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O texto, o leitor e o contexto: A leitura numa perspectiva interacionista

Incentivo à leitura.

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RESUMO

O incentivo à leitura sempre foi uma tarefa árdua e desafiadora para o professor em suas aulas de leituras. Infelizmente, ainda não se encontrou a 'formula' exata para desenvolver e criar nos educandos o interesse pelo universo das leituras. Mas, o que se pode e deve fazer como estímulo fundamental, é apresentar o "valor" triunfante que a leitura traz para as pessoas que dela fazem uso e, o seu progresso na abertura de 'portas' para um futuro eficaz e próspero na vida do cidadão que lê. Este trabalho visa discutir as concepções de leitura que norteiam as práticas pedagógicas no Ensino Fundamental, e priorizar a prática de leitura baseada num viés interacionista, uma vez que concebe a leitura como um processo do qual participa o leitor, o seu contexto e conhecimento de mundo, bem como o autor do texto e, este, por sua vez, deixa “pistas” ao longo do texto para tornar possível a atribuição de sentidos.

PALAVRAS-CHAVE: Concepções, leitura, interacional, prática pedagógica.

O que se percebe no atual contexto da sociedade ou restringindo-se a uma das esferas que a compõem: o contexto escolar, dentro dele, o ato de ler, o desenvolvimento da leitura se tornara defasado, desinteressante, desprazeroso. Tornando-se perceptível que a leitura muitas vezes foge ao seu papel inicial, de formar e construir o pensamento crítico, pelo qual o leitor poderá intervir no seu contexto e/ou usufruir de um universo plurissignificativo que os textos oferecem.

Apresentando-se com uma multiplicidade de gêneros, a noção de texto ultrapassa o próprio limiar de seu significado, isto é, como a própria significação, pode-se encontrar variadas categorias de texto, já que o mesmo é parte do cotidiano da sociedade.

Sendo assim, […] “pode-se definir texto, hoje, como qualquer produção lingüística [sic.], falada ou escrita, de qualquer tamanho, que possa fazer sentido numa situação de comunicação humana, isto é, numa situação de interlocução”. (COSTA VAL, 2004, p. 113).

Por conseguinte, pode-se inferir que todo ato de interlocução, que envolva duas ou mais pessoas, e que se construa uma produção discursiva, considera-se texto, mas torna-se necessário ratificar que há interlocução, também entre o sujeito e o texto. Todavia, o envolvimento do leitor com o texto, além de um ato de interlocução, proporciona ao leitor um sentido, sendo que este não é oferecido pelo texto, mas criado a partir do contato com o mesmo.

Gomes & Souza (2010, p. 3) afirmam que a noção básica que se tem de texto é de que ele é apenas […] “um conjunto de palavras escritas sem muita significação ou um depósito de mensagens e informações a serem reproduzidas”. Nesta perspectiva, o texto é visto apenas como um objeto desinteressante e empregado de maneira errônea, enfraquecendo o interesse do leitor, que pelo contrário deveria ser instigado pela curiosidade de desbravá-lo.

Logo, para corroborar o interesse do leitor, deve-se desenvolver as capacidades textuais, que segundo Gomes e Souza (2010, p. 4), classificam-se em:

  • “A formativa, que permite o usuário da língua criar, entender e avaliar um número significativo de texto;
  • A transformativa, que possibilita modificar, resumir, parafrasear um texto, julgando apropriadas ou não as transformações feitas;
  • E a qualitativa, que torna possível classificar e produzir os diferentes tipos de textos”.

No entanto, torna-se necessário ratificar que para serem desenvolvidas as capacidades textuais é relevante o contato do leitor com o texto, nas diversas situações do seu cotidiano, havendo uma espécie de iniciação ao universo da leitura, já que é através dela que o indivíduo interage com o texto.

Desde a década de 70 do século passado, as diferentes abordagens teóricas cujo objeto de estudo é a leitura variam de foco, ora se encontram no sistema linguístico – o texto (modelos ascendentes de leitura), ora no leitor por meio das teorias cognitivas (modelos descendentes de leitura), e também na interação leitor/texto (modelos interacionais). Todas essas formas de apreensão da leitura influenciam claramente o ensino de língua, por isso para se compreender melhor cada uma dessas concepções que circundam a prática da leitura, Duran (2009) explícita as particularidades de cada uma delas:

  • Concepção Bottom-up – considera a decodificação do texto como processo do ato de ler, no qual a partir da decodificação de palavras o leitor compreende o texto, entende o seu sentido. Nesta perspectiva, o texto oferece seu próprio sentido; essa concepção de leitura também é denominada ascendente.

