponto de vista do outro que incrimina nele os sentimentos de humilhação e vergonha.

“Já pedi esmola, já me humilhei” na falta de alternativas para sobreviver ele se sujeitou a pedir esmola, se humilhar diante de outra pessoa para conseguir algo. Em “a mesma história todo dia é foda e isso tudo gera revolta”, ele cansado de se sentir envergonhado e humilhado. Cansou-se de viver isso todos os dias, o que ocasiona uma revolta. A sua luta diária em tentar melhorar e não conseguir, enquanto outros conseguem tudo.

A desigualdade social relatada na música mediocriza a culpa do indivíduo por “seu fracasso”, como um consumidor da sociedade capitalista. Quem não consegue viver no luxo pregado pelo capitalismo é “condenado” jogado para “morrer na prisão” e possivelmente “virar notícia de televisão” pois a pessoa busca no crime conseguir seus bens. A condição de desigualdades sociais rotula a pessoa como “caboquinho comum com sangue no olho e ódio na veia” ou, simplesmente, como um “fora da lei”, de forma que ele passa a se identificar dessa forma.

O modo como a sociedade está organizada contribui para que o sujeito se torne um “soldado do morro”. O autor da canção expressa isso, porque o “soldado do morro” geralmente é nego, pobre e morador de periferia, mas se fosse “mauricinho criado a sustagem e leite ninho” a história desta vida seria totalmente diferente.

Eu tô ligado qual é, sei qual é o final/ um saldo negativo, menos um marginal/ pra sociedade contar um a menos na lista e engordar a triste estatística/ de que jovens como eu que desconhecem o medo/ seduzidos pelo crime desde muito cedo/ mesmo sabendo que não há futuro/ eu não queria tá nesse bagulho/ já to no prejuízo um tiro na barriga/ [...] não sei se é pior virar bandido/ ou matar por um salário mínimo.

Nessa parte da música, fica claro que o indivíduo ao entrar para o tráfico, ele tem em sua mente que continuará na condição de excluído independentemente da quantidade de dinheiro, fama ou poder que possa ter.  Ele sabe que ter se tornado um “soldado do morro” sua situação perante a sociedade piorou ele se torna um desqualificado social pois sua “condição sinistra” certifica a posição de “marginal”, ainda que esteja tentando construir aquilo que a sociedade não lhe ofereceu diretamente, ou seja, um projeto de vida melhor.

O tráfico de drogas lhe oferece mesmo que, contraditoriamente, uma saída extrema para conseguir sair da condição vergonhosa, humilhante e de medo, ao tempo em que o tráfico permite o acesso ao dinheiro, poder e fama na comunidade. O sujeito sabe que tudo isso é passageiro “mesmo sabendo que não há futuro” ele prefere arriscar.

eu no crime ironia do destino/ minha mãe ta preocupado seu filho ta perdido /enquanto não chegar a hora da partida/  agente se cruza nas favelas da vida/  feio e esperto com uma cara de mal/  a sociedade me criou mas um marginal/  eu tenho uma nove e uma hk/  com ódio na veia pronto para atirar feio e esperto com uma cara de mal/  a sociedade me criou mas um marginal/  eu tenho uma nove e uma hk/  com ódio na veia pronto para atirar/  feio e esperto com uma cara de mal/  a sociedade me criou mas um marginal/  eu tenho uma nove e uma hk/  com ódio na veia pronto para atirar/  feio e esperto com uma cara de mal/  a sociedade me criou mas um marginal/  eu tenho uma nove e uma hk/  com ódio na veia pronto para atirar/  feio e esperto com uma cara de mal/  a sociedade me criou mas um marginal/  eu tenho uma nove e uma hk/ com ódio na veia pronto para atirar.

MV Bill termina a música apresentando que o “soldado do morro” sabe que a qualquer momento pode morrer e que ele sera “menos um marginal”. A personagem pensa em sua “mãe preocupada com seu filho ta perdido”, nesse sentido ele sabe que seu tempo no tráfico é curto. Ele prefere arriscar sua vida, porque não sabe se “é pior virar bandido ou se matar por um salário mínimo”.

A carência em ser reconhecido como pessoa diante da sociedade que leva o indivíduo da canção a se torna um “soldado do morro”. O soldado do morro aparece como uma alternativa de recuperar mesmo sendo por meio da marginalidade, o reconhecimento social que sua conjuntura estigmatizada lhe impossibilita.

Conclusão

O estilo musical rap tornou-se um instrumento de inserção do negro no retrato social brasileiro, ajuda a revelar as situações irregulares vivenciadas por eles, sendo uma maneira de manifestar e fazer a denúncia social e política. Os discursos sempre estão ligados a questões históricas e sociais, sempre tentando sensibilizar aqueles que se disponibilizam a dar atenção a essa manifestação.

