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Livros, canetas e lágrimas: O cotidiano escolar de crianças e adolescentes que sofrem Bullying e seus reflexos no cotidiano escolar

O cotidiano escolar de alunos que sofrem bullying.

O texto publicado foi encaminhado por um usuário do site por meio do canal colaborativo Meu Artigo. Brasil Escola não se responsabiliza pelo conteúdo do artigo publicado, que é de total responsabilidade do autor . Para acessar os textos produzidos pelo site, acesse: https://www.brasilescola.com.

Discutir o insucesso escolar a primeira vista parece voltar a um tema debatido exaustivamente, no entanto, diferentes variáveis podem contribuir para desencadear dificuldades de aprendizagem. Procurar identificar a causa e reverter o processo, exige uma articulação que ultrapassa as paredes da sala de aula e apresenta um universo de sentimentos e atores nem sempre reconhecidos como protagonistas do drama que acomete grande número de alunos.

A aprendizagem só acontece de fato quando o sujeito é compreendido em sua totalidade. Ter as bases biológicas adequadas, por si só não é garantia de que o aluno irá aprender. Ele só passará a construir significados e dar sentido ao que aprende na medida em que compreender a importância que terá para a sua vida, aquilo que está aprendendo. Desse modo, irá despertar o desejo pela aprendizagem e a partir daí passará a assimilar os conteúdos.

No livro Os Sete Saberes Necessários à Educação do Futuro, Morin trata da condição humana e das suas necessidades inerentes. Ele afirma que:

“Todo desenvolvimento verdadeiramente humano significa o desenvolvimento conjunto das autonomias individuais, das participações comunitárias e do sentimento de pertencer a espécie humana.” (MORIN,2000, p.55 ).

Parece claro afirmar que a criança aprende através da imagem de si mesma que recebe do outro. Quando essa imagem é comprometida através de constantes agressões sofridas por colegas no ambiente escolar, o aluno responde emocionalmente com baixa auto estima, depressão, entre outros problemas. As vítimas de bullying constantemente apresentam diferentes disfunções que têm sido muitas vezes negligenciadas pelos adultos. Quando são percebidos sinais e busca-se algum tipo de ajuda, a situação pode tomar rumos diferentes. No entanto, reações diferentes acontecem nesse cenário; pode acontecer da família achar que é bobagem e que a criança precisa aprender a se defender sozinha; outras vezes a família compreende a gravidade do problema e busca o apoio da escola, mas esta nem sempre está pronta para responder a essa demanda. O bullying desperta variadas reações e situações imprevisíveis, o que é previsível e assustador é o poder de destruição que esse cotidiano escolar permeado de frustração causa nos alunos envolvidos.

É fundamental que a família conheça o problema e perceba a necessidade de interferir efetivamente. Sua participação é de extrema importância, tendo em vista que exerce um papel insubstituível na formação do indivíduo. Carvalho e Almeida apresentam no trabalho intitulado Família e Proteção Social, uma discussão que aponta a necessidade de que esse papel seja reconhecido em todas as esferas da vida:.

“Constituída com base nas relações de parentesco cultural e historicamente determinadas, a família inclui-se entre as instituições sociais básicas. Com o desenvolvimento das ciências sociais, ampla biografia internacional tem analisado suas diversas configurações e destacado sua centralidade conforme a reprodução demográfica e social. A família é apontada como elemento-chave não apenas para a “sobrevivência” dos indivíduos, mas também para a proteção e a socialização de seus componentes, transmissão do capital cultural, do capital econômico e da propriedade do grupo, bem como das relações de gênero e de solidariedade entre as gerações.” (CARVALHO, ALMEIDA, 2003, p.1).

Assim sendo, é preciso haver uma articulação entre família e escola para que juntos possam enfrentar e vencer o bullying, uma vez que sozinhos, os pequenos permanecerão presos ao problema, gerando reações negativas para todas as partes.

As vítimas têm sua auto-estima destruída e seus projetos ameaçados pela constante vergonha sofrida, impedindo que sua mente possa abrir espaço para novas descobertas e conquistas. Os agressores permanecem num equívoco que poderá comprometer seu caráter e seus valores, afetando assim seu rendimento escolar, social, com consequências imprevisíveis para o futuro.