Com forte influência estruturalista, a leitura é concebida como uma extração de sentidos que se encontram no texto, num trabalho de decodificação sonora da palavra escrita. Nessa perspectiva, cada palavra do texto é importante, ao leitor cabe ser um receptor passivo dessas informações, pois o texto em si já diz tudo. Nessa lógica, Leffa (1999, p.18) afirma [...] “daí que a construção do significado não envolve negociação entre o leitor e o texto e muito menos atribuição de significado por parte do leitor; o significado é simplesmente construído através de um processo de extração.”

Uma das influências dos modelos ascendentes de leitura no ensino diz respeito às perguntas de interpretação de textos que na maioria das vezes são de uma obviedade que não é nem necessário reler o texto para responder. As informações textuais estão explicitamente destacadas, sem ser preciso aprofundar-se para encontrá-las. Os processos que o leitor executou para compreender o texto não interessam aos modelos ascendentes de leitura. Leffa (1999, ibidem) observa que [...] “o processo de compreensão, por não poder ser explicado empiricamente, é visto simplesmente como uma caixa preta – um processo mais ou menos mágico”.

A perspectiva textual sofreu críticas dentre elas a seguinte: se o texto é o portador de sentidos então cada leitor só poderá dar uma significação a esse texto, claro que isso não se sustenta, tendo em vista que cada leitor partilha de um conhecimento de mundo diferente, e um mesmo leitor pode ler um mesmo texto de diferentes formas, acionando significados diversos.

A compreensão, nesse caso, dá-se de maneira automática, pois, uma vez que o leitor é capaz de decodificar, ele é automaticamente conduzido ao sentido dessa palavra, o que resultaria na imediata compreensão do texto. (LEFFA, 2009, p. 4).

  • Concepção Top-down – contrapõe-se a concepção anterior; neste caso o leitor constrói o sentido do texto a partir da leitura e segundo uma bagagem cognitiva já adquirida.

Essa concepção, também chamada de descendente. Refere-se às teorias cognitivas de base psicolinguística e defendem a ideia de que o sentido do texto reside não no texto, mas no leitor, nessa lógica a leitura se caracteriza pela atitude ativa do leitor, que utiliza seu conhecimento linguístico, seu conhecimento textual e de mundo no processo de compreensão.

As implicações no ensino relacionam-se à ênfase dada a formulação de hipóteses sobre o texto. Perguntas do tipo: O que você acha que o autor quis dizer... Tais indagações possibilitam ao leitor dar a resposta que achar mais plausível, o que nem sempre corresponderá ao que realmente o texto significa.

Assim, a prática de leitura é vista como uma atribuição de significados por parte do leitor que utiliza estratégias de leitura cuja influência está nos objetivos que permeiam o ato de ler, pode ser para se informar, para se entreter, dentre outras finalidades. As críticas a esse modelo alegam que ele não considera o social, além disso, como o significado está sob o poder do leitor este pode atribuir o significado que lhe convier. Desse modo, Leffa (idem, p.28) afirma que [...] “a compreensão não é ditada por um juiz, autoridade ou academia, mas pela relação que se estabelece entre o texto lido e a experiência vivida pelo leitor.”

  • Concepção interacionista – segundo esta concepção há o hibridismo das concepções anteriores, isto é, o processo de leitura

[…] não apenas enfatize o papel do leitor ou do texto, mas que aceite que o produto da relação entre leitor e texto é o sentido da leitura. Isso quer dizer que a interação entre texto e leitor ocorre de maneira a se retomarem ora a perspectiva do leitor, ora a do texto, conforme a necessidade para cada situação de leitura. (DURAN, 2009, p. 4).

As concepções interacionistas consideram a leitura como um processo cognitivo e perceptivo, o prática leitora condensa tanto as informações presentes no texto, como as informações que o leitor traz consigo e a construção dos sentidos ocorre através da interação entre leitor e texto. Solé (1998) considera o modelo interacional como o mais apropriado para o entendimento do ato de leitura como um processo de compreensão, do qual participam tanto o texto, sua forma e conteúdo, quanto o leitor, suas expectativas e conhecimentos prévios.

Para essa abordagem, o leitor usa a sua competência enquanto leitor e interage com o autor, por meios de técnicas interpretativas, seguindo as “pistas” que o autor sugere ao longo do texto, para que consiga chegar às suas conclusões. Diante disso, defende-se os modelos interacionais como os que mais contemplam a dinâmica que cerca o ato de ler, visto que não há uma supremacia nem do texto, nem do leitor, mas uma relação interativa entre ambos na construção dos sentidos.