As mensagens que MV Bill traz em suas músicas tem caráter político social e coloca o poder político como principal responsável pelo caos social. Dessa forma o rapper se torna um porta voz do seu grupo étnico na batalha por melhores condições de vida para as comunidades marginalizadas.

Fundamentado na perspectiva sócio-histórica pode-se configura que a música é um indicador de uma práxis ético-política, de modo que ajuda o jovem a compreender e aceitar que ele pode lutar e ser melhor do que aquilo que está vendo diariamente pode buscar ser um cidadão de bem e ter uma vida digna.

O homem procura ao longo de sua vivencia, criar e reinventar meios de comunicação, suportes do conhecimento que podem possibilitar a transmissão da condição humana. A relação do pensamento e a palavra não é uma coisa, mas um processo. A estrutura da linguagem não se reflete como em um espelho a estrutura do pensamento, o pensamento passa por alterações a se transformar em fala.

O homem é capaz de escreve sua própria história e pode transformar o mundo a partir da tomada de decisão. O sujeito pode lutar e chegar em qualquer lugar diante da sociedade, mas para isso ele deve ter em sua consciência que para isso ele deve ter o domínio da sua voz dentro da sociedade. A atribuição não é fácil para pessoas sem condições e vivem nas periferias das cidades, local onde a educação de qualidade é praticamente impossível.

REFERÊNCIAS

AUROUX, Sylvain. A filosofia da linguagem. Tradução de José Horta Nunes. Campinas: UNICAMP,1998.

BENVENISTE, Emile. Problemas de Linguística Geral I. Campinas: Pontes, 2006.

BRANDÃO, Helena H. Nagamine. Introdução à análise do discurso. 4. Ed. Campinas, SP: Editora da Unicamp, 1991.

Desvendando os segredos do texto/ 5. ed. São Paulo: Cortez; 2006. ORLANDI, Eni Puccinelli. Análise de Discurso: princípios e procedimentos/ Eni P. Orlandi – 3. ed. Campinas, SP: Pontes, 2001.

KEHL, Maria Rita. As frátrias órfãs. In: PEREIRA, Edimilson de Almeida (org.). Um tigre na floresta de signos: estudos sobre poesia e demandas sociais no Brasil. Belo Horizonte: Mazza Edições, 2010, p. 683 – 699.

ORLANDI, Eni P. Análise do discurso: princípios e procedimentos. 7 ed. Campinas, SP: Pontes, 2007.

PÊCHEUX, M. Semântica e discurso: uma crítica à afirmação do óbvio. Tradução de Eni P. Orlandi. 2.ed. Campinas: Unicamp, 1995 [1975].

RIGHI, Volnei José. Rap: ritmo e poesia. Construção indenitária do negro no imaginário do RAP brasileiro. Brasília: UNB, 2011.

SAUSSURE, F. Curso de Linguística Geral. Trad. De Antônio Chelini, José Paulo Paes e Izidoro Blikstein. São Paulo: Cultrix, 1995.

VAGALUME. MV Bill, Soldado do Morro. Disponível em: < https://www.vagalume.com.br/mv-bill/soldado-do-morro.html>. Acesso em: outubro de 2018.

VITALLE, M. A. F. (2002). O obscuro sentimento da vergonha. In B. B Sawaia & M. R. Namura (Orgs.), Dialética exclusão/inclusão: reflexões metodológicas e relatos de pesquisas na perspectiva da psicologia social crítica (pp. 115- 127). Taubaté: Cabral Editora Universitária.

ZIMERMAN, David. E. Grupos de educação médica. In: Fundamentos básicos das grupo terapias. 2. ed. Porto Alegre: Artmed, 2000.

[1] Graduado em Gestão Pública, Filosofia e Licenciado em Letras - Língua Portuguesa; e-mail wendelf.lima@yahoo.com.br

[2]Foi um documentário sobre jovens que vivem em comunidades dominadas pelo tráfico de drogas e consequentemente sobrevivem trabalhando por meio do tráfico. O autor retrata a rotina de dezesseis jovens e destacou o lado humano dessa classe de forma emocional e comovente.

[3] Falcão: Mulheres do Tráfico (2010), semelhante a lógica do primeiro documentário só que agora ele retrata a vida de mulheres que são atraídas pelo tráfico de drogas.

[4] Cabeça de Porco (2005) traz na sua essência uma visão realista das periferias do Brasil local onde o tráfico de drogas é implacável. Autores Luiz Eduardo Soares, MV Bill e Celso Athayde desejavam uma vida melhor para pessoas que vivem nesses locais.


Publicado por: WENDEL FERREIRA LIMA

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