Onde está o professor nesse contexto? No livro A Pedagogia na Escola das Diferenças, Perrenoud avalia a relação professor x aluno, considerando a dificuldade do professor em aceitar determinadas posturas, bem como, até que ponto os alunos estão dispostos a confiar em alguém que faz julgamentos a seu respeito, através de avaliações nem sempre justas. O autor lembra que na verdade o professor informalmente acaba conhecendo muito da vida dos seus alunos, no entanto, ele não apreende a importância dessas informações e acaba por descartá-las ao longo de sua prática cotidiana. Nesse aspecto, ele defende que o professor precisaria dispor de um esquema de classificação e registro de tais informações para poder fazer uso adequado delas. Perrenoud lembra que diferentes profissionais desenvolvem seu trabalho de modo personalizado, como médicos, psicólogos e assistentes sociais, dispondo assim de condições adequadas para compreender a individualidade das pessoas para as quais trabalham; o autor defende que se a profissão de professor tivesse sido pensada da mesma forma, não haveria uma incidência tão grande fracasso escolar, uma vez que não haveria dificuldade alguma para compreender a diferenciação de percurso de cada aluno e ajudá-lo a encontrar o caminho adequado para alcançar o sucesso escolar.

Nesse sentido, avaliar o desempenho escolar de um aluno, exige minuciosa atenção aos aspectos envolvidos, uma vez que a omissão poderá causar danos que serão sentidos por toda a trajetória escolar e assim comprometer os caminhos profissionais que serão ou não seguidos a partir dos meios encontrados para sua efetivação.

O papel da educação nesse processo compreende uma gama de responsabilidades que precisam ser reconhecidas e adotadas. De acordo com Morin:

“ [...] a educação deveria mostrar e ilustrar o Destino multifacetado do humano: o destino da espécie humana, o destino individual, o destino social, o destino histórico, todos entrelaçados e inseparáveis. Assim, uma das vocações essenciais da educação do futuro será o exame e o estudo da complexidade humana.” (MORIN,2000, p.61).

Partindo desse entendimento, averiguar o quanto o bullying poderá afetar o desempenho escolar dos alunos envolvidos, tanto os agressores quanto os agredidos e investigar as variáveis que influenciam a problemática em questão, parece de fundamental importância para estabelecer novos acordos e oferecer outras possibilidades aos diferentes atores do ambiente escolar.

A psiquiatra Ana Beatriz Barbosa Silva, autora do livro: Bullying: mentes perigosas nas escolas, trata do tema com excessiva rigidez aos bullies(denominação usada para definir quem pratica bullying), desconsiderando o fato de que crianças e adolescentes são seres em formação e como ela mesma reconhece podem se tornar bullies por diferentes razões, inclusive como consequência de momentos de dificuldades circunstanciais.

Bourdieu afirma com convicção, o caráter socialmente condicionado das atitudes e comportamentos individuais. No seu entendimento, tudo seria socialmente constituído.

Fica demonstrado que o sistema escolar precisa se debruçar sobre esse tema e reconhecer que negligenciá-lo poderá contribuir para retardar ou mesmo impedir o pleno desenvolvimento de crianças e adolescentes. O Brasil possui uma das legislações mais avançadas na área da infância e da juventude. O Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, criado pela Lei 8069/90 assegura os direitos fundamentais desse segmento e afirma em seu Art. 5º:

“Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais.” (ECA, Art.5º).

Pensar em todos esses elementos e encontrar caminhos para ajudar os atores envolvidos no bullying não é uma tarefa simples, muitas variáveis precisam ser consideradas. Vale a pena questionar:

- As crianças envolvidas com bullying apresentam uma queda no desempenho escolar?

- Existem indicadores que comprovem uma queda nesse desempenho, após a ocorrência constante de bullying?

- O sistema escolar tem apresentado uma resposta especializada para reverter essa situação?

- Como as famílias dos alunos envolvidos têm reagido ao bullying?

- Quem são os bullies?

- Como estão envolvidos no processo de aprendizagem?

- Como poderemos ajudá-los?

- Os reflexos do bullying no desempenho escolar variam de acordo com a classe social em que os alunos estão inseridos?

Identificar as variáveis e encontrar respostas para tais hipóteses permitirá novos encaminhamentos acerca do assunto. O projeto de pesquisa “LIVROS, CANETAS E LÁGRIMAS: O COTIDIANO ESCOLAR DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES QUE SOFREM BULLYING E SEUS REFLEXOS NO DESEMPENHO ESCOLAR" pretende tornar possível a articulação necessária entre teoria e prática para compreender e vencer a problemática em questão.


Publicado por: Maria Aparecida Cunha de Souza

O texto publicado foi encaminhado por um usuário do site por meio do canal colaborativo Meu Artigo. Brasil Escola não se responsabiliza pelo conteúdo do artigo publicado, que é de total responsabilidade do autor . Para acessar os textos produzidos pelo site, acesse: https://www.brasilescola.com.