As concepções abordadas acerca de leitura não a limita, pois como o próprio texto, a mesma apresenta-se diversificada. No entanto, tais concepções ratificam que o processo de leitura é visto como um ato interacional, pelo qual se constroe o conhecimento. Isto é, levando em consideração o próprio texto, as informações que o cercam e bem como o conhecimento prévio do leitor, que a partir do híbrido de ambos, se construirá o sentido.

Entende-se, assim, que ler é apropriar-se de um produto cultural, gerado intencionalmente por um ou mais agentes históricos. O ato de ler expande o leque de experiências do ser enquanto criança ou adulto, percebendo novas formas de conceber o mundo e a si mesmo. São múltiplas as possibilidades de abertura de horizontes quando o ser se apropria do ato de ler. (SANTOS-THÉO, 2003, p. 2)

Sendo assim, o ato de ler deveria ser instigado e provocado, desde os anos iniciais de todo indivíduo. Pois, ele a partir da leitura e da leitura de seu próprio mundo construiria o conhecimento.

A velha casa, seus quartos, seu corredor, seu sótão, seu terraço – o sítio das avencas de minha mãe -, o quintal amplo em que se achava, tudo isso foi meu primeiro mundo. Nele engatinhei, balbuciei, me pus de pé, andei, falei. Na verdade, aquele mundo especial se dava a mim como o mundo de minha atividade perceptiva, por isso mesmo como o mundo de minhas primeiras leituras. Os “textos”, as “palavras”, as “letras” daquele texto – em cuja percepção experimentava e, quanto mais o fazia, mais aumentava a capacidade de perceber-se encarnavam numa série de coisas, de objetos, de sinais, cuja compreensão eu ia apreendendo no meu trato com eles nas minhas relações com meus irmãos mais velhos e com meus pais. (FREIRE, 1989, p. 9)

O contexto contribui de forma significativa na construção da leitura de mundo de todo indivíduo, assim como afirma Freire (1989), a interação do sujeito com o seu contexto irá possibilitar a construção de leituras diversificadas do próprio mundo e de qualquer texto. E, apenas ratificando o que fora dito, deve haver o constante contato do indivíduo ao universo do texto e da leitura. Devendo ser, este processo intensificado no contexto escolar, possibilitando um maior aprendizado e desenvolvimento do conhecimento.

Sendo assim, o professor deve garantir um contato maior do estudante a este universo e

Para começar, muitos livros. Garantir o contato com as obras e apresentar diversos gêneros às crianças pequenas é a principal função dos professores de Educação Infantil para desenvolver os comportamentos leitores e o gosto pela literatura desde cedo. (MEIRELLES, 2010, p. 50).

Logo, torna-se perceptível a estreita relação entre o texto, o leitor e o contexto; sendo que o leitor é o elo construtor dos significados construídos a partir de seu contexto e do texto. E portanto, a partir dessas relações, a concepção de leitura que o educador deve adotar é a interacionista que tem sua origem nas linhas diagnósticas, cognitivo-processual e discursiva, superando a leitura como mera decodificação de letras, palavras e sentenças, mas sim a leitura como uma construção do significado, numa perspectiva de interação entre estes dois mundos: o do autor e do leitor do texto, criando e recriando mundos, trazendo luz à escuridão da ignorância.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

COSTA VAL, Maria da Graça. Texto, textualidade e textualização. In: J.L. Tápias Ceccantini; R.F> Pereira & J. Zanchetta Jr. (orgs), Pedagogia Cidadã: Cadernos de formação: Língua Portuguesa, v. 1. São Paulo: UNESP, prograd. 2004.

DURAN, Guilherme Rocha. As concepções de leitura e a produção do sentido no texto. Revista Prolíngua – ISSN 1983-9979. Volume 2, número 2 – Jul./Dez. De 2009.

FREIRE, Paulo. A importância do ato de ler: em três artigos que se completam. São Paulo: Autores Associados: Cortez, 1989.

GOMES, F. F. L. & SOUZA, J. M. R. Os caminhos para um ensino produtivo de Língua Portuguesa. V Semana de Letras – Linguagem e entrechoques culturais. Língua, literatura e cultura brasileira. Catolé do Rocha – PB, 2010.

LEFFA, V. Perspectivas no estudo da leitura: texto, leitor e interação social. In: __________; PEREIRA, ARACY. O ensino de leitura e produção: alternativas de renovação. Pelotas: Educat, 1999.

MEIRELLES, Elisa. Literatura, muito prazer. Nova escola, a revista de quem educa. Ano XXV, nº 234, agosto de 2010.

SANTOS-THÉO, Irismar Oliveira. O ato de ler. Revista de educação CEAP – Ano 11 – nº 41 – Salvador, jun/2003.

SOLÉ, Isabel. Estratégias de leitura. Porto Alegre: Artmed, 1998.


Publicado por: Marcos Rosendo

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